Friday, July 31, 2009

COME A PAPA, JOANA COME A PAPA

Todas as sociedades têm o seu nível de imbecilidade. O da portuguesa apresenta valores elevados, o que é também sintoma da paroquialidade que caracteriza ainda grande parte da vivência social neste país.
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Porque uma senhora mal vista no seu próprio partido político foi convidada para integrar as listas de deputados por um outro partido, caiu o Carmo e a Trindade, a rádio, a imprensa a televisão chucham o assunto até ao tutano e a convidada passou a ser objecto de discussões e arranhões por toda a parte neste país saloio.
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E tudo isto porque, provavelmente, a tal senhora não recebeu o convite que esperava, e para o qual, segundo se pode deduzir das suas próprias palavras, se teria posto a jeito.

O QUE É ISTO?


Thursday, July 30, 2009

ABERRAÇÃO

Não faltam meios à justiça em Portugal para que seja oportuna. Mas há processos que, claramente, entravam a oportunidade sem a qual a justiça é um arremedo dela.
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Como qualquer criação humana, as leis podem ter defeitos. Um deles, substantivamente o mais grave, é a sua inconstitucionalidade.
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Recomendaria o simples bom senso e a experiência observada nas actividades que têm de garantir a qualidade dos produtos e serviços produzidos, que também as leis fossem sujeitas a controle de qualidade antes de serem aprovadas e entrassem em vigor. Mas não são.
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E, por não serem, observam-se casos que deveriam há muito ter alterado a forma como intervém o órgão (o Tribunal Constitucional) na apreciação da qualidade (constitucionalidade) das leis. Evitar-se-iam perdas de tempo, confrontos políticos sem proveito democrático, situações de democraticidade equívoca. A constitucionalidade das leis deveria ser apreciada antes da ser sujeita à aprovação dos órgãos com competência legislativa.
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Dois casos recentes exemplificam bem as consequências da aberração de ter o sistema judicial na sua cúpula um Tribunal Constitucional de génese político-partidária.
Um deles - o Estatuto dos Açores - que o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional quase um ano depois de ter sido confirmada a sua aprovação na AR, após o veto do PR, provocou um conflito institucional sem qualquer vantagem democrática.
O outro - a inconstitucionalidade da intervenção policial da ASAE - Autoridade de Segurança Alimentar e Económica - foi suscitada por uma pequena empresa que vendia, irregularmente, segundo a ASAE, lotaria popular. Chamado a pronunciar-se o Tribunal Constitucional deu razão à recorrente. Entretanto, a ASAE moveu centenas ou milhares de processos, e encontra-se actualmente debilitada na sua capacidade de intervenção. A lei do enquadramento jurídico de intervenção da ASAE foi aprovada pelo Governo que terá usurpado os poderes que, na matéria, competiam à AR. Ninguém levantou, com oporturnidade, a questão da constitucionalidade.
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Alguma empresa, digna desse nome, se atreveria a oferecer no mercado um produto sem controlo prévio de qualidade. Poder, podia, mas correria o risco de sofrer as consequências ditadas pelos tribunais.
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Dir-se-á que nem os órgãos legislativos nem os tribunais são empresas. Claro que não são. Mas nem por isso deixam de ter obrigações de qualidade perante os cidadãos idênticas às das empresas perante os seus clientes. É por esta, e por outras razões elementares, que a justiça tropeça todos os dias na teia de equívocos e obsolescências em que se move.

