Friday, August 31, 2012

OS MAIS PODEROSOS

Cumprindo os rituais da silly season, o J Negócios voltou a realizar este ano o inquérito de avaliação dos mais poderosos na economia portuguesa. Em tempos de crise, se não servir para nada mais, serve para para promover a venda de mais uns quantos exemplares do jornal quando os seus habituais leitores estão de férias.

O ano passado ocuparam os primeiros sete lugares, Merkel, Passos Coelho, Ricardo Salgado, Miguel Relvas, Vitor Gaspar, Eduardo dos Santos e Américo Amorim. Destes, soube-se hoje, Eduardo dos Santos passou para a sétima posição, provavelmente por troca com Américo Amorim, que deve ser este ano o sexto. Dos outros cinco, nenhum consta da lista nas posições seguintes, sendo muito provável que a quase totalidade permaneça este ano nos lugares de cima. A dúvida está em Miguel Relvas. Mantem-se no pelotão da frente, apesar dos trambolhões que tem dado ou sai do primeiro pelotão, saindo da lista? E se sair, quem entra?

O ano passado o ministro da economia ficou-se pelo 37º lugar e este ano não apareceu ainda? Sai da lista ou consegue uma recuperação espectacular? Parece-me mais provável a primeira hipótese.

Nada disto é relevante para além da falta de credibilidade que Álvaro Santos Pereira continua a merecer junto da opinião pública. Há dias, Daniel Bessa considerava, na sua coluna habitual no Expresso/Economia, o lugar de ministro da Economia o lugar do morto. O epíteto/metáfora tanto se aplica com propriedade a este como aos anteriores ministros da economia, incluindo Bessa. Porque o ministro da economia não conduz a economia, senta-se ao lado do condutor, a sua posição é ainda mais ameaçada quando o ministro não tem peso político e o tempo é de tempestade.

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Act. (3/9) - Miguel Relvas é o 6º. mais poderoso.
Act. (4/9) - Américo Amorim é o 5º.
Act. (5/9) - Ricardo Salgado é o 4º.
Act. (6/9) - Passos Coelho é o 3º.
Act. (7/9) - Vítor Gaspar é 2º.
Act. (10/9) - Merkel continua a ser a mais poderosa

Thursday, August 30, 2012

SE É SECRETO, DIVULGUE-SE

Leio aqui que "uma lista com quase 1.500 nomes que identifica os mais influentes na loja do Ocidente, do Grande Oriente Lusitano (GOL), publicada no início deste mês no blogue "Casa das Aranhas" está a lançar o "pânico" na instituição".

Porquê?

Nunca percebi, e continuo a não perceber, por que razões não assumem os maçons a sua filiação nas irmandades em que comungam de ideários supostamente generosos. Houve tempo e lugares em que foram perseguidos mas não é, nem é previsível que venha a ser o caso, nas sociedades democráticas em que vivemos. 

Percebo e concordo com aqueles que defendem (por exemplo, com este) que nenhum cidadão deve ser obrigado a declinar a sua filiação em associações, tidas por secretas ou não. A menos que seja intimado a fazê-lo por agentes de justiça, se for relevante para o processo. Mas daí a entrarem pânico se lhes descobrem a inscrição em lojas  da especialidade, vai uma distância que pode fazer retinir muitas suspeitas.
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A história da primeira República está recheada de incidentes, conflitos, conivências, traições até, engendradas nas sombras dos templos maçónicos. Sem as conspirações convocadas pelos maçons, as turbulências, as revoltas, que provocaram a emergência da Ditadura, a história contemporânea de Portugal seria outra, e dificilmente poderia ter sido pior. Não foi, nem é, portanto inócuo o envolvimento da maçonaria na política. Não é por acaso que uma grande parte dos actuais deputados à Assembleia da República tem filição maçónica. Mais do que nas sedes dos partidos, é nos templos maçónicos que são em grande parte engendradas as listas que depois somos convidados a votar. 
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Se a revelação dos filiados maçons provoca pânico nas suas hostes, convinha que nos dissessem porquê.   

Wednesday, August 29, 2012

O RECADO

Portugal terá de superar desafios orçamentais após quinto exame da troica, afirmou hoje o primeiro-ministro em Londres onde foi assistir à abertura dos Jogos Paralímpicos. O que quer que seja que esta meia afirmação queira dizer, para bom entendedor é certo e sabido que não serão boas as notícias que aí vêm.    

A propósito da quinta avaliação da troica, em curso, o Financial Times de ontem publicava um artigo -Portugal makes fiscal progress in the shadows - que salientava os resultados positivos dos quatro exames anteriores, os progressos feitos no reequilíbrio das contas públicas e a evolução da apreciação dos mercados financeiros, (vid gráfico abaixo) e a discrição que tem caracterizado o comportamento dos portugueses no atingimento dos objectivos, uma discrição que contrasta com o protagonismo, pela negativa, da Grécia e, pela positiva, da Irlanda.
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O que podemos esperar desta quinta avaliação? Dificilmente a troica poderá mudar radicalmente as opiniões que tem expendido nas auditorias anteriores. Primeiro, porque o programa prescrito tem sido razoavelemente cumprido, depois porque não pode, sob pena de se condenar a si  mesma,  chumbar ou sequer recriminar o aluno que tem dado conta do recado. É por essa óbvia razão que o Governo afirmava há dias estar à espera da troica para resolver o problema do défice. 

Como? Esperando que seja a troica a propor uma extensão do programa de ajuda. 
E, resolve? Não resolve. Adia. 
Repito-me: Não há solução para o défice,  nas circunstâncias envolventes da economia portuguesa,  que não passe pela redução dos juros da dívida até ao nível do suportável.  
O prolongamento do prazo de ajuda pode servir outros objectivos terceiros mas não ajuda a ultrapassar a situação dramática em que Portugal se encontra.  
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Portugal não precisa nem de mais dinheiro nem de mais prazo, porque isso representará mais dívida. E dívida já temos muito mais que bastante. Do que Portugal precisa é duma redução substancial da conta dos juros. Como é que isso se consegue? Eles sabem, mas andam a fazer-se desentendidos.
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Tuesday, August 28, 2012

O TEMPO E O DINHEIRO

A situação na Grécia volta à ribalta da tragédia europeia. Contra o cada vez maior número daqueles que sentenciam a  sua saída do euro, insurgem-se os líderes gregos. O actual primeiro-ministro Antonis Samaras afirmava há dias que a saída do euro seria devastadora para a Grécia e prejudicial para a Europa. Significaria uma nova quebra de cerca de 70 por cento no nível de vida dos gregos que, neste momento, já recuou 35 por cento por causa da acção combinada da desvalorização e da inflação. E admitia a hipótese de vender algumas das ilhas desabitadas, sem perda de soberania sobre as mesmas. (cit. aqui)

Hoje, Venizelos, o lider do Pasok (cit. aqui) afirmava que  "Conversas sobre saída da Grécia do euro devem acabar" e que "a Grécia não precisa de mais dinheiro, apenas de mais tempo para cumprir o programa de reformas".
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Quem parece não comungar deste optimismo de Venizelos é, por exemplo, o Crédit Agricole que (cit aqui) pretende vender aos gregos a sua subsidiária na Grécia,  Emporiki, e continuar a redução da sua exposição em Espanha e na Itália. Mais tempo é o que os bancos agradecem para se safarem dos créditos incobráveis.  

Em Portugal temos nova visita dos troicos para auditoria do progresso das reformas, consequências  e danos emergentes. O Governo português tem afirmado e reafirmado que não precisa nem de mais tempo nem de mais dinheiro, mas, recentemente, com o défice a desobedecer às instruções dos domadores, é muito provável que venha a solicitar uma coisa e outra. 

O que se traduzirá, se vier a acontecer, num adiamento do reconhecimento daquilo que há muito é evidente: Nem Portugal, nem a Espanha, nem a Itália, e muito menos a Grécia, podem safar-se da teia em que se encontram emaranhados enquanto os juros da dívida não forem os suportáveis. 

Mais dinheiro implica mais dívida e mais juros. Mais tempo implica não fazer amanhã o que não se quer fazer hoje. A solução do imbróglio é política. Ou há condições políticas para reduzir a carga que esmaga os países ameaçados e restaurar a confiança dos depositantes desses  países ou não há nem tempo nem dinheiro que possa desatascar a zona euro, e por tabela a União Europeia, dos terrenos movediços em que todos (uns mais que outros) estão metidos. 


