Wednesday, April 30, 2014

GUERRA NA EUROPA?

anotei no meu apontamento de ontem, aqui . Não linha lido ainda, nem sequer reparado que um título próximo era capa do semanário Der Spiegel na sua edição de anteontem. O artigo na versão em língua inglesa está aqui, e uma apreciação crítica  em português aqui.


A pergunta, alerta, do semanário alemão decorre da escalada de hostilidades no leste da Ucrânia. Hoje ouvi na rádio que Kiev já declarou a sua impotência para enfrentar a rebelião nas regiões pró-russas. O meu receio, é a cavalgada da extrema-direita na União Europeia. Por um lado ou por outro, a guerra é o fantasma que volta instalar-se na Europa. Sem desvalorizar o alerta do Der Spiegel considero menos ultrapassável pela via diplomática o risco que o nacionalismo, com os seus frutos perversos do racismo e da xenofobia, assalte a paz na Europa que o confronto na Ucrânia, onde há suficientes cruzamentos de interesses para forçarem ao reconhecimento de uma situação de facto idêntica aquela que reconduziu a Geórgia aos braços de Moscovo. 
---

Tuesday, April 29, 2014

A EUROPA DAS BANANAS

Manuel.m , que, presumo, reside no UK, pergunta aqui  "Como é que vai ser o day after das eleições europeias ?, considerando a sondagem publicada ontem por YouGov:

UKIP-31%
Labour-28%
Conservadores-19%"

Os resultados desta sondagem são hoje comentados pela generalidade da imprensa internacional. Destaco: "Populism is a dangerous game for the political class ", no Financial Times.
que, basicamente, dizem o mesmo: apesar dos escândalos que enxameiam o partido populista britânico, os eleitores parecem estar maioritariamente dispostos a votar nos que defendem o racismo, a xenofobia, o nacionalismo. Se assim for, e se a mesma tendência se observar noutros países do norte europeu, se até a França votar maioritariamente em Le Pen, a UE pode, a médio prazo, ter os dias contados.

E a guerra fica logo ali ao lado.  
---
Correl. - Alvo de racismo em Espanha, Daniel Alves come banana jogada por adepto da equipa adversária


E POR QUE NÃO?*


Discutem-se tanto os custos do estado social em Portugal, nomeadamente os custos de saúde, e ninguém repara que o contribuinte português suporta em um custo médio de EUR 50 por presidiário, o qual, normalmente, tem direito a cama, 3 refeições equilibradas por dia, instalações higiénicas com privacidade, televisão, rádio, acesso a telefone, visita conjugal semanal, roupa grátis, incluindo a sua lavagem e passagem a ferro, biblioteca e visualização de dvds, em troca de ter cometido um crime. Até nisto, o crime compensa … e nem a troica parece ter dado por ela.

Na Holanda, foi apresentado um projecto lei que propõe o pagamento de 16 euros por cada noite que um prisioneiro passa nas prisões do país .. O Governo holandês entende que os detidos devem contribuir para o custo do seu próprio encarceramento.
Em caso de aprovação, todos os condenados pela justiça holandesa terão de pagar por cada noite passada atrás das grades, sendo que o limite máximo está definido nos 11.680 euros, o que equivale a dois anos e meio de pena. No caso de prisioneiros ainda menores, serão os responsáveis pelo jovem a assumir o pagamento.
Numa proposta paralela, é também pedido o pagamento, por parte do condenado, dos custos judiciais dos processos, onde se incluem os encargos estabelecidos com as vítimas. O Ministério da Justiça do país prevê um sistema que permita a liquidação destas dívidas a prazo, em caso de necessidade.
Segundo uma estimativa do Ministério da Justiça holandês, estas medidas - inseridas no processo de reestruturação do sistema penitenciário do país - poderão render cerca de 65 milhões de euros ao Estado. Se forem aprovadas, as leis poderão entrar em vigor no dia 1 de Janeiro de 2015.
---

Monday, April 28, 2014

NEM A META DO DÉFICE

O Público de hoje publica um artigo - Austeridade de 30 mil milhões não chegou para cumprir a meta do défice - que considero suficientemente isento (não há escritos na área das ciências sociais ideologicamente puros), e que merece bem uma leitura atenta. Trata-se de um balanço sintético dos resultados quantificáveis atingidos após a intervenção de três anos de troica.


Agora, que a troica vai sair, mas ficando à espreita, e em vésperas de começar a caça aos votos para as europeias, o mínimo que é democraticamente exigivel aos partidos - democraticamente, no sentido contrário ao registo demagógico com que se enfeitam geralmente os discursos dos candidatos durante as campanhas eleitorais - é a proposta de medidas que os quadrantes ideológicos em que se inserem pretendem fazer vingar em Estrasburgo. E como.

O como é importantísimo uma vez que os poderes do PE (e os da Comissão Europeia) continuam a estar subordinados ao diktat de Berlim com o aplauso generalizado do norte europeu. No fim de contas a questão primordial a que os candidatos deveriam responder é esta: O que é que vocês podem fazer em Estrasburgo, para além, obviamente, de serem bem remunerados e garantirem o direito a reformas antecipadas? Que poderes têm vocês para definir uma estratégia que possa garantir o futuro de uma União coesa porque razoavelmente solidária?

Do PCP e do BE sabemos o que podemos esperar: a saída do euro e, naturalmente, posteriormente, a saída da União Europeia. A grande maioria dos cidadãos portugueses com direito a voto, entre os quais me incluo,  não concorda com tal estratégia, mas sabemos o que pretendem, e não votamos neles. 

Do PSD, do PS e do CDS, o que sabemos nós do que se propõem, se puderem, fazer por denunciar uma estratégia que fomos compelidos a cumprir e redundou em grande medida num fiasco e fazer vingar uma estratégia diferente? Que possibilidades têm eles de obter dos quadrantes políticos em que se integram o compromisso de uma estratégia nuclear que seja conhecida antes das eleições e possa ser honrada depois?

Dizem-nos as mensagens da Comissão Nacional de Eleições que começam a ser difundidas, apelando ao voto em 26 de Maio, que "o nosso futuro passa pela Europa". Um slogan curto, como ensinam as regras de marketing que não respondem a uma pergunta óbvia: Passa, como? 

Sunday, April 27, 2014

PROPOSTA INCONVENIENTE

Rui Rio, defendia há dias num programa da Sic Notícias, além do mais: a regionalização, o redimensionamento dos círculos eleitorais, por redução da sua extensão individual e consequente aumento do seu número e a atribuição de assentos na Assembleia da República (que ficariam vazios) aos votos brancos e nulos.

Subsistindo-me dúvidas quanto à regionalização, sobretudo pelos seus eventuais efeitos perversos, considero que fortaleceria a nossa democracia anémica a redefinição dos círculos eleitorais de modo a que a cada qual correspondesse o mesmo, e logo menor, número de deputados de cada círculo. A terceira ideia é tão aliciante para os eleitores quanto repugnante para os partidos e, por isso, porque são os líderes partidários os donos e senhores da democracia que temos, não funcionará.

E é pena. 
É pena, porque a impossibilidade de o eleitor poder manifestar o seu não apoio aos candidatos que lhe são apresentados sem a faculdade de rejeição de alguns, desacredita a democracia porque desmotiva muitos eleitores aumentando imparavelmente a dimensão da abstenção. Se o não apoio aos candidatos apresentados, manifestado pelo número de votos em branco, tivesse correspondente representatividade na AR, por redução do número de deputados equivalente ao número de cadeiras vazias conquistado pelos "brancos", seria maior o empenho dos deputados e mais limpa a transparência democrática.

