Monday, April 30, 2012

OS PROTAGONISTAS

Quatro dias depois de um conjunto de personagens públicas terem anunciado e concretizado não comparecerem na Assembleia da República ainda ouço na televisão o inevitável professor Marcelo ser chamado a responder à questão que abalou as celebrações de Abril: Foi ou não foi o desejo de protagonismo que levou os contestatários a não comparecer?

Marcelo, à semelhança da generalidade dos comentadores da praça, não aprova as não comparências mas considera que não foi a busca de protagonismo que motivou as suas decisões. E porquê? Porque todos eles, uns mais que outros, são sobejamente conhecidos para pretenderem mais protagonismo. Aliás, essa foi a resposta dada por Mário Soares a Passos Coelho quando este (sem nomear a quem se dirigia) disse (e não devia ter dito) que as anunciadas ausências decorriam do normal desejo de alguns quererem protagonismo em ocasiões destas.

Marcelo há muito que iniciou a sua campanha como candidato às próximas eleições presidenciais e, para o efeito, dispõe de palco duradouro e bem remunerado. Não lhe convêm posições públicas fracturantes e precisa de votos à esquerda do seu partido. Por tal motivo, nunca neste, como em casos com configurações semelhantes, lhe interessarão interpretações que passem para além do óbvio à primeira vista.

Porque há outra perspectiva pelo menos tão óbvia como a mais politicamente correcta.
É óbvio que, salvo muito raras excepções,  uma personagem pública (da política, do futebol, da televisão, etc.) nunca considerará, enquanto puder, que o seu protagonismo é suficiente enquanto ele não chegar ao fim. Do mesmo modo que um ricalhaço nunca abdicará de procurar mais fortuna mesmo que não precise de mais nenhuma.

Precisa um multimilionário de ser mais rico? Precisa pela sua atitude de necessidade incontida de mais riqueza.
Precisa Mário Soares de mais protagonismo? Precisa pela sua atitude incontida de intervir publicamente mesmo que algumas dessas intervenções possam ser geralmente reprovadas.

Dos protagonistas do 25 de Abril, recordo-me de apenas um, que após ter cumprido o papel principal que lhe tinha sido atribuído nas acções militares desse dia, dispensou todas as oportunidades e honrarias, licenciou-se em Ciências Políticas e Sociais, foi transferido para os Açores em 1979 e  colocado dois anos depois como comandante do presídio militar de Santa Margarida.
Chamava-se Fernando José Salgueiro Maia, morreu há 20 anos, a 4 de Abril.

Ficará na história como o herói  maior daquele dia em que mudou Portugal.

Sunday, April 29, 2012

DIGAM-ME QUE NÃO É VERDADE

Digam-me que isto não é verdade


O ESTADO DA DESUNIÃO - 2



O Economist publica esta semana  nova edição do seu mapa interactivo dos principais indicadores que caracterizam a situação económica, financeira e social da União Europeia em cada dos seus países membros. Basta clicar para espreitar.

O artigo que incorpora este mapa - funny money, fuzzi maths - reporta as dificuldades que se colocam ao financiamento do ajustamento imposto por uma política de austeridade que está a ser cada vez mais contestada pelas classes sociais mais atingidas pela crise e colocada em dúvida a sua eficácia por reputados economistas e analistas, por empresários e, obviamente, pelos sindicatos. 

No centro de um furacão em grande medida provocado pelo risco moral em que os bancos depositaram a sua irresponsabilidade nos créditos concedidos sem medida do risco assumido confrontam-se agora duas frentes que são irreconciliáveis se não forem prosseguidos caminhos de aproximação para uma união política.

Dentro de dias é muito provável que François Hollande, que o Economist considera um homem muito perigoso, será eleito presidente da França, até com a ajuda de Merkel, que ao apoiar Sarkozy despertou ainda mais os brios nacionalistas gauleses. E ainda que aquilo que o candidato à eleição promete não corresponda, frequentemente, em grande parte, ao que o candidato eleito acaba por fazer (ou ser obrigado a tal), é, nas actuais circunstâncias, pouco provável que Hollande venha a manter intacto o eixo Mercozy franco-alemão com outro nome, Mercollande, por exemplo.

Merkel já se antecipou e anunciou alguma abertura quanto à ampliação das atribuições do BCE para a solução da crise, mas nem tudo o que Merkel anuncia acaba por confirmar. Por outro lado, e ao mesmo tempo, fez saber que não altera os alvos acordados no tratado de consolidação orçamental dos países subscritores.

Continuam carregadas de tensão as nuvens negras que pairam sobre a Europa. E não há perspectivas de que o estado da desunião se distenta quando o Verão chegar.



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Act. - Aqueles que atribuem ao euro as culpas da crise europeia ofereço um pastel de nata se conseguirem estabelecer correlação entre os indicadores do mapa e cada uma das três situações: membro da Zona Euro, ligado ao Euro, fora do Euro.  

Saturday, April 28, 2012

BEM VISTO, SENHOR JUIZ!

Segundo notícia divulgada aqui hoje, um juiz do tribunal de Portalegre decidiu que a entrega da casa ao banco na sequência de uma penhora por incumprimento de pagamento das amortizações do empréstimo pelos seus tomadores liquida integralmente a dívida.

Abordei várias vezes esta questão neste caderno de apontamentos. Tantas, que seria fastidioso estar  enumerá-las agora. Sempre disse, e continuo a dizer, que, contrariamente ao que tem sido propalado, existe uma bolha imobiliária em Portugal de uma dimensão que só não é ainda mensurável porque está a ser esvaziada de forma discreta e contida por uma regra bancária que há muito tempo deveria ter sido ilegalizada: a continuidade da dívida após a dação em pagamento da casa hipotecada quando o valor comercial atribuido à propriedade entregue em dação é inferior ao valor em saldo da dívida. 

Se assim for, se a decisão do tribunal de Portalegre fizer jurisprudência (mas receio que não faça; o BE vai propor na AR a aprovação de uma lei que concorra no mesmo sentido) nada será como dantes: a bolha rebentará mais rapidamente, o nível de imparidades nos bancos subirá para valores incalculáveis, no futuro os banqueiros serão, como lhes compete ser, mais criteriosos nos empréstimos, a especulação bancária será menos alimentada por eles, as bolhas imobiliárias serão mais reprimidas, as famílias deixarão de ficar acorrentadas às vicissitudes dessa especulação de que foram participantes mas os menos responsáveis.

Dir-se-á: Mas nos EUA, onde as foreclosures (recuperação pelos bancos de dívidas por empréstimos para compra de habitação ) dão quitação completa da dívida por contrapartida da entrega dos prédios hipotecados, houve bolha imobiliária, houve subprime (empréstimos a juros elevados a quem não tinha realmente poder de reembolso dos mesmos), houve uma crise que abalou o mundo financeiro. É verdade. Mas não ficaram as famílias sem casa e com encargos, frequentemente insuportáveis,  às costas por conta das casas que perderam.  

Por outro lado, à política de subprime seguiu-se a politica do ludíbrio: os bancos norte-americanos empacotaram esses empréstimos (activos tóxicos) em fundos que venderam por todo o mundo. Duvido que os bancos portugueses tivessem capacidade para fazer o mesmo.

Ainda que não lhes faltasse vontade.  

A FAVOR DOS OCUPAS

Há dias foi notícia o embate da polícia no Porto com um grupo que ocupava já há algum tempo um prédio camarário devoluto. Se bem entendi o grupo de ocupas utilizava as instalações disponíveis para fins de cooperação social. Não sei se a utilização era aquela e só aquela que os ocupas invocavam mas a favor dos ocupantes deponho os  meus argumentos de defesa.

