Sunday, July 19, 2020

UM TÍTULO POR UNS MILHÕES


Queen knights Capt. Tom Moore, 100-year-old who raised millions for British NHS

There was nothing quite normal about the ceremony in the middle of a deadly pandemic.

Saturday, July 18, 2020

E VIVA O PORTO!


Caríssimo António!


Lamentavelmente não nasci com o dom da fé clubística, gosto de ver um bom jogo de futebol sentado no sofá, mas admiro o entusiasmo civilizado de alguns adeptos enquanto abomino os fanatismos, qualquer que seja o fanatismo, de muitos outros. Parabéns, meu caro, o clube do teu coração é, mais uma vez, campeão, ... a bem da nação ... "o Porto é uma nação!".
Escrevo isto e ocorre-me uma sugestão, provavelmente não original, mas que considero pertinente.
Celebra a "cidade invicta" no centro do jardim da Praça Mouzinho de Albuquerque, largo da Boavista, no cimo de um pedestal com 45 metros de altura um leão inglês a pisar uma águia napoleónica, os heróis da Guerra Peninsular.
Infelizmente, os heróis da guerra foram sobretudo as vítimas, pessoas do Porto, que se afundaram no  Douro no desastre da Ponte das Barcas.
O monumento é, esteticamente, do meu ponto vista, claro, um aborto.

Resumindo: Julgo que há boas razões para remover do pedestal o leão e a águia e colocar lá uma estátua do sr Pinto da Costa com o um dragão ao lado, celebrando as vitórias do Dragão do Porto.

Os chineses podem fazer o trabalho por um preço muito em conta.




Friday, July 17, 2020

UMA OPORTUNIDADE PARA O INTERIOR

  

Em 31 de Maio deste ano, escrevi aqui: "

 
"... há uma oportunidade para fazer crescer o interior proporcionada por esta experiência alargada de tele-trabalho forçado pela pandemia. Se o sr. Costa e Silva, convidado pelo primeiro-ministro para  "coordenar e negociar o Programa de Recuperação Económica e Social", acreditar, como eu acredito há três dezenas de anos, no fundamental da mensagem transmitida no vídeo que coloco a seguir, talvez possa eleger uma acção de colocação de funcionários públicos (incentivada ou para novos recrutamentos) em regime de tele-trabalho no interior do país. Atrás dos tele-trabalhadores, por consequência natural, seguir-se-iam os não tele-trabalhadores necessários aos primeiros: professores, médicos, entre outros."

Hoje leio no Jornal de Negócios: Funcionários públicos ganham mais férias e prémios se forem para o interior em tele trabalho - aqui.

Não tenho qualquer presunção que o meu apontamento tenha sido lido por alguém com responsabilidades no governo, mas é gratificante ler a notícia do despacho do governo conhecido agora.

"O Governo publicou esta sexta-feira o decreto-lei que regula as compensações que oferece aos funcionários públicos que aceitem ir para o interior do país em regime de teletrabalho.

Este é um dos programas do Governo que visa colocar um quarto dos funcionários públicos em regime de teletrabalho e insere-se também no objetivo de "colmatar as assimetrias económicas e sociais que, atualmente, tornam o país territorialmente desequilibrado".

Aos funcionários públicos que procedam a uma "alteração temporária do local de trabalho" para o interior do país, são concedidas uma série de regalias, incluindo "uma compensação pecuniária de caráter temporário, a fixar por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública".

Além do prémio monetário, os funcionários públicos beneficiam de uma sério de outras compensações (ver lista em baixo), como mais dois dias de férias por ano.
Incentivos 
- A garantia de transferência escolar dos filhos de qualquer dos cônjuges ou de pessoa com quem viva em união de facto, nos termos regulamentarmente previstos;
- O direito a dispensa de serviço, até cinco dias úteis, no período imediatamente anterior ou posterior ao início de funções no posto de trabalho, que é considerada, para todos os efeitos legais, como prestação efetiva de serviço;
- O aumento da duração do período de férias, em dois dias, durante o período de exercício de funções ao abrigo das figuras previstas no artigo 2.º, vencendo-se o respetivo direito nos termos legalmente previstos;
- O gozo de 11 dias úteis consecutivos do período de férias a que legalmente tem direito, em simultâneo com o cônjuge ou a pessoa com quem vive em união de facto, nos termos legalmente previstos;
- O apoio específico dirigido às jovens famílias com filhos, sendo considerada como condição de acesso a esse apoio serem beneficiários de abono de família ou de subsídio de parentalidade, em termos a definir por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da Administração Pública e do trabalho, solidariedade e segurança social.
"O teletrabalho pode constituir um mecanismo de fixação de postos de trabalho em regiões menos populosas, bem como de favorecimento da conciliação da vida profissional com a vida pessoal e familiar, para além de prevenir o absentismo", explica o Governo no decreto-lei.