E, nesse caso, votaria nas próximas eleições.

Saturday, April 26, 2014

HÁ 450 ANOS

Shakespeare nasceu há 450 anos, provavelmente entre 19 e 25 de Abril mas registado como nascido a 26. O El País dedica hoje à efeméride aqui uma série de textos que vale bem a pena ler.

Curiosamente, do calendário das representações comemorativas salienta-se aqui como prato forte a encenação de King Lear dirigida por Sam Mendes distinguido pela Academia de Hollywood em 2000, neto de Alfed Hubert Mendes, figura pioneira da literatura das Caraíbas. Era descendente de portugueses presbiterianos expulsos da Madeira no seguimento das perseguições a Robert Kalley.

Já agora, quem foi Rober Kalley? Responde a Wiki: Como médico de bordo, conheceu muitos portos, inclusive Funchal, na Ilha da Madeira, onde, anos depois fundaria, juntamente com sua mulher, Margaret, a primeira comunidade protestante lusitana.

Mesmo após a abolição da Inquisição em Portugal, em 1821, a prática do protestantismo continuou sendo proibida para todos os cidadãos portugueses. Apenas aos estrangeiros era permitido praticar outras religiões que não a católica, desde que não em língua portuguesa e tampouco em edifícios que pudessem ser identificados externamente como igrejas. Só após a implantação da República é que se pode falar de liberdade religiosa em Portugal, o que possibilitou a existência oficial de comunidades protestantes.
Sendo portugueses, os Mendes eram obrigados a ser católicos. Sendo protestantes tiveram de abalar para outras paragens mais acolhedoras. Aliás, é muito provável - presumo -, que os Mendes fossem de ascendência judaica, fugidos das sucessivas vagas de perseguição para a Madeira. 
São vários e antigos os caminhos da diáspora portuguesa. Raramente, por bons motivos.

CACILHEIRO SHOW


"Alguém tem dúvidas que vai dar nas vistas? E se a artista diz que é arte, e, demais a mais, total, quem poderá duvidar?", perguntei aqui há um ano atrás. 


É bonito, mas é arte?,
pergunta-se aqui, hoje, no Público.
 

Friday, April 25, 2014

MISTÉRIO PÚBLICO

Ou, um jogo de cabra cega,
ou, neste caso, a recorrente reemergência dos submarinos,
ou, o costume.

Portas ouvido como testemunha no processo dos submarinos
Swaps de Portas dão 231 milhões de euros a bancos no financiamento da compra dos submarinos.
Ministério Publico demora oito anos para ouvir Paulo Portas no inquérito dos submarinos


Vice-primeiro-ministro pediu à PGR para anunciar que tinha testemunhado no processo aberto pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal em 2006.

Thursday, April 24, 2014

VOTAR, PARA QUÊ?

Ouço esta manhã na rádio uma parte do discurso - vd. aqui -  proferido ontem por Jorge Sampaio na  Gulbenkian:  "Este presente não pode ser o nosso futuro. Quarenta anos depois do 25 de Abril de 1974, a melhor maneira de o celebrarmos é usarmos as eleições europeias para fazer renascer a esperança e acreditar no futuro de Portugal e da Europa".

Sampaio mantem o registo que sempre caracterizou os seus discursos políticos: elegantes e redondos."Este presente não pode ser o nosso futuro" é uma senhora afirmação, esbelta, tautológica em todos os sentidos, que dá entrada a um apelo recorrente em vésperas de todas as eleições: votem!, porque é com o voto que renasce a esperança de um futuro diferente! Ou, trocado por miúdos, "votem no PS porque o neoliberalismo deste governo levou-nos a este presente desgraçado!".

Há, ou poderá haver, no Parlamento Europeu, uma bancada socialista, qualquer que seja a ideia política nuclear que lhe dê uma coesão mínima, que possa apontar, e em que sentido, para uma União Europeia significativamente distinta daquela que conhecemos hoje? Certamente que não. Os destinos da União Europeia têm sido guiados fundamentalmente pelos interesses individuais de cada um dos seus membros, e a tão proclamada unidade na diversidade é uma panaceia, porque só uma união política apropriada poderia dar consistência à União, e esse passo não está nos programas de nenhum dos principais vectores políticos representados em Estrasburgo. Mas há, por outro lado, propostas de desagregação defendidas pelos partidos radicais, em crescendo de representatividade no PE. 

Em França, por exemplo, e a França é um exemplo crítico, diz-se socialista o partido que suporta o governo de Monsieur Hollande. Muito provavelmente, o PS francês registará mais uma derrota record e Marine Le Pen poderá ver o seu nacionalismo, o seu racismo, a sua xenofobia, embaladas em propostas de retirada do euro, e da UE, representados de forma muito convincente daquilo que pretendem. Quem é que, sentado nas bancadas socialistas (ou liberais, ou o quer que seja), sobrepõe no hemiciclo europeu os interesses ideológicos do seu sector político aos interesses particulares dos países que representam? Que propostas defenderão os socialistas franceses, que não se acomodem às políticas do seu governo, recentemente remodelado?

Votar nestas eleições europeias sem rumos definidos, exceptuando os daqueles que se propõem fazer voltar ao passado, significa dar crédito a um presente que não augura nenhum futuro diferente para a Europa. A abstenção tem pelo menos o mérito de afirmar quantos, por indiferença (que também existe nos votantes) ou decisão pensada, dizem não a um presente e a um futuro que não será diferente.

Wednesday, April 23, 2014

A CAMBADA

É médica. Recorreu aos serviços do SNS do hospital onde trabalha, foram utilizados alguns meios auxiliares de diagnóstico, no fim foi-lhe entregue uma mensagem - a mesma mensagem que agora entregam a todos os utentes dos serviços do hospital - com a indicação do custo dos serviços prestados, do preço que a médica tem de pagar e da parte que será paga pelos contribuintes.

Ouço-a, e recordo-me dos desaforos na justiça de que há notícias constantes, mas de que ninguém calcula os custos, nem factura os preços nem informa os contribuintes da enormidade das lesões provocadas no Orçamento de Estado. A todos os níveis, desde os escândalos de alto gabarito que envolvem banqueiros e outros safados de calibre identico até aos custos da pastosidade com que agentes da justiça deixam prescrever milhares de processos de menor dimensão individual.

Ontem, - vd.. aqui - soube-se que só uma juíza tem oito mil processos em atraso, processos de multas de trânsito e de delitos comuns, à mistura com oito processos interpostos pelo Banco de Portugal e pela Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM). Em apenas cinco casos contraordenacionais prescritos, o Estado saiu lesado em 72 milhões de euros, que poderão ascender a 86 milhões se se somarem aqueles que se encontram ainda em risco de prescrição. Aberto inquérito disciplinar à juiza, que se mantem em funções, foi-lhe aplicada uma pena mínima. 

