É um dado adquirido pela generalidade dos media que as eleições autárquicas em Lisboa e Porto estão decididas: ganham os incumbentes. E esta quase certeza de que quem hoje se senta nas cadeiras do poder local tem, na generalidade dos casos, garantida a sua reeleição, não é de agora porque se vem repetindo desde a instauração da democracia em Portugal. Enquanto a instabilidade na rotatividade dos governos centrais tem sido a regra e o ajustamento dos períodos de governo aos prazos de legislatura a excepção, no poder local a renovação dos mandatos é regra e a alternância a excepção. A perenidade no cargo dos titulares autárquicos é tão evidente que há muito tempo lhes granjeou o apodo de dinossauros e suscitou a emergência legislativa de limitação do numero de mandatos sucessivos.
Aliás, os exemplares mais desenvolvidos de dinossauros autárquicos não se têm observado em Lisboa e Porto. Cito Lisboa e Porto porque sendo os dois municípios politicamente mais relevantes do país é mais evidente o contraste entre as dificuldades que se colocam aos titulares de cargos no poder central e a garantida popularidade dos autarcas. Regra geral: os ministros claudicam, os autarcas cimentam-se. Por que é que instabilidade é norma a nível central e a continuidade no poder local tão excessiva que foi necessário por-lhe cobro?
Aos autarcas não se colocam opções de decisões politicamente fracturantes, a opinião pública aplaude-lhes a obra que, geralmente, é obra de cimento, ainda que, não raramente, seja de gosto e interesse colectivo duvidosos. Como as obras autárquicas são pagas pelos impostos cobrados pelo poder central, que dificuldades se colocam à gestão autárquica para além da concorrência dos interesses dos empresários que lhes batem à porta?
No Porto, Fernando Gomes (PS) foi presidente da Câmara entre 1990 e 1999, completando dois mandatos de 4 anos. A meio do terceiro mandato foi tentado pelo cargo de Ministro Adjunto e da Administração Interna, mas sucumbiu menos de um ano depois de tomar posse ferido pela polémica morte de touros em Barrancos. Ainda tentou voltar à presidência da Câmara do Porto mas, nessa altura, o incumbente Rui Rio cumpriu a regra.
Rui Rio (PSD), eleito pela primeira vez em 2002, sucedeu a Nuno Cardoso, que terminou o terceiro mandato de Fernando Gomes envolvendo-se em várias polémicas, completou o limite, já em vigência, de três mandatos. Sucedeu-lhe o independente Rui Moreira que agora parece ter a reeleição garantida apesar de não contar com apoios partidários e estar envolvido numa polémica em que se confrontam interesses familiares e do município a que preside.
Em Lisboa, Nuno Krus Abecassis (AD) completou três mandatos, sucedendo-lhe Jorge Sampaio, então líder do PS, que arriscou a candidatura quando nenhum dos outros principais dirigentes do partido se dispuseram a concorrer. Sampaio completou um mandato, sucedendo-lhe no início de um segundo mandato João Soares, que perdeu a eleição para novo mandato. Nomeado Ministro da Cultura do actual governo presidido por António Costa, João Soares claudicou após envolvimento polémico com dois colunistas do Público.
Sucedeu-lhe Santana Lopes que intercalou o mandato com o curto cargo de PM. Substituiu-o Carmona Rodrigues que, por envolvimento em polémicas com contornos de prevaricação de titular de cargo político, abriu caminho a António Costa que não completou o segundo mandato por ter assumido o cargo de PM, sendo substituído na presidência da Câmara por Fernando Medina.
O desempenho de Fernando Medina tem sido geralmente aplaudido pelas obras (sempre as obras) de reabilitação que a câmara tem vindo a realizar. Algumas delas, já o tenho apontado neste caderno de apontamentos, só fariam sentido se os investimentos feitos tivessem a garantia de suporte financeiro para a sua manutenção. Lamentavelmente, não é essa a tradição em Portugal. Pelo contrário, feitos os investimentos, falham normalmente os serviços de manutenção, e as obras desfazem-se com o tempo.
Por outro lado, há obras que podem embasbacar muita gente mas são, do meu ponto de vista, despropositadas em número ou em dimensão.
Tradicionalmente, os quiosques de Lisboa têm um carácter distintivo que os torna parte do imaginário identificador da cidade. De tal modo que os CTT os celebraram emitindo há uns anos uma série de pinturas de Maluda.
Por razões económicas que desconheço e de estética duvidosa, instalou a câmara de Lisboa, pelo menos, dois quiosques que são duas enormidades, um dos quais junto ao Monumental - um centro comercial sem grande afluência-, e outro em Campolide, e, próximo deste, uma parede vegetal. Para quê? Havia falta de espaço comercial no Saldanha? E em Campolide? E aquela parede vegetal por quantos meses vai perdurar?
Recordo-me, a propósito, que quando João Soares era presidente, a Câmara colocou mais de uma dúzia de quiosques quadrangulares, modelo caixote, feitos em aço inox, no Martin Moniz. Passado algum tempo, e porque a ideia era bizarra e ninguém pegava nos caixotes, andou a Câmara a oferecê-los a diversas entidades para dispersar a bizarria.
Casos destes há, de Norte a Sul, às centenas.
Foi por estas e por outras do estilo que o sr. João Soares foi batido (à justa) pelo sr. Santana Lopes?
Não foi. Falta-lhe vocação para ganhar eleições.