"Esta é mais uma oportunidade de promover a descentralização e desconcentração gradual da Administração Pública", refere o Governo, destacando ainda "os benefícios associados ao coworking e à partilha de conhecimento e de métodos que dele advêm".

O teletrabalho pode ser desenvolvido em espaços partilhados entre trabalhadores da Administração Pública, "devendo o Estado promover, numa lógica de eficiência e de aproveitamento de recursos, a utilização de infraestruturas públicas que possam ser utilizadas para o efeito".

Aos trabalhadores abrangidos pelo presente decreto-lei é atribuída uma compensação pecuniária de caráter temporário, a fixar por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública, sempre que deslocados da área geográfica não abrangida pela Portaria n.º 208/2017, de 13 de julho, para os territórios do interior identificados no anexo àquela portaria, salvo quando haja lugar ao pagamento de ajudas de custo, nos termos da legislação aplicável"

Monday, July 13, 2020

SINTRA DESERTA


Senhor Presidente da Câmara Municipal de Sintra,

Enviei no dia 18 do mês passado uma mensagem via e-mail com alguns reparos acerca de um passeio que demos naquele dia, eu e minha mulher, com máscara, no Parque da Liberdade.

Além do mais, referi naquele e-mail que dois homens envolvidos em trabalhos de manutenção do referido parque não usavam máscara e varriam o chão sem se preocuparem com a poeira que lançavam na nossa direcção. Fizemos sinal, pararam, e ficaram especados a olhar para nós como se no parque tivessem entrado dois extraterrestres.

Entretanto, há cerca de duas semanas, recebi na caixa de correio um envelope com indicação de ter sido remetido pela Câmara de Sintra contendo cinco máscaras cirúrgicas.

Hoje voltámos ao Parque da Liberdade, vimos no parque a uma distância de segurança apenas uma senhora com quatro crianças e dois funcionários da manutenção. Um carregava uma mangueira de rega, não usava máscara, parou a olhar para nós como se os extraterrestres tivessem voltado ao parque.
Mais adiante ultrapassou-nos, sem máscara, um indivíduo, que nos pareceu ser o capataz.

Numa das entradas fotografámos, fotografia em anexo, um aviso da C M de Sintra recomendando, além do mais, o uso de máscaras e a distância de 2 metros. Nenhuma destas recomendações estava a ser observada pelos funcionários da Câmara durante a nossa primeira visita nem nesta segunda.

Estão isentos do cumprimento das recomendações os funcionários da Câmara ou não há verba para comprar máscaras nem tempo para formação dos profissionais? Enganaram-se os serviços da Câmara quando me enviaram as cinco máscaras que deveriam ter sido entregues a funcionários a trabalhar em locais públicos?

Encontrámos, novamente, deserto, o centro da nossa cidade, reflexo da péssima imagem que estamos a dar ao mundo, até no Parque da Liberdade.

Com os nossos melhores cumprimentos,


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Act.

Acusamos a receção do presente email, o qual mereceu a nossa melhor atenção.

Face ao seu conteúdo, informa-se V.Exa. que o mesmo foi remetido para o Departamento de Obras Municipais e Intervenção no Espaço Público, para diligências.


Com os melhores cumprimentos,

Alexandra Carvalho
(Assistente Técnica)
Gabinete de Apoio ao Munícipe

MARIA BEATRIZ


Morreu Maria Beatriz, artista de sentido poético, tão portuguesa quanto holandesa - c/p aqui

Vivia e trabalhava desde 1970 em Amesterdão. Tinha 80 anos. O sentido poético da sua linguagem plástica e as preocupações sociais e humanas atravessavam a sua obra.