Maria José Morgado denunciava no Expresso do último fim-de-semana - vd. aqui - a preversidade, se não propositada pelo menos consentida pelo governo,  da atribuição de casos de criminalidade complexa praticada por banqueiros e conhecidos a tribunais de pequena instância que julgam os casos de criminalidade de rua. Da confusão no mesmo molho tiram, obviamente, partido os senhores banqueiros e outros ilustríssimos safados.
.
Fala-se muito no custo da função pública. Muito raramente da sua eficiência. O preço pago pelos contribuintes não se resume aos valores estimados no OE porque a estes escapam totalmente os custos de ineficiência, que são enormes, e, sobretudo enormíssimos, porque põem em causa a sustentabilidade da democracia, na área da jutiça. 
---
Solicitei ao IMTT - Instituto da Mobilidade e dos Transportes a renovação da carta de condução com três meses de antecedência sobre a data do termo de validade. Cinco meses depois, ainda não chegou. Ontem, renovaram-me a guia por mais seis meses porque, disse a funcionária, a emissão de cartas está com 8 meses a um ano de atraso. Se quiser atravessar a ponte em Vila Real de Santo António para ir a Ayamonte tenho de comprar uma carta internacional no ACP. Custa 40 euros, passada na hora, 30 passados dois dias. Por que não entrega o governo a emissão de cartas de condução a uma entidade privada, o ACP, por exemplo?

Tuesday, April 22, 2014

O JOGO DA CABRA CEGA

Já vem de longe.

Hoje foram divulgados os resultados de uma sondagem à opinião pública conduzida pla Universidade Católica para o DN, JN, RTP, Antena 1, que, além do mais confirmam, a imagem mais negativa dos tribunais junto da opinião pública, mal acompanhados pelos bancos e pelos políticos. 


Um amigo enviou-me hoje por e-mail um artigo de M Sousa Tavares publicado no Expresso em 29/12/2007, onde a tríade se reune. Deve andar a cirandar pela net desde então.  Mas vale sempre a pena recordá-lo. Os protagonistas de um jogo jogo iniciado há mais de uma década atrás estão em vias de ser todos ilibados nos dias de hoje. 

Da Opus Dei à maçonaria: a incrível história do BCP
Em países onde o capitalismo, as leis da concorrência e a seriedade do negócio bancário são levados a sério, a inacreditável história do BCP já teria levado a prisões e a um escândalo público de todo o tamanho. Em Portugal, como tudo vai acabar sem responsáveis e sem responsabilidades, convém recordar os principais momentos deste "case study", para que ao menos a falta de vergonha não passe impune.
 
1 Até ao 25 de Abril, o negócio bancário em Portugal obedecia a regras simples: cada grande família, intimamente ligada ao regime, tinha o seu banco. Os bancos tinham um só dono ou uma só família como dono e sustentavam os demais negócios do respectivo grupo. Com o 25 de Abril e a nacionalização sumária de toda a banca, entrámos num período 'revolucionário' em que "a banca ao serviço do povo" se traduzia, aos olhos do povo, por uns camaradas mal vestidos e mal encarados que nos atendiam aos balcões como se nos estivessem a fazer um grande favor. Jardim Gonçalves veio revolucionar isso, com a criação do BCP e, mais tarde, da Nova Rede, onde as pessoas passaram a ser tratadas como clientes e recebidas por profissionais do ofício. Mas, mais: ele conseguiu criar um banco através de um MBO informal que, na prática, assentava na ideia de valorizar a competência sobre o capital. O BCP reuniu uma série de accionistas fundadores, mas quem de facto mandava eram os administradores - que não tinham capital, mas tinham "know-how". Todos os fundadores aceitaram o contrato proposto pelo "engenheiro" - à excepção de Américo Amorim, que tratou de sair, com grandes lucros, assim que achou que os gestores não respeitavam o estatuto a que se achava com direito (e dinheiro).
 
2 Com essa imagem, aliás merecida, de profissionalismo e competência, o BCP foi crescendo, crescendo, até se tornar o maior banco privado português, apenas atrás do único banco público, a Caixa Geral de Depósitos. E, de cada vez que crescia, era necessário um aumento de capital. E, em cada aumento de capital, era necessário evitar que algum accionista individual ganhasse tanta dimensão que pudesse passar a interferir na gestão do banco. Para tal, o BCP começou a fazer coisas pouco recomendáveis: aos pequenos depositantes, que lhe tinham confiado as suas poupanças para gestão, o BCP tratava de lhes comprar, sem os consultar, acções do próprio banco nos aumentos de capital, deixando-os depois desamparados perante as perdas em bolsa; aos grandes depositantes e amigos dos gestores, abria-lhes créditos de milhões em "off-shores" para comprarem acções do banco, cobrindo-lhes, em caso de necessidade, os prejuízos do investimento. Desta forma exemplar, o banco financiou o seu crescimento com o pêlo do próprio cão - aliás, com o dinheiro dos depositantes - e subtraiu ao Estado uma fortuna em lucros não declarados para impostos. Ano após ano, também o próprio BCP declarava lucros astronómicos, pelos quais pagava menos de impostos do que os porteiros do banco pagavam de IRS em percentagem. E, enquanto isso, aqueles que lhe tinham confiado as suas pequenas ou médias poupanças viam-nas sistematicamente estagnadas ou até diminuídas e, de seis em seis meses, recebiam uma carta-circular do engenheiro a explicar que os mercados estavam muito mal.
 
3 Depois, e seguindo a velha profecia marxista, o BCP quis crescer ainda mais e engolir o BPI. Não conseguiu, mas, no processo, o engenheiro trucidou o sucessor que ele próprio havia escolhido, mostrando que a tímida "renovação" anunciada não passava de uma farsa. E descobriu-se ainda uma outra coisa extraordinária e que se diria impossível: que o BCP e o BPI tinham participações cruzadas, ao ponto de hoje o BPI deter 8% do capital do BCP e, como maior accionista individual, ter-se tornado determinante no processo de escolha da nova administração... do concorrente! Como se fosse a coisa mais natural do mundo, o presidente do BPI dá uma conferência de imprensa a explicar quem deve integrar a nova administração do banco que o quis opar e com o qual é suposto concorrer no mercado, todos os dias... 
 
4 Instalada entretanto a guerra interna, entra em cena o notável comendador Berardo - o homem que mais riqueza acumula e menos produz no país - protegido de Sócrates, que lhe deu um museu do Estado para ele armazenar a sua colecção de arte privada. Mas, verdade se diga, as brasas espalhadas por Berardo tiveram o mérito de revelar segredos ocultos e inconfessáveis daquela casa. E assim ficámos a saber que o filho do engenheiro fora financiado em milhões para um negócio de vão de escada, e perdoado em milhões quando o negócio inevitavelmente foi por água abaixo. E que havia também amigos do engenheiro e da administração, gente que se prestara ao esquema das "off-shores", que igualmente viam os seus créditos malparados serem perdoados e esquecidos por acto de favor pessoal.
 
5 E foi quando, lá do fundo do sono dos justos onde dormia tranquilo, acorda inesperadamente o governador do Banco de Portugal e resolve dizer que já bastava: aquela gente não podia continuar a dirigir o banco, sob pena de acontecer alguma coisa de mais grave - como, por exemplo, a própria falência, a prazo.

6 Reúnem-se, então, as seguintes personalidades de eleição: o comendador Berardo, o presidente de uma empresa pública com participação no BCP e ele próprio ex-ministro de um governo PSD e da confiança pessoal de Sócrates, mais, ao que consta, alguém em representação do doutor "honoris causa" Stanley Ho - a quem tantos socialistas tanto devem e vice-versa. E, entre todos, congeminam um "take over" sobre a administração do BCP, com o "agréement" do dr. Fernando Ulrich, do BPI. E olhando para o panorama perturbante a que se tinha chegado, a juntar ao súbito despertar do dr. Vítor Constâncio, acharam todos avisado entregar o BCP ao PS. Para que não restassem dúvidas das suas boas intenções, até concordaram em que a vice-presidência fosse entregue ao sr. Armando Vara (que também usa 'dr.') - esse expoente político e bancário que o país inteiro conhece e respeita.
 
