Wednesday, October 31, 2007

PINTURAS DA CHINA



Inspired by family photos from the Cultural Revolution period, as well as the European tradition of surrealism, Zhang Xiaogang’s paintings engage with the notion of identity within the Chinese culture of collectivism. Basing his work around the concept of ‘family’ –immediate, extended, and societal – Zhang’s portraits depict an endless genealogy of imagined forebears and progenitors, each unnervingly similar and distinguished by minute difference.
Often painted in black and white, Zhang’s portraits translate the language of photography into paint. Drawing from the generic quality of formal photo studio poses and greyscale palette, Zhang’s figures are nameless and timeless: a series of individual histories represented within the strict confines of formula. The occasional splotches of colour which interrupt his images create aberrant demarcations, reminiscent of birth marks, aged film, social stigma, or a lingering sense of the sitter’s self assertion.
Incorporating the aesthetic of traditional Chinese charcoal drawing, Zhang’s style wavers between the exaggeration of animation and stoic flatness. Muted and compliant, Zhang’s extended family convey individual identity through their unalterable physical features: too big heads, tiny hands, long noses, and subtle alterations in hairstyle give clues to intimate characteristics and stifled emotions. These dream-like distortions give a complex psychological dimension to Zhang’s work, heightening the tension of regulated claustrophobia, and initiating suggestive narrative readings.

Xiaogang Zhang (nasceu em 1958 e reside em Beiging) registou nove vendas acima de um milhão de dólares em menos de um ano.

O TRUQUE DO REFERENDO

No Quarta República , J M Ferreira de Almeida recomenda a leitura do artigo Quem tem medo do referendo de Vasco Graça Moura, publicado hoje no Diário de Notícias.
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Vasco Graça Moura é, inquestionavelmente, senhor de uma bagagem intelectual com um peso que se avista, mesmo ao longe, de várias perspectivas. Paradoxalmente, ou talvez não, quando põe o chapéu de comentador político as ideias saem-lhe, não raras vezes, baralhadas.
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Neste seu artigo "Quem tem medo do referendo", VGM cai em armadilhas de argumentação que ele próprio colocou.
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Vejamos: Reconhece VGM que
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"É verdade que a figura do referendo é um expediente mais ou menos demagógico e que os eleitorados tendem a transpor para a votação, sem grande custo aparente, as queixas que tenham em relação aos seus governos. Mas isso é uma responsabilidade dos próprios eleitorados e não pode haver quem se lhes substitua no exercício dela, por mais desvirtuado que seja."
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E acrescenta, logo a seguir, que
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"se reconhece ser ela (a democracia representativa), ainda assim, melhor que todos os outros sistemas"
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No penúltimo período do seu artigo, VGM coloca de parte a sua análise indecisa aos méritos e deméritos do referendo e desloca o seu raciocínio para a crítica ao Tratado: percebe-se que não concorda com ele, e que, muito provavelmente, havendo referendo votaria Não.
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As conclusões são óbvias: VGM não concorda com os termos do Tratado e confia que do jogo demagógico do referendo resulte a possibilidade de ganhar o Não. Consequentemente, VGM entende que o futuro de 500 milhões de europeus possa depender do juízo que eles fizerem, muito provavelmente não acerca acerca dos termos do Tratado mas das birras locais que não podem deixar de acontecer em algum ou alguns dos 27 estados membros. Que daí resulte uma nova e mais grave crise institucional e a confiança dos europeus na União seja irremediavelmente abalada é um aspecto que não merece ao deputado europeu a mínima reflexão.
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Parafraseando uma crítica a uma frase que ficou lamentavelmente célebre, VGM sabe muito bem que continuará a haver União Europeia se não houver Tratado ... mas não será lá grande coisa.
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Aparentemente, para Vasco Graça Moura esta é uma questão menor.

QUANTO VALE O PAPA?



"The Pope"(1997), de Minjun Yue, é a obra que obteve o oitava melhor preço até hoje atingido em leilões de arte contemporânea. Foi leiloado pela Sotheby´s, em Londres, por 3,7 milhões de dólares.
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Yue Minjun Biography ,
1962, Born in Daqing, Hei Long Jiang province, China
1968, Moved to Beijing
1979, Worked as an electrician, Ocean Oil Company, Tianjin
1983, Graduated form Hebei Normal University, oil painting department
1996, Designed Redstar watch for The Artists Collection of Swatch Watches, 1996 Spring Collection


Artprice
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Quem foi que disse que tudo o que é chinês é barato?

PORQUE NÃO!

Ainda no conselho nacional do PSD de ontem, foi decidido votar contra o orçamento apresentado pelo governo e que vai começar a ser discutido na Assembleia da República na próxima semana. O PCP já tinha anunciado idêntica posição, muito provavelmente por razões diversas, se não contrárias.
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O contribuinte ouve estes anúncios tomados antes da discussão em sede própria e interroga-se qual o papel dos deputados para além de se entreterem com discursos inconsequentes, levantarem-se quando os mandarem levantar-se, e o chefe da bancada do PSD ter enervado ou não o chefe do governo. Se as posições relevantes estão pré-definidas porquê o debate?
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Porque, segundo o prof. Marcelo, se o chefe da bancada do PSD conseguir irritar o chefe do governo, ganha o debate.
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É o combate dos galos com sala cheia. O que estará em causa não será o orçamento mas quem irrita quem. Quanto ao orçamento, é sim porque sim!, é não porque não!

POR QUE NÃO?

O conselho nacional do PSD reuniu ontem à noite e decidiu, por maioria, que a ratificação do Tratado Reformador se deve efectuar na Assembleia da República, contrariando uma decisão tomada anteriormente pelo mesmo conselho. Aqueles que votaram contra ou se opõem a esta posição do partido, de entre os quais se salienta Pacheco Pereira, argumentam que o PSD se põe deste modo a reboque do PS e poderá ficar em situação equívoca se o governo decidir mesmo promover o referendo.
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Mas é um argumento que não faz sentido. Ao tomar esta decisão, o actual líder do PSD invoca, que se alteraram recentemente os órgãos do partido cabendo-lhe toda a legitimidade para alterar resoluções anteriores. E tem razão. Por outro lado, assume uma posição acerca do Tratado antes de ser conhecida a posição do governo. No caso do governo decidir promover o referendo, a discussão passa a ser outra: a da ratificação ou não do Tratado, e a propósito dela já o PSD deu uma indicação clara de que é favorável à ratificação.