A artista portuguesa Maria Beatriz, que vivia e trabalhava há muitos anos em Amesterdão, morreu este sábado à noite, de cancro, na cidade holandesa, confirmou o PÚBLICO junto de fonte familiar. Tinha 80 anos. A pintura, desenho, gravura, colagem, instalação, fotografia ou azulejaria, foram algumas das técnicas artísticas que desenvolveu. Distinguia-a o sentido poético da linguagem plástica, as preocupações sociais e humanas, e os modos de fazer, o recorte e a colagem, compondo e recompondo elementos. 
Conhecida nos meios artísticos portugueses, não é muito reconhecida pelo grande público, em parte pela sua vivência holandesa, pelo arredamento dos circuitos mais comerciais e também, dizem os que lhe são próximos, pela personalidade discreta. No seu site oficial da internet descreve que as principais características do seu trabalho são o envolvimento social, a forma como lida com a emancipação, em particular, a luta pela libertação. E também a sua abordagem poética. “É o aspecto inconsciente que me interessa”, descreve, adiantando que a técnica de colagem lhe interessa sobremaneira, seja para utilizar em pequenos desenhos ou em telas grandes. 
Nascida em 1940, em Lisboa, nunca se adaptou bem a Portugal, em parte porque cresceu durante a ditadura do Estado Novo, vindo a dedicar-se às artes plásticas após uma inicial e breve incursão por biologia. Opta então pelo curso de pintura na Escola de Belas Artes que também cedo abandona devido à crise académica de 1961-62. Em 2015 afirmava numa entrevista à historiadora e actual directora do Museu Nacional de arte Contemporânea (Museu do Chiado) Emília Ferreira, que sentia “falta de ar” no Portugal dos anos 1960. “Não havia qualquer possibilidade para os jovens de escolherem a sua vida. Os rapazes viram-se a ter de seguir o serviço militar e partir para a guerra do Ultramar”, dizia, enquanto “as raparigas viram-se metidas num espartilho de proibições e preconceitos - para uma moça como eu, não conforme, rebelde e desejosa de poder escolher a direcção à minha vida, a opção foi partir.”
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PÚBLICO -
Foto 
Na galeria Ratton em 2016 
Galeria Ratton
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Após uma estadia em Londres, em 1962-63, onde toma contacto com a “arte pop” inglesa dos primórdios, começa a ter lições de desenho e de gravura, na Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses, por onde passaram alguns dos mais importantes artistas da época. Começa então a experimentar as técnicas de gravura em metal e é lá que encontra o inglês Stanley William Hayter, fundador do Atelier 17, estúdio de gravação em Paris, que tinha vindo a Lisboa dar um seminário sobre esta técnica artística. 
Em 1965, é-lhe atribuído o 1º prémio em Pintura na Exposição de Outono da Sociedade Nacional de Belas Artes, e no ano seguinte vai para Paris, como bolseira da Fundação Gulbenkian, onde retoma os estudos com S. W. Hayter, no Atelier 17, durante dois anos. Os anos na capital francesa foram tempos de aprendizagem artística e de crescimento cultural, mas também político e cívico, vivendo o período efervescente do Maio de 68. A proximidade da Cinemateca francesa de sua casa, levam-na a ver clássicos e filmes experimentais, ao mesmo tempo que priva com o pintor Júlio Pomar. Com ele, diz ter percebido o que era a “dificuldade da pintura”. Uma luta incessante “que era preciso levar avante para acabar uma pintura. Com os materiais e consigo próprio. Uma pintura espelha o que somos.” 