7 E eis como um banco, que era tão independente que fazia tremer os governos, desagua nos braços cândidos de um partido político - e logo o do Governo. E eis como um banco, que era tão cristão, tão "opus dei", tão boas famílias, acaba na esfera dessa curiosa seita do avental, a que chamam maçonaria. E, revelada a trama em todo o seu esplendor, que faz o líder da oposição? Pede em troca, para o seu partido, a Caixa Geral de Depósitos, o banco público.
 
8. Pede e vai receber, porque há 'matérias de regime' que mesmo um governo com maioria absoluta no parlamento não se atreve a pôr em causa. Um governo inteligente, em Portugal, sabe que nunca pode abocanhar o bolo todo. Sob pena de os escândalos começarem a rolar na praça pública, não pode haver durante muito tempo um pequeno exército de desempregados da Grande Família do Bloco Central.
 
Se alguém me tivesse contado esta história, eu não teria acreditado. Mas vemos, ouvimos e lemos. E foi tal e qual.

SAMPAIO 2 - RONALDO 2

clicar para aumentar
c/p de aqui

Monday, April 21, 2014

QUEM SUBSCREVE O QUE DIZ CORREIA DE CAMPOS?

Senhor Deputado do PS ao Parlamento Europeu, António Correia de Campos,


Subscrevo o que afirma na segunda parte do seu artigo -  Insustentáveis -  publicado hoje no Público, a propósito das medidas iníquas adoptadas pelo actual Governo em matéria de pensões e das indefinições pendentes sobre o mesmo assunto.  Reclama o senhor Deputado, e muitíssimo bem!, "o direito de saber quanto ele (o ónus social) vai durar, (porque) as respostas (que obtem) são ambíguas, incompletas ou perversas."

Senhor Deputado: Deste Governo não podem os pensionistas da Segurança Social esperar senão mais do mesmo. Alterações, se houver, só mesmo na forma. Acerca disto, não me parece que as dúvidas, se dúvidas há, sejam por este Governo esclarecidas e esbatidas as iniquidades que refere.

Mas os pensionistas e reformados, que não esperam nenhuma mudança de rumo deste Governo, esperam que o partido que o senhor Deputado representa diga aos portugueses que políticas vai adoptar, nomeadamente nesta matéria, e que medidas tomará para reparar as tropelias já cometidas, e que o senhor Deputado justamente refere.

Um distinto amigo meu, que por convicção muito arreigada tem apoiado este Governo desde a sua concepção, sempre que lhe aponto as prepotências cometidas, acumuladas com um imposto sobre uma classe, contra os reformados, responde-me que "se há alternativas elas não tardarão a aparecer, é só uma questão de esperar por um novo governo liderado pela actual Oposição". E esta sim, é uma questão que já deveria ter sido clarificada pelo PS: vai o PS alterar a política do actual Governo em matéria de segurança social, e em que sentido? Saberá o PS responder, na altura oportuna, às questões do senhor Deputado e corrigir as diatribes cometidas pelo actual Governo ou, dando razão ao meu amigo, manter os resultados do dirty job realizado já consumados?

Cumprimentos,


---
"O dr. Passos Coelho deu uma entrevista para declarar falida a Segurança Social, ou, de outra forma, insustentável o nosso sistema de pensões. Um grande contributo para a fuga futura às contribuições. O que ele não disse nem por tal o questionaram, foi que o atoleiro económico em que nos meteu conduz o país a uma inexorável incapacidade de sobrevida financeira para os seus cidadãos seniores. Claro que só na sua mente liberal de pacotilha pode a Segurança Social estar falida. Certamente prefere que sobre os escombros se crie um regime de pensões de tipo chileno, sem ofensa para essa bela e próspera nação.  Acabo de saber que a minha pensão “milionária” de funcionário público durante 42 anos, que ainda não comecei a receber, me será amputada em 59,3% do valor bruto. Sem o saber, e sem o esperar, transformei- me num generoso contribuinte. Aceito naturalmente o ónus social extraordinário, só que tenho o direito de saber quanto ele vai durar, e as respostas que obtenho são ambíguas, incompletas ou perversas. Gostaria de saber se os pensionistas do Banco de Portugal, os magistrados e juízes jubilados e os diplomatas na reforma também são contribuintes extraordinários de solidariedade. E, já agora, pedia que me explicassem a razão pela qual a solidariedade, entre nós, apenas é exigida aos pensionistas. Claro que tenho que declarar conflito de interesses nesta matéria, mas bem gostaria de que a razão para tal conflito não existisse. "

António Correia de Campos, Deputado do PS ao Parlamento  Europeu - in Público de hoje









ÓPIO DO POVO


O delírio à volta de catorze mercenários: quatro argentinos, dois brasileiros, dois sérvios, um esloveno, um paraguaio, um uruguaio, um espanhol e ... vá lá, vá lá, dois portugueses. Que amanhã, é uma questão de dinheiro, poderão estar noutro "plantel" qualquer. (plantel: s.m. Bras. Lote de animais de boa raça, especialmente bovinos e equinos, reservados para a reprodução. Grupo de animais selecionados.- vd. aqui. Plantel principal do Benfica - aqui

Sunday, April 20, 2014

POR QUE RAZÃO NÃO VOU VOTAR


Do artigo de opinião, - Os casos também julgam os tribunais - publicado esta semana na sua coluna habitual - Justiça de Perdição - no Expresso - da Procuradora-Geal Adjunta Maria José Morgado, destaco,

"O Banco de Portugal ou a Comissão de Mercado de Valores têm o poder de condenar os responsáveis dos bancos ou de insituições financeiras que prejudiquem o mercado e os clientes ... Depois de aplicação das multas ou de decisões de poibição do exercício de funções o que acontece? Nada, e sempre a coberto da lei, salvo raras excepções. Até 2012, os condenados recorriam das sanções para um tribunal de pequena instância .. (onde) o banqueiro respondia naquele tribunal em companhia dos os restantes clientes do dia tais como carteiristas dos transportes públicos e outros modestos autores de criminalidade de rua...  Este regime de impugnação mantem-se ... depois da criação (em 2012) do tribunal especializado em Santarém. No decurso da impugnação judicial, o tribunal repete tudo, duplica tudo, avalia tudo, desta vez não à luz do regime das instituições de crédito mas do código do processo penal, que tem regras distintas. O que é válido para o supervisor pode ser nulo para  tribunal. O que está feito pode ser desfeito ao fim de anos de audiências pagas pelo contribuinte. Ninguém é condenado por litigância de má fé. É uma espécie de betoneira processual. Há um remédio bom de mais: manter as condenações em coimas e as proibições de exercício apesar da interposição de recurso e impugnação judicial, com obrigação de depósito de todo os valores ou apreensão de bens. Ou seguir a solução europeia: criação de uma comissão especial para rápida reapreciação das impugnações limitadas drasticamente."

Já alguém ouviu o senhor Passos Coelho, ou a senhora Paula Teixeira da Cruz, ou o senhor Paulo Rangel, ou o senhor António José Seguro, ou o senhor Alberto Martins, ou o senhor Francisco de Assis, proporem e aprovarem medidas que desatem as mãos atadas da justiça? Neste como em tantos outros casos fétidos que não abrandam de ser atirados à cara da impotência da opinião pública.