PORTUGAL AO NATURAL

Praia de Mira
Casa do canhão 

Monday, August 27, 2012

A CULPA DAS CALÇAS

Kenneth Rogoff, ex-economista chefe do FMI, co-autor de "This Time is Different: Eight Centuries of Financial Folly", professor em Harvard, afirmou numa entrevista à rádio BBC, na quinta -feira, citada aqui,  que a "Europa tem de decidir se quer romper com o euro", resumindo, deste modo tão simples de enunciar quanto complexo de atingir, o resultado da sua análise das diferentes posições que agora se confrontam na União Europeia e, mais prementemente, na zona euro.
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Segundo Rogoff,  muito poucos acreditam que a Grécia ainda estará no euro daqui a uma década, uma vez que a probabilidade de abandonar a moeda única é muito elevada, mas não é certo que o país abandone o euro se o financiamento for cortado porque a Grécia poderá dizer que “não pagamos, mas vamos ficar no euro”.  

Os responsáveis políticos devem decidir se querem seguir adiante ou romper com o projecto da moeda única, o que implica, por sua vez, decidir se querem ou não “seguir adiante e ser um país”.
A “grande tensão” nesta decisão localiza-se entre a Alemanha e França, já que os franceses acreditam que o euro pode existir sem “um centro forte”, enquanto os alemães discordam dessa visão, mas  “à maneira francesa não vai funcionar".

A Alemanha tomou uma posição coerente, dizendo que está disposta a pagar, desde que haja um sistema, e não transferências abertas sem “governação”.

Na edição de sábado, a Der Spiegel noticiava  (cit aqui) que  Angela Merkel quer que os líderes da União Europeia (UE) cheguem a acordo ainda este ano sobre um grupo de trabalho para um novo tratado que reforce a integração dos 27 países-membros, e que o assessor de Merkel para a política europeia, já comunicou a intenção da chanceler em conversações em Bruxelas. Merkel pretende que na cimeira da UE que se realiza em Dezembro se estabeleça uma data concreta para a convocatória do grupo de trabalho que irá redigir o novo tratado da UE. Merkel tem pressionado desde há algum tempo os seus parceiros europeus para completar o pacto fiscal acordado pelos países do Eurogrupo com uma união política.

Mas a iniciativa alemã não foi bem recebida por parte dos parceiros europeus, e num encontro do chamado 'grupo do futuro', uma reunião informal de trabalho de dez ministros dos Negócios Estrangeiros, a maioria opôs-se à proposta alemã. Países como a Irlanda querem evitar o risco de convocar um novo referendo, uma obrigação imposta em caso de um novo tratado, e outros países, como a Polónia, são contrários à iniciativa de Merkel por considerarem que são escassas as possibilidades de um compromisso entre os 27 países da UE.

Hoje (cit aqui), o ministro alemão das Finanças anunciou que Alemanha e França estão de acordo sobre a criação de um grupo de trabalho para preparar soluções para concretizar os avanços prometidos para a Zona Euro, que deverá caminhar para uma união bancária e no caminho de maior integração orçamental e monetária.

Obviamente, como afirmou Rogoff, "a Europa tem de decidir se quer romper com o euro", os europeus têm de decidir se "se querem ou não seguir adiante e ser um país”. Como referiu Rogoff, não pode assacar-se à Alemanha a culpa de não apresentar uma solução. No entanto, trata-se de uma solução exequível, na melhor das hipóteses, a médio prazo, enquanto no imediato a Alemanha e a França continuam a colocar dívida a taxas de juro negativas e, por exemplo, a Espanha continua a ver o seu prémio de risco situar-se acima dos 500 pontos (cit aqui).  
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É neste caldo de cultura do salve-se quem puder enquanto há tempo  que continua a afogar-se a Europa.

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Cor.- Depósitos em bancos espanhóis registam maior queda mensal desde 1997
- A ministra das Finanças da Áustria diz que é preciso pesar as consequências da saída de um país da zona euro.
- La banca espanõla sufre en julio una fuga récord de depósitos - Los depósitos del sector privado en los bancos españoles sumaron el pasado mes de julio un total de 1,508 billones de euros, lo que representa una caída mensual del 4,6%, equivalente a la retirada de 74.228 millones de euros, la mayor salida de depósitos privados de las entidades españolas desde septiembre de 1997, según los datos del Banco Central Europeo (BCE). De este modo, el importe de los depósitos del sector privado en bancos comerciales españoles registrado en julio representa el cuarto descenso mensual consecutivo del dato, que se sitúa en su nivel más bajo desde mayo de 2008, cuando los depósitos sumaban 1,507 billones.

Sunday, August 26, 2012

A EUROPA EM SALDO

Segundo contas de um relatório, citado aqui, do Instituto de Investigação Económica de Munique de há um mês atrás, será mais caro para a Alemanha e a França manterem a Grécia no euro que expulsá-la: no primeiro caso, os dois países perderiam um total de 155 000 milhões de euros, no segundo, 144 000. A diferença (11 mil milhões) entre segurar a Grécia e deixá-la cair é, segundo o prestigiado (qualificativo do El País) instituto alemão de cerca de 7,6%! Aqueles que defendem esta última opção consideram que já estão preparados para o pior, basicamente desfazendo-se de posições em dívida grega e desinvestindo no país. 
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Não faço a mínima ideia de quais os critérios adoptados pelos investigadores do IIEM para calcularem os valores que resumem os resultados do relatório mas, quaisquer que eles sejam, as conclusões são sobremaneira revelantes da miopia política avançada que atacou a Europa e a faz deambular desnorteada e trôpega, ameaçando estatelar-se de um momento para o outro.

Só por miopia política extrema se atreve alguém, por mais prestigiado que seja, a concluir que por 11 mil milhões de euros (menos de dois BPN!), franceses e alemães farão um bom negócio se abandonarem a Grécia entregue ao seu destino, atirada para os braços que lhe estenderão a leste. Só por cegueira política total é possível supor que a queda da Grécia é possível sem danos colaterais de consequências incalculáveis, porque não há investigadores, por mais geniais calculadores que sejam, que possam avaliar todas as consequências de um desmembramento da União Europeia que a saída da Grécia pode espoletar.

Obviamente, estes relatórios nunca são inconsequentes nem inocentes nas suas intenções, e são estas que encaminham as conclusões pretendidas por mais que reclamem os autores a sua independência.

Saturday, August 25, 2012

NÃO PODE SER VERDADE

Já ontem tinha ouvido na Antena 1 que António Borges (porquê António Borges, é uma originalidade do sistema governativo português que falta explicar)  tinha apresentado algures um modelo de privatização do canal 1 da RTP, envolvendo ainda o encerranto do canal 2 e a garantia da continuidade das taxas do audiovisual a que estão sujeitos os consumidores de electricidade. Pensei: devo ter ouvido mal. 

Tinha ouvido bem: a exploração do canal 1 da RTP vai ser concessionada em termos que, segundo o Expresso de hoje, garante ao concessionário lucros certos de 20 milhões de euros, porque passará a receber 150 milhões de euros da (subreptícia) taxa do audio visual.

É um escândalo que só não estou certo que não passará porque vivemos tempos em que a imoralidade e a ilegitimidade andam à solta. Acrescenta o Expresso que falta obter o acordo de Bruxelas onde (o absurdo) pode vir a ser vetado pelas regras da concorrência. Tem todos os requisitos para ser liminarmente reprovado, desde logo porque não há negócio sem risco e a este quer atribuir o governo um inconcebível, em termos empresariais, lucro vitalício.

Depreende-se da notícia que subjacente à entrega das receitas da taxa do audiovisual a uma empresa privada está a concessão da produção do serviço público de televisão, uma espécie rara que nunca ninguém soube definir, enquanto foi supostamente realizado pela RTP. Como é que pode ser definido agora, quando do outro lado estarão  privados monopolistas desse serviço, naturalmente interessados sobretudo nos seus interesses privados?

Repito-me: se há  serviços públicos de televisão a concessionar eles devem ser adjudicados segundo as regras que regem as concessões de serviço público em geral, isto é, através de concurso aberto a todos os candidatos, neste caso operadores de televisão, independentemente do facto da privatização da RTP.
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Friday, August 24, 2012

À ESPERA DA FELÍCIA

A Felícia era uma mulher das arábias, lá em casa quem dava ordens era ela. O Silvestre, desobrigado da responsabilidade de decisão, limitava-se a ouvir e a proceder em conformidade. Viviam em união de facto, naquele tempo o estatuto não era reconhecido pela lei mas era confirmado pela sociedade, e geralmente funcionava sem incidentes notórios a vida inteira. Em casa do Silvestre, a Felícia mandava, o Silvestre obedecia, viviam ambos felizes, só não tinham tido meninos por razões que ninguém sabia.