A partir de 1970, fixa residência na Holanda, realizando estudos de pintura e artes gráficas, diplomando-se na Academia Livre (Vrije Academie), de artes visuais. Em 1974, obtém uma bolsa do Ministério da Cultura holandês que lhe permite ir ao México, país onde a gravura teve um importante papel na modernidade artística. 
Nesse ano, de regresso à Holanda, começa a leccionar gravura (de 1974 a 1987) e depois pintura e desenho (de 1988 a 1990) na Academia Livre de Haia. É bolseira da Amsterdam Kunstfonds em 1977, e depois, mais uma vez, do Ministério da Cultura holandês entre 1978 e 1980. 
A partir de 1983, começa a trabalhar com a Galeria Asselyn, em Amesterdão, onde expõe diversas vezes. Expôs pela primeira vez individualmente nos anos 80, com La tierra es lo probable paraiso perdido no Museu de arte moderna de Arnheim. Nos anos 90 expõe na Casa da Cerca de Almada, na Galeria Palmira Suso e na Diferença, em Lisboa. Em 2002 expõe a sua série Vita Brevis no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian, em Lisboa, tendo esta mostra individual transitado para o Kunstuitleen K.N.S.M. de Amesterdão e para o Centro Cultural Calouste Gulbenkian em Paris, em 2004.
A sua última exposição individual museológica em Portugal foi a mostra Comedores de Batatas no Museu da Electricidade, Fundação EDP, em 2012. Sobre essa exposição, afirmou: “É possível que esta exposição seja a última de grandes formatos (tenho muitos problemas de artrose). E quis, neste semi-adeus, referir-me a Van Gogh. Porque, na situação actual em que o dinheiro se tornou a bitola de tudo, me pareceu relevante lembrá-lo, por se ter dedicado a desenvolver o seu talento, seguindo um desejo profundo interior. Sem ser por sucesso ou dinheiro. E assim foi a vida de muitos outros artistas que me têm acompanhado.”
Ao longo dos anos realizou exposições no Museu de Arte Moderna de Arnhem (1987, 2005), no Kunstuitleen K.N.S.M., em Amesterdão (1998, 2003), no Centro Cultural Calouste Gulbenkian em Paris (2004), na Gallery 59/SBK Zuid /Adam (2009), e em Portugal, na Casa da Cerca, em Almada (1998, 2003), na Galeria Palmira Suso (1998, 2000), na Galeria Diferença (1999), no Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian (2002), na Galeria Ratton (2009, 2012), no Centro de Artes e Cultura de Ponte de Sôr (2011) e no Museu da Electricidade (2012), entre outras.
Em 2016 existiram duas exposições simultâneas, Calendário na galeria Ratton, e a antológica Trabalho de Casa 1960-2013, na Casa da Cerca, com curadoria da Galeria Ratton, tendo sido publicado um catálogo conjunto. Nessa altura dizia que não escolheu seguir uma carreira, mas sim enveredar por um desejo. “O ter querido desenvolver o desenho e a pintura pediu-me horas de trabalho no meu ateliê. Tive, pois, menos tempo para a vida social. Também não tive um salário certo ao fim do mês. Mas preferi a vida que tenho.” 
Está representada em Portugal, nas colecções da Caixa Geral de Depósitos, da Fundação Calouste Gulbenkian, da Casa da Cerca - Almada, do Museu da Cidade, em Lisboa, do Museu do Traje, da Fundação Ilídio Pinho (Porto), da Fundação EDP, na Colecção Jorge Gaspar, e no Município de Ponte de Sor, e no estrangeiro, no Nederlandse Bouwfonds - Gemeente Hoevelaken, na colecção John Loose (Amesterdão), na colecção Bram Volkers (Amesterdão), no Congresgebouw (Haia), em CRM, Rijksdienst (Haia), no Museu Haags Gemeente (Haia), no Museu de Arte Moderna de Arnhem, no Museu Stedelijk (Gouda) e a Colecção S.B.K. (Amesterdão).
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Comentário