Tuesday, October 30, 2007

EDUQUÊS - 2

de Nuno Crato, Publicado no Expresso de Sábado passado:
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Pouca gente o sabe, mas a Matemática do Ensino Básico rege-se actualmente por dois documentos discrepantes. A correcção está prevista, mas prepare-se o país para o pior: a ser aprovado um documento de reajustamento agora em discussão, a Matemática da escolaridade obrigatória passará a reger-se por três documentos desconexos. Sim, três.O primeiro é o «Programa», completado em 1991 e que, com Roberto Carneiro, introduziu oficiosamente a pedagogia construtivista no ensino, com as consequências que se conhecem. O segundo é o chamado «Currículo Nacional do Ensino Básico - Competências Essenciais», construído ao longo de vários anos, nos tempos de Ana Benavente, e aprovado em 2001, estando previsto ser concretizado num programa que substituiria o de 1991 e que nunca foi acabado. O terceiro será um documento de reajustamento, colocado fugazmente à discussão este Verão e agora em análise na 5 de Outubro. Pretendeu o ministério evitar as descontinuidades e as grandes reformas pedagógicas; em vez de estabelecer um novo programa, fez um reajustamento que permitisse clarificar o que se ensina na Matemática do Básico. É natural que as intenções tivessem sido de tornar claro o que se ensina e não se ensina e de esclarecer o que se pretende que os jovens aprendam e consolidem ao longo dos nove anos do ensino obrigatório. Esperariam pais e professores que o novo documento resolvesse as incoerências entre o «Programa» de 1991 e o «Currículo» de 2001 e que traçasse objectivos claros, ano a ano, com rigor, objectividade e alguma exigência. Engano. O nosso Ministério da Educação tem dito que quer cortar com o passado. Transmite uma imagem de rigor e até de intransigência. Seria bom que cortasse também com o passado nas orientações pedagógicas que a experiência mostrou serem erróneas. A reformulação do programa é pouco clara nos objectivos e conteúdos, mas insiste na má orientação pedagógica da Matemática e em muitos dos erros das últimas décadas. Quer isto dizer que as vozes críticas que se têm levantado na educação continuam a não ter qualquer sucesso? O reconhecimento público quase generalizado de que as coisas não vão bem no ensino, em particular no da Matemática, não tem abrandado o dogmatismo daqueles teóricos da pedagogia que de há anos a esta parte negam a evidência dos resultados e se esforçam por propagar a «escola inclusiva», as «competências gerais», a «pedagogia não directiva» e o «ensino centrado no aluno». Mas tem obrigado a um maior comedimento nas palavras. Os dislates discursivos que ficaram conhecidos como «eduquês» abrandaram. O sestro não. Um exemplo elucidativo é fornecido precisamente pelo actual documento de reajustamento do programa. Os seus responsáveis defenderam durante anos uma teoria pedagógica perniciosa que opõe conteúdos a competências. Defenderam que os conteúdos não fazem sentido se não estiverem englobados em «competências», conceito que corresponderia a atitudes, conhecimento em acção ou capacidades gerais. Se esta teoria pretendesse apenas contrariar o ensino excessivamente livresco e sublinhar a importância de aplicar os conhecimentos, nada haveria a opor. Contudo, como é habitual entre ideólogos dogmáticos, o prélio foi levado ao limite, rejeitando a importância do conhecimento e acentuando competências vagas e palavrosas. A moda alastrou ao Ensino Superior. Aos professores começou a pedir-se que preenchessem formulários longos em que fossem destacadas as «competências comunicacionais» da Álgebra ou as «competências multiculturais» da Electrónica. No Ensino Básico, as «competências» foram de tal forma glorificadas que os documentos oficiais desprezam o valor do conhecimento em si. Como resultado, as exigências claras e precisas respeitantes aos conteúdos começaram a ser substituídas por referências palavrosas e vagas às competências genéricas. Começou a falar-se do «conhecimento contextualizado» como receita geral, esquecendo a necessidade da abstracção. A verdade, contrariamente ao documento de 2001, é que o conhecimento não pode nem deve ser totalmente organizado em competências e deve ser especificado em conteúdos disciplinares precisos e testáveis. Como os críticos dessa orientação focaram, dever-se-ia utilizar «conhecimentos e capacidades» ou outra expressão que explicitamente incluísse os conteúdos. Mais importante do que o invólucro são as recomendações práticas. Começando pelas omissões. Como o afirmou a Sociedade Portuguesa de Matemática num parecer sobre este mesmo documento, ele «não constitui um apoio claro e preciso, de consulta simples e directa, para o professor. Constitui apenas um amontoado de recomendações, algumas ambíguas, outras de hierarquia confusa, muitas redundantes, algumas repetitivamente apresentadas». Ao contrário do que seria de esperar, o documento não apresenta metas claras e verificáveis para as diversas etapas. Diz que o «professor decide o nível de profundidade a tratar cada tópico» (pág. 11) e rejeita a apresentação de «um roteiro possível de temas e tópicos a trabalhar por se considerar que tal deve ser definido a nível de escola ou de agrupamento escolar» (pág. 2). O estado actual do ensino e das escolas, no entanto, necessita de recomendações objectivas e precisas, onde possível especificadas ano a ano. É absolutamente indispensável que os professores e as escolas trabalhem com metas claras. Os vícios da linguagem «não directiva» continuam. Fala-se em «discutir com os alunos» (pág. 62) e nunca em «transmitir conhecimentos». Fala-se em «tarefas que o professor decide propor» (pág. 12) ou «pedir» (pág. 35) e não se diz que as deve «indicar» ou «mostrar». Para se perceber a profundidade do descaminho linguístico, basta dizer que nem uma única vez se usa a palavra «ensinar». O mais gravoso é a persistente desvalorização da memorização, dos automatismos e da mecanização dos algoritmos. Desiludem-se os professores e pais que esperavam encontrar recomendações claras sobre a necessidade de domínio da tabuada, de prática de algoritmos das operações elementares e de domínio de conhecimentos. Não se clarifica, por exemplo, em cada etapa de estudo, a destreza na multiplicação com papel e lápis que os estudantes devem ter. Insiste-se no uso da calculadora desde o Primeiro Ciclo. Aquilo que toda a gente sensata vê com facilidade, que é a necessidade de evitar a máquina enquanto se aprende a tabuada e as operações elementares, os ideólogos dogmáticos do «eduquês» não conseguem ver. As ferramentas modernas, como a calculadora e o computador, devem ser introduzidas no Ensino Básico. E mesmo no Primeiro Ciclo pode ser conveniente que os alunos comecem a familiarizar-se com estes instrumentos. Mas é absolutamente necessário que os jovens estudantes sejam impedidos de usar a calculadora no momento em que estão a memorizar a tabuada e a treinar as operações. Não se aprende a nadar passeando de barco. A calculadora pode e deve ter lugar na sala de aula, mas quando o professor disser, não quando os alunos quiserem. O programa de 1991 cometia o erro de dizer que o aluno tem o direito de usar a calculadora sempre que o entender. O novo documento deveria corrigir expressamente esse erro absurdo, ao invés de voltar a insistir no uso indiscriminado da máquina. Mas alguma vez a «nomenklatura» da Educação reconheceu algum erro?! O problema, infelizmente, não é apenas português. Se lermos o recém-publicado Eduquês: Um Flagelo sem Fronteiras, de Laurent Lafforgue e outros (Gradiva, 2007), vemos como a degradação dos conteúdos disciplinares e a sobrevalorização da calculadora têm ajudado a degradar as capacidades de cálculo e de raciocínio numérico dos jovens franceses e de outros países europeus. O documento de reajustamento do programa menospreza os algoritmos tradicionais e pretende que os professores treinem o cálculo por processos morosos, pouco eficientes e viciadores. Assim, por exemplo, defende-se que se aprenda a somar 3 com 4 fazendo «3+3+1=7» (pág. 17), a somar 543 com 267 por «somas parciais» (pág. 19) e a dividir 596 por 35 por «subtracções sucessivas» (pág. 19). Ou seja, em vez de exercitar a memória e treinar os processos mais eficientes, pretende-se prolongar no aluno o uso de métodos de recurso propensos ao erro. Ao mesmo tempo que se desprezam os objectivos modestos, mas atingíveis, destacam-se metas utópicas, como a de os alunos serem «capazes de fazer Matemática de modo autónomo», nomeadamente «formular e investigar conjecturas matemáticas» (pág. 6), recomenda-se que realizem «investigação matemática» (pág. 11) e diz-se que devem «descobrir os critérios de divisibilidade» (pág. 35). Poderá pensar-se que se trata apenas de exageros, mas uma das características mais marcantes do construtivismo educativo dogmático é falar da compreensão, da descoberta autónoma e do desenvolvimento do raciocínio - metas grandiosas! - e, ao mesmo tempo, repudiar o desenvolvimento das destrezas básicas que lhes são antecedentes. Para que os fracassos destes métodos de ensino não se revelem, o documento defende que a avaliação deve «centrar a sua ênfase no que os alunos sabem, o que são capazes de fazer, e como o fazem, em vez de focar-se no que não sabem» (pág. 13). Frase lapidar! A merecer moldura negra para relembrar às gerações futuras o que ideólogos dogmáticos dizem quando cegos pela sanha ideológica. Esta ideia, por si só, erradicaria por completo o insucesso escolar. Teste-se nos alunos o que eles sabem e não o que deveriam saber que o país progredirá sem o incómodo de conhecer as suas deficiências educativas.Por estranho que pareça, a ideia de rejeitar a avaliação como algo incómodo não é uma excentricidade do «eduquês», antes é parte integrante e basilar dos extremos da pedagogia romântica. Alguns, negando a possibilidade de objectividade absoluta, rejeitam a avaliação no seu todo como um resquício do positivismo (pobre positivismo!). Outros assumem alguns momentos de teste de conhecimentos, mas apenas como pró-forma prófuga. Apesar de largamente discutidos e anualmente polemizados, os exames rareiam em Portugal. Os estudantes passam os nove anos de escolaridade obrigatória sem nenhum exame nacional. Apenas no 9.º ano, depois de terem frequentado dezenas de disciplinas, são testados nacionalmente a duas. Apenas duas: Português e Matemática. Mesmo nestes exames, que só existem de há três anos a esta parte, a classificação obtida apenas conta para 30% da nota final. Os efeitos são reduzidíssimos, embora tenham tido uma acção moderadora. O país mudou desde que os exames nacionais do 12.º ano, com Marçal Grilo, e os exames nacionais do 9.º ano, com David Justino, foram instituídos. Imagina-se que mais poderia mudar se a avaliação externa nacional fosse mais frequente, se incidisse sobre mais disciplinas e se fosse mais rigorosa e fiável. As mudanças no sistema de avaliação são decisivas para a regulação de todo o sistema educativo. Mas, ao longo de anos de provas de aferição e de exames nacionais, o ministério não conseguiu (ou não quis) instituir testes fiáveis, isto é, comparáveis de ano a ano e, por isso, avaliadores da evolução global do ensino. A agravá-lo, fala-se em limitar o âmbito dos exames do 12.º ano às matérias desse ano lectivo e não às de todo o Ensino Secundário, como tem sido regra. Mantêm-se as oscilações. No fim do ano lectivo transacto, o exame de Matemática do 12.º ano teve mais meia hora de tempo de prova, mantendo um conteúdo comparável ao dos anos anteriores. A percentagem de aprovações subiu de 71% em 2006 para 82% em 2007. Na Matemática do 9.º ano, o único nível onde houve um plano de acção ministerial específico, a percentagem de aprovações desceu de 37% para 27%. No Português do mesmo nível escolar, a percentagem de aprovações subiu de 54% para 86%. São oscilações espantosas. Alguém acredita que correspondam a mudanças reais nos conhecimentos dos alunos? Uma das conclusões dos estudos internacionais é a da grande inércia dos sistemas de ensino. Os resultados reais mantêm-se semelhantes ao longo de anos e só lentamente mudam. Em Portugal, aquilo que os alunos sabem também tem mudado pouco. O que tem mudado são os exames. Querendo moralizar o sistema de ensino, é indispensável produzir exames fiáveis, comparáveis ano a ano. Estamos a começar um novo ano lectivo. Imagine-se um professor dedicado, tentando este ano dar mais atenção às deficiências básicas dos seus alunos e desdobrando-se para incentivar ainda mais os melhores. Imagine-se um casal que resolve investir mais no seu filho, acompanhando diariamente os seus estudos. Imagine-se um jovem aluno do 12.º ano, ambicionando notas elevadas para poder entrar no curso que escolheu. E pense-se agora que as notas finais vão depender em larguíssima medida não do trabalho do professor, não do esforço dos pais e não do trabalho do aluno, mas sim da maneira como este ano forem feitos os exames.É difícil trabalhar numa escola assim! Generalizar e reformular a avaliação é uma das tarefas mais urgentes do nosso sistema de ensino. Conte-se com os professores que gostariam de ver o resultado do seu trabalho honestamente medido. Conte-se com as famílias que começam a perceber o logro dos progressos fictícios. Não se conte com o «eduquês». Olhemos para a maneira como as «competências» são tratadas neste novo documento. Omitem-se e substituem-se por «conhecimentos e capacidades»... O facto seria de louvar, mas é tão surpreendente nas pessoas que mais defenderam a teoria das competências que é difícil de perceber. Os documentos estão na Internet e permitem uma busca por palavras. Procure-se «competência», ou «competências». Desapareceram! A tentativa de evitar a controversa palavra foi tal que, nas referências bibliográficas, o próprio título do documento de 2001 foi truncado. É espantoso. A surpresa é quase tão grande como a que teríamos se, subitamente, padres da Igreja Católica elidissem do seu vocabulário a palavra «Jesus».

