Marcelo tomou posse e, à noite, saltou à cadência da música de Abrunhosa, lembrou-me Dom Pedro na rambóia com a Lisboa medieva pobre.
O país estava a precisar de um presidente assim, à maneira de Mário Soares, ouviu-se repetidamente, e o próprio Marcelo não escondeu, mesmo durante a campanha eleitoral, que lhe admirava o estilo. Não a dançar, Soares, mesmo quando jovem, segundo parece, tinha o pé pesado.
Hoje está em Lisboa Pierre Moscovici para discussões com António Costa e Mário Centeno*.
O
Eurogrupo insiste num Plano B.
Por razões óbvias, um plano B não é hipótese de que se reconheça publicamente a existência (mas que, no entanto, não pode deixar de existir) e se divulgue antes que se torne imperioso adoptá-la. Se anunciar um plano é uma jogada arriscada, divulgar uma hipótese alternativa equivaleria a comprometer o Plano A, que, neste caso, é o OE 2016. Estará o Eurogrupo a tentar precipitar o derrube do governo quando pretende o anúncio público da insuficiência das medidas previstas no OE, ainda em discussão na especialidade? Ou ficará sossegado quando hoje António Costa tiver uma conversa de pé-de-orelha com Pierre Moscovici?
A propósito de planos que, como os chapéus, há-os de vários feitios:
Completam-se hoje 30 anos sobre a data em que Mário Soares iniciou o seu primeiro mandato como Presidente da República.
Nos primeiros dias de 1986 tinha havido um frente-a-frente entre Freitas do Amaral e Maria de Lourdes Pintassilgo. A páginas tantas, a discussão de ideias centra-se no confronto entre as virtudes e os malefícios do Plano. Freitas do Amaral aceita o Plano porque a Constituição** obrigava, Maria de Lourdes Pintassilgo considera o Plano uma exigência de sobrevivência nacional.
Que o Plano não é assim tão útil e pode até ser perigoso, explica Freitas do Amaral, mostra-o o facto de haver países que não perdem tempo com planos, e são muito felizes com isso, e, pelo contrário, países que têm no Plano o seu santo salvador não passam da cepa torta. Quanto muito, Freitas do Amaral, concede que deveria haver um conjunto de objectivos.
Por pouco, não venceu as eleições na primeira volta.
Defrontou Mário Soares na segunda volta, que havia partido de uma posição de popularidade, medida pelas sondagens, inferior aquela com Cavaco Silva deixou ontem a presidência.
No frente-a-frente final, Freitas do Amaral foi analítico, exaustivo na explicitação dos objectivos que se propunha atingir como presidente da República; Mário Soares, foi sintético, mais voltado para a contestação à consistência dos propósitos do seu opositor do que dar conta dos seus. Venceu Mário Soares.
Trinta anos depois, Marcelo Rebelo de Sousa, tomou posse como Presidente da República.
Foi eleito à primeira volta, assumindo explicitamente ver em Mário Soares o modelo que se propõe adoptar, sem obediência a planos prévios, movimentando-se consoante as circunstâncias. Mais do que manda a Constituição, a presidência é moldada pela personalidade do incumbente, ouviu-se ontem com insistência.
Não sabemos, nem saberemos como se haveria Mário Soares com o espectro no horizonte próximo de planos de medidas de austeridade, que colocarão à prova a fragilidade do apoio condicionado ao Governo.
Como se haverá Marcelo Rebelo de Sousa com eles? É esse o travo amargo de quarta-feira de cinzas.