Nuno Júdice

De fora para dentro: Maria Beatriz (1940-2020)

Maria Beatriz utilizou processos como a citação e a colagem para afirmar uma individualidade que tirava da sombra e do obscuro uma luz carregada de lirismo.




A pintura portuguesa do século XX ganhou uma dimensão internacional graças a duas pintoras expatriadas: Maria Helena Vieira da Silva e Paula Rego. Outros pintores viveram fora de Portugal, como António Dacosta, Costa Pinheiro, René Bertholo, Júlio Pomar, por períodos mais ou menos longos, ou nalguns casos em definitivo, e nestes últimos destacam-se dois que acabamos de perder nos países que escolheram como residência: José Barrias, em Milão, e Maria Beatriz, em Amesterdão. Essa escolha de um exílio que, em tempos de democracia, já não é político mas pessoal ou cultural, faz com que os seus nomes não encontrem, entre nós, o prestígio ou o conhecimento que outros, com uma presença maior no mundo das nossas galerias e salas de exposição, têm; mas não será menor a sua importância no campo de experiências e projectos que as suas obras trouxeram.


O caso de Maria Beatriz distingue-se pela forma como o seu trabalho aproveitou uma vida nesse mundo em que o acesso à grande pintura fazia parte do seu quotidiano, da pintura holandesa a outras a que tinha acesso no seu espaço próximo de todos os grandes museus da Europa além-Pirinéus. Maria Beatriz utilizou processos como a citação e a colagem para afirmar uma individualidade que tirava da sombra e do obscuro uma luz carregada de lirismo, sugerindo por vezes um percurso em que é possível ler um diálogo com os Mestres, a começar por Van Gogh que lhe inspirou uma sequência baseada nas batatas da fase inicial do pintor, exposta em 2000 na galeria Diferença, até aos nus femininos que expôs na Galeria Ratton, já em 2016-17, em que surge um erotismo que vai buscar a sua raiz às Vénus renascentistas para terminar num século XIX que vai de Ingres a Manet, usando a colagem de uma forma inovadora e inteiramente pessoal.



Não creio que se possa, para lá dessa situação literal que é a morte física da pessoa, falar de morte quando referimos um artista. Nenhum dos nomes acima referidos, que conheci pessoalmente, com excepção de Vieira da Silva e de Dacosta, a que gostaria de acrescentar João Vieira e Manuel Amado, desapareceram do meu horizonte: claro que sinto a sua falta física, com destaque para o amigo mais próximo que foi Pomar, mas cada obra sua permite o reatar e o aprofundar desse diálogo que mantivemos em múltiplos encontros, e que se prolongava quando mostravam e explicavam nos seus ateliers as obras em curso.
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É o caso com Maria Beatriz. A sua figura discreta talvez não deixasse adivinhar essas explosões visuais que nasciam das soturnas batatas vangoghianas; ou o erotismo fulgurante das imagens femininas, algumas ligadas ao conceito de modelo que tem vindo a ser posto em destaque na crítica de arte francesa (sim, ainda tenho a França como referente cultural, que me desculpem os anglo-americanófilos a quem cada vez mais desculpo menos coisas), outras a um realismo que, no fundo, está por detrás do seu universo.
Se em certos momentos o objecto se esconde sob a cor que evoca a abstracção, é quase sempre o gosto pela imagem concreta que se encontra na sua pintura, e isso decorre do prazer com que a mão evolui ao longo do desenho de cada figura. A precisão com que o executa não deixa de evocar os predecessores que a essa arte se dedicaram desde a época dos flamengos, não obviamente em termos de imitação mas antes da forma como capta o olhar e o faz descobrir o génio da inventio que, na retórica romana, acompanhava a dispositio, ou seja, a arte de organizar no espaço os elementos fornecidos pela memória, indispensáveis para que o resultado final capte essa admiração que, por muito que custe aos que defendem minimalismos de facilidade para esconder a ignorância, é parte integrante do funcionamento do dispositivo estético.
Esperemos que a sua obra não se perca de uma apreciação mais vasta do público e que possa estar disponível, como merece, em colecções ou museus de acesso público, não se limitando a uma referência enciclopédica (nos tempos actuais diz-se wiquipédica) que reduz tudo a um conhecimento de superfície. Não acontece muitas vezes, mas guardo na memória alguns dos quadros ou desenhos que vi em momentos e tempos diversos; e se não fosse essa capacidade de dar vida a cada fase do seu trabalho, infelizmente demasiado discreto em termos nacionais, nenhum dos que tiveram o privilégio do seu contacto guardaria tão presente essa memória.

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Wednesday, July 08, 2020

ACERCA DA INFINITA ESTUPIDEZ DO ESTADO

 

De cada vez que alguém subscreve um contrato em nome do Estado, um ente abstracto sem capacidade volitiva própria,  a probabilidade de o resultado desse acto redundar em perdas para os contribuintes é muito alta. Tão alta que é raro o dia, se é que há algum, em que não seja noticiado um caso em que os contribuintes não sejam burlados ou, no mínimo, vítimas da irresponsabilidade material, porque não estão em causa interesses materiais próprios, de quem actuou como representante do Estado. 

O sr. Carlos Costa termina o seu mandato hoje, mantém-se em funções até que o sr. Mário Centeno ocupe o lugar. Costa atribuiu em Novembro de 2016, vd. aqui, sem mencionar o nome, os sucessivos escândalos na banca portuguesa a deficiências nas funções de supervisão durante o mandato do seu antecessor.

Espera-se que o Centeno não desiluda e promova, até onde possa ir, a recuperação de pelo menos parte dos rombos, para não dizer roubos, cometidos no Orçamento do Estado por agentes que subscreveram contratos ruinosos paras as finanças públicas.