INFORMAÇÂO PRIVILEGIADA - 3

Acaba de ser publicado mais um fascículo do folhetim que, pelo menos provisoriamente, tem agora o título Millennium BPI . Percebe-se mal, pelo menos para aqueles que não estejam familiarizados com todas as intrigas com que se tece esta história, que os termos do casamento, que pelos vistos ambas as partes desejam, não tenham sido discutidos em privado pelos protagonistas.
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Percebe-se mal como é que possa ter acontecido a incrível peixeirada durante o programa "Prós e Contras" de ontem à noite.

ABSOLUTAMENTE DÉFICE - 2

O meu comentário ao "post" de Pinho Cardão no Quarta República mereceu de Tavares Moreira e Suzana Toscano os comentários, que a seguir transcrevo e comento:
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Tavares Moreira said... Caro Rui Fonseca,
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Passei agora por mais este oportuno POST do Pinho Cardão e reparei na sua insistência sobre a existência ou não de uma iniciativa do PSD, no decurso do próximo debate orçamental, de propositura de um plano de acção para a racionalização da despesa pública.Acha mesmo o meu preclaro Amigo que é essa a função da Oposição - propor planos de acção?Não considera que o papel da oposição fica melhor no controlo político dos planos de acção prometidos pelo executivo, para saber se têm os efeitos anunciados ou não?Não têm faltado, como deve ter reparado, anúncios de medidas mais ou menos profundas, de carácter estrutural, para reduzir/racionalizar a despesa pública.Não me parece que o papel da Oposição seja propor ainda mais medidas, antes de se verificar se as que o Executivo prometeu, produzem os resultados anunciados...Não devemos, também aqui, colocar o carro à frente dos bois...Digo-lhe até mais: se a Oposição (maxime PSD) for capaz de exercer com saber e perspicácia a referida função de controlo político, já nos deveríamos dar por muito felizes!O problema está em que, ordinariamente, esse controlo tem ficado muito, mas muito aquém do desejável.Penso eu de que...
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Suzana Toscano said...
Concordo consigo, Tavares Moreira, acho que é esta a resposta ao caro Rui Fonseca, seria muito cómodo se passasse a ser a oposição a propor medidas (sobretudo as difíceis) e depois o Governo criticar. Porque, se não for para criticar, porque é que dá a primazia? A cada um o seu espaço...já não é nada mau se a oposição for responsável e não destruir com críticas as propostas do Governo com as quais concordaria se estivesse nesse lugar!Não seria inédito, mas seria muito censurável.
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Rui Fonseca said...
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Caro Tavares Moreira,bom dia!
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Agradeço-lhe o comentário com o qual concordo, porque é pertinente por duas razões inamovíveis:
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- não sendo eu, nem nunca tendo sido político, nem tendo pretensões a ser, assumo estas questões com o desprendimento e o voluntarismo que a minha condição liberta me concede; daí a ingenuidade da proposta, do ponto de vista do jogo político; daí a minha condição de autêntico velho ingénuo.
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- mas da minha proposta e do seu comentário (que está, de muito longe, muito mais e melhor acompanhado que a minha) ressalta uma conclusão e uma interrogação, inevitavelmente ingénua:
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Se à Oposição só compete (e já é um feito se o fizer!) controlar a realização dos programas do governo, que sentido tem uma discussão de um orçamento geral do Estado? Não estamos, neste caso, perante uma situação passível de controle mas, quanto muito, de crítica. Ora, parece-me, que a crítica pressupõe uma apreciação relativa de valores, monetários ou/e dos outros.Se uma proposta que precisamos ver discutida é a redução da despesa, alguém terá de a fazer em sede própria se o governo não a fizer.
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Por maior impacto que tenha na opinião pública o Quarta República e a persistência e oportunidade do Pinho Cardão. Sei que, como Suzano Toscano refere, o que é normal é "já não (ser) nada mau se a oposição for responsável e não destruir com críticas as propostas do Governo com as quais concordaria se estivesse nesse lugar" E, relativamente às quais não concorda? Abstem-se? Não, de maneira nenhuma. Vota contra? Certamente. Mas, sem explicações?Sem dizer porquê? E dizendo porquê, sem dizer como? E quanto? E quando?

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Todo o jogo tem a sua táctica e a sua estratégia. A mais comum vai sendo a de esperar que se estrague. As eleições não se ganham, são os outros que as terão de perder.
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Na minha santa ingenuidade (e por me sentar na bancada, valha a verdade) penso que Portugal precisa de quem ouse assumir programas alternativos para separar águas e acordar os cidadãos.
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Acordar a malta. Porque a malta adormeceu outra vez ou nunca deixou de dormitar.