Wednesday, July 29, 2009

PORTUGAL - ESPANHA

Andamos pelo Norte. Chegámos ontem à tarde a Guimarães par mostrar o berço da nacionalidade aos mais novos. Há obras no Largo Morais Sarmento no Paço dos Duques de Bragança integradas num plano de renovação da cidade que será capital europeia da cultura em 2012. Este ano celebram-se 900 anos do nascimento de Afonso Henriques.
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É no meio deste ambiente de portugalidade que leio no "El País"
: "El 40% de los portugueses apoya una unión política con España" . Não é uma novidade, ainda não há muito tempo uma outra sondagem publicada em Portugal apontava para resultados semelhantes, e é frequente ouvir-se que teria sido melhor que tanto Afonso Henriques como os conjurados de 1640 se tivessem dedicado a jogar às damas em vez de conspirarem.
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Porque é que isto acontece?
Indiscutivelmente, porque os portugueses andam zangados com eles próprios. Tendo perdido passada relativamente aos vizinhos, concluem apressadamente que se pertencessem ao mesmo pelotão estariam mais à frente. Esquecem-se, por exemplo, que os andaluzes não têm o nível médio de vida dos catalães, nem Vigo o mesmo de Madrid. Por outro lado, inseridos na União Europeia, caminhamos para uma integração que, depois de ser económica, será social e finalmente política, se a roda não inverter de sentido. Daqui a duas ou três gerações, é fácil adivinhar que o espanhol será a segunda língua falada em Portugal.
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E a cultura portuguesa, para além da qual não existirá Portugal, onde a trave mestra continuará a ser a língua, só subsistirá se aos portugueses restar a portugalidade suficiente para afirmarem as suas diferenças no contexto ibérico. É essa portugalidade que, cada vez mais, se sente esboroar-se por um desânimo de que só os portugueses são responsáveis porque só nós somos culpados da indignidade de algumas instituições que nos envergonham.
A Justiça é a maior responsável por essa indignidade e pelo nosso descontentamento.

Tuesday, July 28, 2009

SEMPRE OS MESMOS

Procuro na Web a notícia de cabeçalho do Jornal de Notícias "Férias no estrangeiro escapam à crise" e o resultado da pesquisa diz-me que " Cada vez mais portugueses passam férias no estrangeiro " e que "mais de um milhão de portugueses optou por fazer férias no estrangeiro em 2005, em detrimento dos destinos nacionais". O que confirma que i) o hábito vem de longe ii) a crise não altera os comportamentos dos portugueses iii) a falta de meios, sim.
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Surpreendente? Não parece.
E não parece porque, como é sobejamente sabido, há quem tenha visto os seus vencimentos aumentados (o funcionalismo público e alguns mais) numa altura em que o índice geral de preços está em queda. Tendo mais dinheiro disponível, alguns portugueses gastam-no, apesar da crise ou sobretudo porque há crise: gasta agora porque amanhã pode não haver. Os outros, os que não viram aumentos ou perderam o emprego, fazem o que sempre fizeram: ficam em casa. Português não é japonês, e a crise dos outros não assusta aqueles a quem a crise (ainda) não bateu à porta, e trata de laurear a pevide como se habituou a fazer desde há alguns anos.
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Segundo o Jornal de Notícias, "a Associação Portuguesa de Agências de Viagens e Turismo está surpreendida com a procura de viagens de férias registada no mês de Junho por parte dos portugueses, que ultrapassou as expectativas iniciais do sector, tanto no que se refere à procura de destinos no exterior como nacionais ... os portugueses estão a pagar por este tipo de ferias ... consoante o destino, 750 a 800 euros por pessoa para estadias de oito dias.
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E ainda há quem ande preocupado com a influência da redução da procura no agravamento da crise. A nossa crise está, claramente, do outro lado, do lado da oferta.