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Novo Banco vendeu activos com 70% de desconto a fundo ao qual o seu chairman esteve ligado

Até ser nomeado chairman do Novo Banco, Byron Haines liderou um banco detido pelo fundo Cereberus. Foi a este fundo que o banco vendeu 200 imóveis com uma perda de 328 milhões de euros. Uma queixa à autoridade europeia denuncia “gestão ruinosa”, “conflito de interesses” e pede uma investigação criminal. - aqui

Em Agosto de 2019, o Novo Banco vendeu um lote de quase 200 imóveis com um desconto próximo de 70%, a entidades ligadas ao fundo norte-americano Cerberus. A operação ter-se-ia destacado apenas pela perda de 328,8 milhões de euros caso o fundo comprador não fosse o principal accionista do banco austríaco BAGAW P.S.K. que foi gerido por Byron Haines até este assumir o cargo de chairman da instituição financeira portuguesa. Os indícios de conflito de interesse e de eventuais decisões ruinosas no Novo Banco deram origem a uma queixa reportada à ESMA, Autoridade Europeia de Mercados e Títulos, na qual também se requer que se apure se “pessoas politicamente expostas” estiveram envolvidas na transacção.

No dia 7 de Agosto de 2019 o Novo Banco vendeu por 159 milhões de euros um lote de 195 propriedades agregadas a sociedades detidas indirectamente pelo fundo norte-americano Cerberus, que as adquiriram com um desconto de 67,9%. O valor bruto contabilístico da carteira de activos imobiliários era de 487,8 milhões de euros e o conjunto incluía 1.228 unidades individuais, de diferentes usos (industrial, comercial, terrenos e residencial), abarcando também estacionamentos. A gestão do Novo Banco baptizou a transacção de “Project Sertorius”.





Contas feitas, o negócio implicou uma perda de 328,8 milhões de euros em relação ao valor dos activos registados no banco, ainda que tenha ocorrido num contexto em que o mercado imobiliário em Portugal se valorizou 15,6% em cinco anos. O fundo nova-iorquino Cerberus relacionado com os veículos que adquiriram os imóveis desvalorizados é, desde 2006, o dono do banco austríaco BAGAW P.S.K., cujo CEO foi, até Março de 2017, Byron Haynes. Trata-se do actual chairman do Novo Banco, em funções desde Outubro de 2017.
Todas as informações constam da queixa enviada a 30 de Dezembro de 2019 à ESMA, e quem a subscreve tem envolvimento e interesse directo no Novo Banco. Na denúncia, é sublinhado que o desconto de 67,9% “oferecido pelo Conselho de Administração do Novo Banco” às sociedades do universo do fundo Cerberus consistiu “numa decisão ruinosa”. E, por isso, é pedido que a autoridade europeia garanta o “direito” de os stakeholders, do banco saberem se apurarem as razões que levam “o Novo Banco a vender activos abaixo do seu valor.” Na queixa, é também realçado que “o Project Sertorius foi executado num claro conflito de interesses, dado que Haynes, o chairman do Novo Banco, foi até final de 2017 o CEO do BAGAW P.S.K., do qual o Cerberus é o accionista.”





