O cerco aperta-se. Aos resultados da repetição das eleições na Grécia que podem colocar a extrema esquerda no poder e destroçar um sistema financeiro já fortemente abalado, juntam-se as notícias do progressivo agravamento da situação dos bancos espanhóis, com particular destaque, pela sua dimensão, o Bankia, já parcialmente nacionalizado.
Segundo El País, o relatório do Bankia publicado ontem avisa os accionistas que podem perder tudo se não reforçarem as suas participações. Em 2011 as perdas do Bankia atingiram os 2979 milhões de euros, um valor que estrondosamente contrasta com o lucro de 305 milhões que havia sido apresentado há três meses.
Em consequência destes resultados e das exigências impostas pela UE o Bankia pede agora que o estado espanhol injecte 19 mil milhões de dinheiro público, que se somarão aos 4465 milhões que já recebeu. As contas foram visadas pelos auditores que, no entanto, registaram reservas. Os activos tóxicos do Bankia decorrentes essencialmente de financiamentos ao sector imobiliário elevam-se agora a 30950 mil milhões; o volume de activos tóxicos detidos pelo BFA (Banco Financiero y de Ahorros) é ainda mais elevado mas as suas contas ainda estão a ser objecto de reformulação. Como o BFA consolida nas suas contas os resultados do Bankia, o montante dos activos tóxicos contabilizados no BFA já atingem os 41500 milhões antes da reformulação em curso das contas do BFA.
Este é apenas um exemplo (embora, em princípio, o mais saliente em Espanha), das primeiras previsiveis consequências de uma derrocada de um grande banco sobre um sistema com diversos níveis de interdependência.
É neste contexto resultante de uma política de irresponsabilidade resultante da conivência entre a ganância dos banqueiros e a demagogia dos políticos, que a União Europeia tem de decidir se vai prosseguir no sentido da integração política ou do desmantelamento da obra edificada até agora.
Ontem, comentei o contexto em que tal decisão tem de ser tomada, e resumi algumas afirmações contidas num longo artigo (mais um entre centenas) que o Economist já dedicou ao tema. Curiosamente, enquanto o futuro de Portugal passa pela Europa, por melhor que seja sucedida uma política atlantista que muitos defendem, jornalistas, comentadores, analistas, políticos da oposição e do governo, esgotam e esgotam-nos o tempo com temas com que costumavam vender os tablóides.
No fim de contas, pensarão muitos, que podemos nós fazer para impor seja o que for à dona da loja, a senhora Angela Merkel? Merkel, por opção ou inevitabilidade, tornou-se protagonista da crise, oxalá não seja protagonista do início do desmembramento da União e do conflito cultural que ele desencadear.
Cito, a seguir, um resumo da segunda parte do referido artigo do Economist:
"A Alemanha é culpada da crise? Muito, segundo alguns entusiastas federalistas. Para o ministro alemão das finanças, Wolfgang Schäuble, a moeda única foi à partida uma passada no caminho para uma integração plena da Europa. Mas
para lá chegar é preciso haver harmonização fiscal e centralizar o poder de decisão, a Comissão Europeia deverá ser eleita e devem ser atribuídos novos poderes ao Parlmento Europeu. Contudo, não é oportuno avançar quando o euro está à beira do colapso e os eleitores serão coagidos a votar numa situação ameaçadora. Com o tempo, a Europa voltará a crescer e as novas instituições ganharão legitimidade."
"Aproveitar a crise do euro como uma oportunidade para federalizar a UE provocaria um equívoco eleitoral. A geração do pós-guerra que via na UE um baluarte contra um novo conflito báelico está a a desaparecer ... Hoje não é evidente que os europeus sintam o mesmo...O projecto de Constituição foi abortado, o Parlamento Europeu está muito distante."
"Uma outra versão de um super estado europeu consistiria na aceitação da continuidade das políticas nacionais mas aumentar o poder de controlo do governo de cada país sobre os outros. Contudo, a crise do euro veio demonstrar que
as decisões colectivas são muito difíceis e os países mais pequenos receiam a influência excessiva dos maiores. Se Berlim paga as facturas e diz ao resto da Europa como devem comportar-se, arrisca-se a fomentar um nacionalismo destruidor e uma animosidade contra a Alemanha. Por outro lado, reforçaria a propensão para a saída dos membros mais liberais na perspectiva económica"
"É por isso que defendemos um caminho que limite a partilha da carga da dívida e a transferência de soberania. ... A zona euro necessita de um sistema global de supervisão bancária (uma ideia que Wolfgang Munchau adiantava há dias no FT, que comentei neste caderno), recapitalização, garantia dos depósitos, e regulação. Os governos da zona euro serão capazes de dominar e reduzir as suas cargas fiscais se houver mutualização da dívida acima de determinados limites (outra ideia já várias vezes adiantada por alguns economistas). Mas em qualquer caso a resposta não é transferir tudo para a UE."
"Haverá (mesmo assim) mudanças enormes. Os políticos deixarão de pressionar os bancos nacionais para apoiarem empresas nacionais (inviáveis) ou comprar obrigações do tesouro. Os bancos deixarão de ser espanhóis ou alemães mas progressivamente europeus. Trata-se de uma integração limitada à finanças quando as fronteiras económicas há muito foram abolidas"
"A integração fiscal pode também ser limitada. Não há necessidade para Bruxelas se ocupar dos impostos sobre o consumo nem de toda a dívida de cada estado membro. O que é preciso é que os países sobreendividados tenham acesso ao crédito e que os bancos tenham uma carteira de activos não principalmente ligados às circunstâncias de um país."
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"Até agora, Angela Merkel tem-se oposto a todas as formas de mutualização ... Se adoptasse a sugestão (do Economist, e não só), a Alemanha pagaria pagaria mais do que paga pela sua dívida, subsidiando os credores em risco, mas não seria uma federalização total da dívida. ... Estas emissões de dívida conjunta não contrariariam as restrições constitucionais da Alemanha."
"Mesmo assim uma versão limitada de federalismo é complicada. Um regulador bancário único pode exigir alterações aos tratados, que pode ser dificultada pelo facto de dez membros da UE não fazerem parte da zona euro..."
"...Uma questão subsiste para além de tudo isto: Estarão os alemães, os austríacos ou os holandeses suficientemente solidários com os italianos, os espanhóis, os portugueses e os irlandeses para pagar a conta? Pensamos que eles teriam interesse nisso. Chegou a hora da verdade para os líderes europeus, e especialmente para Angela Merkel, decidirem"
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