Um dia, a Felícia ia chegar tarde a casa e disse ao Silvestre que fosse adiantando o jantar, que na ocasião era arroz de feijão com umas coxas de frango fritas. Deu a Felícia as devidas instruções ao Silvestre, que ele garantiu mais tarde ter cumprido à risca, mas o arroz saiu-lhe espapaçado e as coxas de frango tão esturricadas que a vizinha do lado ficou alarmada com o cheiro que inundara a escada e foi bater-lhe à porta a perguntar se havia algum azar.

Que não, repondeu-lhe o Silvestre, estava tudo como devia, nenhuma preocupação à volta, estava só à espera da Felícia.

Lembrei-me desta cena simplória quando li que o Governo está à espera da troica para resolver o problema do défice.

Thursday, August 23, 2012

POLÉMICA À VISTA

Foi hoje aprovada em Conselho de Ministros a medida que prevê que os beneficiários do Rendimento Social de Inserção terão que aceitar trabalhos de até 15 horas por semana em autarquias e IPSS, sem remuneração. Entidades só pagam o subsídio de almoço, transporte e o seguro.( ) Em causa estão actividades de limpesa em espaços como jardins, "pequenas obras" em instituições sociais ou outras actividades "pontuais".  (aqui)

Parece-me bem. Mas não vai ser fácil convencer muita gente da bondade da decisão.

Desde logo porque haverá contestação política à esquerda, aquela que considerará que os beneficiários do RSI estarão a partir de agora sujeitos a trabalhos forçados. Depois porque alguns dos atingidos, antes de renunciarem voluntariamente ao benefício, irão sabotar o sistema com incidentes propositadamente provocados com o objectivo de esgotarem a paciência de quem os vai enquadrar no desempenho das actividades que lhes atribuirem.

Teria sido mais exequível e eficiente acabar com o RIS e atribuir às autarquias e IPSS a competência e os recursos para admitirem trabalhadores em regime de horário parcial, remunerados consoante as horas prestadas, nas condições em que hoje são atribuidos os RIS pela segurança social, e sujeitas ao controlo que delas já é exercido.

Wednesday, August 22, 2012

SE CÁ NEVASSE

Nicholas Kaldor, nascido na Hungria, mas um dos mais proeminentes economistas de Cambridge do pós-guerra, citado aquidaquiconsiderava em 1971 que pensar que “a união económica e monetária pode preceder a união política” é um “erro perigoso”. Talvez Kaldor tenha acertado. E daí, poderemos concluir que seria possível construir uma união europeia começando pela edificação de uma união política? Os teóricos das ciências sociais são frequentemente propensos a enlearem-se nestas experiências irrealizadas de resultados irrebativelmente magníficos.

Que os problemas que abalam hoje a União Europeia, e, muito particularmente, a Zona Euro, só podem ter solução política, só não vê quem não quer ver. Mas olhar quarenta anos para trás, e tirar do armário uma afirmação, talvez acertada mas inconcretizada, só lembra a coleccionadores de barcarolas com rendimento de investigação social garantido.  

Porque a história política da Europa é uma narrativa de conflitos alargados quase permanentes, intercalados por raros e curtos períodos de paz, onde nos períodos mais sangrentos alguns tentaram colocar o continente inteiro sob a sua alçada. Falharam todos, sempre derrotados por um se qualquer.

Se a união económica tivesse sido precedida da união política europeia outro galo nos cantaria agora. Quem tem dúvidas? Mais: quem é que alguma vez as teve? Obviamente, a questão é outra: Como é que se poderia conseguir uma união política, unindo aquilo que séculos e séculos de história tinham mostrado não ser  unificável nem às leis da espada ou da bala? Batendo as palmas e convencendo com um discurso e peras os irredutíveis renitentes? Alguém, com um mínimo sentido político, acredita nisso?

A União Europeia ou se une por linhas já tortas ou não se une. Os europeus deparam-se hoje com um risco enorme: o de aceitarem pela força de circunstâncias o que noutras circunstâncias nunca aceitaram pela força das armas.

Dirão alguns: E por que não voltarem os europeus a desunidos como sempre?
Os fundadores dos alicerces da União quiseram com a obra evitar mais guerras em solo europeu.
Um erro perigoso, o deles?
A única resposta válida só poderá ser dada agora pelos europeus em referendo à volta de um projecto de constituição federativo mínimo.

Tuesday, August 21, 2012

O INCONTENENTE

Volta e meia, AJJ levanta, mais ou menos disfarçadamente, o espantalho da independência da Madeira.

Hoje desafiou o Estado português para, em caso de dúvidas, ter a coragem de permitir um referendo na Madeira sobre a autonomia. Segundo AJJ, a Constituição da República "só tem de dizer quais as cinco áreas de competência do Estado no território", designadamente "as matérias de direitos, liberdades e garantias, política externa, defesa nacional e segurança interna, tribunais de recurso e sistema nacional de Segurança Social". "No resto, a competência deve pertencer aos poderes eleitos, fiscalizados pelo povo madeirense. Menos do que isto os autonomistas não aceitam."
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A mim, parece-me bem. Muito bem, mesmo.
Só me sobra uma dúvida: Quanto é que custará aos "cubanos do contenente" a autonomia fiscal do território madeirense.
Se for a custo zero, fogo à peça!

Jardim diz que "a Constituição da República só tem de dizer quais as cinco áreas de competência do Estado neste território"

Monday, August 20, 2012

MR RYAN NÃO É HONESTO

Anteontem, Martin Wolf no Financial Times - Paul Ryan´s plan for America is note credible - já tinha rebatido a ideia que Ryan, o candidato a vice-presidente dos EUA em Novembro imposto a Romney,  não é o homem honesto que reclama ser. Em abono da sua afirmação, Martin Wolf cita depoimentos insuspeitos do lado republicano, além do menos insuspeito, a este respeito, Paul Krugman.

Krugman tem vindo a denunciar, naquele modo de reagir oportuno e geralmente contundente, na sua habitual coluna no New York Times as incongruências de um plano que não são apenas políticas mas também aritméticas.
  
Em "Un unserious man" datado de ontem, e que no momento em que o começo a ler conta com 261comentários e quando termino está já com 559, Krugman prevê daqui até às eleições um inevitável debate renhido sobre a política fiscal dos EUA. Inevitável, porque Ryan, a eminência parda do Tea Party congregou à sua volta a popularidade que hoje desfruta nos meios conservadores porque decidiu que era Honesto e um Conservador Sério, e que as sua suas propostas devem ser merecer consideração mesmo da parte de quem não goste dele. 

Mas, garante Krugman, nem Ryan é honesto nem as suas propostas têm merecimento.
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"Do lado da receita fiscal, o senhor Ryan propõe grandes cortes nos impostos dos mais ricos e das empresas. O Tax Policy Center calcula em $4,3 triliões (1 trilião=1 milhão de milhões) as perdas de receitas resultantes desse corte ao longo de uma década. Do lado da despesa, o senhor Ryan propõe cortes na ""Medicaid", poupando $800 biliões, redução do apoio em alimentos aos mais pobres, poupando $130 cerca de 130 biliões, outras reduções, incluindo a redução de ajudas a estudantes. Tudo junto, estas poupanças não excederão $ 1trilião de dólares

Em cima disto, Ryan inclui mais $716 biliões de poupanças em Medicare, uma parte do programa "Obamacare", ainda que a sua intenção seja acabar com ele. Apesar disto, Ryan juntou-se a Romney denunciando o Presidente Obama de estar a cortar o "Medicare"... É demais em tão curto espaço de tempo. Portanto, para cortes nos impostos de $4,3 triliões, Ryan não conta mais do que $1,7 triliões de poupanças, com a particularidade de os cortes de impostos beneficiarem desproporcionalmente os 1% mais ricos, e o défice agravar-se-ia em $2,5 triliões de dólares. Ryan reconhece que seria um défice falcão, e adianta que seriam necessários outros cortes mas recusa-se a identificá-los" 

"É notório que o "Medicare" vai ser o prato forte da campanha e que aos republicanos não repugnará repetirem as acusações a Obama, feitas durante a campanha das eleições intercalares em 2010, de fazer algumas reduções que são parte do plano Ryan."  

"So will the choice of Mr. Ryan mean a serious campaign? No, because Mr. Ryan isn’t a serious man — he just plays one on TV."