Chairman na supervisão

Depois de, em Outubro de 2017, o fundo norte-americano Lone Star ter concretizado a compra de 75% do banco português (injectando quase mil milhões de euros), e ter assumido o controlo total da gestão, foi buscar o britânico Byron Haynes, para presidir ao CGS (Conselho Geral e de Supervisão, o equivalente a uma administração não executiva) do Novo Banco, que é reportado na qualidade de independente. A escolha do britânico, devido à sua experiência de gestão no banco austríaco BAGAW P.S.K., sob fiscalização europeia, serviu então para legitimar a presença do Lone Star como accionista de controlo do Novo Banco.
Apesar de ser o chairman do Novo Banco, o CGS indicou-o para integrar três dos principais órgãos de controlo interno. Um deles é o comité de risco (onde está também o vice-presidente Karl-Gerhard Eick), a que preside, que tem, entre outras competências, a análise das operações de crédito e a tomada de decisões sobre alterações de políticas de risco.
Haynes preside ainda ao comité de remunerações, que aprova a contratação de colaboradores com remuneração anual superior a 200 mil euros. E integra o comité para as matérias financeiras, que faz o “acompanhamento e a supervisão da performance financeira”, das “políticas e processos de reporte de contas e no acompanhamento do auditor externo”, este encabeçado pelo seu número dois, Gerhard Eick, apresentado como independente, mas que está relacionado com a Lone Star (IKB).
Quem a assina a denúncia, sugere à directora executiva da ESMA, Verena Ross, que equacione avançar com um pedido de investigação criminal aos actos de gestão do Novo Banco, deixando questões para serem respondidas: “Qual é nome do último beneficiário das entidades detidas indirectamente pelos fundos de investimentos geridos pelo Cerberus?”; “Qual é o montante de crédito concedido pelo Novo Banco ao Cerberus Capital na transacção do Project Sertorius”; “Porque que é que o Novo Banco está a esconder informação pública relevante?”; “Será para esconder os montantes de compensação pedidos ao governo português no âmbito do Acordo de Capital Contingente?”; ou, ainda, para saber se a ausência de informações acontece “devido às decisões ruinosas do Conselho de Administração do Novo Banco?”
Logo nas primeiras linhas da queixa, é mencionado que o objectivo da comunicação é denunciar as “irregularidades no Novo Banco associadas à apresentação de informação e de práticas contabilísticas relativamente à venda do portfolio de imóveis, conhecido como Project Sertorius”. A autoridade europeia é instada a obrigar o Novo Banco a prestar informação completa aos stakeholders sobre esta operação, em particular sobre os valores de venda dos activos imobiliários, com o tal desconto de 67,9%, assim como a sua localização geográfica. Na mesma carta, com três páginas, é descrito que o mecanismo de capital contingente “permite enganar o Estado português com operações como” a do “Projecto Sertorius”.
Tudo o que se passa no Novo Banco só foi possível devido às condições do acordo de venda fechado em Outubro de 2017”, é referido à ESMA. E isto porque, explicam os autores da queixa, o negócio está protegido por uma almofada de capital (público) contingente de 3,89 mil milhões de euros, a que o Novo Banco pode aceder automaticamente sempre que necessitar de repor os rácios de capital nos patamares definidos ou acomodar as perdas relacionadas com créditos. E é precisamente o que o Lone Star tem vindo a fazer nos últimos dois anos e meio. Desde Outubro de 2017 que o Fundo de Resolução, que é risco público, já injectou no Novo Banco 2,9 mil milhões de euros (2, 1 mil milhões dos quais com empréstimos do Tesouro), do bolo de 3,89 mil milhões.
O procedimento é este: o Novo Banco solicita ao Fundo de Resolução acesso ao mecanismo de capital contingente, o Fundo de Resolução, gerido no quadro do BdP, após verificar se as condições do protocolo assinado são respeitadas, autoriza e informa o Conselho de Administração do BdP da sua avaliação. E é a equipa de Carlos Costa que comunica o pedido ao Ministério das Finanças que transfere os fundos, a título de empréstimo ao Fundo de Resolução, a 40 anos.
A negociação deste acordo que envolve a utilização de dinheiros públicos foi encabeçada por Sérgio Monteiro, o ex-secretário de Estado das Obras Públicas de Pedro Passos Coelho, que actuou por delegação do BdP, ainda chefiado por Carlos Costa. O primeiro contrato, de 12 meses, assinado (em 2015) com Monteiro custou ao Fundo de Resolução 304,8 mil euros brutos e o último de seis meses mais 152,4 mil.    
Quando o acordo foi assinado o Fundo de Resolução (que era o dono de 100% do Novo Banco) era presidido pelo vice-governador José Ramalho, mais tarde substituído por Luís Máximo dos Santos, agora no cargo. Já no Ministério das Finanças estava em Outubro de 2017 Mário Centeno, que em Junho último renunciou, para ser indicado por António Costa como próximo governador do BdP. E será agora nessa nova função (ainda por formalizar), que terá de decidir sobre futuros pedidos de injecções de fundos.

Tuesday, July 07, 2020

SUBSÍDIOS SUJOS


Ontem, foram afastados de funções os presidentes executivos da EDP e da EDP-Renováveis, considerados arguidos há cerca de três anos por eventuais crimes de corrupção, entre outros, com reflexos nos preços excessivos da energia em resultado de rendas excessivas concedidas  em contratos subscritos por um, ou vários, governantes corrompidos.

Mais recentemente, os investimentos em energias alternativas, com sobre custos para os contribuintes - sobre custos quando comparados com os que resultam da produção energética com utilização do petróleo, do gás e do carvão - vieram exacerbar a discussão com a hipótese de investimentos utilizando o hidrogénio na produção de energia. 