Monday, October 29, 2007

ABSOLUTAMENTE DÉFICE

Pinho Cardão acha que a medição do défice orçamental em relação ao PIB é uma mistificação porque o PIB é projectado com optimismo quanto baste e o défice uma carga que não se ajusta às variações de peso do PIB. Se o PIB encolhe, o défice geralmente não encolhe e, pelo contrário, incha. Sendo as perspectivas de crescimento económico, tanto nos EUA como na União Europeia, para 2008 pouco animadoras, o défice em termos relativos corre sérias ameaças pelo lado do numerador (crescimento défice por contração da actividade económica, nomeadamente das exportações) e pelo denominador (menor crescimento do PIB, pelas mesmas razões). De modo que, clama Pinho Cardão : Abaixo a despesa!
Já somos dois.
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Como nesta coisa de cruzadas os cruzados nunca são demais, vislumbrou Pinho Cardão outro companheiro de jornada na pessoa do professor Campos e Cunha, e destacou do seu artigo no Público de sexta-feira, a seguinte passagem:
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"foram apresentadas as contas públicas. Não deixo de assinalar que pensava ser quase impossível cumprir o objectivo défice sem a reforma da administração pública. Mas enganei-me. Apesar da reforma da administração pública ter ficado pelas leis, o objectivo foi cumprido. As receitas dos impostos superaram as expectativas, o PIB foi revisto em alta, o investimento foi cortado e o resultado foram os mágicos 3 por cento. Fica, no entanto, este resultado envolto em mistério, como tudo o que é mágico. O INE põe cá fora três versões do relatório de défices excessivos no espaço de poucas semanas. E o INE viu-se obrigado (e bem) na última versão, a reafirmar aquilo que só os entendidos sabem: as contas do ano corrente - ou seja 2007 - são da exclusiva responsabilidade do Ministério das Finanças. Primeiro corrigiram-se ( ou reclassificaram-se ) os valores do investimento público, deixe de cair em relação a 2006 em termos reais, embora continue a cair em percentagem do PIB. Depois corrige-se o valor do PIB e a 16 de Outubro o défice passa de 3,3 por cento para 3 por cento. Porquê tudo isto? Ninguém sabe! Para poucas semanas são trabalhos a mais nesta empreitada."
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Comentei.
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Terminas (...) dizendo
"Vou tendo, pois companhia!...", e, dizendo isto presumo que te referes a Campos e Cunha. Contudo, no mesmo artigo, ele continua a resmungar assim:
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"Curiosamente, estas interrogações (penso que legítimas) não levaram Manuela Ferreira Leite a pedir esclarecimentos. No congresso do PSD MFL resolveu discutir o orçamento (ou a estimativa do défice) de 2005!Se vamos a discutir o passado, falemos de 2004, que, apesar dos truques contabilísticos e subida do PIB, ficou em 3,4% e, sem aqueles, passa em muito os 5%. E a célebre operação de MFL de titularização dos créditos fiscais , em 2003, apesar de todos os esforços de quatro ministros das Finanças de Portugal, apenas recentemente foi aprovada pelo Eurostat. E logo que (finalmente) aprovado, o Eurostat fez questão em proibir, para todos os países e daqui para a frente, todas as operações daquela natureza! Entendido?"
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Portanto, (...), parece que Campos e Cunha se deu uma no cravo fartou-se de martelar depois na ferradura.
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Para bater rijo no cravo, meu caro, temos a discussão do orçamento para 2008 à porta. 2007, a bem dizer, já lá vai. É altura, portanto, de dar com força no sítio certo.Por mim, não discuto mais a questão da relatividade do défice. Ponho-me do teu lado e faço coro contigo: "abaixo a despesa, absolutamente!"
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Acreditas que o PSD (e o CDC, já agora) se vão bater pela redução défice de 4 100 milhões proposto pelo governo?
Apontando onde, quanto e como? Não creio. Mas gostaria de estar enganado.

INFORMAÇÂO PRIVILEGIADA - 2

O Jornal de Negócios Online de hoje faz manchete com a informação dada ontem por Marcelo Rebelo de Sousa no seu programa dos domingos na antena 1: de que Jardim Gonçalves tem relatório do Citibank aprovando a fusão entre o BCP e o BPI. Trata-se, obviamente, de um abuso de linguagem na medida em que compete aos accionistas tal operação e não a um banco concorrente. Entendendo a notícia em termos hábeis, como dizem os advogados, o relatório em questão foi, muito provavelmente, encomendado pelo BPI ou por Jardim Gonçalves, ou por ambas as partes quando o BPI deu a mão a Jardim Gonçalves e, com esse gesto, atirou Teixeira Pinto para fora da carroça. Tratando-se de uma encomenda, se não satisfizesse os interesses de quem encomendou, não veria a luz do dia. Se fosse, como é, aprovador, só cumpriria o objectivo se fosse divulgado. Neste caso, o segredo não é a alma do negócio.
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Ainda no mesmo Jornal de Negócios Online, e, contrariando mais uma vez o aforismo, é divulgado que a gestão do BCP não aprova a proposta mas que só amanhã o conselho executivo se pronunciará. Depois cabe a vez ao conselho de supervisão e, finalmente, a assembleia de accionistas.
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Perspectiva-se, portanto, uma longa metragem para delícia dos media.

Sunday, October 28, 2007

INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA

Ontem o suplemento Única do Expresso transcrevia a carta confidencial enviada por Jardim Gonçalves e entregue em mão a Filipe Pinhal onde JG solicitava indicação do montante da dívida do seu filho Filipe ao BCP com o objectivo de aquisição do crédito e regularização da dívida perante o Banco.
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O segredo bancário, definitivamente, já não é o que era.