É público, notório, e muitas vezes referido nos media que o Estado, central e local, continua a deixar desmoronarem-se muitas edificações devolutas, total ou parcialmente, que são património público.
Esse abandono, que se junta ao abandono de muitos outros milhares de casas de propriedade privada, constitui uma afronta a quem não tem casa e dá uma imagem a quem nos visita da apagada e vil tristeza de quem se habituou a viver com total indiferença entre escombros. 

A lei das rendas tem sido vezes sem conta dada como culpada do abandono dos edifícios mais antigos, mas sabe-se que nem só a famigerada lei (ou a ausência dela) está na origem desse abandono. A especulação, heranças em contencioso, e outras causas sem qualquer conexão com a tal lei das rendas,  não têm sido suficientemente penalizadas de modo a promover a racionalidade económica da propriedade, urbana e rústica. Tenho insistido nisto neste caderno de apontamentos: o direito de propriedade não pode colidir com o interesse mais vasto dos interesses da sociedade. E, objectivamente, cada casa, cada prédio, ao abandono reduz o valor dos prédios vizinhos e constitui uma mancha repelente para quem nos visita se não procura o lado sórdido das cidades.

Hoje é notícia de que também a Câmara de Lisboa tem uma casa com ocupas activistas e a polícia intimou os ocupantes a sairem no prazo de dez dias. A ocupação é um abuso de direito que deve ser reprimido. Mas o abandono de um prédio camarário, sendo também um abuso de direito, deveria de igual modo ser punido. A ocupação é uma forma de punição do abandono de um bem público. A desocupação só deveria ser accionada a partir do momento em que a Câmara desse início às acções necessárias à utilização legal desse bem público. 

Se assim fosse, se tal princípio fosse adoptado e generalizado à propriedade privada abandonada, as nossas cidades, nomeadamente Lisboa e Porto, seriam mais habitadas e mais acolhedoras para quem nelas reside e para quem as visita.

Friday, April 27, 2012

UM HOMEM PERIGOSO?



François Hollande é hoje protagonista de capa e editorial do Economist. E não o faz por menos do que para classificar Monsieur Hollande como um homem muito perigoso: The rather dangerous Monsieur Hollande. 

E porquê?

Quando ontem escrevi esta nota perguntava-me: Se François Hollande promete ( não ratificar o tratado de controlo do défice e alargar as atribuições do BCE), ganha (as eleições) e Merkel discorda o que é que acontece (à União Europeia)?

O Economist responde (resumidamente):

A França representa metade do motor franco-alemão que conduz a União Europeia, tem sido medianeira na actual crise entre o norte prudente nos gastos e o descontro do sul, entre devedores e credores. E é grande. Se a França for o próximo país a entrar em dificuldades, o euro pode não sobreviver.

Apesar da diferença estreita que o separou de Sarkozy na primeira volta, Hollande provavelmente será eleito a 6 de Maio, a menos que o debate televisivo entre ambos na próxima semana lhe seja claramente desfavorável. Se ganhar, também provavelmente, o seu partido ganhará as legislativas.  

O Economist que se afirmou a favor de Sarkozy nas eleições que o levaram à presidência da França, continua preferi-lo, não pelos seus méritos que encalharam em algumas contradições flagrantes, mas porque considera Hollande uma ameaça ao futuro da União Europeia. A oposição de Hollande à política de aperto fiscal imposta pela Alemanha, que impede a recuperação económica da Zona Euro, seria conveniente se por detrás dessa oposição estivessem as boas razões.

A França tem uma dívida pública elevada que continua a crescer, há 35 anos que o défice orçamental tem sido ininterruptamente negativo, os bancos estão descapitalizados, o desemprego continua persistente e corrosivo e, representando 56% do GNP, o estado francês é o maior da Zona Euro.

O programa de Monsieur Hollande não dá a resposta necesssária a este conjunto de problemas quando outros mambros da Zona Euro estão a por em prática reformas relevantes. Fala muito em justiça social mas ignora a necessida de criar riqueza. Promete reduzir o défice através do aumento de impostos e não da redução da despesa pública. Prometeu admitir mais 60 000 professores, segundo cálculos do próprio, a despesa pública crescerá em consequência das suas propostas 20 biliões de euros em cinco anos.
O Estado será ainda maior. A sua proposta de tributar com uma taxa de 75% os rendimentos mais elevados não terão reflexos relevantes na receita por ser muito reduzida a base de incidência; por outro lado a promessa de voltar a fixar a idade da reforma em 60 anos, contrariando Sarkozy que pretende alargar a idade mínima para 62 anos, beneficiará um número muito reduzido. A França perderá credibilidade junto dos investidores.
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Que consequências terão as políticas de Monsieur Hollande sobre o resto da Europa? Num primeiro momento, as declarações do candidato sintonizam-se com a vaga de críticas às políticas de austeridade de inspiração alemã que varre o continente desde a Irlanda e Holanda à Itália e Espanha. 

O problema não está na opção por um ajustamento fiscal mais moderado mas pela total recusa de qualquer ajustamento, pretendendo manter o modelo social francês a todo o custo. A menos que haja um recuo de Hollande que permita conciliar projectos à partida tão divergentes entre Hollande e Merkel, o futuro próximo da União Europeia é, mais do que nunca, imprevisível.   

Um em cada três eleitores franceses votaram na primeira volta em Le Pen e Mélechon, que se posicionaram contra o euro e contra a globalização. Na Holanda, Geert Wilders, chefe de fila dos extremistas de direita abandonou o governo por discordar dos cortes orçamentais. Apesar de concordarem com a política de austeridade, os holandeses discordam do modo de atingir esse objectivo. Estas revoltas estão a ecoar em Espanha e Itália. 

Hollande, se persistir em hostilizar a mudança comprometerá a decisão da Europa de prosseguir reformas que permitam a sobrevivência do euro. E isso torna-o um homem perigoso.

O MESTRE DO BANDO

Acerca da polémica levantada por uma proposta de nomeação para um lugar no Tribunal Constitucional de um candidato sem credenciais reconhecidas pelos mais destacados constitucionalistas do sítio, já foi tudo dito (vd. por exemplo, aqui). O pretendente não é constitucionalista, foi efemeramente juiz, presidiu à Câmara do Cartaxo, foi secretário de Estado Cultura e da Justiça nos governos antececedentes, actualmente é advogado, está sob suspeita de envolvimento no negócio do campus da justiça, segundo esta notícia.

O que é pode justificar a insistência do partido proponente e a persistência do proposto na candidatura a um lugar que, parece ao senso comum, deve ser preenchido por especialista na matéria e isento de suspeitas? Se num hospital há uma vaga para um especialista de cirurgia cardiotoráxica seria motivo de chacota que se candidatasse ao lugar um psiquiatra. Ou um fisioterapeuta.

Na tropa (à moda antiga; não sei se a moda continua a mesma) costumavam os sargentos incumbidos do recrutamento dos mancebos para as diferentes especialidades escolher para enfermeiros os que na vida civil tinham prática de mecânica de automóveis. E a razão era esta: de mecânica já eles percebiam, e em caso de emboscada, um mecânico reconvertido em enfermeiro dava ao pelotão uma polivalência impossível de garantir de outro modo. 

E havia também aquele aprendiz de saxofone, que por lhe faltar fôlego ou não se entender com as semifusas, experimentou a percussão, sem sucesso, e acabou por ser proposto para chefe da banda.
E aquele tipo que, porque não se ajeitava na defesa, nem no meio campo nem no ataque, era sempre remetido para guarda-redes.   

Afinal, com alguma reflexão mais aturada, talvez a polémica seja injustificada e o candidato plausível.

Thursday, April 26, 2012

O ESTADO DA DESUNIÃO



A política de austeridade está a ser posta em causa por todo o lado menos pelos governos que a subscrevem.