Não há progresso sem justiça. Depois de quarenta anos de lágrimas choradas pelos crocodilos que habitam no pântano, recuso-me a contribuir com a pequeníssima parte que me cabe da faculdade de os alimentar ou fazer-lhes um manguito. 


 ---

Saturday, April 19, 2014

O JOGO DA CABRA CEGA

... e de mãos atadas.

"Nos tribunais da Madeira estão suspensos 61 processos criminais devido à não autorização do levantamento da imunidade de deputados ou por recusa do presidente e membros do governo a deporem, como testemunhas ou arguidos, em audiências de julgamento"."Jardim lidera as recusas do governo e o deputado Jaime Ramos (PSD), com Coelho (PTP), reparte o topo do não levantamento das imunidades parlamentares". (19/04/2013) aqui

PSD pára justiça ao não levantar imunidade.
É o próprio MP da Madeira que o diz. Há dezenas de processos parados porque o PSD não levanta a imunidade parlamentar de deputados e governantes regionais. (21/05/2011) cit. aqui


CLIMAS


A cinematografia norte-americana é, de longe, a mais invasiva das salas de cinema europeus. Desde o melhor ao péssimo, a preponderância da exposição da história dos EUA ou do american way of life é esmagadora junto das tribos de um continente que conta com uma multitude cultural e histórica incomparávelmente superior mas que, por razões que escapam a um observador menos enfronhado nas contas com que se alavancam as indústrias, continua, também no campo cinematográfico, na penumbra. 

Ainda assim, são notáveis algumas obras de realizadores de países economicamente mais desfavorecidos. Há dias fiz aqui referência a um filme romeno que, suponho, encontrar-se ainda em exibição numa única sala em Lisboa. Anteontem, a RTP1 transmitiu Climas, um filme turco, de 2006, que se recomenda ver, ou rever, se possui sistema que permita visualizar emissões anteriores. 

Friday, April 18, 2014

FLAGELAÇÃO DOS INOCENTES

(cont. de aqui)

Em síntese, o imeil diz aquilo que é conversa trivial e merece registo apenas por isso, por estar tão pegado à pele que já faz parte do corpo, e porque que lembra os rituais de sexta-feira santa em sociedades com mais remela nos olhos: "Que o português (retratado à la minute como oportunista, admirador de patifes, inculto, incumpridor, incivilizado) reclama sempre contra os governantes que tem, que teve, e, certamente, criticará os que terá, esquecendo-se que quem votou nos políticos foi ele, o povo que temos".  Uma afirmação falaciosa que se tornou convicção generalizada.

Falaciosa, porque, não sendo o retrato feito uma completa desfiguração da realidade - quem é que pode negar que por troca de duas transgressões à ética ou à lei a generalidade dos portugueses fecha os olhos a outra feita à sua frente? E quem pode contestar que a falta de pontualidade e o incumprimento de compromissos é mais regra que excepção? - são pecadilhos as transgressões cometidas na base quando comparadas com as fraudes, as burlas e os roubos, o compadrio, a desfaçatez, a falta de vergonha em larguíssima escala tão corrente entre muitos dos que ocupam os estratos cimeiros da pirâmide social*. 

Falaciosa ainda,  porque levando à conta de pecado maior o exercício do único direito que nos iguala a todos - o direito de votar, ou não votar - desvia a atenção dos que frequentemente subvertem os compromissos feitos, enquanto candidatos, uma vez eleitos.

Como nas procissões medievais de sexta-feira santa, autoflagelam-se os penitentes anónimos de meia tijela para desconto dos pecados gordos das hierarquias.

---
 * O mal é geral. Aqui, mais um exemplo, conhecido hoje.


Thursday, April 17, 2014

A CULPA DO POVO

Há quase um ano coloquei aqui um apontamento, com o mesmo título, a propósito de uma afirmação feita na altura pelo professor Pranto*:"se foram feitos (disparatados) investimentos públicos foi porque o povo assim o quis". 

Há dias, outra vez por mero acaso de zapping, topei com uma conversa entre um crónico televidente e a professora M Filomena Mónica, naquele caso a propósito da publicação de um livro da prof. Mónica, sobre o descalabro da disciplina nas escolas portuguesas, e não só, porque - afirmou ela - a praga foi criada por metodólogos inspirados nas doutrinas roussianas, que defendem a prevalência da liberdade criativa sobre a disciplina e o método nas escolas, e espalhou-se por toda a Europa e Estados Unidos.

Não é difícil concordar com a professora Mónica neste ponto, tantas são as notícias de insubordinação, vandalismo, agressões a professores, que frequentemente chegam a público. E que o desaforo não se localizou em Portugal testemunha-o, por exemplo, "Entre les murs", um filme rodado em França, que passou em Portugal como "A Turma". Até aqui, nada de novo. E de quem é a culpa, perguntou o crónico? A culpa é do ministro? Não é, responde Mónica, os culpados são um grupo de iluminados instalados no ministério, discípulos de Rousseau, e que nenhum dos trinta ministros nos últimos 40 anos conseguiu desalojar, incluindo o actual, amigo do crónico, que, quando comentava televidente com este, afirmava que o ministério deveria levar uma limpeza de alto a baixo. Não foi, e não foi porque, continuou Mónica a explicar, não há exigência de qualidade do ensino em Portugal, porque os portugueses habituaram-se a desenrascar-se com cunhas e, do ensino, a esperar apenas um papel, um diploma, um canudo. E, portanto, segundo Mónica, o culpado de tudo isto é o grau nulo de exigência  do povo. 

Ouvi, e esqueci. A generalização de responsabilidades é o álibi falacioso dos verdadeiros responsáveis. Quem são os culpados da crise? Os culpados, dizia João Salgueiro há dois anos, somos nós todos. E vá lá, vá lá, segundo esta outra sumidade, a culpa não é só do povo!

Mas o que me fez voltar ao tema não foi o facto recente de Mónica acusar o povo. Acusações do estilo são frequentes da parte daqueles que não são povo, são eles, uma espécie de gambozinos que não existe como povo. O que me suscitou o comentário de hoje foi um imeil, um de muitos milhões com que se entretem o povo a distribuir pelo povo (suponho que é povo, se não os confundo com os gambozinos).

(continua).

---
* O prof. Pranto foi secretário de Estado do Tesouro e das Finanças do XIV Governo Constitucional (António Guterres) (1999-2000), foi depois membro do Conselho Nacional do PSD, entre 2008 e 2011, tem acumulado cargos em várias empresas públicas e privadas. Enquanto membro do segundo governo de António Guterres esteve, certamente, muito próximo da gestação do esbanjamento de dinheiros públicos em obras que excederam largamente as exigências da organização do Euro-2004.

Wednesday, April 16, 2014

NA PRIMEIRA NOITE ELES APROXIMAM-SE E NÓS NÃO DIZEMOS NADA


"Primeiro, Vladimir Putin atacou a Geórgia, mas o mundo perdoou-o, porque a Rússia é demasiado importante para ser excluída. Depois devorou a Crimeia, mas o mundo aceitou porque a Crimeia nunca deveria ter deixado de ser russa. Agora infiltrou-se no leste Ucrânia, mas o mundo hesita porque infiltração não é propriamente uma invasão. Mas se o Ocidente não enfrentar Putin dentro em breve tê-lo-á às suas portas"


É este o começo de um artigo publicado aqui no Economist desta semana, e o poema de Maiakovski, tantas vezes glosado pelo verso e pela realidade, é desta vez recordado a propósito das intenções de Putin de reagrupamento da União Soviética com outro nome.