EDUQUÊS

Por sugestão colhida no Quarta República trouxe de O Sexo dos Anjos a transcrição de uma entrevista dada por Nuno Crato à revista VISÃO, " onde se explica como a ideologia tem sido desastrosa para o ensino português. E leia-se de novo o que a este propósito ficou logo no número inaugural da Alameda Digital."
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Uma professora de Ciências pede à turma para inventar uma experiência científica. Uma aluna deixa cair duas bolas, uma de pinguepongue outra de ferro, e diz que a segunda cai mais depressa dado o seu peso. Satisfeita, a docente diz à aluna para apresentar o trabalho num concurso de ciências.«A professora, evidentemente, não sabia que Galileu demonstrou que a velocidade da queda livre dos corpos se deve ao atrito e não à diferença de peso», explica Nuno Crato, 54 anos.
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O episódio desta aula de Ciências, em Sintra, o ano passado, vem transcrito em O Eduquês em discurso directo e é utilizado pelo autor, professor universitário, para exemplificar os efeitos que a pedagogia «romântica e facilitista» produziram no ensino português. Repescando e criticando opiniões de governantes e docentes, Nuno Crato mostra que o «eduquês» é um conjunto de lugares comuns e de ideias vazias - a vitória do laxismo sobre o rigor e o esforço
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VISÃO: Quem ler o seu livro fica com a sensação de que nunca a Educação esteve tão mal... É uma ilação possível?
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NUNO CRATO: De uma coisa tenho a certeza: a escola está muito mal e se não a mudarmos rapidamente sofreremos todos, os jovens e o País. Houve uma série de ideias erróneas que tiveram um peso muito grande na Educação e que são talvez os maiores responsáveis pelo estado a que se chegou. Falo da formação dos professores, dos métodos de avaliação, das directivas avulsas do Ministério da Educação.
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É a tal pedagogia romântica e construtivista que, no seu entender, liberta o aluno de qualquer exigência...
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Exactamente. Parte-se da ideia romântica de que a pessoa aprende por si e que basta motivar as crianças para que elas se desenvolvam e atinjam o conhecimento. Os resultados são desastrosos. Veja-se que só no último ano passou a haver exame nacional no ensino básico. Durante décadas, o ensino obrigatório terminava sem uma única avaliação externa. E porquê? Porque durante anos os românticos defendiam que o exame não avaliava todas as competências dos alunos e que lhes criaria traumas quando não corressem bem. Embora com alguma verdade, estes argumentos serviram para adiar os exames. E, sem eles, o ensino cai na decadência que se tem visto.
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Porque vê como positivo a introdução de exames no 4.°e 6.° anos de escolaridade?
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É necessário haver mais momentos de avaliação entre o início e o fim da escola. É errado haver apenas exame no 9.° ano. Nove anos é muito tempo para aferir, num só momento, todo o percurso educativo. Isso existiu durante muito tempo sem resultados traumáticos. Claro que o exame não deve ser o elemento avaliativo absoluto, mas devia pesar mais do que os 25% actuais. No mínimo, 30 por cento.
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O facilitismo que diz nortear a Educação começa na escola ou as crianças já o trazem de casa?
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Não sei, talvez fosse interessante um estudo sociológico sobre essa questão. Julgo, contudo, que existe uma cultura geral, em Portugal, que não valoriza o conhecimento, o estudo e o trabalho. E isso reflecte-se na escola, onde interessa que o aluno passe de ano, em vez de aferir o que eles efectivamente sabem. Por cá, os pais só procuram os professores para se queixarem das más notas dos filhos.
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Quando é que tomou consciência desse estado de coisas?
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Em 2001, quando regressei dos Estados Unidos. Vinte anos antes, quando parti, pensava que o ensino americano não prestava. Ao voltar, percebi que era a nossa escola que estava pior. Lá não existe o centralismo da Educação como em Portugal. Têm planos educativos alternativos - os trackings - que permitem a um aluno com dificuldades prosseguir os estudos com acompanhamento especializado e uma avaliação rigorosíssima dos professores. Claro que também eles tiveram muitos conceitos românticos no ensino, mas nos anos 60 e setenta....
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Enquanto, por cá, persiste o «eduquês»?
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O antigo ministro Marçal Grilo criou esse termo, gracejando com a linguagem confusa e imperceptível dos agentes educativos. O que eu reparei, lendo várias publicações da área, foi que por detrás dos discursos de alguns não existem estudos técnicos mas pura ideologia. Exemplo taxativo: um professor que discute se 4x1 é igual a 4 ou se isso é uma manobra de exploração capitalista. E isto foi publicado há dois anos!
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Mas crê que esta posição é representativa do ideário dos professores?
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Não, mas o facto de ninguém da Educação criticar abertamente esta posição produz uma permissibilidade.
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O seu livro é particularmente crítico para com as posições da ex-secretária de Estado, Ana Benavente. A vossa discordância é total?
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Não estão em causa as pessoas, mas sim as ideias, sobretudo as de alguém que foi governante e que teve grandes responsabilidades na política educativa. Separam-nos muitas coisas, em particular no sistema de formação de professores, o qual devia compreender um exame de admissão à profissão.
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Tal como na Ordem dos Médicos ou na dos Advogados?
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Exactamente. Os professores chegam hoje à profissão com treinos muito diversos. O facto de o ingresso depender apenas da nota de fim de curso e não de um exame leva as instituições de ensino superior a inflacionarem as notas, incentivando os professores a escolherem as escolas mais facilitistas, onde conseguem melhores classificações.
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Por isso diz haver um défice de cultura de base nos professores?
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Pelo menos em alguns casos é uma verdade. E isso conduz a uma postura construtivista perigosa, na qual, deixado a si próprio, o aluno consegue redescobrir toda a ciência que a Humanidade produziu. Se fosse assim, a escola não era precisa. Mas é: toda a cultura e ciência foram construídas laboriosamente, durante séculos, contra o senso-comum e as ideias feitas. Não é possível a um aluno, por mais inteligente que seja, refazer sozinho todo esse percurso.
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Até que ponto é errado pôr a tónica central do ensino na motivação do aluno?
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Segundo o dogmatismo da ideologia romântica, o que a criança descobre vale enquanto o que se lhe transmite não vale. É preciso ajudar o aluno a descobrir algumas coisas, mas muitas têm de lhe ser transmitidas. É bom que ele saiba pensar, mas também que saiba memorizar e exercitar. Quando me falam em desmotivação dos alunos eu pergunto: Será que não estudam porque não estão motivados, ou não estão motivados porque não percebem a matéria?
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Presumo que se incline para a segunda opção...
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Evidente. Existe a ilusão romântica de que os exercícios repetitivos fazem com que os alunos detestem as matérias e se desmotivem. Eu acho que se desmotivam quando não as compreendem.
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A Matemática é um caso flagrante?
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Sim, mas as dificuldades sentem-se em todas as disciplinas. A matemática deve ser dada da maneira mais criativa possível, mas o ensino não deve ser subordinado ao que é apelativo. Senão, estaríamos a competir com a televisão.
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Nota essas debilidades nos seus alunos universitários?
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Têm pouco raciocínio abstracto: qualquer problema que se lhes apresente tem de ser acompanhado por um exemplo, para perceberem. Depois, têm muita dificuldade no trabalho autónomo, nem tentam resolver exercícios sem ir logo perguntar ao professor.
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Como se explica o êxito crescente no estrangeiro de estudantes portugueses?
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Há um crescimento de escolas internacionais em Portugal, cujo êxito, a meu ver, radica na autonomia. O centralismo do ministério, em Portugal, vai ao ponto absurdo de discutir horários. O que tem o ministério a ver com as aulas de 50 ou de 90 minutos? Cada escola devia organizar-se consoante a sua experiência.
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Tem noção que parte das ideias que defende são tidas como reaccionárias?
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Preocupo-me tanto com isso que até procurei citar vários pensadores revolucionários e de esquerda, como o [Antonio] Gramsci, um marxista convicto que, logo nos anos 30, reconheceu que a escola romântica condenava as classes trabalhadoras à ignorância. Se queremos o acesso de todos à cultura, temos de rejeitar ideias que afastam as pessoas desse trilho. O grande paradoxo da dita «escola nova» é que diz preocupar-se com os mais desfavorecidos mas, ao baixar o nível do ensino, faz com que os mais abastados recorram ao ensino complementar privado e os mais desfavorecidos continuem como estão.
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Embora nos últimos anos a rede escolar pública tenha sido equipada com Internet, mediateca...
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Não é por haver net que passa a haver gosto pela leitura, tal como não é por existirem calculadoras que os alunos passam a perceber de Matemática. A tecnologia não é essencial para melhorar o ensino. Isso consegue-se com a relação professor-aluno, a qualidade dos manuais, a exigente transmissão de conhecimentos e a prática esforçada dos jovens. O problema surge quando há currículos que veiculam o facilitismo, como ter incorporado o Big Brother no programa de Português. Eu chamo a isso «Rousseau, versão pimba». Pensaram que ao porem nos manuais coisas pimba e de apreensão rápida, os alunos vão aprender Português, ao passo que a literatura é aborrecida e, como tal, não deve ser ensinada. O que não se pensou é que o Big Brother é muito mais aborrecido do que um conto de Eça de Queiroz...

Friday, October 26, 2007

A TREPADEIRA

Tavares Moreira em Quarta República comenta mais uma vez a propósito da escalada de juros que continua a formar-se à volta da economia portuguesa. Estando as taxas a níveis ainda relativamente moderadas, acrescente-se.
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"Se me perguntarem onde vamos parar,por este caminho, reservo para já a minha resposta..."
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Caro Tavares Moreira,
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Pois, com sua licença, eu, como não pago imposto por isso (o Ministro das Finanças ainda não se lembrou de um imposto sobre a asneira, que lhe resolvia o défice) arrisco a minha perspectiva:
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Segundo notícias de há dias a Banca portuguesa tem no crédito ao sector imobiliário um encavanço de 57%, em média. São os novos senhorios. Mais a Caixa e o Montepio, menos o BPI, quase todos dependem hoje, em grande parte, da sua condição de senhorio.E não vão querer (ou poder) deixar de o ser e crescer.
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Como a economia está quase recoberta por esta trepadeira que é a construção civil se um dia destes a trepadeira apanha uma moléstia a economia desmorona-se. Se não existissem em muitos casos as garantias pessoais que amarram os arrendatários aos novos senhorios, o muro desmoronava-se mais cedo. Havendo garantias pessoais, a amarração pode aguentar a situação mais tempo.
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Em todo o caso, nem as trepadeiras crescem até ao céu. E se os juros se enlaçarem a elas vem tudo abaixo em três tempos.
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Está a acontecer na América. Mas aí há vários tipos de trepadeiras. As moléstias são mais perigosas no caso de culturas extensivas.
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É escusado dizer que eu percebo pouco de botânica.

MAL QUERIDA MATEMÁTICA

Muita gente nesta terra dá voltas às meninges para arranjar uma explicação para os maus resultados dos estudantes portugueses em matemática. Alguns culpam as calculadoras. É o caso de Margarida Corrêa de Aguiar em Quarta República .
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Já abordei esta questão várias vezes aqui no Aliás, mas como não se dignam de vir até cá continuam a fazer o diagnóstico errado...Perdoem a imodéstia.
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Comentei:
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Salvo o devido respeito, discordo.
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Se a questão nuclear desta fobia matemática residisse na utilização ou não da calculadora o problema estaria há muito tempo equacionado e resolvido.A questão é bem mais complexa.Retiro do seu texto duas afirmações:
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1- "Os maus resultados do ensino da matemática no nosso País são um "quebra-cabeças" para alunos, professores e Ministério da Educação"
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2 - "É hoje reconhecida a importância da matemática para a vida das pessoas em geral."
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No primeiro caso (a preocupação) não incluiu os pais nem a sociedade em geral. No segundo,(o reconhecimento) é abrangente.
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É na contradição entre estes dois pontos que reside o busílis da questão:Na realidade, lamentavelmente, a importância da matemática NÃO é geralmente reconhecida.Conheço mesmo casos de bons alunos de matemática que foram vítimas da sua capacidade. E não estou, ao dizer isto, a tentar fazer humor superficial. Vejamos alguns exemplos soltos:
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Já reparou, certamente, que muitos jovens que se empregam nos centros comerciais fazem as contas pelos dedos ou recorrem às máquinas e, frequentemente, se enganam porque não têm sensibilidade às grandezas com que estão a lidar? Para muitos um resultado de 2,7 que deveria ser 27 não lhes faz soar nenhuma campaínha. Foram estes empregados sujeitos a alguma prova de perícia aritmética pelos empregadores? Pelos vistos não. Contou, sobretudo, o aspecto físico, alguma cunha, mas não os conhecimentos do candidato.
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Vejamos como se comporta outro grande empregador: o Estado.Realiza o Estado provas de avaliação de competência na admissão dos seus funcionários?Nem para a admissão de professores de matemática. Aliás, uma das consequências do "numerus clausus" foi a entrada para as faculdades de matemática de maus (não todos, mas muitos)alunos a matemática no secundário. A crua realidade é bem esta: Muita gente clama que a matemática faz falta mas a verdade é que a grande maioria não é obrigada a dar por isso. A começar pelos alunos e pelos pais dos alunos.Como as pessoas respondem a incentivos, se o incentivo é quase nulo a resposta é a esperada.
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Só mais uma palavra quanto às vítimas de muito boas notas a matemática: alguns enveredam por uma carreira científica. Sabe o que lhes sucede?
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Muitos arrependem-se.