Neste vídeo do Economist comentam-se os mais recentes acontecimentos que mergulham na crise com que a União Europeia se confronta depois da prescrição da política de austeridade aceite por quase todos os seus membros. Em França, François Hollande, se for o próximo presidente, promete não ratificar o tratado recentemente subscrito por 25 dos 27 membros da União, e exigir que o BCE possa financiar directamente os diferentes membros sem intermediação bancária; na Holanda o governo caiu e a assinatura do tratado está na razão imediata do divórcio entre os parceiros da coligação que governava o país. Na República Checa há movimentações sociais de contestação; em Espanha, o governo recentemente eleito não contem a dívida, nem a recessão, nem o desemprego; em França, a extrema-direita volta a atingir resultados expressivos de descontentamento por razões diversas, algumas certamente opostas, mas onde um lastro de xenofobia continua a sedimentar-se e a crescer.

No vídeo, alguns destes sintomas são enunciados mas não escalpelizados. Outros, como o momentum recessivo no Reino Unido, onde o Economist é nado e criado, não entram na agenda dos dois comentadores. Percebe-se: os britânicos continuam a olhar com distanciamento os problemas do continente como problemas dos outros.

Aliás, este distanciamento progride um pouco por toda a União onde as discussões monopolizadas pela crise não dão oportunidade para reflectir sobre o futuro, como se a crise possa ter outra solução que não seja fundamentalmente política.

Se François Hollande promete e ganha e Merkel discorda o que é que acontece?
O que é que acontece à União Europeia se cada qual, sacando das suas prerrogativas de soberania, se remeter para seu canto e amuar de vez? É possível solucionar a crise e recolocar a União Europeia nos carris depois de lhe ter caído uma crise desta dimensão em cima dos carris sem a cooperação de todos?

O Estado paga!, ordena o dr. Mário Soares, e a Merkel que vá bugiar.
A soberania é a última coisa a perder depois de estar totalmente perdida.  

Wednesday, April 25, 2012

A CULPA DAS CALÇAS



A economia britânica volta a entrar em recessão

O euro é geralmente considerado um dos culpados e vítima da crise que ameaça desmoronar a União Europeia. É inquestionável que uma moeda forte exige outros factores de competitividade que compensem e ultrapassem o handicap da valorização cambial em sectores em que o preço é determinante. A competição sustentada numa guerra de preços  acabará sempre por ser ganha por aqueles que disponham de outros argumentos. Aconteceu em Portugal  com o encerramento definitivo ou  a deslocalização de empresas de baixa tecnologia para outras bases mais competitivas. 

Mas, o Reino Unido? O que se passa com a economia britânica, transaccionada na sua própria moeda, susceptível de ajustar-se  e garantir alguma competitividade monetária. 

Não é caso único na União Europeia, onde há situações para todas as justificações plausíveis. Há países da Zona Euro com balanças comerciais superavitárias (a Alemanha é o caso mais flagrante), mas há também a Grécia, Portugal, Espanha, a Irlanda, até a França com problemas de défices incontroláveis ou em vias disso. Fora da Zona Euro, o Reino Unido não está confortável e a Hungria está em situação muito problemática.

Que conclusão pode retirar-se da amostra?
Que não é a água tónica que embriaga mas os espíritos que se misturam com ela.

MORTALIDADE JOVEM

É frequente o justo regozijo com que são citados os progressos feitos em Portugal na redução da taxa de mortalidade infantil: Portugal progrediu em poucas décadas da cauda dos países desenvolvidos para os lugares cimeiros das mais baixas taxas de mortalidade até aos cinco anos de idade (vd. aqui).

Há, no entanto, uma dolorosa realidade que não tem sido citada: a mortalidade juvenil (entre os 10 e os 24 anos). O gráfico publicado no Economist retrata essa realidade que deveria merecer a atenção de quem tem obrigações na matéria, desde os governantes às famílias passando pelos media e pela escola. Mas, pelos vistos, ainda ninguém reparou nem adiantou soluções.

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Das causas discriminadas, a mais mortífera da juventude portuguesa são os acidentes rodoviários, uma praga que tem, certamente, origem nos hábitos de consumo de alcool de muitos jovens portugueses.  
Portugal encontra-se nos lugares cimeiros, segundo a OMS, no consumo de alcool per capita.
Trata-se, aliás, de uma posição em que os portugueses têm mantido desde há muito tempo, ainda que muita gente queira duvidar dos dados da OMS.

Com uma taxa de natalidade das mais baixas do mundo, a taxa de mortalidade juvenil é mais um dos factores do reduzido crescimento demográfico do País.

Insisto nisto: Portugal deveria adoptar uma lei que restringisse a venda de bebidas alcoolicas a menores de 18 anos e a venda de bebidas de alto teor alcoolico (geralmente importadas) a locais exclusivamente dedicados a esse negócio. 

Obs.- Como sempre tenho afirmado quando abordo este tema, reafirmo que não sou abstémio. 

IMPOTENTE RIO

Rui Rio critica a banca pelo descalabro financeiro do país

Haja frontalidade de referir que, também, a banca não se pode eximir das responsabilidades que lhe cabem no descalabro financeiro a que chegamos. A começar na incompreensível passividade do Banco de Portugal e acabar nos erros de gestão da banca comercial, cujo respeito pelo interesse do país esteve quase sempre, aquém daquele que foi a preocupação com o lucro (...)”

Oh! Rio!, Só agora é que percebeste ou só agora te assomou a frontalidade?
Não acredito.
Se há coisas que não te faltam é capacidade de entendimento e frontalidade. 
Admitamos que este teu discurso é aviso ao esquecimento ou falta de informação que leva os cidadãos a culparem os políticos pela totalidade do descalabro e a, implicitamente, absolverem outros culpados. 

Mas, então, considerando as graves culpas dos banqueiros, caixeiros e reguladores, qual é a tua sentença?
São culpados mas não condenados?
Que farias tu, Rio, se fosses primeiro-ministro deste País à deriva, e a inimputabilidade fosse regra sem excepção porque, mesmo nos casos contemplados pelo Código Penal, ninguém foi ainda condenado, alguns nem acusados, o governador do Branco de Portugal foi promovido para Frankfurt e todos os outros funcionários, mais graúdos ou menos graúdos, são contemplados por isenções e beneficiados com privilégios? E quando a conta do descalabro não é apresentada equitativamente a todos, nenhuma aos banqueiros, que, se perfilam, aliás, para uma ajuda dos contribuintes?

Que farias tu se os caixeiros (administradores da Caixa Geral de Depósitos, não confundir com os banqueiros, administradores dos bancos) continuassem integrados na cauda do rebanho pisando o que os da frente deixam para trás, dedicando-se, como eles, à intermediação da importação de endividamento para o Estado e para os sectores protegidos (vulgo monopólios de facto) da economia? 

Que farias tu, se depois de terem embriagado o País com construção civil e obras públicas, consumismo imparável, continuassem a massacrar o excelentíssimo consumidor endividado até ao cocuruto com propaganda para lhe sustentar os vícios a taxas de juro que ultrapassam os 30%?

Rio: uma frontalidade inconsequente é uma saliente impotência.
Uma frustração típica de um blogger (ou de um Presidente da República! em cada 25 de Abril) não deve ser apanágio de um político com a tua dimensão.
De um político no activo como tu espera-se intervenção activa e determinante em sede própria.

O JOGO DA CABRA CEGA

Continua.
Com os mesmos ou outros foliões, o jogo é interminável à volta dos braços abertos da cabra que roda vendada, insegura, imprecisa, incapaz.