Monday, July 27, 2009

O COMBOIO QUE ANDA PELA ESTRADA

Há muitos anos, havia combóios entre a Figueira da Foz e Vilar Formoso, era a linha da Beira Alta, explorada por uma companhia com o mesmo nome. Depois, a Beira Alta foi integrada na CP e a linha da Beira Alta foi segmentada entre o Ramal Figueira-Pampilhosa, e a linha da Beira Alta entre a Pampilhosa e Vilar Formoso. Coisas que tínhamos de aprender na quarta-classe, porque o combóio ainda era importante na deslocação de pessoas e mercadorias. Na década de 60, o combóio começou a perder terreno para os transportes rodoviários e também o ramal da Figueira-Pampilhosa viu reduzido, quase anulado, o número de passageiros e mercadorias transportados.
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Recentemente, alguém se lembrou de fazer obras, demoradas e dispendiosas, no túnel localizado a sete quilómetros da Figueira, ao mesmo tempo que era contruído ali perto um viaduto para deixar passar a A17, a novíssima auto-estrada Leiria-Figueira-Aveiro. Foi ainda renovado o troço da via próximo do túnel. Tanta obra obrigou a CP à suspensão completa do débil tráfego ferroviário no ramal e a alugar autocarros para substituir os pouquíssimos combóios (na realidade pouco mais que duas estafadíssimas automotoras) temporariamente suprimidos.
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Agora, que as complicadas obras no túnel terminaram, chegaram à conclusão que não pode o tráfego rodoviário ser retomado, por razões de segurança, porque a via não se encontra em condições de exploração a montante da zona renovada.
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Entretanto, continua o alternativo tráfego rodoviário, com razoável número de passageiros. O ferroviário deve ter parado de vez. Sobra o túnel, renovado, iluminado, como nunca.

Sunday, July 26, 2009

ACERCA DA (DES)NECESSIDADE DAS CONTAS

Os economistas desentenderam-se ainda mais com a emergência da crise. Se já havia fissuras no edifício, a crise derrubou uma parte significativa dele: a macroeconomia. De um dia para o outro, aquilo que dava à arte alguma reputação científica - a análise quantitativa -, foi mandada às malvas pelos que imputaram ao neo liberalismo, à sua fé no princípio do equilíbrio dos mercados, e nos modelos econométricos em que se baseavam, as culpas de ter causado a crise.
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Entre nós, onde a aversão às contas até chega a ser considerado um must, os cálculos nunca foram levados a sério, não há obra pública que não demore mais que o previsto e não tenha revisões de custos sucessivas. É natural, portanto, por muitas razões e mais estas, a discordância entre a nata dos economistas portugueses acerca do interesse público, e da oportunidade, na realização dos chamados mega projectos e, nomeadamente, do TGV.
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Há dias ouvi na mesma emissão de rádio a opinião de três desses economistas, por acaso formados na mesma escola, não formalmente alinhados políticamente, opinarem de modo radicalmente diferente. Enquanto dois deles apontavam a dívida externa como obstáculo o terceiro ignorava o obstáculo e as contas dos outros e defendia o TGV por razões de integração do país na Europa.
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Este é, aliás, o modo com que frequentemente se discutem os grandes projectos em Portugal, se elaboram programas eleitorais, se tomam decisões estratégicas: por instinto. As contas ficarão para serem feitas à posteriori pelo Tribunal de Contas do dr. Oliveira Martins, sem consequências visíveis.
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Afinal de contas, para quê tanta ânsia à volta dos resultados dos exames de matemática, se as contas estão cainda cada vez mais em desuso?

Saturday, July 25, 2009

CONVERSAS AO ALMOÇO

- Também na educação, o falhanço é total. Para iludirem o falhanço entraram no facilitismo e na manobra das estatísticas. E não só. Recentemente, passaram de ano alunos do 10º. ao 12º ano com oito negativas! Só depois da bronca ser conhecida é que emendaram a mão.
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- Está mal, não há dúvida. Mas anda toda a gente a errar o alvo. Os grandes responsáveis são os empregadores. Se os empregadores, a começar pelo Estado, fossem exigentes quanto às capacidades das pessoas que admitem, o caso mudava de figura. Os alunos passariam a estudar porque sabiam que iriam ser submetidos a provas se quisessem arranjar emprego.
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- No nosso tempo, para se fazer a quarta classe tínhamos de aprender um ror de coisas. Agora nem somar sabem.
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- Isso só é, parcialmente, verdade. A grande maioria daqueles que tiravam a quarta classe, mas iam para ocupações onde os conhecimentos adquiridos não eram postos à prova, ao fim de muito pouco tempo estavam quase analfabetos de novo. Li, recentemente, que estudos realizados nos Estados Unidos concluíram que os alunos, pelo facto de terem, nos EUA, mais um mês de férias de Verão que na Europa, esquecem cerca de 30% das matérias ensinadas no ano anterior. De modo que, não havendo exigência de conhecimentos por parte dos empregadores, se, por exemplo, um aluno passar com uma negativa e outro com três, ao fim de pouco tempo os conhecimentos de ambos serão sensivelmente os mesmos.