COMENTA DORES

Ontem, na SIC notícias, no programa "Negócios da Semana", tanto o coordenador do programa como os quatro jornalistas convidados, comentaram a proposta de fusão BCP/BPI como uma operação decalcada da OPA falhada movida pelo BCP: o valor de transacção das acções do BCP seriam objecto de negociação.
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Nada mais errado. A proposta pode, eventualmente, vir a ser substituida por outra. Tudo é possível. Mas esta proposta da administração do BPI é muito clara: cada acção do BCP valerá metade de cada uma do BPI. Se uma subir a outra sobe, e vice-versa. Se atendermos à evolução observada, desde o lançamento da OPA hostil, das cotações dos dois bancos, os accionistas do BPI serão, claramente, também neste aspecto, os ganhadores.
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E Fernando Ulrich o laureado. Como previ aqui no Aliás, quando Ulrich aguentou Jardim: não há almoços grátis e desta vez seria J. Gonçalves a pagá-lo. E ainda não sabíamos que teria também de pagar os almoços do filho.
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Do Jornal de Negócios, esta manhã:
Relação entre cotação do BPI e valor da oferta pelas acções do BCP
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Se a proposta de fusão apresentada pelo Banco BPI for aceite pela administração do Banco Comercial Português, as acções dos dois bancos passam a negociar em bolsa de forma correlacionada, permitindo ganhos de arbitragem. Veja aqui as relações entre as cotações.

Thursday, October 25, 2007


Suzhou - Jardim do Humilde Administrador

RANKINGS

Com a divulgação dos rankings do ensino secundário começam as mais diversas explicações dos
vários por quês que estas divulgações suscitam. Para O Jumento
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"Os rankings das escolas secundárias que vão sendo divulgados todos os anos mostram que a massificação do ensino não resultou em maior igualdade social, antes pelo contrário, o sucesso das escolas privadas evidencia que o actual modelo de ensino gera desigualdades. Os mais pobres poderão ter agora mais oportunidades de aceder ao ensino, concluir a escolaridade obrigatória ou mesmo conseguir um curso universitário, mas isso não significa maior igualdade social."
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Comentei


Percebo a sua intenção mas discordo em grande parte do seu raciocínio.

Concordo que as desigualdades persistem e são por demais flagrantes. Mas afirmar que "a massificação do ensino não resultou em maior igualdade social, " carece de lógica.

Pelo menos por três razões:

- Aquilo que v. chama massificação permitiu fazer entrar no ensino secundário (é desse que v. fala quando fala dos rankings acabados de sair, mas já lá vamos ao ensino superior) milhares e milhares de jovens (por isso v. fala de massificação) que antes não entravam.
A passagem pela escola (lamentavelmente muitos abandonam sem concluir mas esse é outro aspecto, que também analisaremos) permite aceder a um grau de instrução (ainda que sofrível em muitos casos) que necessariamente permite alguma ascensão social. Dizer o contrário seria contrariar o que muita gente diz: a instrução é condição necessária para a promoção do desenvolvimento humano.

- Diz ainda v. que "o sucesso das escolas privadas evidencia que o actual modelo de ensino gera desigualdades" . Também neste caso não se descortina nexo entra causa e efeito. Porque é que o sucesso das privadas gera desigualdades? Por serem privadas? Por serem pagas e frequentadas por aqueles que podem pagar? Repare que a desigualdade está antes da escola. Não é a escola que, por ser privada, a provoca ou acentua.

- É um facto que tendencialmente as privadas são frequentadas pelos filhos de pessoas com maiores rendimentos. Mas nem sempre é assim. (...)

Há, evidentemente, razões sociológicas e económicas que justificam em grande parte o sucesso das privadas (no ensino secundário) relativamente às públicas. Isso é incontestável. Mas não justificam tudo. E, sobretudo, não acentuam as desigualdades como v. refere.

Uma parte mais ou menos significativa daquele sucesso também resulta da forma como os professores são recrutados e das exigências a que estão submetidos.

Na escola pública, até agora, os professores foram admitidos sem quaisquer provas de competência. Ao longo da carreira eram promovidos por antiguidade. Por mais incompetente que fosse tinha o lugar garantido e a promoção assegurada.

V. sabe bem que assim é, temos abordado esta questão aqui mesmo várias vezes já.

Os sindicatos dos professores realizaram ao longo de vários anos uma empreitada de perpetuação da incompetência e da irresponsabilidade.

E, nestas, circunstâncias, paga o justo pelo pecador.

Tudo o que atrás referi se reporta ao ensino secundário. Porque no ensino superior, é espantoso, com excepção da Católica (não conheço outra, não garanto que não haja) os mais abonados frequentam o ensino público e os mais desabonados o ensino privado...

Por razões conhecidas que não vale agora a pena referir. Mas que também aqui mesmo já tenho debatido consigo.

Para terminar deixo-lhe 3 questões que não vejo levantadas por ninguém:

1º. Por que gastamos quase tanto com a Defesa como com o ensino superior?

2º. Por que é que continuamos com o ensino superior quase gratuito quando as nossas maiores insuficiências educativas estão no secundário?

3º. Por que é que a Defesa terá em 2008 um aumento de 8,5%, o mesmo do ensino superior, e o ensino secundário não tem qualquer aumento?

Meu caro J., já vai longa esta missiva mas antes de terminá-la ainda queria acrescentar o seguinte:

O 25 de Abril apresentou um caderno reivindicativo - Paz, Pão, Saúde, Habitação.

De guerra, ninguém se queixa
De pão, estamos, em média, bem alimentados. Eu disse, em média.
De saúde, não estamos mal classificados
De habitação, temos 30% de habitações a mais do que famílias.

Tudo em termos médios.

Repare que do caderno reivindicativo não constava a Educação.

E continua a não constar. E aí é que está o problema. A generalidade dos portugueses não vê a educação dos seus filhos como o melhor investimento. A maior parte dos estudantes não se interessa pela qualidade do ensino. Basta-lhes que passem.

Xangai ou o Big Bang

E SE MALTA EMBIRRAR? - 2

Sequência do cruzamento de argumentos com Adolfo Mesquita Nunes em Arte da Fuga a propósito da ratificação do Tratado Reformador.

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Adolfo, voltamos ao princípio?

A democracia representativa foi inventada precisamente para minorar problemas levantados pela democracia directa. Não é a mesma coisa pedirem-me para votar em A ou B, consoante a minha opção, para A ou B escolherem a melhor solução para um problema, ou pedirem-me a mim que resolva eu próprio o problema quando não tenho capacidade para tanto.

Mas nem todos os problemas apresentam igual grau de dificuldade. Alguns desses problemas, eu sei resolver sem recorrer à intermediação de representantes.

Óbvio, não?

No caso do referendo ao Tratado Reformador a questão é nítida: Imagine que todos os países membros, à excepção de Malta, ratificam o Tratado. E em Malta votam apenas 40% dos eleitores (admitamos, 120 mil). Destes 51% votam Não, portanto cerca de 61 mil eleitores. Destes, cerca de metade votou Não porque acha que o Tratado é excessivamente federalista e a outra metade considera-o insuficientemente federalista. Tudo isto em consequência de uma campanha que se polarizou nestes dois pontos.

Há algum sinal de siso nesta imponderabilidade que faz com que quase 500 milhões de europeus vejam os seus destinos comandados pelas caturrices de 61 mil malteses?

Já parece, por outro lado, muito pertinente que os malteses decidam se querem ou não permanecer na UE. Se querem manifestar essa vontade através de referendo ou no parlamento é lá com eles.