Quadro do Governo Regional da Madeira tentou fugir com documentos

Um engenheiro que faz parte dos quadros dirigentes dos serviços do Governo Regional da Madeira foi ontem interceptado pela Guarda Nacional Republicana (GNR) quando tentava fugir com documentos das instalações da extinta Secretaria Regional do Equipamento Social da Madeira, onde desde manhã decorreram buscas no âmbito do processo-crime às contas da Madeira


A 5.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa decidiu esta tarde que ainda não prescreveram os crimes pelos quais Isaltino de Morais foi condenado a dois anos de prisão por fraude fiscal, ao contrário do que sustenta o autarca de Oeiras. E rejeitou o pedido do Ministério Público para que Isaltino Morais fosse detido de imediato.

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Act. - A dívida oculta da Madeira terá subido para 3,6 mil millhões de euros e a dívida total pode já ter ultrapassado os 8 mil milhões de euros, depois da investigação do DCIAP ter detectado mais 2 mil milhões de euros ligados a negócios da construção civil.

Tuesday, April 24, 2012

PARÁBOLA DO CASAL COM CONTA CONJUNTA


O Financial Times de hoje publica um artigo de Kenneth Rogoff ( professor de economia na Universidade de Harvard e co-autor de “This Time is Different”) - Uma parábola para o euro : um casal com uma conta bancária conjunta.


A parábola é conhecida, Kenneth Rogoff acrescenta, no entanto, um conjunto de outros titulares à conta inicial  para vincar mais a demonstração de que não há grupo que não acabe por se desintegrar se não houver entre os seus elementos um conjunto de valores centrípetos que lhes garanta unidade ao longo da viagem pelo tempo. 

Na sua versão original e mais simplificada que esta de Rogoff, pergunta-se se é possível a perdurabilidade da união de um casal que possui uma conta conjunta no banco mas um dos parceiros é perdulário ao ponto de afundar a solvabilidade e a credibilidade financeira do outro. A resposta óbvia é não. Por mais intensos que sejam os outros laços que os unem, mais tarde ou mais cedo o desregramento perdulário de um deles acabará por destroçá-los. A probabilidade dessa ocorrência aumenta quando aumenta o número de elementos ligados pela mesma conta conjunta. As vantagens, que também existem, na medida em que os banqueiros retribuem melhor as contas maiores, desfazem-se se um ou mais elementos do grupo colocar em causa a fiabilidade do conjunto.

Acontece o mesmo com um conjunto de países unidos por uma moeda comum. A mobilidade do factor trabalho entre os países membros é uma condição necessária mas não suficiente à coesão da união. Uma moeda comum exige, entre outros factores de coesão, uma autoridade fiscal central com autoridade tributária sobre os países membros, um regulador financeiro central, mas sobretudo não pode dispensar a legitimidade do poder de uma união política.

Em resumo: A União Europeia ou é uma união política legitimada democraticamente ou será desunião com todas as consequências dramáticas que esse divórcio implicará.

Dentro de algumas horas, cerca das 10 da noite, celebram-se 38 anos do início dos movimentos militares que no dia seguinte derrubariam um regime de quatro décadas que caiu sem que alguém tenha disparado um tiro em sua defesa. Este ano, as celebrações do 25 de Abril não vão contar com os militares representados na Associação 25 de Abril, Mário Soares também já fez saber que não contem com ele e Manuel Alegre, idem aspas. Argumentam, certamente por desmemoriação pontual, que a soberania do país está no prego e culpam este governo da afronta. 

Há dias, soube-se que o governo dos Países Baixos, que não se encontram em situação de fragilidade financeira, se demitiu por falta de apoio às medidas decorrentes do tratado recentemente assinado por 25 dos 27 membros da União Europeia.

Apenas  dois exemplos extremos, onde o incómodo das consequências da adesão a uma conta conjunta pré-nupcial ameaça acabar mais dia menos dia com a conta e destruir o grupo. A soberania, real ou imaginada, continua a determinar as emoções dos povos europeus enquanto eles não forem colocados perante a questão curial:

---, é de sua livre vontade ser europeu?, sujeitando-se a regras de convivência que não podem deixar de passar pela perda de soberania de cada um movimentar a conta conjunta conforme lhe der na real gana?  

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Act. - É muito curioso, e essa foi a principal razão que me levou a escolher o artigo de Rogoff como tema do meu apontamento de hoje, que sejam sobretudo os economistas norte-americanos que defendem o federalismo como única saída para o impasse europeu. Na União Europeia, o assunto continua tabu. Mesmo os federalistas europeus não disfarçam o incómodo da, consequente,  perda de soberania, muitas vezes já largamente perdida.  

Monday, April 23, 2012

CONVERSA DE BANQUEIRO

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Da longa entrevista de Ricardo Salgado ao Expresso/Economia deste fim-de-semana destaco duas respostas do banqueiro:

Expresso - A banca não andou a financiar o Estado e sectores não produtivos?
 Ricardo Salgado - O Estado é o Estado, tem obrigação de saber o que faz. Se há programas de investimento público que não se coadunam com a realidade ... Houve certamente exageros, mas se não fossem os bancos portugueses, apareciam os bancos estrangeiros ...  

Expresso - Foi muito criticado por ter feito discurso favorável às grandes obras públicas e à não convocação de eleições. Arrepende-se desse discurso?
Ricardo Salgado - Não me arrependo. Fui criticado por defender duas coisas que continuo a defender: uma é o TGV e a outra o novo aeroporto de Lisboa.


Pois é.
Segundo o banqueiro Ricardo, se houve (e continua a haver) um desastrado descarrilamento nas contas públicas, a culpa é do Estado porque, notem bem nesta subtileza, o Estado é o Estado, tem obrigação de saber o que faz. Se há  programas de investimento público que não se coadunam com a realidade ... (Se) houve exageros, a culpa não é dele nem dos seus pares, porque se não fossem os banqueiros portugueses a emprestar ao Estado, apareciam os bancos estrangeiros... Agora mesmo, quando os bancos estrangeiros tiram o cavalo da chuva quem é está ali para socorrer o Estado? O Ricardo e seus pares portugueses.

O banqueiro Ricardo não se arrepende de ter feito um discurso favorável às grandes obras públicas e ainda hoje continua a defender o TGV e o novo aeroporto de Lisboa, mas, evidentemente para o banqueiro Ricardo, se algumas, grandes ou menos grandes, obras públicas foram feitas que não se coadunavam com a realidade, se o país se endividou até aos gorgomilos, a culpa é do Estado que tinha (e tem) obrigação de saber o que faz, já tem mais que idade para isso.

Mas nem só o Estado é culpado do desastre. As famílias também. Quando Ricardo voltou a Portugal em 1992, diz ele, havia falta de 700 mil habitações. Quem é que financiou a construção civil e dotou o País de um excesso que não encontra paralelo na Europa, salvo a Espanha? Os banqueiros. Evidentemente segundo o banqueiro Ricardo, se houve excessos e muitas famílias agora não podem pagar os empréstimos contraídos para comprar a casa, a mobília, e umas viagens de férias, a culpa é delas, que já tinham idade para ter juízo e obrigação de saber fazer contas.

Resumindo e concluindo, segundo o banqueiro Ricardo, a banca está inocente, a história tem de ser contada ao contrário.

Pois tem, Ricardo.
A história, Ricardo, é que os empréstimos que a banca concedeu ao Estado, importou-os do estrangeiro. A poupança dos portugueses não chegava para mandar cantar um cego. Os banqueiros portugueses não se anteciparam nem substituiram os bancos estrangeiros, simplesmente intermediaram esses empréstimos externos, cobrando as margens e as comissões com que se banquetearam enquanto a festa durou. A festa da ganância dos lucros fáceis à mesa dos votos comprados com a demagogia. Só uma autoestrada senhor primeiro-ministro?, faça duas ou três, e ganha a dobrar. Só três rotundas, senhor presidente da Câmara? O seu vizinho já fez seis e a oposição promete mais sete. Oh senhor presidente do Governo Regional da Madeira, por quem é! Financiamos-lhe os viadutos que quiser. Um heliporto?  Só um? Uma marina? Faça duas, que ficam a um preço médio mais baixo.