Sunday, August 19, 2012

O SUPER SUPERVISOR


Parece-me bem.
Se a supervisão do BCE apenas abranger os maiores ficam de fora sobretudo os das economias mais fragilizadas. Por outro lado, sendo a supervisão central e global do sistema bancário europeu uma condição necessária à evolução para uma globalização das garantias dos depósitos, e esta uma condição imprescindível à retoma da confiança dos depositantes nos países de onde se têm observado maiores saídas de fundos para bancos alemães, sobretudo, esta declaração da UE, que não é original, e talvez até seja inconsequente, é  oportuna.

Com o prematuro apagamento de Hollande na cena europeia, é fundamental que Barroso assuma a posição
que lhe compete de contraponto ao poder cada vez mais hegemónico de Merkel. Até porque sem oposição, a Chanceler fica sem argumentos para convencer os alemães das vantagens que, também eles, alemães, têm na continuidade da União Europeia, e de arrepiar caminho que leva ao exacerbamento dos nacionalismos e, inevitavelmente, ao fim da União.

Não sendo provável que esteja a considerar chocar uma renovação de mandato, Barroso tem a oportunidade e o dever de ir mais além e denunciar os objectivos que estão por detrás da contradição entre as declarações de intenções e as decisões de Merkel. A globalização europeia das garantias bancárias é um exemplo disso. Sem essa globalização os alemães continuarão a gozar o escandaloso benefício de juros a taxas negativas da sua dívida pública, mas é impossível que essa regalia imperial possa perdurar por muito tempo.

Não há úberes inesgotáveis.

Saturday, August 18, 2012

O AVAL DO BANQUEIRO

De vez em quando, mais frequentemente do que seria esperável, estoira um projecto tido por magnífico, que dinamizaria uma região deprimida, criaria muitos postos de trabalho, contribuiria para dar a volta à crise. A semana passada o Governo retirou os apoios a Alexandre Alves, conhecido pelo "Barão Vermelho" por "incumprimento" da  RPP Solar na construção de uma fábrica de painéis solares em Abrantes, um investimento de 1052 milhões. Quem fica, para já, com o investimento abortado nos braços é a Câmara de Abrantes (isto é, os contribuintes), que adquiriu os terrenos para os disponibilizar a quase custo zero ao empreendimento.  

Na mesma semana, a sociedade promotora do maior complexo turístico no Alqueva - SAIP, Sociedade Alentejana de Investimentos e Participações -, liderada por José Roquette, apresentou quatro pedidos de insolvência em tribunal:  SAIP, Sgps; a SAIP Turismo; a Monte das Areias - Gestão Cinegética e Turística; e a Sociedade Imobiliária Lagoa do Alqueva.

Segundo o JN online de ontem, e o Expresso de hoje, José Roquette voltou acusar a CGD de não apoiar investimentos estratégicos, perguntando "porque é que se mantém público um banco que não dá apoio a investimentos privados que o accionista Estado considera de interesse estratégico para relançar a economia".

Mas o que travou os projectos de Roquette para o Alqueva foi a continuidade da exigência da Caixa de um aval pessoal do empresário que a SAIP (entenda-se Roquette)  "considera "incomportável", argumentando que "a CGD, tal como o BPI fez, financiava o projecto e não pessoalmente o accionista, dispondo-se a correr o risco pelo qual é, e seria, remunerada, assim cumprindo a sua função de instituição bancária".

Antes de se dedicar a outras actividades, José Roquette foi banqueiro e não ignora que a exigência de garantias pessoais é uma quase constante nos empréstimos bancários em Portugal salvo se o tomador do empréstimo oferece garantias reais consideradas suficientes de reembolso dos compromissos assumidos. Pelos vistos, não é esse o caso, e José Roquette reconhece isso mesmo ao declarar que pretendia que a CGD corresse o risco incalculado do projecto limitando o risco de José Roquette aos capitais por ele investidos. É, aliás, elucidativa desta intenção a missão que Roquette atribui à Caixa enquanto banco do Estado: o de assumir o risco de projectos privados com interesse estratégico relevante. Não por ser banco, mas por ser um banco do Estado.
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Mas é público e notório que:

. Nem sempre a Caixa salvaguardou convenientemente o reembolso dos capitais emprestados e são conhecidos vários casos gordos em que a sua intervenção desastrada foi comandada por razões políticas ou outras de natureza conivente; por esses motivos, o banco do Estado, que é o maior colector das poupanças dos portugueses, está a recorrer a empréstimos avalizados pelos contribuintes para se recapitalizar;

. A generalização da prática de avales pessoais, que atinge sobretudo os créditos pessoais (habitação, por exemplo) e os pequenos e médios empresários, é também uma das razões pelas quais os bancos (e, nomeadamente a Caixa) não dispõem, e não se vêm obrigados a dispor, de capacidade técnica para avaliar o mérito dos projectos que lhes são submetidos para financiamento.

. A perseguição aos avalistas tem condenado muita gente a uma vida inteiramente hipotecada.  

. Não há em Portugal um, um só que seja, banco de investimento, digno desse nome.

. Roquette terá alguma razão, sobretudo porque parece ter sido surpreendido com uma mudança de intenções dos gestores da Caixa quando o projecto já avançava, mas não pode ignorar o que se passa no país onde já foi banqueiro.

Friday, August 17, 2012

O DISCURSO DO OUTRO

É impressionante o número de professores portugueses de economia que ensinam no estrangeiro, sobretudo nos EUA. Um deles, professor em Princeton, prognosticou logo após o começo da crise nos EUA que ela seria extinta a curto prazo. Outro, que foi  primeiro ministro da Economia do anterior Governo, e que há dias publicou um artigo no Expresso/Economia sobre a sua experiência pedagógica na China, declarou o fim da crise em Portugal há seis anos, para dois anos depois garantir que tinha acabado o mundo da prosperidade. Ontem, o actual responsável pela pasta da Economia e Emprego, professor em Vancouver, informava o seu entrevistador num canal televisivo que começa sempre por alertar os seus alunos que "previsões macroeconómicas são sempre previsões macroeconómicas, isto é, falíveis".

Não foi, portanto, original o anúncio feito há dias no Pontal pelo actual primeiro ministro de que 2013 será o ano de estabilização da economia e de preparação da reparação económica para Portugal e não é estranho que o seu ministro da Economia se tenha  posteriormente, aparentemente, distanciado do optimismo do chefe do Governo. Nem original nem infalível, portanto, porque, sendo as previsões macroeconómicas intrinsecamente falíveis, como ressalvou o ministro, a perspectiva optimista é, em princípio, tão provável quanto a pessimista e tem a vantagem de aumentar a esperança dos geralmente distraídos.

À falta de originalidade, neste caso, do primeiro  ministro corresponderam as nada originais críticas do lado de quem, na ocasião, não é governo. Mas todos sabem que, para além das nossos específicos handicaps, existe uma envolvente geralmente deprimida que, inevitavelmente, condiciona a evolução do comportamento da economia portuguesa no próximo futuro.

A propósito, trancrevo um gráfico/barómetro publicado anteontem no Economist das expectativas de evolução global dos negócios resultante de um inquérito conjunto do Economist/FT junto de 1500 executivos de topo.    



Conclusão: Continuam geralmente sombrias as perspectivas dos homens de negócios em todo o mundo. Entre Abril e Julho deste ano caiu 5 pontos percentuais a diferença entre optimistas e pessimistas. Globalmente, 42% dos executivos reconhecem agora que a situação vai agravar-se, a maioria está convencida que os maiores problemas se situam na Europa, mais de 60% acredita que as condições económicas na zona euro se degradarão nos próximos seis meses. É mais optimista o outlook para os EUA mas as eleições de Novembro podem mudar estas perspectivas. A reeleição de Obama é geralmente considerada favorável para os negócios, ... excepto nos EUA, onde os homens de negócios preferem Romney (39,3%) a Obama (31,9%).
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Passos Coelho não leu o barómetro. Mas se tivesse lido, não teria alterado o discurso. Há sempre um discurso apropriado a cada ocasião independentemente do discurso dos outros.  

Thursday, August 16, 2012

OUTRA GOLPADA

(Revisto)

Segundo o Negócios online de hoje,

"O custo do apoio do Estado vai reduzir factura fiscal da banca.
Para o Fisco, "CoCos" subscritos pelo Estado foram equiparados a títulos de dívida. A remuneração que BCP, BPI e CGD vão pagar ao Estado pelo apoio público concedido através de instrumentos de capital contingente ("CoCos") vai ser dedutível na factura fiscal que estas instituições terão de suportar ao longo dos próximos anos. No total, os três bancos poderão abater mais de 400 milhões de euros aos seus encargos com impostos, o equivalente a um quarto dos custos totais que terão com a ajuda estatal nos próximos cinco anos e que podem ascender a mais de 1.650 milhões."