Com o meu pedido de desculpas aos malteses que, obviamente, foram atirados para aqui a título de exemplo.

Wednesday, October 24, 2007


Museu de Xangai - guardião celestial

E SE MALTA EMBIRRAR?

Em A Arte da Fuga , Adolfo Mesquita Nunes volta a desencontrar-se com Vital Moreira, a propósito de um "post" deste no Causa Nossa prevendo a hipótese, e tirando o chapéu a Sócrates pela ideia, de referendar, não o Tratdo, mas a presença de Portugal na UE. Hipótese esta que, perdoe-me a imodéstia, se alguém ler isto, tenho dito e redito aqui, no Aliás, e em cruzamento de argumentos com outros bloggers e, nomeadamente, com Adolfo Mesquita Nunes , seria a saída mais satisfatória para uma questão que pode gerar um imbróglio.
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Transcrevo do A Arte da Fuga:

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"Pois eis agora que Vital Moreira
vem dizer que o verdadeiro e genuíno referendo europeu seria, então, perguntar ao tuga-que-não-percebe-nada-de-tratados-mas-já-percebe-de-programas-eleitorais, se Portugal deve ou não sair da UE. E assim se reduz o tuga à estupidez máxima..."

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Comentei:

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Não, Adolfo, não seria a estupidez máxima, seria a forma mais inteligente de resolver a questão do referendo de vez.

Tenho dito o mesmo repetidamente nas minhas palavras cruzadas, algumas das quais neste cruzamento de argumentos consigo.

O que foi mal pensado, do meu ponto de vista, foi o programa de preparação, aprovação e ratificação do Tratado. Imagine que Malta, por exemplo, não ratifica. Vai tudo por água abaixo.

É incrível que ninguém, ao que parece, tenha pensado nisso. Ou, se pensou, não vingou.

Há, realmente, uma cláusula de negociação de saída que é uma espécie de válvula de segurança: quem não se sente bem, sai.

Caso contrário, a UE seria sempre o bode expiatório dos desaires locais; os políticos veriam a UE como o Alberto João vê Lisboa.

Não percebo, francamente, a sua posição: é completamente diferente perguntar ao país em referendo se concorda com o texto de um tratado só acessível a poucos, e que geraria a maior confusão demagógica, de uma questão simples como esta: Concorda ou não com a permanência de Portugal na UE?

Aí sim, a discussão seria clara, porque as diferentes partes teriam de convencer as vantagens e inconvenientes em permanecer ou não, e não a discussão de um articulado complexo.

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De qualquer modo parece-me que o Arte da Fuga está de parabéns, pois tanto Vital Moreira como José Sócrates parece estarem atentos ao que aqui se escreve...

Tuesday, October 23, 2007

POCKER

Pergunta Vital Moreira, em Causa Nossa :
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Os que defendem o referendo sobre o Tratado de Lisboa já experimentaram lê-lo? E acham que algum cidadão comum consegue passar da segunda página? Não será tempo de deixar de brincar aos referendos?
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Pergunto eu: Se já há tanto desencontro entre juristas acerca da realização ou não de um referendo, que clarificação pode resultar para os cidadãos de uma discussão pública acerca dos termos de um Tratado de 152 páginas densas de conceitos jurídicos? Discussão, aliás, que está e estará sempre aberta mas que, paradoxalmente ou não, ninguém quer agarrar, a menos, dizem os que defendem o referendo, que haja referendo.
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Como no "pocker", teríamos de pagar para ver.

COIMBRA, UMA LIÇÃO DE BOÉMIA

Em "Cartas ao Director" uma leitora de o " Público" insurge-se contra a autorização dada pela Câmara Municipal local para convívios até às quatro da manhã, que provocam altos ruídos da Alta para a Baixa coimbrã, da margem esquerda para a margem direita. "Não sei se o senhor presidente da câmara já se apercebeu da evolução de estilo de convívios realizados durante a Latada e a Queima das Fitas: são autênticos rave parties comparáveis às festas de Verão em Ibiza ou à love parade em Berlim. Já não são os convívios da discoteca e do caldo verde e da bifana, tornou-se tudo muito mais sofisticado e grandioso. E estamos a falar de rave parties no núcleo da cidade... Se os estudantes querem organizar rave parties que o façam numa área fora do perímetro da cidade e que deixem as outras pessoas em paz."
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São estes os estudantes que reforçam a imagem de boémia que sempre se colou à Universidade de Coimbra. E que as outras Universidades portuguesas, em geral, tendem a imitar.
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São estes os estudantes que reclamam um ensino superior quase gratuito à custa dos contribuintes, muitos dos quais não conseguem assegurar aos seus filhos o ensino secundário completo sequer.

Monday, October 22, 2007

DANTES E AGORA

"Essa é de cabo-de-esquadra!" . Isso era dantes,

agora "Essa é de Procurador-Geral Pinto Monteiro!"

A EUROPA COMO PROJECTO

No Quarta República , David Justino convida-nos em "post" Diz-me o que lês a comentar o livro "A Europa como projecto" de Vitorino Magalhães Godinho.
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Caro Prof. David Justino,
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Congratulo-me com esta sua ideia de uma leitura partilhada (...) e foi com muito interesse que esta manhã fui comprar "Europa como projecto", que já li: 70 páginas em formato de bolso, de texto claro.
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Vitorino Magalhães Godinho, que também merece todo o meu respeito, não me parece que acrescente neste seu livro algo de relevante sobre o tema que dá o título à obra, até porque, desde a primeira linha o autor nega a existência desse mesmo projecto: "A Europa não é uma construção acabada (conclusão tautológica, porque nunca o será), e deixou de ser um projecto". Convenhamos que a partir desta conclusão o destino da prosa subsequente está traçado.
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Ainda na primeira página afirma VMG,"teima-se em tratar de tudo em circuito fechado, sem participação dos cidadãos, escamoteando a vontade geral". Mas VMG é, diz ele mais adiante, “frontalmente contrário à realização de referendos e plebiscitos – essas formas de legitimação queridas por regimes totalitários (a constituição salazarista assim o foi). “Não é possível submeter a uma pergunta única ou um feixe de perguntas em número razoável, sem ambiguidades, um texto complexo e necessariamente longo (…) nem aceitar respostas que podem ir, justificadamente, em sentidos opostos.”
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Também eu penso que um referendo a este Tratado desencadearia uma maré alta de discussão demagógica onde os votantes seriam inundados de slogans (muitos dos quais não terão a ver com a matéria do Tratado em si) e mergulhados na habitual floresta de outdoors onde as caras dos prescritores ficarão a conspurcar a paisagem até que novo ciclo demagógico substitua os figurões.
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Ainda na primeira página, VMG atira, de repente, para o lado que sempre esteve virado: "A Europa no mundo não passa de um instrumento do imperialismo norte-americano, a subserviência a essa política catastrófica impede-a de desempenhar o papel que deveria ser o seu e que nenhuma outra potência pode desempenhar". Uma afirmação que o Francisco Louçã subscreverá com todo o gosto . Como subscreverá outras que não vou transcrever para não me alongar ainda mais.
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"O projecto rejeitado (tratado constitucional) não criaria um quadro institucional adequado e eficiente, continuaríamos com o poder concentrado nos governos e na burocracia, o cancro grave da situação actual - não participação do povo na vida pública -...)"
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VMG insiste repetidamente no seu texto neste ponto da ausência de participação dos cidadãos e vem, de forma extemporânea, propor um grande concílio de sábios, antecâmara de uma assembleia constituinte porque “A Europa é uma opção demasiado séria para (nós) a entregarmos às mãos dos Governos refastelados no conforto neo-liberal"
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Nós, quem? Para VMG "os pensadores com a multiplicidade de formação indispensável para formular a problemática pertinente e traçar rumos intelectuais do que deixava de ser uma mera designação geográfica"(…) "Deve-se estimular a formação de numerosos grupos de reflexão e estudo, compostos por intelectuais, escritores, artistas, geógrafos, historiadores, pensadores políticos, de múltiplas formações, que divulguem conhecimentos básicos e ideias inovadoras"(…)”"Em seguida há que convocar eleições para uma assembleia com poderes constituintes “(...) "Não se afigura necessário ratificação pelos parlamentos nacionais, mas não é de excluir se exequível e não conduzir a becos sem saída"Esta proposta é de um contorcionismo inteiro: começa por reclamar alto e bom som a participação dos cidadãos, convoca depois os intelectuais para desenhar o projecto europeu, apoia-se na democracia representativa a nível europeu para lhe dar a bênção, acaba por colocar reticências à participação dessa mesma democracia representativa a nível nacional e vota o referendo às urtigas.
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Neste último aspecto (do referendo nas urtigas) estou inteiramente de acordo com ele. VMG sabe bem, todos sabemos que a construção da Europa é um caminho que, para usar a expressão de A. Machado, se faz caminhando. Tem curvas e alguns becos. O próximo poderá ser, eventualmente, a rejeição por um ou mais países deste Tratado em referendo ou votação parlamentar.
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Espera-se que se algum, ou alguns dos membros actuais, votar Não, tenha a bondade de sentir convidado a sair. A bem do projecto europeu.