Agora que o maré baixou e a corrente cheira a lodo que tresanda, o banqueiro Ricardo mete o nariz entre o polegar e o indicador, e culpa o Estado por não saber o que faz!

Fizesse ele o TGV e o novo aeroporto de Lisboa, aí sim, faria bem.
Mas o Estado, Ricardo, é um estupor que faz tudo ao contrário. Pelas dívidas que lhe vendeste manda-me agora a conta a casa.

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Act. - Aqui : Outro que não sabia que o estado não sabe o que faz: O BCP ajustou os resultados de 2011 com as perdas assumidas com a reestruturação da dívida grega. Face ao já anunciado, o banco agora liderado por Nuno Amado registou mais 63 milhões de euros de perdas, o que leva os prejuízos para os 849 milhões no ano passado.

Sunday, April 22, 2012

MISTÉRIO PÚBLICO

As sondagens à opinião pública valem o que valem, costumam dizer os desiludidos com os resultados delas, e acrescentan que as únicas sondagens que valem são as que resultam das contagens dos votos nos dias em que há eleições. Outros desiludidos dizem que não governam para ou consoante as sondagens mas vão-se sempre ajustando em função delas. 

Os resultados da sondagem publicada este fim-de-semana no Expresso não espantam : Cavaco Silva vê o seu balanço de popularidade com a situação líquida mais baixa de sempre, Seguro ultrapassa Coelho por ligeira diferença, Portas beneficia da discreta exposição às consequências da crise, Jerónimo e Louçã andam por ali, como sempre, entre o nem bom nem mau, não valem um carapau, sem ofensa ao peixe e desculpas pela tosca rima.

O mais interessante, por ser regra, nestas sondagens é a persistente má imagem  pública das instituições  objecto das sondagens que não se submetem ao voto popular. São elas a Assembleia da República (popularidade 1, ligeiramente acima da linha de água), o Governo (-16,7, que pode justificar-se pelas medidas de austeridade), os Juízes (-17,3) e o Ministério Público (-22,2).

A conclusão mais indiscutível desta e das sondagens precedentes é esta: a Justiça continua a perder confiança dos portugueses e ninguém mexe uma palha para inverter este descrédito público que corrói inexoravelmente a democracia e é um dos factores mais determinantes da nossa perda de crescimento económico e social. 

Ainda assim há um aspecto surpreendente na avaliação que os portugueses fazem da Justiça e, em particular, do Ministério Público: Ainda há 17,4% dos inquiridos que dão nota positiva à actuação do MP!
Porquê?
Valeria a pena saber. Como as sondagens não chegam aos fundamentos só podemos especular.

Para muitas pessoas as questões sociais não as motivam a pensar. Por falta de consciência cívica, por desilusão ou até por enjôo, a política e as instituições públicas são-lhes indiferentes ou mesmo repelentes. Não se pronunciam, não discutem, ignoram-nas tanto quanto possível. Quantas, das que responderam ao inquérito, sabe o que é o Ministério Público? Colocados perante a pergunta: Como julga a prestação do Ministério Público, uma parte, que, não vá o Diabo tecê-las, quer estar sempre de bem com todos, diz que sim senhor, é positiva. Porque, convictamente, só os familiares e amigos dos magistrados do MP lhes darão nota positiva e, mesmo assim, am alguns casos deve haver política doméstica de disciplina de voto.

Mas só esse.
Porque como não dependem do voto democrático podem continuar a cair que ninguém os obriga a levantarem-se nem eles fazem por isso. 

Saturday, April 21, 2012

CEFALÓNIA*

A memória comanda a existência dos indivíduos e das sociedades. Diz-se, a memória dos homens é curta, mas não é curta nem é longa, cada uma tem a exacta medida de cada um, porque são a mesma coisa. Um indivíduo sem memória não existe, vegeta. A dimensão incorpórea de cada sociedade, a que geramente se chama cultura, é do tamanho da sua memória. É na memória que se sedimentam os valores prevalecentes em cada época em cada sociedade, e que lhe traçam o percurso.  

Que pode ser tortuoso. A memória da hiperinflação na Alemanha, na sequência das insuportáveis indemnizações que os alemães, considerados principais culpados da Guerra 1914/18, se obrigaram a pagar, e a subsequente tomada do poder pelos nazis, que arrastaram os alemães para novo conflito mundial, e mais uma humilhante derrota no espaço de duas gerações, permanece indelével na memória teutónica passados 80 anos.

E na memória dos outros? Daqueles que a Alemanha ocupou e desvastou, e se reergueram, incluindo a Alemanha, em grande medida com a ajuda dos EUA, o que subsiste?  A união europeia forjada com o intuito primordial de evitar novo conflito progrediu sem grandes percalços e nítidas vantagens comuns até ao momento em que, subitamente, os valores morais foram convocados para dirimir os conflitos emergentes de descontrolos financeiros de alguns dos seus membros.

E começou a primeira parte daquilo que pode ser uma terceira guerra europeia. Inamovível na sua fixação contra uma solução que consentisse um nível de inflação controlada no espaço europeu, a Alemanha persiste numa política de sanções que, já está mais que provado, os países devedores não vão poder cumprir. A história não se repete mas ensina. O que vai ocorrer quando a situação de ruptura for ( se vier a ser) incontrolável? Se não for possível conciliar um conjunto de valores nucleares entre os membros do clube, ou alguns membros são expulsos, ou alguns membros se retiram, ou, mais provavelmente, o clube dissolve-se.

Se isso ocorrer, a memória recordará o passado repassada com os ódios semeados na primeira metade do século passado. Que foi ontem.

Ontem à noite vi na televisão "O Capitão Corelli" - "Captain Corelli's Mandolin" -, mais uma história de amor em tempo de guerra. Não é filme que perdure na memória. O que nunca deixará de perdurar, contudo, na memória dos gregos foram as atrocidades cometidas pelas tropas nazis na sua terra. E se do baú da memória saltam os fantasmas esquecidos, a diferença entre povos germânicos e os nazis torna-se difusa e perigosa.
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*Cefalônia (português brasileiro) ou Cefalónia (português europeu) (em grego Κεφαλληνία) é uma ilha e uma unidade regional da Grécia, localizada na região das Ilhas Jônicas. Sua capital é a cidade de Argostoli. Está separada de Ítaca pelo estreito de Ítaca. O nome da ilha é derivado de Céfalo, filho de Deioneu; exilado de Atenas por ter matado sua esposa Prócris, ele ajudou Anfitrião a destruir os teleboanse passou a habitar esta ilha, que recebeu o nome de Cephallenia por causa dele.[1]
Durante a Segunda Guerra Mundial, a ilha foi ocupada pelos italianos em 1 de maio de 1941 como parte da campanha da Grécia. Depois do armistício de 8 de setembro de 1943, as forças de ocupação italianas recusaram-se a entregar as armas e munições a seus ex-aliados alemães e foram atacadas com a perda de cerca de 3000 homens. Dos sobreviventes, outros 5000 foram executados em represália (14-22 de setembro de 1943). (aqui)

Friday, April 20, 2012

FORA DO PRAZO DE GARANTIA

Hoje é notícia a entrevista da ministra da Justiça.
O noticiário da manhã, que anuncia a entrevista, não destaca novidades sobre a Justiça mas uma antiguidade sobre as garantias da reposição dos (mal denominados) subsídios cortados aos funcionários públicos - e aos pensionistas da segurança social, que, sabe-se lá porque bulas são ignorados nestas notícias depois de terem sido assimilados a funcionários públicos, que nunca foram na vida.  