A taxa de juro dos empréstimos para a recapitalização da CGD, do BCP e do BPI, intermediados pelo Estado por imposição da troica, que veio a público, é de 8,5%. O impacto dos juros pagos nos resultados dos bancos reduzirá aquela taxa para 6,375%, um valor ainda suficientemente elevado para  não arredar a hipótese do BCP vir a cair nos braços dos contribuintes no fim do período de reembolso contratado.

Há nesta equiparação de "CoCos" subscritos pelo Estado a títulos de dívida alguma excepção ao regime geral de tributação das sociedades financeiras? A notícia é equívoca. Em princípio, nestas matérias, só é notícia o que exorbita da regra geral. Se "CoCos" são configurados como empréstimos, os juros pagos são custos de exploração. Presumo que a redução de 25% referida pelo JN é calculada tomando como base a taxa de IRC média paga pela generalidade da banca, e muito contestada pela opinião pública por ficar aquem da taxa do código.

Se for esta a interpretação correcta, a notícia do JN é tendenciosa porque induz ao entendimento de uma situação de favor concedida aos bancos que "poderão abater mais de 400 milhões de euros nos seus encargos ...". Por que não?

 A fiscalidade sempre beneficiou a remuneração (juros) dos capitais alheios, aceitando-os como custos, relativamente à remuneração (dividendos) dos capitais próprios. E os "CoCos" podendo (fatalmente) virem a transformar-se em capitais próprios, são inquestionavelemente capitais alheios até à sua metamorfose, se e quando ela vier a ocorrer.  

Se tal vier a acontecer nalgum caso, a golpada é outra: O Estado não será reembolsado, não receberá mais juros, nem cobrará impostos. E os contribuintes pagam a factura.
Já aconteceu.

Wednesday, August 15, 2012

O JOGO DA CABRA CEGA

Advogado do Estado queixou-se de falta de informação do Governo no caso dos submarinos
Ministério Público arquiva investigação sobre Bernardo Ayala
PGR vai questionar Governo sobre documentos dos submarinos quando regressar de férias
Portas desvaloriza e diz que notícias sobre os submarinos emergem e submergem
Actual Ministro da Defesa desconhece se há documentos desaparecidos
Antigo Ministro da Defesa, Severiano Teixeira, diz ter respondido a todas as solicitações do Ministério Público
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Tenho os poderes da Raínha de Inglaterra, garantiu há dois anos o senhor PGR Pinto Monteiro. Se isto acontecesse numa sociedade onde a dignidade pessoal e a do cargo fosse um valor estimado, o senhor juiz conselheiro Pinto Monteiro ter-se-ia demitido após ter declarado a sua impotência ou quem o nomeou tê-lo-ia demitido. Não aconteceu nem uma coisa nem outra porque vivemos numa sociedade moralmente falida.

A continuidade do senhor juiz conselheiro à frente do Ministério Público tem prolongado a permanência em estado comatoso da justiça em Portugal. O processo dos submarinos é exemplar da indignidade a que chegaram os agentes da justiça. Passados nove anos sobre os acontecimentos, quase oito anos sobre a coincidência de depósitos de um milhão de euros em contas do CDS, oito meses depois da justiça alemã ter condenado dois gestores por suborno na venda dos submarinos a Portugal, o MP volta a promover as audiências dos media com mais uma notícia que é tão surprendente quanto será inconsequente: desapareceram documentos do processo, diz o Ministério Público, procurem bem que eles devem lá estar, garante um ex-ministro da Defesa, respondi a tudo quanto o MP solicitou afiança outro ex, o actual desconhece se há documentos desaparecidos. Em cima da barraca senta-se o PGR, que promete questionar o Governo quando voltar de férias. Inacreditável.

Ciclicamente, o Ministério Público abana a opinião pública com declarações bombásticas que acabam por morrer na praia. Até agora, nenhum dos processos mais mediáticos foi concluido com a condenação dos suspeitos. Entretanto, a opinião pública condenou a generalidade dos arguidos no tribunal vesgo da justiça popular.

Ninguém vai preso nem ninguém é demitido.
E rimo-nos da nossa imbecilidade colectiva contando a propósito anedotas recicladas.


Imagens engraçadas - MISTÉRIO DESVENDADO

Tuesday, August 14, 2012

O LAMBE BOTAS

"Mas também foi eleito pelos colegas como o "maior lambe botas"

Quando Mitt Romney aceitou, há dias, escolher Paul Ryan para o acompanhar no ticket republicano à conquista da presidência dos EUA em Novembro, resignou-se à mesma imposição da ala mais conservadora do partido de há quatro anos atrás, quando John McCain foi obrigado a aceitar a companhia de Sarah Palin. E se com Sarah Palin os conservadores contavam com o populismo da ex-governadora do Alasca para mobilizar os sectores mais tradicionalistas do país, com Paul Ryan esperam garantir o eleitorado radical que considera Mitt Romney demasiado liberal, no sentido que os norte-americanos dão ao termo.

Qando dentro de pouco mais de dois meses os norte americanos votarem  para a eleição do próximo presidente, as opções em confronto imporão uma escolha que não poderia ser mais clara. Simon Schama, professor de Columbia,  considerava há dias no Financial Times que a escolha de Novembro será entre Franklin Roosevelt e Ayn Rand, mas exagera. Desde logo porque quem concorre à presidência é Mitt Romney, não é Paul Ryan. E Mitt Romney não é um discípulo de Ayn Rand ainda que a sua visão política do Estado o coloque uma distância bem visível das opções da administração de Obama. De entre todas as diferenças que essa distância comporta, a política de segurança social, embora mitigada até por representantes do seu próprio partido, é a mais emblemática mas também a mais fracturante das medidas tomadas por Obama.

Sobreviverá a "Medicare" a uma eventual mudança de administração na Casa Branca em Novembro?
Mitt Romney já assegurou que não e a  candidatura de Paul Ryan à vice-presidência apenas reforça aquela determinação de Romney. Há quatro anos a vitória de Obama foi clara mas não foi esmagadora. Num contexto económico ainda deprimido, Romney irá prometer até o que não poderá cumprir. Não será o caso da "Medicare", um tema em que, se for eleito, sê-lo-á essencialmente em função da promessa feita de anular a política de Obama nesta matéria.

E faz sentido que, tendo sido Obama eleito também por ter prometido introduzir nos EUA um sistema de segurança social capaz de abranger cerca de 30 milhões de norte-americanos que estavam desprotegidos, seja vencido por ter cumprido? Para os norte-americanos fará. Porquê? Alguns dirão que  será o trunfo do lambe botas.

Monday, August 13, 2012

OLIMPICOS, MAS POUCO

mais fotos aqui

Um dos maiores circos do mundo, que de quatro em quatro anos monta instalações e pode ser visto em toda a parte do mundo, terminou ontem, e como é costume, com mais pompa e luminância que nunca. Para lá das competições entre atletas e, mais notoriamente entre países, há uma competição em grandeza kitsch entre os países organizadores que se exibe na abertura e encerramento do espantoso evento que se traduz em sucessivos recordes, segundo os observadores geralmente bem informados. O Brasil, próximo anfitrião, já está em pulgas para montar este Carnaval diferente e promete gastar o que pode e o que não pode para conquistar também esta medalha única.

Não me impressiona a generalidade das modalidades olimpicas mas ninguém que esteja acordado pode ignorar o fenómeno que põe tanta gente horas a fio a olhar absorta os ecrans de televisão. Dei uma olhadela a uma ou outra modalidade, continuo a não entender por que desígnio há quem entegue uma parte da sua vida, por exemplo, à tentativa de redução de um milésimo de segundo numa corrida de cem metros; assim como não entendo os critérios que afastam da consagração olimpica os artistas do futebol mais aplaudidos e imperialmente pagos. Dir-me-ão que se pretende preservar a imagem do desporto amador nos jogos olimpicos mas toda a gente sabe que o argumento é treta.

Numa olhada ao quadro das medalhas olimpicas, ressalta, para além da comparação do incomparável -países com a dimensão económica dos EUA ou da China (os dois primeiros do quadro de honra) com outros centenas ou até milhares de vezes mais pequenos -, a continuidade da supremacia norte-americana perseguida pelo sucesso desportivo da China, replicando o sucesso à vista na ultrapassagem dos americanos na modalidade força económica.