- De qualquer modo, noutros tempos havia gosto de aprender.

- Hoje, também há para muitos. A diferença está, sobretudo, no muito maior número de jovens que agora frequentam a escola relativamente aos que podiam frequentá-la há, digamos, trinta ou quarenta anos atrás. Embora hoje se assista a uma grande perda de valores.

- Pois. Fazem falta aulas de moral. A religião é importante nestas coisas... Não matarás!

- Não matarás, e matavam (e continuam a matar) sem dó nem piedade em nome de Deus.

- Pois ...
- Os valores morais religiosos são emanações dos valores destilados pelas sociedades. Se fossem de inspiração divina não seriam diferentes consoante os credos religiosos, seriam universais, e não são.

OVELHA NEGRA

SEXTA FEIRA, 24
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Fernando Ulrich é um banqueiro heterodoxo. Contrariamente ao perfil normalmente vestido pelos seus pares, o CEO do BPI não se resguarda na torre corporativa e ataca as situações que lhe parecem negativas para o sistema financeiro e os agentes de actos que considera condenáveis . Merece aplausos.
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Ontem, mais uma vez, Ulrich não se coibiu de imputar responsabilidades ao Banco de Portugal e à CMVM pelas falhas de supervisão, também, no BPP, e ao Governo pela forma como o processo de resolução se tem arrastado ao longo dos meses, provocando uma "relevância sistémica" de uma "ovelha negra", o BPP, que prejudica a imagem do sector. Dirigiu ainda críticas duras à intervenção do Ministério das Finanças pela inclusão dos "depositantes de retorno garantido" da "ovelha negra" ao abrigo do Fundo de Garantia de Depósitos para investimentos em produtos com risco.
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Numa terra de bonzos, as críticas de Ulrich correm o risco de se perder no meio desta indiferença pastosa que caracteriza as instituições de supervisão do sistema e da justiça. Nenhum dos seus pares até agora o apoiou, ninguém contesta nem ninguém se defende. Até onde deve levar Ulrich os adjectivos para provocar o leventar da pálpebra de algum deles?

Thursday, July 23, 2009

TÍTULOS DO DIA

Nasdaq com mais longa série de ganhos desde 1992
Dow Jones supera 9.000 pontos e S&P

Vídeo: Ulrich ataca autoridades portuguesas na solução para o BPP

Roubini diz que recessão pode voltar em finais do próximo ano
Retorno de 40%
Buffett está a ganhar mais de 2 mil milhões de dólares no Goldman Sachs

Rendeiro constituído arguido
Ganhos inferiores à Europa
Bolsa nacional encerra em máximos de 8 de Maio

PARECE IMPOSSÍVEL



Parece impossível, mas será verdade?

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Las nuevas células madre son capaces de generar un ratón vivo
Hasta ahora se podían reprogramar células de la piel o del pelo para llevarlas a un estado pluripotente como el de las células embrionarias, pero no había nacido ningún animal a partir de ellas.