Prisioneira da sua pusilanimidade estrutural, dos seus interesses privativos, do seu egoísmo radicado numa fragmentação cultural que não encontra pontos de apoio convergentes, duma dependência energética sem solução a curto prazo, duma fragilidade defensiva perante um adversário economicamente realtivamente débil mas militarmente forte e determinado, a União Europeia assiste à progressão insaciável do actual czar da Rússias de braços atados cruzados. 

Enquanto teclo este apontamento ouço o secretário-geral da Nato anunciar a mobilização de arsenal terrestre, aéreo e naval para locais ao alcance de tiro, que é a pior das soluções. Ao municiar movimentos descaradamente nacionalistas em Kiev, o Ocidente abriu o jarro de Pandora repleto de ressentimentos antigos naquela zona da Europa.

E, neste caso, nem um inimigo externo suscita mais coesão interna.



Tuesday, April 15, 2014

OPINIÃO PÚBLICA HÁ 40 ANOS

A divulgação de alguns resultados de estudo de opinião pública realizado sete meses depois de 25 de Abril de 1974 só terá algum interesse como retrato sociológico meio sumido pelo tempo de uma sociedade há pouco tempo abanada por uma revolta militar que viria a espoletar mudanças políticas, sociais, económicas,  profundas  nos 12 meses seguintes. 

Na impossibilidade de dar a conhecer aqui o conjunto, podendo no entanto ceder para consulta e para fins pertinentes o relatório resumo (489 páginas dactilografadas) transcrevo algumas das conclusões:

" O primeiro ponto importante a referir ... é a existência de uma elevada percentagem de pessoas que não emitiram opinião sobre a quase generalidade dos assuntos focados" "É no campo político que a ausência de respostas mais se faz sentir..."

 " A maior liberdade surge como a mudança mais importante verificada em Portugal, seguindo-se, mas a um nível bastante inferior, a mudança de governo, o fim da guerra do Ultramar ..."

"Metade da população desconhece quem fez o 25 de Abril; por outro lado, o Movimento das Forças Armadas aparece como o seu principal originador na opinião da outra metade, seguindo-se Spínola e Otelo Saraiva de Carvalho, mas colocados em planos nitidamente inferiores"

" As opiniões (sobre uma série de factos considerados resultantes da mudança) são geralmente consideradas positivamente salvo no que respeita à possibilidade do divórcio, que obtem apenas uma pequena maioria de opiniões favoráveis, e ainda no que se refere às greves e à possibilidade de Portugal se tornar um país comunista, onde as opiniões negativas superam as positivas"

"A maioria da população maior de 18 anos admite que o país está numa crise económica, acentuando-se esta convicção nos grupos mais evoluídos"

"As opiniões susceptíveis de localizar a origem desta crise, antes ou depois do 25 de Abril, são contraditórias. Com efeito apenas um por cento mencionam a crise económica como (origem  de) mudança mais importante e inversamente uma maioria pensa que o regime anterior deixou o país de rastos" "Por outro lado, o aumento de salários, que poucos referiram como mudança mais importante, e que a maioria encara favoravelmente como um dos resultados da revolução, é também considerado pela maioria como a causa de muito desemprego e do encerramento de muitas empresas; para cerca de metade da população, o povo ficou pior porque os preços aumentaram mais que os salários, e para cerca de um quarto os países estrangeiros não estão a dar-nos auxílio" 

"Para cerca de metade da população Portugal deveria manter-se no Ultramar se fosse posível acaba com a guerra ... e que para cerca de um terço "saímos de lá nós para utros lhe deitarem o dente ... havendo outro terço para quem a independência só devia ser dada depois do povo ter sido ouvido" 

"A opinião da maior parte da população sobre o modo de governar (do Governo de então) é positiva, apenas uma miniria considera que governa mal. Comparativamente com o governo de Marcelo Caetano também o actual governo é apreciado favoravelmente pela maior parte já que as pessoas que consideram que governa da mesma forma ou governa pior são uma minoria. Aresença de militares no governo é também encarada favoravelmente"

"A maioria refere como resultados positivos do 25 de Abril a libertação dos presos políticos e a prisão dos agentes da PIDE. Metade da opulção não se manifestou quanto ao país junto do qual poderemos agora obter maior auxílio e os que exprimem opinião referem com mais fequência os países da Europa, seguindo-se os americanos e depois os russos"

"Surge destacadamente como primeira figura política nacional Costa Gomes (que cerca de 20% preferem para Presidente da Republica), seguindo-se Mário Soares (preferido por 5%), Vasco Gonçalves e Spínola. Depois, com menor importância e muito próximos uns dos outros, Sá Carneiro, Álvaro Cunhal e Otelo Saraiva de Carvalho. Mais abaixo, Pereira de Moura, Saldanha Sanches e Freitas do Amaral. Por ultimo, Marcelo Caetano e Américo Tomáz."

"A percentagem de favoritismo pelos vários partidos traduziu-se por:

PS  -             23%
PPD -          17%
PCP -            6%
MFA -            3%
MDP/CDE - 1%
CDS -            1%

----
*Conduzido pela CEAD - Centro de Estudos de Administração e Desenvolvimento, foi realizado um "Estudo de Opinião Pública" em Dezembro de 1974. O trabalho de campo decorreu entre 5 e 31 de Dezembro de 1974, envolveu entrevistas pessoais directas de 6629 indivíduos seleccionados aleatoriamente, dentre o conjunto de todos os indivíduos de nacionalidade portuguesa, residentes em Portugal Continental, de ambos os sexos e com idade superior a 18 anos.


NEGÓCIO ELEITORAL

Há 18 partidos, o maior número de sempre a concorrer às eleições europeias. Cada partido ou coligação poderá gastar até 2,9 milhões de euros. Deste modo, o acto eleitoral poderá custar aos contribuintes mais de 50 milhões de euros. Nas europeias de 2009, as 13 formações políticas concorrentes gastaram mais de oito milhões de euros com as despesas da campanha eleitoral.

As eleições são um negócio? Assim parece, considerando o número de partidos concorrentes - 18 - a um muito restrito número de vagas  21. Considerando o peso eleitoral relativo de cada partido ou coligação, dos 18, provavelmente apenas 3 conseguirão representatividade no PE: PSD/CDS, PCP e BE. Deste modo, parece que 15 concorrem para gerir fundos e garantirem projecção mediática que lhes possa ser rentável no futuro.

Há outra explicação?

E se o negócio pega, e por que não há-de pegar se o risco é nulo?,  e dentro de 4 anos houver, por exemplo, 30 partidos concorrentes, aumentarão os fundos atribuíveis na mesma medida, provocando um rombo de cerca de 100 milhões de euros nos bolsos dos contribuintes? Que lei de financiamento é esta que coloca nas mãos de arrivistas, políticos de ocasião, milhões de euros que retiram a pensionistas e funcionários públicos? 

A bem da democracia?

Monday, April 14, 2014

AS CONTAS DA FALTA DE VERGONHA


Os partidos são a principal base orgânica da democracia.
Segundo o que se lê aqui, o Tribunal Constitucional tornou público ter aplicado coimas aos partidos políticos, em montantes que totalizam 2,26 milhões de euros por ilegalidades ou irregularidades detectadas pelo Ministério Público nas suas contas anuais e campanhas eleitorais entre 2005 e 2009.
Do que se passou de então para cá, e já passaram cinco anos sobre a data dos resultados mais recentes, não temos notícias. Porque os partidos ainda não fecharam as contas? Porque o Ministério Público é institucionalmente lento? Pela falta de entrega das contas dos exercícios de 2009 a 2011 foram aplicadas multas de 89500 euros.