Tanto aparente sucesso de um regime ditatorial acabará, mais tarde ou mais cedo, se não abrir falência entretanto, por questionar as razões do insucesso aparente da democracia.
Até onde dois rankings de grandeza, económica e desportiva, liderados pela China podem suscitar o confronto dialético aberto entre ditadura e democracia?
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Se ao menos, entretanto, a UE fosse uma entidade politicamente integrada e se apresentasse como tal no Rio... 

Sunday, August 12, 2012

ABAIXO OS SALÁRIOS!

"BCE pede medidas céleres e decisivas para baixar os custos unitários do trabalho. Depois da Comissão Europeia, é a agora a vez do Banco Central Europeu defender a implementação de medidas que reduzam os custos unitários do trabalho nos "países fortemente afectados pela crise", nos quais se inclui Portugal."

Nos sectores transaccionáveis - aqueles que competem, em Portugal ou no estrangeiro, com a concorrência externa - a redução dos salários já começou há muito. Hoje quem está desempregado ou à procura do primeiro emprego raramente tem capacidade negocial e aceita o salário que o empregador oferece. A redução processa-se, deste modo, de forma lenta mas persistente e atinge desigualmente os diferentes sectores de actividade económica, alguns dos quais escapam à crise por desenvolverem as suas actividades, total ou parcialmente, em ambiente protegido de facto

Os custos unitários de produção não dependem apenas dos custos do trabalho, havendo sectores de actividade onde os custos externos - a energia, por exemplo - representam uma parte importante dos custos unitários totais e que têm vindo persistentemente a crescer em ambiente recessivo.

Quando o Governo decidiu cortar os salários e pensões dos funcionários públicos e, as pensões dos contribuintes do regime geral da segurança social, com o objectivo imediato de reduzir o défice das contas públicas, introduziu um factor de maior desequilíbrio no mercado do trabalho porque atingiu indirectamente os salários de uma parte do sector privado mas deixou quase  intocáveis alguns dos sectores que nos últimos doze anos foram os grandes beneficiário de uma moeda forte. E os preços destes sectores, monopólios de facto, aumentaram o seu peso relativo nos custos unitários de produção dos seus clientes.

Havia alternativa?
Havia mas foi ignorada pela coligação entre as ideologias de esquerda e o politicamente menos incorrecto dos partidos do arco governamental: a redução geral/pontual/proporcional dos salários. Teria sido mais eficiente, porque de resultados mais imediatos, mais justa, porque abrangeria todos de forma proporcional, mais recessiva mas num período mais curto.

E agora? Que vai fazer o Governo após o chumbo do TC aos cortes salariais e pensões dos funcionários públicos e das pensões dos contribuintes do regime geral da segurança social e desta recomendação, que vai em certa medida no mesmo sentido, do BCE e da UE se não adoptar agora o que ignorou antes?

Saturday, August 11, 2012

O JOGO DA CABRA CEGA

"Desapareceu grande parte dos documentos sobre o negócio dos submarinos. A documentação sobre o concurso liderado pela equipa do então ministro Paulo Portas já não está no Ministério da Defesa. É o próprio Ministério Público que o reconhece." (aqui

Poderia supor-se que mais este desaparecimento tanto pode ter sido provocado com a intenção de eliminar suspeitas como de as levantar se os famigerados processos dos submarinos não estivessem já contaminados com outros incidentes que pendem todos para o mesmo lado.

O que, mais uma vez, está em causa é a inimputabilidade dos políticos e dos funcionários públicos desempenhando as mais altas funções do estado. Nenhuma outra organização, onde os erros dos seus responsáveis não são pagos pelos contribuintes, consentiria continuar a contar nos seus quadros com aqueles que, por acção ou omissão, não sabem dar conta das ocorrências que atravessaram as suas áreas de responsabilidade.

O que, mais uma vez está em causa, é a incapacidade, a incompetência ou a conivência, daqueles a quem compete localizar os responsáveis e, sistematicamente, assumem a sua ignorância real ou fingida, continuando impunes e bem pagos.

O actual ministro dos Negócios Estrangeiros, Ministro da Defesa ao tempo em que ocorreram os factos reportados na notícia, argumentará com o seu silêncio, que não lhe competia nem compete a guarda dos documentos que subscreveu ou foram subscritos pelo seu ministério. Mas sabe-se, ou deveria saber-se, quem estava incubido dessa guarda. Num caso ou noutro há certamente intervenientes identificáveis. As declarações do Ministério Público são, inequivocamente, típicas de um Estado também moralmente insolvente.

Friday, August 10, 2012

PORTUGAL AO NATURAL


Costa da Caparica - Rua Mista

Árvores plantadas na rua, carros estacionados nos passeios

COMO ACABAR COM O EURO


O tema do Economist desta semana - Tempted, Angela? A controlled break-up of the euro would be hugely risky and expensive. So is waiting for a solution to turn up - é tão assertivo como provocador.

Assertivo, porque o mais divulgado magazine do mundo, de análise e crítica económica e financeira, em repetidas edições tem defendido a zona euro e proposto soluções que, se tivessem sido tomadas em tempo oportuno, provavelmente a sustentabilidade da moeda única europeia não estaria hoje em causa. Um facto tanto mais notável por ser o Economist uma publicação de raiz e matriz anglo-saxónicas, destacando-se, do eurocepticismo táctico comum à generalidade dos súbditos britânicos. Por outro lado, nunca o Economist disfarçou o seu alinhamento económico liberal, mantendo-se sempre crítico relativamente à enormidade burocrática de Bruxelas. 

Provocador, porque muito sucintamente resume, quantificando, as enormes interrogações que se colocam a Angela Merkel, numa altura em que já é tarde para tudo: para resgatar de vez a zona euro ou acabar, total ou mesmo parcialmente, com ela. 

Inquestionavelmente, pelo menos para quem não esteja pessoalmente condicionado pela defesa de uma ou outra solução, Angela Merkel já perdeu a aposta em que acreditou (ou supomos que acreditou) de reequilibrar a zona euro recorrendo a políticas de natureza fiscal rebocadas por medidas de austeridade nos países surpreendidos pela súbita reacção dos investidores relativamente a algumas dívidas soberanas. Se alguns acreditaram que esse era o caminho possível e recomendável, desses, a maioria já terá mudado de ideias à medida que os factos vieram rebater os argumentos. 

Também inquestionavelmente, a solução passará  sempre por Berlim e, sobretudo, pela determinação que o Governo alemão colocar na defesa da sua proposta.

Poderá continuar a haver uma não proposta, isto é, poderá continuar a assistir-se à continuidade do adiamento à espera que as mesmas medidas produzam resultados diferentes? Pode. Mas esse será o caminho que conduz à desintegração não controlada da zona euro, ao caos, e sabe-se lá a que mais.

Subsiste ainda outra dúvida: É possível uma desintegração controlada? É possível. Mas, por agora, ninguém saberá o que isso significa.   

Thursday, August 09, 2012

E SE AMANHÃ HOUVESSE UMA CORRIDA AOS BANCOS NA ALEMANHA?

E se amanhã houvesse uma corrida aos bancos na Alemanha, o que diria Dona Merkel ao senhor Draghi?

É impossível uma corrida aos bancos na Alemanha? Não é impossível.
Nenhum banco, mesmo um conjunto de bancos dispostos a conceder liquidez uns aos outros, está imune a uma corrida aos bancos se o banco central que os suporta não tiver a capacidade para tornar ilimitada a liquidez do sistema. A Reserva Federal Americana (Fed), o Banco de Inglaterra, o Banco do Japão, todos os bancos centrais podem, se as circunstâncias o exigirem, emitir a moeda necessária para eliminar a hipótese de uma corrida aos bancos. O Banco Central Europeu não possui essa capacidade, daí a possibilidade (embora remota em alguns países membros da zona euro) de poder ocorrer uma corrida aos bancos.

Uma corrida aos bancos pode ser, portanto, inteiramente racional. Mervyn King, governador do Banco de Inglaterra, disse uma vez que pode não ser racional o princípio de uma corrida aos bancos mas é racional participar numa. De acordo com este princípio é normal que os depositantes gregos e espanhóis levantem o seu dinheiro dos bancos. Se, além disso, há especulação acerca da saída Grécia da zona euro, então é racional que os gregos retirem o seu dinheiros do país. (aqui)

Recentemente, a Grécia, onde a probabilidade de saída do euro não se reduziu, já não é a hipótese mais preocupante para a continuidade da zona euro. A Itália e a Espanha, mas sobretudo a primeira, pela dimensão das suas economias e a intersecção dos seus sistemas bancários com os dos outros membros da zona, nomedamente, alemães, franceses e holandeses, podem desencadear um processo de desconfiança global na zona euro que atingirá inevitavelmente a Alemanha.