Que disse a ministra? Que a Constituição não está suspensa, que os direitos estão garantidos, mas que não há dinheiro. E contra a falta de dinheiro não há direitos constitucionais nem constitucionais tribunais que valham.

A tarefa deste Governo nunca seria fácil. Mas tornou-se mais difícil a partir do momento em que o indigitado primeiro-ministro decidiu deixar de fora do barco abalroado o partido com mais responsabilidades no abalroamento.

A questão dos cortes dos subsídios e das contínuas alterações das garantias da sua reposição, as garantias de que não há necessidade de mais empréstimos, as garantias de que não vai haver reestruturação das dívidas, a garantia de que em meados de 2013, depois em finais de 2013, depois em 2014, Portugal volta aos mercados financeiros, estão apressadamente a perder credibilidade em cada dia que passa, e não está de modo algum garantido o que o ministro das Finanças ontem garantiu em Nova Iorque: a garantia de que os portugueses estão dispostos a suportar todos os sacrifícios.

Porque a verdade é esta: Os cortes nos ordenados e pensões de alguns (este o verdadeiro nome do "corte de subsídios") não vão ser repostos, alguns aumentos salariais e de pensões começarão a ser feitos só daqui a uns anos largos, vai haver reforço da ajuda externa, vai haver mais medidas de austeridade, vai haver reestruturação da dívida,

se Passos Coelho não garantir em Bruxelas o contrário do que o ministro das finanças afiançou em Nova Iorque: porque há limites para os sacrifícios da esmagadora maioria daqueles que sobreviverem ou não emigrarem. 

Thursday, April 19, 2012

UMA INEVITABILIDADE

Toda a gente sabia mas nem o Governo (nem a troica) queriam que se soubesse:

O FMI e a Comissão Europeia reviram em alta as estimativas de necessidades de financiamento do Estado daqui até 2014. São mais 15 a 16 mil milhões de euros que resultam da inclusão nas contas das necessidades das regiões autónomas e das empresas públicas. (aqui).

Mais empréstimos, mais juros, mais austeridade, maior impossibilidade de reduzir a dívida para níveis comportáveis. Um dia destes chegará A OUTRA inevitabilidade: a da reestruturação da dívida, por "hair cut" e ou dilatação dos prazos de reembolso a perder de vista. Não seria mais sério, mais racional, começar já? Dito de outro modo: Não seria mais racional reconhecer desde já aquela impossibilidade de pagar a totalidade da dívida e admitir esta inevitabilidade: Reduzir a dívida e os juros na medida dos empréstimos que agora perfilam como necessários?
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Segundo a mesma fonte, o Citigroup prevê que o " PIB português deverá recuar 5,4% este ano e 3% em 2013. O Banco de investimento mantém previsão que Portugal vai pedir um segundo pacote de ajuda este ano e reestruturar a dívida, com o envolvimento dos privados, em 2013. O resultado será uma forte recessão, devido às novas medidas de austeridade que terá que implementar.

Se as previsões do Citigroup merecem alguma credibilidade, o pacote de ajuda, desajuda.

Entretanto, este Governo continua obsecado com as virtudes das políticas macroeconómicas sustentadas nas expectativas racionais mas quanto à racionalidade do Estado as expectativas continuam de molho.

O Banco de Portugal decidiu penalizar (ainda que lhe chame outra coisa) os bancos que paguem taxas de juro nos Depósitos a Prazo acima de determinados valores, justificando a medida intrusiva no sistema como forma de prevenir o risco assumido pelos bancos nessas operações passivas. Mas mantem-se completamente alheio à continuação da pressão feita pelos bancos (e em geral todas as empresas que emitem cartões de crédito, e são muitas) de crédito ao consumo e da agiotagem sem freio.

Por exemplo este, de que acabo de receber mais uma "oferta" na caixa do correio:


TAEG de 33,1%! Uma pechincha, não?
Exemplo pra um financiamento de € 1500 com reembolso no prazo de 12 meses à taxa anual normal (TAN) de 26,99%.

Quem é que disse que não houve "subprime" em Portugal? Não só houve como continua a haver.
Até ver.

NO PAÍS DO FAZ- DE- CONTA

as contas continuam por fazer.

Ouço na Antena 1, esta manhã, que o presidente da RTP ( o mesmo é dizer o presidente lá da casa) insiste em que o governo abra mão de mais uma excepção e lhe outorgue a condição de gestor de empresa em concorrência e, desse modo, seja pago, ele e os seus colegas gestores da RTP, acima do salário do primeiro-ministro.

Como é que uma empresa que, por um lado está encostada ao orçamento do estado e dele recebe uns largos milhões anuais*, que nos cobra taxas à sucapa nas facturas da electricidade, que tem uma dívida maior que ela avalizada pelo estado, pode ser considerada em concorrência? Só na república dos bananas. 

Quem está em concorrência é o senhor presidente da RTP e os seus vogais. Se ele, ou ele e eles, têm oportunidades de serem melhor remunerados, por que não dão o salto e mudam de patrão ou de negócio?

Ipsis verbis, para os caixeiros (conselho de administração e comissão executiva da Caixa Geral de Depósitos). Que concorrência enfrenta a Caixa, que dispõe dos favores do estado e obedece aos governos, a todos, recolhe a maior fatia das poupanças dos portugueses, por obrigação, por tradição, por distracção ou por inércia? E que com elas interveio e continua a intervir em guerras e negócios que lhe deviam estar proibidos? E, para lá de tudo isto, importou endividamento que agora custa austeridade a muitos e nenhuma a outros, definhou ainda mais a economia do país, embebedando-a com miragens, e agora tem de ser recapitalizada a fundo perdido?   

Já noutro registo, aparece um banqueiro privado também a puxar, como é habitual em Portugal, pelas abas do chapéu do estado, que de tanto puxado já está quase todo roto e acabará em fanicos. Trata-se do novo presidente do maior banco comercial português. O maior bcp, como é sobejamente sabido, tem de ser, dizem, recapitalizado, o mesmo é dizer que precisa de empréstimos intermediados pelo estado porque os accionistas privados não se chegam à frente. Quer dizer o estado endivida-se, e em vez de pagar o que deve, empresta ao bcp (à Caixa não empresta, dá). Em que condições? Estão em negociações. O ministro das finanças quer uma participação accionista (que será maioritária, mas sem direito a voto!) o presidente do maior banco comercial português (cujas acções não valem unitariamente um chavo) quer CoCos ( obrigações de capital contingente, que contarão para o reforço dos rácios, mas que não implicam a emissão de novas acções). Num caso ou noutro, o mais provável, é que aconteça uma nacionalização de facto, mas a fazer de contas que não. 
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Act. - O défice das contas do Estado aumentou mais que o esperado em consequência da redução das receitas fiscais e da transferência de 350 milhões de euros para a RTP para pagamento de dívidas da empresa (20/4/2012)

Wednesday, April 18, 2012

NON CON MI DINERO


Juan Carlos apresentou hoje públicas desculpas aos espanhóis.
Deveria abdicar, reclamam muitos, porque não se submete à decisão do voto popular. A monarquia é, por natureza, não democrática.

SERIA BOM QUE ISTO FOSSE UM ASSUNTO SÉRIO

"Seria bom que a sociedade civil contribuísse activa e responsavelmente para este debate." (aqui, a propósito da sustentabilidade da segurança social)

Inteiramente de acordo.

Mas para que o debate seja consistente e não uma discussão predominantemente dominada pelas ideologias nem pelos interesses individuais ou de classe, seria importante saber os dados fundamentais que estão em jogo. E pouco se sabe. Sabe-se, no entanto, alguma coisa.