Por outro lado, inesperadamente, a pandemia intrometeu-se alinhando pelo favorecimento do consumo de hidrocarbonetos, com procura em queda livre. 

"Investigação: São mais de 137 mil milhões de euros por ano, em isenções fiscais ao petróleo, ao gás e ao carvão. Há licenças gratuitas de emissões de CO2 para a indústria pesada (cimento, siderurgia),
descontos no gasóleo agrícola e no combustível dos aviões. A força do lobby é clara. E ameaça todos os planos “verdes” da União Europeia"

"O petróleo, o gás natural, até o carvão, a aviação civil ou o sector automóvel estão dentro dos governos e nos corredores da omissão e do Conselho [europeus] - Viriato Soromenho-Marques" 


 

- c/p - Público (P2) de 5/7

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Correl . -  UMA BOMBA DE HIDROGÉNIO

A ARTE DOS NEGÓCIOS DA ARTE EM TEMPOS DE PANDEMIA

Francis Bacon Triptych Sells for $84.6 Million







A Francis Bacon triptych sold tonight (29/6) for $84.6 million with fees at Sotheby’s inaugural digitally streamed “live” auction of contemporary and Impressionist art that replaced its postponed May evening sales in New York. A global online audience watched the company’s star auctioneer, Oliver Barker, take bids from international colleagues on screens in an empty salesroom in London specially adapted for the coronavirus pandemic.
After a 10 minute duel, the Bacon was finally bought by a telephone bidder in New York against determined competition from an online opponent in China. The price is the third-highest ever achieved for the artist at auction.
The celebrated British artist’s “Triptych Inspired by the Oresteia of Aeschylus” (1981), was being sold by the Astrup Fearnley Museet, a private museum in Oslo founded by the Norwegian collector Hans Rasmus Astrup. Entered for the auction before the coronavirus lockdown, the Bacon had been guaranteed by Sotheby’s to sell for at least $60 million, making it the most valuable work so far offered at auction this year. The pandemic has made wealthy owners wary of selling trophy pieces.
“It’s a bit late, but it’s an important work from a good collection,” James Holland-Hibbert, a leading London-based dealer in 20th century British art, said of the triptych by Bacon, whose most prized works date from the 1950s, ’60s and ’70s. The presale estimate of $60 million was “not unreasonable,” given that the museum had previously tried to sell the work privately for more than $100 million, Mr. Holland-Hibbert said. “It was not entirely fresh to the market.”

Bacon’s characteristic depiction of three animal-like figures in claustrophobic interiors was the first large-scale triptych to have appeared on the auction market since 2014. A year earlier, the artist’s 1969 triptych, “Three Studies of Lucian Freud,” had sold for a record $142.4 million, at the time the highest price ever paid for an artwork at auction.
The evening sale may shatter a record for the most tired auctioneer ever: With the time differences in three cities, Oliver Barker hammered down his last work at 2:51 a.m. Tuesday in London (it was 9:51 a.m. Tuesday in Hong Kong). And there was still one more auction, of Impressionist and Modern Art, to go.

Christie’s Gets Creative for 20th-Century Art Auction in July

The sale, which includes works that were to be sold in New York in May, will be a hybrid: in-person (where allowed) and online in a format tailored for the coronavirus era.





Christie’s has a new auction format for a July 10 event that it hopes will revive at least some of the drama — and the prices — of the live evening sales that were held pre-pandemic.
Billed as “ONE: A Global Sale of the 20th Century,” the auction will include a livestream with auctioneers offering works of Impressionist, modern and contemporary art in consecutive sessions from Christie’s salesrooms in Hong Kong, Paris, London and New York.
This gives owners of high-value artworks an opportunity to sell in a globally marketed live sale preceded by public exhibitions where allowed. Since the advent of the pandemic, auction houses have had to rely on more routine online-only sales to generate revenue, which require bidders to buy items without physically examining their quality or condition. Buyers are rarely confident enough to bid above $1 million.
This relay-style auction is expected (perhaps optimistically) to last about two hours and consists of 50 to 70 lots. It will start in Hong Kong at 8 p.m. local time, then progress across time zones, becoming an afternoon sale in Europe and a morning sale in the United States, finishing by about 10 a.m. Eastern time. Buyers can bid online, by telephone, and, where “government advice allows,” in the salesroom, Christie’s said in a statement.