Talvez por isso, certamente por isso, suponho, Dona Merkel está tão interessada em angariar tempo para os bancos alemães para se imunizarem contra as falências que venham a ocorrer em membros da zona euro.

Se, por razões incontroláveis, a zona euro vier a desintegrar-se, a confiança na moeda única europeia, mesmo que subsista no norte da Europa, esboroar-se-á. Até que ponto? Ninguém sabe. Mas a dúvida subsiste:

Se amanhã houvesse uma corrida aos bancos na Alemanha, o que diria Dona Merkel ao senhor Draghi?


Wednesday, August 08, 2012

ROBALHEIRA

Acabou de chegar à redacção este e-mail:

SUCATA, OS ROBALOS E AS ALHEIRAS

Quando perguntaram a Armando Vara o que tinha recebido de prenda de Manuel Godinho, respondeu que tinham sido ROBALOS... e acrescentou que lhe tinha retribuído com ALHEIRAS ...

Pois bem, estudos recentes da Universidade de Coimbra, da Faculdade de Ciências Criminais e Gatunagem Robótica Eléctrica às Vezes, concluiu que ROBALOS e ALHEIRAS, propiciam uma reacção química a que se deu o nome de :  

CIENTIFICAMENTE, TUDO NA MESMA*

A 13 de Maio deste ano, Krugman ilustrava o seu apontamento do dia - Eurodämmerung - com um youtube do final de Götterdämmerung - O Crepúsculo dos Deuses.

Segundo Krugman (que citei aqui),

1.- A Grécia sai do euro, provavelmente já no próximo mês; (em Junho, portanto)
2.- Espanhóis e italianos transferirão largos montantes de dinheiro para os bancos na Alemanha;
3a.- Talvez possam ser introduzidos controlos, de facto, proibindo a saída de fundos desses países, e limitando os montantes levantados;
3b.- Alternativamente, ou em simultâneo, largos montantes de crédito serão disponibilizados pelo BCE de modo a evitarem o colapso do sistema;
4a.- A Alemanha tem de escolher entre aceitar mudar de estratégia, permitindo medidas que reduzam os custos dos empréstimos, e, consequentemente, que a inflação faça o ajustamento possível dos preços na Zona Euro, ou

4b.- Acaba o euro.

Quatro dias antes, a Fitch garantira que a eventual saída da Grécia não determinaria o fim da moeda única europeia (cf aqui). Recentemente, um estudo realizado pela mesma agência financeira confirma a garantia que deu há cerca de três meses: a zona euro será capaz de resistir às pressões dos mercados e manter-se intacta a longo prazo.

Apesar da oposição das previsões, tanto Krugman como a Fitch (ou quaisquer outros opinadores mais ou menos credenciados) partem da mesma premissa: o comportamento da Alemanha. Krugman critica as obstinações alemãs e prevê o fim do euro se elas persistirem. Fitch garante a sobrevivência da zona euro porque, segundo eles, a Alemanha será perdedora com a sua extinção. Mas a Fitch terá razão se, e só se, os alemães estiverem convencidos disso mesmo.

Até lá, se entretanto nada de muito inesperado acontecer, Merkel quer que os bancos alemães continuem a tirar o cavalo da chuva, e, cientificamente, continuará tudo na mesma.
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* Para um mote publicado aqui.

Tuesday, August 07, 2012

PARA TROICA VER

A privatização da RTP vai ser pelo menos tão controversa quanto a reorganização administrativa do país, prometendo ambas as acções ficar a meio do caminho se conseguirem arrancar do ponto de partida. A favor da garantia de algum percurso, apenas os compromissos assumidos perante a troica, contra, quase todos quantos vivem do orçamento ou sentem ameaçadas as posições ou privilégios. O ministro que se incumbiu de uma coisa e doutra está politicamente diminuido mesmo considerando que bate os gatos em matéria de foles e é pelo menos tão destro com os felinos em cair de pé. 

A organização administrativa do país vem do tempo da maria caxuxa, todos concordam que deve ser alterada, nenhum dos que a podem alterar está disposto a alterá-la mais do que superficialmente. É lamentável que a troica não exija o cumprimento dos compromissos assumidos e pareça estar disposta a transigir numa acção essencial à eficiência da gestão dos governos locais. As freguesias, onde o governo está  centrar o exclusivo das discussões à volta do tema, não têm a importância que os partidos impingem sobretudo por razões partidárias. Repito-me: deveriam ser todas mantidas, todas, criadas as que as populações solicitassem, com funções limitadas à representatividade nas assembleias municipais, sem remuneração dos seus membros. Os concelhos, onde os partidos não se atrevem a tocar por razões exclusivamente partidárias, deveriam ser aglutinados para a obtenção de maior operacionalidade dos meios e melhor planeamento das acções do conjunto. Os vereadores não deveriam ser executivos, salvo os presidentes das câmamas municipais e desempenhariam as suas funções graciosamente. Punha-se à prova, deste modo, quem é que estaria disposto a servir o interesse público, desmobilizando muitos aqueles que vivem à custa dele.  

Quanto à privatização da RTP, só não é estranha a intenção da privatização do Canal 2 porque o ministro Relvas não podia ser mais claro: A RTP 1 é necessária à propaganda política, o Governo não procura maximizar o produto da venda, vendendo o canal de maior audiência, mas continuar a tutelar um canal aberto generalista vocacionado para disputar as audiências com programas geralmente popularuchos. O objectivo de se distinguir pela qualidade dos outros canais abertos é, deste modo, deitado borda fora com o abstracto serviço público. Estarão, certamente de acordo, os partidos do arco governamental por razões eleitoralistas, o PCP e o BE por motivações ideológicas.

O que até se poderia aceitar por razões economicistas se o canal público deixasse de continuar a depender do dinheiro dos contribuintes. De outro modo á uma clara transgressão das leis da concorrência. Espera-se que os concorrentes  procedam como podem e devem.

Monday, August 06, 2012

NÂO É UMA QUESTÃO DE VIRILIDADE

"Já há mais de 25 anos que a fertilidade tem vindo a decair no nosso país. E qual tem sido a resposta dos nossos governantes perante esta acentuada descida da natalidade? Assobiar para o lado e/ou pensar que o problema se vai resolver por si próprio. Enfim, o habitual." (aqui)

Virility Simbols é o título de um artigo do Economist desta semana que ironiza, a propósito da inversão recente de posições em matéria de natalidade na Europa e nos EUA, recorrendo à correlação usada pelos conservadores norte-americanos que gostam de exibir o contraste do vigor e virilidade dos States com a decadência e o declínio da Europa. Durante muitos anos, os EUA tiveram taxas de fertilidade total (número médio esperado de filhos por cada mulher durante a sua vida) à volta de 2,1, acima dos valores observados na genaralidade dos países ricos. Aquele valor (2,1) equivale à "taxa de substituição", aquela que estabiliza a população a longo prazo. Nos países europeus, as taxas de fertilidade total estiveram até há pouco tempo abaixo da "taxa de substituição".

Em 2011 a situação inverteu-se em alguns países europeus. Mas não em todos. Não em Portugal, onde as taxas de fertilidade continuam a decrescer há mais de 25 anos, afirmava o ano passado o actual ministro da Economia quando ainda era professor em Vancouver.

A taxa de fertilidade é agora de 1,9 nos EUA e continua em queda, na França é 2,0 e estável, em Inglaterra e no País de Gales está pouco abaixo de 2,0 mas está a crescer ligeiramente.
Nos EUA, a crise é causa da queda  por duas vias: por um lado, os imigrantes que não conseguem emprego voltam para casa. Como são eles que, normalmente, têm famílias mais numerosas que as dos naturais do país, a sua saída reduz a taxa de fertilidade; por outro, a redução de rendimentos, aliada à crise do imobiliário provoca o adiamento de casamento. Segundo uma sondagem da Pew Research Center junto de jovens entre os 18 e os 24 anos, 22% declararam ter adiado o nascimento de um filho e 20% disseram ter adiado o casamento em consequência da crise. 
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Em Portugal o persistente decréscimo da taxa de fertilidade (que estará a agravar-se em consequência da vaga de emigrantes em idade de procriação) está a colocar o país na cauda do crescimento demográfico e do envelhecimento da população, a nível mundial. A emigração de jovens portugueses e o retorno de imigrantes aos seus países de origem em consequência da crise estão a acelerar uma tendência que já vem de longe.