Sabe-se que subsistem ainda vários sistemas de segurança social tutelados, directa ou indirectamente pelo estado, sabe-se que há excepções, sabe-se que há iniquidades. Sabe-se que a austeridade seria menos severa se fosse suportada em função dos rendimentos de cada um. E não é. Ainda ontem foi notícia que "os pensionistas bancários ganham mais uma  excepção"*. Porquê? Por que é que há, também em matéria de segurança social, portugueses de 1ª, de 2ª, de 3ª. de vagão jota? 

Sabe-se, por exemplo, que o desemprego atingiu níveis sem precedentes, que muito provavelmente continuarão a subir mesmo que daqui a dois, três anos se observe algum crescimento económico incipiente. Há dois factores que podem reduzir, e estão já, a contribuir para a contenção, os níveis de desemprego: a emigração e o retorno de imigrantes. Dois factores, contudo, que têm efeitos perversos sobre as contribuições para a segurança social dos que ficam. Porque agravam os efeitos da evolução demográfica natural.

Durante os últimos doze anos, a partir do momento em que os sectores industriais de transaccionáveis (a grande maioria dos quais de baixa tecnologia) encerrou ou deslocalizou-se para outras paragens por falta de competitividade, assistiu-se ao mesmo tempo ao crescimento do emprego na construção e obras públicas, nos serviços, e nos monopólios de facto (não transaccionáveis). Continuamos praticamente na mesma, salvo na construção que, inevitavelmente, acabou por claudicar. 
Acho que até agora só disse o que toda a gente sabe. Se assim é, como é que pode resolver-se a questão do emprego e, por tabela, a sustentabilidade da segurança social, que é condição primeira para a coesão social e impedimento à revolta?
Alguém pode pensar que podemos voltar à economia do cimento como forma de criar emprego? É que, só por si, directa ou indirectamente, o sector chegou a representar mais de um terço do emprego no sector privado. A economia do cimento só foi possível porque a banca importou endividamento (sem se importar com as consequências) que embebedou a sociedade fazendo-a julgar supor que era possível continuar a construir até que não restasse mais que um metro quadrado para preencher em comprimento, largura e altura.

O pitoresco secretário geral da UGT informava ontem que se, além do mais, o governo não adopta políticas de criação de emprego, a UGT denuncia o acordo tripartido. Que políticas?, o Proença não sabe. A verdade é que ninguém sabe.

O equilíbrio das contas públicas (uma coisa inédita em democracia) é uma condição necessária para um crescimento sustentável mas não suficiente. Portugal tem uma parte muito significativa da sua população em idade profissionalmente potencialmente activa encostada aos subsídios de desemprego e à expectativa da reforma antecipada.

Dando um salto no tempo, e pressupondo que o défice público já ronda as exigências da "regra de ouro" (como, não sei, a não ser com um hair cut da dívida acima dos 50% e consequente redução substancial dos juros) o que é que pode atrair nessa altura o investimento reprodutivo? Sem investimento não há crescimento económico, sem este não há emprego. Sem emprego não há segurança social.

Do meu ponto de vista, só há uma via: renegociar Portugal (a dívida) e a União Europeia alguns termos dos tratados do comércio livre. Aliás, Portugal é apenas o exemplo mais adiantado das consequências de uma globalização sem regras.

Tem um problema para que possa ser suficientemente sentido: é pequeno. A Espanha tem outra dimensão mas tem alguns problemas estrurais semelhantes. Que não se resolvem com a saída do euro. A União Europeia para além da fragilidade de algumas economias, ditas periféricas, tem sobretudo um problema político. Portugal, só por si, não tem capacidade para romper o cerco ainda que tenha muito trabalho de casa por fazer. Se o problema não tiver solução política na União Europeia, Portugal não vai conseguir criar condições para atrair investimento, para crescer, para criar emprego, e o estado social esvair-se-á progressivamente. 

Mas se assim for, a União Europeia também não estará longe da dissolução.
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Os pensionistas da banca que foram integrados na Caixa Geral de Aposentações vão poder acumular o valor da reforma com um salário no Estado, de acordo com a proposta dos partidos da maioria para alterar o Orçamento Rectificativo.

Os pensionistas da banca que foram integrados na Caixa Geral de Aposentações vão poder acumular o valor da reforma com um salário no Estado. Esta excepção à regra é consagrada numa proposta de alteração ao Orçamento Rectificativo, do PSD e do CDS, que argumentam que o objectivo é salvaguardar as expectativas legítimas dos aposentados beneficiários dos fundos de pensões”.  (E as de todos os outros? São ilegítimas?????)

Os dois partidos dizem ainda que, com esta solução o Estado poderá ainda "beneficiar da prestação da actividade de aposentados daquele universo sempre que o interesse público o justifique".

Estes pensionistas já tinham sido isentados dos cortes de subsídios de férias e Natal.


Tuesday, April 17, 2012

O JOGO DA CABRA CEGA

Afirma Pinto Monteiro, PGR,

Os processos dos submarinos (não há um, há dois) não estão parados.
Não têm andado por falta de verbas para as perícias necessárias às investigações. Essas verbas foram pedidas ao ministério da Justiça mas inda não foram disponibilizadas pelo governo.

O Ministério da Justiça nega pedido de verbas para perícias. (in Público)

É de esperar a todo o momento que o PGR anuncie abertura de inquérito ao desaparecimento do pedido de verbas para as perícias, que, se as investigações exigirem perícias, terão de esperar por verbas que, eventualmente, se poderão perder no caminho.  And so on.

A propósito: na Alemanha, os acusados de suborno na venda dos submarinos foram condenados a dois anos de prisão (pena suspensa); na Grécia, o ministro da Defesa quando os submarinos alemães foram aquiridos foi detido há dias.

ESTADOS DESUNIDOS DA EUROPA

Perguntei hoje a um jovem grego em quem é que ele vai votar nas próximas eleições gregas, em Maio. Encolheu os ombros, muito desanimado, e disse que não fazia ideia, mas que também não era importante porque considera as eleições uma farsa, o que quer que seja que eles digam e prometam não fará qualquer diferença. (aqui)

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O Economist publicava anteontem este gráfico que correlaciona o nível de endividamento externo de alguns países (entre os quais, Portugal) e os juros das obrigações a 10 anos da dívida soberana desses países. Portugal destaca-se pela negativa.

Houve um tempo em que alguns dos que deviam entender alguma coisa de macroeconomia (entre eles, o governador do Banco de Portugal) venderam a ideia que, a partir do momento em que um país fazia parte de uma união monetária, o problema do endividamento externo simplesmente deixava de existir. Tal ideia bizarra foi música melodiosa para os banqueiros (que medem o sucesso pelos lucros, honorários e bónus que arrecadam) e para os políticos que mostram obra para caçar votos. Rejubilaram, entre outros, os construtores civis, pequenos, grandes e grandessíssimos, para o povo foi uma festa, uma bebedeira em grande, drogou-se a economia. 

E, inevitavelmente, aconteceu a ressaca e a dependência. De quem? Pois, naturalmente, de quem, distraída ou propositadamente, vendeu a droga e, subitamente, reduziu o fornecimento e exige o pagamento do atrasadado com juros insuportáveis. 

Pergunta-se: Mas como é que os EUA, onde a subprime colocou o sistema de patas para o ar já deu a volta e já progride razoavelmente enquanto a União Europeia continua atarantada às arrecuas? Creio que o gráfico é elucidativo: a dívida pública dos EUA é enorme mas é, em termos relativos, essencialmente interna. No caso da Alemanha os empréstimos do estado alemão a outros países ultrapassam os montantes de dívida pública alemã subscritos por estrangeiros.