Pela notícia, sabemos dos montantes das coimas, não sabemos os montantes das irregularidades ou ilegalidades  cometidas.

O que sabemos é que aqueles a quem cumpria dar o exemplo de civismo, isenção e exigência democrática continuam a demonstrar um descarado desplante de falta de vergonha. Todos, sem excepção foram apanhados nas malhas de uma fiscalização de um orgão que não prima pela eficiência. Até o PCP!, tão orgulhoso dos seus pergaminhos é transgressor relapso. Em conjunto com a CDU, pagou, ou vai pagar, se pelo caminho não se atravessar uma prescrição, 385900 euros. Mais do que o CDS, campeão destacado da violação das regras de financiamento dos partidos em termos relativos. 

Por estas e por muitas outras, quem é que pode ouvir esta gente sem ver neles uns refinadíssimos aldrabilhas?  E votar neles. 

---
Correl . - O Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais é regulado pela Lei nº. 19/2003 e alterações subsequentes  aprovada pelos beneficiários. Além de outras subvenções, a cargo do OE, a subvenção pública para o financiamento dos partidos políticos determina (º. 2 do artº. 5º) que "A subvenção consiste numa quantia em dinheiro equivalente à fracção 1/135 do valor o IAS, por cada voto obtido na mais recente eleição de deputados à Assembleia da Reública". Trocado por graúdos, por cada voto expresso pagam os contribuintes (pela cotação actual do IAS) cerca de 3,11 euros.

Sunday, April 13, 2014

OS PROTAGONISTAS

40 anos depois

Destaco a imagem mais positiva, de Ramalho Eanes (61%), e a maior queda de Mário Soares (10 pontos percentuais, para 38%) nos últimos dez anos apesar de atingir o máximo (100%) em notoriedade.
 
Conclusão (minha): a insistente intervenção política de Mário Soares, se lhe grangeou a admiração e o espanto de muitos, valendo-lhe o reconhecimento de personagem do ano pela imprensa estrangeira em Lisboa, tem-lhe corroído notoriamente a imagem junto da opinião pública. 

Mas sondagens, são sondagens, vocês acreditam em sondagens?

Saturday, April 12, 2014

MUDEI DE PONTO DE VISTA

Quando foi anunciada, e depois posta em prática, a decisão do governo de creditar aos contribuintes 15% do valor do IVA cobrado em despesas em restaurantes, de manutenção e reparação de automóveis e de cabeleireiros (não garanto que a lista seja mesmo esta) considerei a medida mais adequada a um país do terceiro mundo e procedi em conformidade. Aliás, anotei neste bloco de notas que me parecia (e continua a parecer) ser pouco razoável induzir o fisco a um conflito entre clientes e fornecedores que deveria ser resolvido por uma acção de fiscalização eficiente do ministério das finanças.

Corto o cabelo há mais de trinta e cinco anos no mesmo local. Sempre adoptei uma postura, logo que me sento na cadeira, de não discutir política nem futebol com o homem que empunha a tesoura e a navalha. Quem tenha visto Sweeney Todd, em cena ou na tela, mesmo que não seja juiz, sabe do que falo. Vou agora, passados tantos anos, colocar uma encrenca num relacionamento cordato tão prolongado?

Penso nisto quando leio a entrevista ao senhor secretário de Estado dos Assuntos Fiscais publicada hoje no Expresso. Fico a saber que do investimento de um milhão de euros em 45 Audis de gama alta,  espera o Governo cobrar ceca de 800 milhões de euros. É dinheiro. Ora este Governo, que me atingiu confiscadamente com um imposto de classe, se encaixar aqueles 800 milhões talvez possa vir a moderar a sua impetuosidade contra a classe em que já caí. Assim, sendo, decidi mudar de opinião e passar a contribuir na medida das minhas possibilidades para o objectivo que o Governo se propõe atingir.

Com uma excepção: o barbeiro, pelas razões que referi. Afinal de contas de que me serviria o Audi se o Ribeiro, violentado por uma exigência inesperada de um velho cliente, passasse a imitar Sweeney Todd?







Friday, April 11, 2014

O JOGO DA CABRA CEGA

Distúrbios no jogo à margem do jogo.

"Eleição de juízes acaba em guerra no Conselho Superior de Magistratura."

Mesmo assim, segundo sondagem publicada hoje no Expresso online - vd. aqui - os senhores juízes são agora menos impopulares que o senhor primeiro-ministro.




TEORIA DA RELATIVIDADE DA POBREZA


 Aqui


 

Thursday, April 10, 2014

A EXPLICAÇÃO DO MILAGRE

O sucesso da emissão, hoje, de 3 milhões de dívida publica grega a 5 anos, a uma taxa de 4,95%, aliado ao facto da Irlanda ter obtido uma taxa de 2,91% numa emissão a 10 anos, levou o FT a titular "entusiasmo investidor alastra-se pela Europa". Como a Grécia continua embaraça da com uma dívida pública elevadíssima - cerca de 175% do PIB -, mesmo depois dos resgates e reestrurações, envolvendo reduções de dívida  de juros, estamos a assistir a uma súbita comovente alteração dos objectivos dos investidores de todo o mundo?

Certamente que não. Os investidores não se comovem. Os investidores movem-se consoante as circunstâncias com que se lhes deparam. Neste caso, a explicação mais plausível para esta mudança de atitude só pode envontrar-se no único facto novo: as declarações de Draghi que há uma semana atrás comentei aqui.

Se o  que disse Draghi em Julho de 2012 e a semana passada tivesse sido dito quando deflagrou a crise outra seria a situação dos países que o tsunami financeiro apanhou fora de pé. Alguns dirão que, nesse caso, não teriam os que tinham sido afoitados para se lançar  em águas em que não sabiam nadar recuado das posições de perigo. Mas é uma justificação inconsistente porque as medidas tomadas para resgatar os afogados não os deixou livre de perigo - a reforma do Estado em Portugal continua por fazer após três anos de intervenção da troica - e deixou-os ainda com menos pé - a nossa dívida pública subiu, ainda que não tenha subido tanto quanto reclama a oposição.

E a dúvida subsiste: até onde irá, ou poderá ir, Draghi sem ser desautorizado por Schäuble?
O entusiasmo investidor é embalado pelo fulgor das paixões: dá forte mas passa depressa. O peso do ambiente envolvente está longe de estar desanuviado. Antes, pelo contrário, o confronto aberto na Ucrânia vai ser decisivo para uma clarificação do que pretendem os europeus fazer com a União Europeia.

Wednesday, April 09, 2014

O REGRESSO A CASA


Em cena no Teatro Nacional D.Maria II.

Harold Pinter é um autor de navegação difícil. Deixaram Jorge Silva Melo aventurar-se a bordo e o espectáculo só não naufraga completamente porque João Perry consegue escapar à encenação obtusa de J S Melo. É por João Perry que o público está a esgotar a plateia do D. Maria II mas é notória a desilusão dos espectadores à saída. O preço pago pelos contribuintes é excessivo para a produção realizada na casa do teatro nacional.