Sunday, October 21, 2007

AREIA NOS OLHOS

No caderno de economia do "Expresso" de ontem, Manuela Ferreira Leite relembra que o défice do orçamento aprovado (pelo governo de Santana Lopes), em 2005, (já depois da decisão de Sampaio dissolver a AR) era de 2,8% e, sobre ele, foi construído (por Vitor Constâncio) o défice de 6,1%, retirando-lhe receitas extraordinárias e adicionando pagamentos de dívidas.
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Afirma Ferreira Leite que "a leitura correcta da evolução do défice implicaria que ao valor agora apresentado se aplicassem os mesmos critérios que em 2005 e, nessa altura se concluiria que a queda do défice não é a anunciada."
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E por que não? O que é que impede o grupo parlamentar do PSD de obter uma reformulação das contas e confrontar o Governo com os resultados?
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No mesmo semanário e no mesmo caderno de economia, o actual Ministro responde a várias perguntas, uma das quais se relaciona com a eventual desorçamentação das Estradas de Portugal. Responde o Ministro que não haverá desorçamentação porque os resultados das Estradas de Portugal consolidarão com as OGE. A análise das mudanças de critérios contabilísticos competem, segundo o Ministro, ao INE e ao Eurostat.
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Pena que o jornalista não tenha perguntado quando é que vamos ter um quadro de conceitos e procedimentos contabilísticos que reduzam este constante lançar de areia nos olhos de quem quer ver alguma coisa nestes assuntos.

Saturday, October 20, 2007

A GRANDE ILUSÃO

Há dias podia ler-se no caderno Expresso de economia que em Portugal a "dependência do imobiliário chega aos 57%". Por cada euro que um banco empresta, 57 cêntimos vão para a casa e para outras actividades ligadas por cimento, como construção, pontes ou estradas. Em Espanha são 60 cêntimos, Em Inglaterra 43 cêntimos. Considerando apenas a habitação, o peso do crédito concedido é de 44,7% na Finlândia, 41,9% na Alemanha, 35,8% em Espanha, 18,2% na Itália, 12,2% no Luxemburgo, segundo o BCE - Balanço agregado das instituições monetárias da zona euro.
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Em Portugal, a exposição ao imobiliário, dos bancos portugueses era a seguinte (dados em 2006) : Montepio 90,2%;CGD 66%; BCP 55,9% BES 48,9% BPI 45,9% Banca 57,2%.
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Daqui se pode concluir a excessiva importância que o sector representa nas economias europeias em geral e na portuguesa em particular. E avaliar os riscos que o rebentar da bolha pode deflagrar.
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Curiosa, no entanto, a este propósito é a posição do presidente da Associação Portuguesa de Bancos: "os montantes do crédito à habitação resultam do sucesso das campanhas dos bancos. É um sector muito atractivo, todos os bancos esmagaram margens para ganhar quota. São clientes muito estáveis...Se houver uma grande crise não temos forma de escapar dela. Se houver uma descida de preços não muito acentuada em Espanha, não vejo que haja muitos problemas, além de alguma estagnação nas compras e vendas. Cá a habitação é uma grande prioridade, porque não há mercado de arrendamento, e portanto as pessoas venderão primeiro o carro e reduzirão outras despesas, antes de deixar pagar a casa."
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O discurso de João Salgueiro, que repercute uma ideia generalizada de que não há um mercado de arrendamento, inverte por completo a realidade: - existe um mercado de arrendamento. Os senhorios são os bancos. O negócio é tão importante para eles que se degladiam a conquistar quotas de mercado uns aos outros. E por ser tão importante não podem deixar de o manter e reforçar, por falta de alternativas; - os senhorios (à moda antiga, chamemos-lhes assim) não têm quaisquer hipóteses de competir com a banca a não ser em situações de arrendamento temporário ou a inquilinos sem capacidade de apresentação de garantias consideradas suficientes pelos bancos, um nicho "sub-prime" à portuguesa.
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Mas o slogan mantem-se e as causas para a continuação do estado de degradação de muitas casas continuará a ser atribuída à lei das rendas.

PARABÓLICA

A propósito do Tratado de Lisboa tenho sintonizado diversos canais da blogosfera e é, sem surpresa, que constato que uma grande parte deles, não digo a maioria porque não os sintonizei todos, alinha pela crítica à ausência de discussão pública dos termos do tratado e, muito significativamente, reclamam a realização do referendo. E digo muito significativamente porque a blogosfera é de natureza contestária e sem referendo lá se vai (se for) uma riquíssima oportunidade por água abaixo. O Tratado seria, sem dúvida, mãe para todas as discussões à excepção da discussão do próprio, que supõe um domínio do seu articulado que a esmagadora maioria dos cidadãos não tem nem está interessado em ter.
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Ontem fiz zapping para O Cachimbo de Magritte , post Parábola dos Cegos e pesquei de lá:
A cegueira continental dos burocratas que governam a Europa está resumida na frase que o Público atribui hoje a Jean-Claude Juncker, Primeiro-Ministro do Luxemburgo: "Haverá um acordo [sobre o novo tratado europeu] em Lisboa porque tem de haver um acordo em Lisboa".
Alguém me explica porque é que tem de haver um acordo?
que motivou a seguinte troca de argumentos:
RF - disse...
Se o acordo tinha de ser obtido em Lisboa ou não, pode ser discutível. De qualquer modo a actual configuração da União Europeia exige um contrato, a que chamam Tratado, para poder funcionar.Se esse funcionamento é necessário ou não, depende do ponto de vista do observador. Para mim é, que me confesso europeísta convicto.Convicto de que Portugal tem muitíssimo mais a ganhar do que a perder com a sua adesão à UE.Porque aí é que está o cerne da questão: Queremos ou não queremos ser membros da UE? Esse, sim, é talvez o referendo que falta.Sim ou sopas.Quanto à discussão dos termos do Tratado V. já leu as suas 152 páginas? Acha viável a discussão de um texto tão hermético na praça pública?Meu caro, foi por estas e por outras que os homens inventaram a democracia representativa. Há muitos anos já.
PP - disse...
Ou seja, Rui Fonseca, como o tratado é muito hermético e tem 152 páginas não pode ser submetido a referendo porque o povo, coitado, é um pouco estúpido. Acho que o dr. Salazar também tinha esta ideia de democracia representativa.
RF - disse...
P Picoito,V. diz:
"Acho que o dr. Salazar também tinha esta ideia de democracia representativa."
Não acredito que v. ache isso. Porque v. sabe muito bem que Salazar do que fugia a sete pés não era da democracia representativa mas da democracia, qualquer que fosse o seu modo de expressão.E é neste seu achar confundindo que está a intenção (que julgo propositada da sua parte) demagógica dos que vêm no referendo uma forma de manifestação da vontade do povo por excelência.Porque o referendo, como v. muito sabe, não é uma forma de democracia representativa. Para os que, demagogicamente, clamam por um referendo a este Tratado, altamente complexo na sua formulação intrincadamente jurídica , só o referendo pode recolher a expressão genuína da vontade popular.Ora não é nada disso. Alto e bom som diga-se que, em matérias como estas, o referendo é uma oportunidade a que se agarram os grupos políticos para a chicana permanente e é, portanto, altamente antidemocrático.E antidemocrático porque, precisamente, pretende encostar a democracia representativa para o lugar das instituições não democráticas, assumindo-se como único meio legítimo de expressão do voto e lançando achas para a fogueira do populismo.Não é. Serviria sobretudo para discutir tudo menos o Tratado.
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Há dias, a 13 deste mês, perguntavauma jornalista a uma peregrina em Fátima, o que achava ela do discurso do Papa que acabava de ser transmitido: Olhe, respondeu ela, não percebi nada, mas acho que falou bem, muito bem mesmo.Seria assim o referendo acerca do Tratado.
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Pergunte-se, em referendo, se queremos ou não continuar a ser membro da União Europeia. Essa sim, seria uma pergunta que não daria lugar a grandes derivas demagógicas.