A diferença é por mais evidente: O gráfico reporta a dívida soberana dos EUA ( e não dos 50 estados monetariamente unidos mas não soberanos) e as dívidas soberanas de estados europeus, soberanos, mas monetariamente desunidos. E esta é uma realidade que explica quase todo o resto. Uma realidade indomável mesmo com "regras de ouro"  porque nenhuma outra regra pode substituir um princípio indispensável a uma união de facto: a união política. Com tudo o que isso implica, a começar pela perda de soberania de cada estado pela sua reunião no conjunto. Mas esta questão, que deveria ser a discussão mais generalizada, continua quase tabu. Um tabu que chega a ser ridículo quando se ouvem alguns nacionalistas serôdios, iracundos contra a perda de soberania e reclamantes contra a falta de liquidez agora que a ressaca ataca.

Repito-me: O futuro da União Europeia pressupõe uma união política consolidada numa federação de estados e num governo federal mínimo. Ou dissolver-se-á. Com todas as consequências dramáticas que essa dissolução arrastará.

Monday, April 16, 2012

A CULPA DOS OUTROS

"Eles pagam a agricultores para não produzir."

Esta afirmação, retirada do texto de JH Engström, um dos quatro fotógrafos convidados para a exposição no Centro Cultural de Vila Flor, em Guimarães, que coloquei aqui, ouve-se ou lê-se recorrentemente*. Tanto, que está generalizadamente adquirida a ideia de que se somos tão dependentes do exterior também em bens alimentares, se os terrenos estão incultos, se as pescas já não são o que foram, a culpa é da União Europeia, talvez dos alemães, que "pagaram aos agricultores para deixarem de produzir e aos pescadores para abaterem as embarcações". Foi também esta a ladaínha contada em Guimarães a JH Engström.

Nada de mais errado. Só quem desconhece em absoluto qual era a situação das actividades agrícolas e piscatórias antes a entrada de Portugal na União Europeia pode comprar e vender aquela ideia. Portugal sempre foi mais dependente do exterior em bens alimentares do que qualquer outro membro da União. 
Para esta dependência concorrem razões naturais (clima, solos) e estruturais da propriedade fundiária. 
Vieram fundos da União Europeia para racionalizar o aproveitamento dos solos, para, por exemplo, arrancar vinhedos sem dimensão nem qualidade, para abater embarcações sem diemensão, nem tecnologia, nem condições de segurança. Que lhes fizeram? Reestruturou-se a propriedade fundiária com vocação agrícola ou silvícola? Redimensionou-se e apetrechou-se a frota pesqueira? Alguma coisa foi feito mas a maior parte continua por fazer. Muitos desses fundos foram desviados para outros fins ou desbaratados sem qualquer sentido economicamente útil.

Os sucessivos ministros da agricultura e pescas realizaram-se na negociação de fundos e quotas em Bruxelas mas nenhum se atreveu até agora a ir ao fundo da questão. Porque não é fácil. Porque implicaria realizar a reforma agrícola que nunca foi feita desde o tempo de D. Fernando.  Atravessamos Portugal de Norte a Sul, de Leste a Oeste, e as superfícies cultivadas são excepções à regra na progressão dos silvados. Culpa da União Europeia? Quem é que impede os portugueses de produzir mais? A troica? O Durão Barroso e seus comissários? A Merkel?

A agricultura há muito tempo que deixou de ser uma actividade de mão-de-obra intensiva e pouco qualificada. Consoante a vocação dos terrenos, exige dimensão que lhe garanta competitividade, capital, e, em qualquer caso, competência técnica. A Norte do Tejo, os terrenos mais ferteis encontram-se retalhados e, frequentemente, assaltados por urbanizações erráticas. Mudar esta situação é condição imprescindível para atrair capital e competência para as actividades agrícolas. Que não serão mais, em qualquer caso, geradoras de muitos empregos directos.

Leio no Expresso do passado domingo que "Cristas aluga terras da reforma agrária". Terrenos nacionalizados após a revolução vão ser arrendados a jovens agricultores. É a reforma da reforma agrária, diz a ministra da Agricultura. ... São cerca de 600 hectares no Alentejo e na Região Centro, com parcelas cuja dimensão média ronda os 60 hectares... A. Cristas tem identificados por todo o país 3 mil hectares pertencentes às direcções regionais da agricultura e o Governo está a fazer o levantamento das terras dos vários ministérios que podem igualmente ser disponibilizados para venda ou arrendamento a explorações agrícolas..."

É pouco. É mesmo muito pouco, mas já é alguma coisa. "A última fase do plano do Governo é identificar as terras agrícolas que estão ao abandono, disponibilizando-as também na bolsa de terras." 

Talvez alguma coisa aconteça desta vez. Talvez, pela primeira vez, o ministério da Agricultura deixe de ser apenas um mistério. Estou certo que a União Europeia não se opõe nem a troica se intromete.

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*Vd., por exemplo, aqui

Sunday, April 15, 2012

PORTUGAL AO NATURAL

Guimarães - Varandim dourado,
colocado durante as obras de beneficiação da Praça do Toural.
Anedótico.

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PAISAGENS TRANSGÉNICAS - 2

M João,

Pergunta-me o porquê deste título estranho. Não sei. Tento decifrar a explicação do curador da exposição (1ª. foto, ampliar para ver) e fico, vá lá, quase na mesma. O que é muito normal. O artista contemporâneo pretende-se sobrenatural, a começar pelo título que dá às obras, porque sabe que o ser humano extasia-se perante o incompreensível. É esta atitude temente perante o inexplicável  que explica, parece-me, o comportamento circunspecto que se observa no ambiente quase religioso de um museu ou de uma exposição de arte abstracta. Neste caso, a intenção da abstracção começa e acaba no título. Um dos fotógrafos escolheu como tema central da sua participação na exposição a paisagem degradada que tanto pode encontrar em Guimarães como em muitos outros lados do mundo (e em Guimarães, felizmente para os vimarenenses, nem é muito evidente); outro manipulou pequenos planos, imagens e tons, dificilmente identificáveis com Guimarães, outro usou uma técnica (não original, aliás) de fotomontagem de que coloquei um exemplo (o único disponível no site da exposição) no apontamento anterior; outro  preferiu os detalhes, o close up, da arquitectura do centro histórico, sobretudo. 

Este último escreveu em inglês um texto curioso, que coloco no fim, e está traduzido a seguir:


Faço as minhas fotografias. Penso sobre a Europa. Penso em Portugal. Eles falam-me aqui sobre todo o dinheiro vindo da Comunidade Europeia. Eles investiram em autoestradas que agora atravessam Portugal. Eles pagam a agricultores para não produzir. Enquanto eu aqui estou há um ataque terrorista em Oslo, a duas horas de minha casa, na Suécia. Entre 50 a 100 pessoas foram dadas como mortas. Na internet, no meu quarto de hotel, vejo as reportagens e vídeos feitos a partir de telemóveis. Penso sobre as casas que vi aqui e sobre as pessoas que as habitam. Toda a sua esperança e os seus sonhos. Ainda aqui, em Guimarães, a minha namorada sofre um aborto espontâneo, na noite portuguesa. Sangue nos lençóis. Qualquer entendimento ou representação do mundo à minha volta parece-me impossível. O Pedro leva-me a um homem que tem dois enormes bois. Eles têm uns cornos impressionantes e a casa do homem está cheia de taças e prémios ganhos em concurso. Eu levo o carro para dar umas voltas e ver. Vejo o novo. Vejo o velho. Os dpois não se parecem encontrar. O rio está sujo. Mas eles dizem-me que está menos sujo do que antes e em todo o lado há fábricas de têxtil abandonadas. Penso em dinheiro, poder e fado. Faço as minhas fotografias.

JH Engström  
Guimarães, Julho de 2011

Conto colocar amanhã os comentários que este texto me sugere.