©Jorge Gonçalves

Tuesday, April 08, 2014

TOLICES CATEDRÁTICAS

Há dias o prof. Freitas do Amaral, catedrático de Direito, defendia o voto obrigatório como forma de evitar a abstenção e motivar os jovens a participar na vida cívica e política portuguesa. Anteontem, o catedrático de Direito prof. Marcelo aderiu à proposta do prof. F Amaral. A adesão do prof. Marcelo foi feita na sequência de uma avaliação que fez a partir de declarações que terá ouvido junto de colegas da faculdade, de alunos, de amigos e conhecidos, e que o terão levado a concluir que "se o tempo estiver bom no dia das eleições serão muitos os que vão até à praia".

A mim, não me admira que essa seja, efectivamente, a decisão de uma larga maioria nas próximas eleições, e não só das europeias no mês que vem mas também das legislativas no próximo ano. O contrário é que seria de admirar. A proposta dos catedráticos é uma rotunda tolice a vários títulos, de que destaco três. 

Porque a obrigatoriedade de voto seria uma medida antidemocrática na medida em que sendo o voto uma opção cívica de cada eleitor o seu não exercício é um direito que não lhe pode ser retirado. Aliás, a obrigatoriedade de voto é, geralmente, imposta em países onde a pretensa democracia não passa de um arremedo dela. Mas, para além da tirania que estaria subjacente na obrigatoriedade de exercício de um direito que tem de ser livre, para ser sério, o voto em branco ou  nulo acabaria por frustar a aquela intenção tola. 

Por outro lado, nem uma forte participação eleitoral é sintoma de amadurecimento democrático, nem os níveis de abstenção alteram substancialmente os resultados, uma vez que aqueles que se abstêm se fossem obrigados a votar, ou votariam em branco, ou anulariam o voto, ou votariam replicando a tendência do voto dos não coagidos a votar. Esta conclusão é fácil de comprovar considerando que as sondagens feitas às intenções de voto prevêm resultados muito próximos dos reais a partir de amostras relativamente muito reduzidas.

Quanto a motivações dos jovens de participar na vida cívica e política portuguesa, sabem bem os senhores catedráticos das razões pelas quais os jovens, e não só os jovens se alheiam da participação cívica. Eles sabem, ou têm obrigação de saber, que a política é dominada pelo compadrio, pela conivência nas conveniências, pelo incumprimento da lei, pela corrupção, pela mentira. É isso, é esse fedor da putrefacção da democracia, que afasta os eleitores das mesas de voto. 

Só uma concepção totalitária da vida em sociedade se pode atrever a restringir-nos o direito ao ar do mar.

---
Recomenda-se aos catedráticos a leitura, por exemplo, distodisto, disto.  E de tantos casos em que a falta de vergonha de uma grande parte das elites enxameia de escândalos de falta de civismo incessantemente este país.

Monday, April 07, 2014

AINDA NOS FALTAVA ESTA

Provadamente vivemos num país de amplas liberdades, tão amplas que o incumprimento das leis é a moeda corrente no tráfico de liberdades com que se perdoam a generalidade dos portugueses uns aos outros: faz lá tu uma safadeza e deixa-me fazer duas a mim. Como em qualquer outro tráfico, há neste mercado desde pequeníssimos transgressores até aos grandessíssimos. Num contexto destes, o nível de exigência é reduzido, reflectindo-se em níveis débeis de produtividade e de qualidade do trabalho produzido. Os interesses colectivos, reunidos no Estado, são as vítimas preferenciais desta idiossincrasia de um povo em situação de menoridade democrática, porque, frequentemente cedem, transigem ou participam no cambalacho os tutores incumbidos de os defender.

É exemplo desta convivência na transgressão (se a notícia tem fundamento) a descoberta publicada hoje no Jornal i: "Presidência da República e parlamento escondem as compras que fazem" " Presidência da República, municípios, freguesias, institutos e empresas públicas, hospitais, inspecções-gerais e fundações "escondem" compras. Há milhares de organismos e entidades públicas que não publicam qualquer procedimento de aquisição de bens e serviços no portal Base dos contratos públicos ( http://www.base.gov.pt/base2/). A publicitação dos procedimentos contratuais no portal é obrigatória e o Código dos Contratos Públicos (CPC) determina até que a não publicitação tem como consequência a sua "ineficácia", nomeadamente em termos de pagamentos."

O Parlamento tem dado ao longo dos 40 anos de regime democrático diversos sinais de propensão transgressora. O caso das facturas falsas apresentadas por diversos deputados, era Jorge Sampaio Presidente da República e Jaima Gama Presidente da Assembleia da República é, provavelmente, o exemplo mais flagrante de uma transgressão que deveria ter sido severamente reprimida, para referência futura, e não foi. E não tendo sido, fortaleceu a propensão transgressora. 

O que parece estranho é a inclusão da  Presidência República na lista anunciada pelo Jornal i. Estranho, porque sendo a Presidência da República um cargo uninominal, não existe, em princípio, lugar a um mercado de transgessões com outras entidades ou indivíduos. Dito de outro modo: por que razão é que o Presidente da República esconde as compras que faz? Por esquecimento? Por incompetência dos assessores na área? Espera-se que haja uma resposta tranquilizadora.
 --- 
Correl. - 8/04 - A banalização do incumprimento da lei

O JOGO DA CABRA CEGA

 Cada vez mais animadíssimo.

"Não se prova que foi crime, portanto foi um extraterrestre"
 

Sunday, April 06, 2014

PRIVATIZEM O MINISTÉRIO PÚBLICO

Há mais de dois anos anotei aqui , e em outros apontamentos posteriores, que os interesses colectivos, reunidos nesse ente abstracto a que se convencionou chamar Estado, com E grande, só seriam convenientemente defendidos se os advogados de defesa (geralmente designados por procuradores da República) fossem interessados nos resultados das causas que defendem. No limite, que se privatize o Ministério Público! É uma ideia idiota, no sentido de que jamais poderá funcionar? Talvez. 

 

Mas ontem, e a propósito de, poucos dias depois do chefe ter sido absolvido, pela prescrição da ordem, de pagar a multa de 1 milhão de euros, ter sido o folião-director-corporativo -vd aqui - também absolvido, pela mesma via, de pagar 650 mil euros, e desinibidos de continuar a banquetearem-se, tudo levando a crer que todos os outros implicados na mesma tramóia sejam absolvidos e desinibidos do mesmo modo, afirmava um dos vários políticos comentadores que temos que "por estar o governo a cortar indiscriminadamente nos salários da função pública, os melhores saem para o sector privado" . E que "é normal que os interesses colectivos sejam mal defendidos quando, como acontece no caso em questão, se alinham perante 29 advogados de defesa dos arguidos, muito bem pagos,  2 defensores dos interesses colectivos cada vez mais mal pagos".

 

Apesar de algumas dúvidas que o argumento me suscita - por exemplo, continuo sem perceber se nos casos em questão a defesa não é paga pelo Banco de Portugal e pela CMVM, que é suposto não serem abrangidos pelas restrições salariais que impendem sobre a função pública  - o raciocínio encaixa-se perfeitamente na ideia frequentemente confirmada de que a justiça é variável consoante os honorários pagos aos advogados. 

 

Assim sendo, não há reforma da justiça que valha a pena se não passar pelo interessamento dos  advogados nos resultados das demandas. Interessamento que tem de ir além de uma remuneração certa mas sempre menos gratificante do que aquela que atiça o engenho do outro lado. 

Repito-me: há algum cliente que manteria um advogado que lhe perdesse sistematicamente as causas? Há um: o Estado. Um cliente, naturalmente estúpido. Uma estupidez que só pode ser moderada se for alterada a forma como os interessados lhe comem as papas na cabeça.