Haverá medidas que possam inverter esta tendência dramática senhor ministro da Economia? Ou continuará o assobio para o lado à espera que que o problema se resolva por si próprio?
Um problema bicudo porque envolve múltiplas variáveis, todas elas difíceis de dominar. Dificuldades que se exacerbam em tempos de crise profunda.
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Pela boca ...
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Há quem pense que são necessários mais apoios à maternidade para inverter a tendência observada em Portugal, e dão o exemplo da Suécia. Não creio que seja a solução, mesmo que ela fosse suportável pela segurança social nos tempos de crise que correm. Será, quanto muito, uma das medidas necessárias mas, certamente, insuficiente. Aliás, como provam os resultados invisíveis das que foram tomadas nos últimos anos.

A DAMA PÉ-DE-CABRA

Lado a lado, Paula Rego e Adriana Molder, na Casa das Histórias, em Cascais

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Paula Rego, a mais prestigiada artista nascida em Portugal, continua a produzir a um ritmo que só os maiores conseguem.

Sunday, August 05, 2012

O NEGÓCIO DOS ENCOLHIDOS

O Expresso de ontem publica mais um artigo de Paul De Grauwe - O BCE deve mudar o modelo de negócio - onde o professor da Universidade Católica de Lovaina continua a sua habitual crítica à actuação do Banco Central Europeu. Para De Grauwe, e provavelmente para a generalidade daqueles que podem intervir na matéria, "o BCE é a única instituição que pode evitar o pânico nos mercados da dívida soberana empurre os países para um "mau equilíbrio". Um título e uma conclusão pacíficos para um texto estranho.

Estranho, porque De Grauwe, um professor de reconhecido prestígio internacional, exige do BCE um conjunto de acções que o BCE não está mandatado para accionar. Que o BCE não faz aquilo que deveria fazer porque não pode, ficou mais uma vez demonstrado a semana passada quando o senhor Draghi teve de recuar de um discurso animador, desautorizado pelo senhor Jens Weidmann, o mais poderoso presidente do Bundesbank. Weidmann, aliás, foi mais longe e comparou, na ocasião, os países endividados da União Europeia aos alcoólicos, e afirmou que a disponibilidade do BCE de comprar dívida soberana para ajudar os Estados em maiores dificuldades seria o mesmo que "dar um último trago a um alcoólico".

Perante estas declarações, que só podem ter o suporte do governo alemão, que capacidade de manobra tem o presidente do BCE num espaço tão encolhido? Demitir-se? Draghi, quando aceitou o cargo, conhecia as limitações do seu mandato. Apesar da sua inquestionável experiência e "savoir faire", Draghi é mais um encolhido de um conjunto de pseudo líderes que enquadram milhares de burocratas, principescamente bem pagos, que, no seu conjunto, representam a maior e mais redundante superestrutura política que alguma vez foi montada.

O Parlamento Europeu, a Comisão Europeia, o Banco Central Europeu, chegaram a um ponto de vacuidade de onde já não é esperável que possa sair qualquer ar fresco. Ninguém se demite porque os honorários são invejáveis, as instalações magníficas e a situação geográfica privilegiada. Mas a grande maioria é redundante.

A senhora Merkel só não manda a troica analisar os custos/benefícios da União porque ainda é cedo para denunciar os seus propósitos escondidos. E se Merkel não manda, ninguém ousa. Hollande calou-se, Cameron distanciou-se e ameaçou com um referendo nas Ilhas, Monti faz o que pode, mas não pode muito, Rajoy está cada vez mais perdido no meio da fúria espanhola. 

Entretanto, a vaga dos eurocépticos eleva-se cada vez mais alta um pouco por toda a parte, mas a desintegração da União não será pacífica.

Se continuar por este caminho, o rentável negócio dos encolhidos pode fechar dentro de pouco tempo. 
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Saturday, August 04, 2012

UM CASO MUITO COMPLICADO

Segundo o El País de hoje, Rajoy empieza a asumir el nuevo rescate, o que significará que, se o pedido de novo resgate  vier a concretizar-se, o orgulho espanhol terá de submeter-se a um conjunto de acções que a troica prescrever segundo o receituário já conhecido, definido pelo FMI e pelos alemães.

Digo alemães, porque no ponto a que o confronto europeu chegou - quem duvida que há hoje um confronto latente entre os europeus do norte e do sul? - a opinião pública será decisiva no desenrolar dos acontecimentos nos próximos meses. E a opinião pública alemã, segundo as últimas sondagens conhecidas, está a mover-se no sentido da desintegração europeia, mesmo que Merkel e Schäuble repetidamente afirmem publicamente pretenderem o contrário quando dinheiros do sul se refugiam na compra de dívida alemã a taxas negativas e os países do sul pagam taxas de juro insuportáveis em contexto económico recessivo.

Quando Rajoy começou por rejeitar o apoio externo aos bancos espanhóis insolventes, argumentando que a Espanha não carecia de ajuda exterior, a basófia pareceu despropositada. Agora, quando a cena se repete porque, para além da insolvência do sistema financeiro, se revelou a falência de várias comunidades autónomas, a reacção de Rajoy precisa de ser reinterpretada.

Transcrevo do El País:

"Mientras, Rajoy sigue moviéndose para intentar que se apliquen los acuerdos de la última cumbre y así pueda intentar evitar pedir el rescate suave o al menos hacerlo en mejores condiciones, cuando entre en vigor el ESM. El presidente ha mandado una carta a Herman Van Rompuy, el presidente del Consejo Europeo, en la que exige que se pongan en marcha los mecanismos acordados en la última cumbre. En ella, Rajoy pide muy claramente a Europa que compre deuda de los países que cumplen y recortan, como España.

“En la cumbre se acordó que el instrumento más adecuado son las compras [de deuda] en los mercados. El anuncio reciente de la posibilidad de dotar al ESM [el nuevo fondo de rescate] de una ficha bancaria complementaria refuerza de forma muy eficaz esta idea”. Rajoy recuerda que los nuevos mecanismos no se han puesto en marcha cuando se esperaba, el 9 de julio. Por eso pide una urgente reunión del Eurogrupo para tomar esas decisiones.

Rajoy se mostró impaciente con Europa e indignado con una situación en la que Alemania se financia a tipos negativos y España lo hace al 7%. “Si hablamos de un proyecto político, de convivencia, no se pueden aceptar estas diferencias en una zona de moneda común. No sucede en ningún área monetaria del mundo, es imposible que pase”, lanzó con evidente molestia. Pero esas soluciones sobre la estructura del euro, si llegan, son a medio plazo. En la más perentoria, la de la petición de ayuda al fondo de rescate, el giro de ayer fue evidente y todo parece ya poco a poco encauzado hacia ese temido redil."

Há no comportamento do directório alemão (a França deixou de contar, Monsieur Hollande saiu de cena)
o intuito cada vez mais claro de ganhar tempo para safar os bancos germânicos. Às boas intenções das suas propostas seguem-se os condicionalismos conhecidos. Rajoy e Monti estão, deste modo, a ser confrontados com condições que dificilmente podem ou serão autorizados a aceitar. 

Quando os italianos votarem am Abril do próximo ano, dificilmente os partidos que se apresentarem às eleições com um programa de aceitação de condições que claramente não conseguirão cumprir, poderão vencê-las. Até lá, Monti, designado primeiro-ministro por uma coligação de partidos que não quererão chegar a Abril comprometidos, não tem margem de manobra para contrariar uma discussão política que tenderá a polarizar-se na culpabilização dos tedescos. Aliás, a saída de Itália da zona euro seria, segundo um estudo do Bank of America que registei neste caderno há duas semanas atrás, vantajosa para os italianos; pelo contrário, e ainda segundo esse mesmo estudo, a Alemanha seria perdedora se saísse, mas estas conclusões não as reconhecem, pelos vistos, os alemães.

Quanto a Espanha, porque não há uma Espanha mas várias Espanhas, a capacidade de Rajoy levar os espanhóis a abdicar e obedecer aos desígnios alemães, é muito limitada desde logo pela contestação das comunidades autonómicas às medidas de austeridade que o seu governo decida aceitar. Perante Rajoy levantam-se várias "Madeiras" e outros tantos "Albertos João", menos burlescos mas não menos duros de roer.

E têm outra saída?
Têm, se Merkel & Companhia se convencerem e convencerem os alemães que não basta dizer que pretendem salvar a zona euro mas levarem por diante as medidas que a podem salvar.