Las células madre de la tercera vía siguen acumulando méritos hacia su aplicación médica. Son las células iPS (induced pluripotent stem cells, o células de pluripotencia inducida), que se obtienen reprogramando simples células de la piel o el pelo, pero son tan versátiles como las embrionarias. Dos laboratorios de Pekín han demostrado ahora que estas células son capaces de generar no ya todos los tejidos del cuerpo, sino ratones vivos y coleando. El primero que ha nacido se llama Tiny.
Qi Zhou, Fanyi Zeng y sus colegas de la Academia China de Ciencias en Pekín empezaron por generar 37 líneas celulares a partir de simples células de la piel de los ratones. La mayoría no sirven, pero tres de ellas han producido 27 ratones. Y deben encontrarse en forma, porque ya han tenido un hijo por el procedimiento estándar, según los datos que presenta Nature.
Pero los científicos añaden que ya tienen 200 ratones de la segunda generación y 100 de la tercera. También han admitido que algunos de ellos tienen malformaciones.

MÁ (CONS)CIÊNCIA

"Tão espertos, tão brilhantes, tão hábeis no manejo dos números - e nenhum deles, no mundo inteiro, soube prever nem travar a epidemia de ganância e corrupção que nos fez dar a todos com os burrinhos na água" - Inês Pedrosa, in Expresso/Única


O que atrás se transcreve reflecte o estilo de liberdade com que os ficcionistas compõem os seus textos mas também a liberdade com que o público em geral olha a realidade à sua volta: de forma caricaturada e, portanto, tendencialmente desfocada.

Reconheça-se, no entanto, que os economistas têm grossas culpas no cartório onde registam as suas tentativas de apreensão da realidade social e económica a que se dedicam. Transcrevi ontem para aqui alguns exemplos de textos publicados em órgãos de referência no campo económico e financeiro, mas outras posições, de índole parecida, podem ser encontradas transcritas neste caderno de apontamentos. Na generalidade dos casos, os autores assumem culpas de co-responsáveis pela crise, admitindo o falhanço de algumas convicções que eles tinham adquirido como verdades sólidas.

Tenho alguma dificuldade em entender grande parte deste autoflagelo por parte de uma classe de académicos que i) teve alguns representantes que contestaram, alguns há muito tempo, o princípio do equilíbrio dos mercados financeiros ii) outros que previram a evolução para a situação de crise que veio a deflagrar iii) mas, como frequentemente acontece em qualquer domínio da evolução do conhecimento as hipóteses adoptadas pelas maiorias sobrepõem-se às das minorias até ao momento em que a experiência demonstram maior consistência das segundas relativamente às primeiras iv) para além de não existirem nexos de causalidade entre a maior parte dos acontecimentos que originaram a crise e quaisquer teorias económicas por mais neo-liberais que fossem.
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E, depois, o que é que impediu estes arrependidos de terem denunciado a "má teoria" durante tantos anos em que a ensinaram?

Wednesday, July 22, 2009

MUDAR DE CIÊNCIA

What went wrong with economics
And how the discipline should change to avoid the mistakes of the past

... In a recent lecture, Paul Krugman, winner of the Nobel prize in economics in 2008, argued that much of the past 30 years of macroeconomics was “spectacularly useless at best, and positively harmful at worst" (... )

... Much of that body of knowledge has no link to the financial crisis and remains as useful as ever.

Economics is in crisis: it is time for a profound revamp
We need a new science of macroeconomics. A science that starts from the assumption that individuals have severe cognitive limitations; that they do not understand much about the complexities of the world in which they live.
writes Paul De Grauwe, professor of economics at the University of Leuven and the Centre for European Policy Studies

QUE FAZER?

"que alternativas..."
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Pergunta-me ( ), que alternativas?
Começámos esta conversa a propósito de um post seu anterior, "As pessoas estão obsoletas".
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Por detrás da evidente ironia, pressente-se o registo um pessismismo global. Em situações de crise as pessoas tendem a sugerir opções radicais que apontam para todos os sentidos. Até a destruição das máquinas, vistas como as mais desonestas concorrentes na ocupação de postos de trabalho. Outros propõem a expulsão de emigrantes, outros o boicote às importações de países de mão-de-obra barata, outros o regresso às barreiras alfandegárias.
E a guerra ali tão perto.
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Não tenho soluções na manga, seria escusado dizê-lo. Mas há uma coisa que eu julgo saber: É o que não podemos nem devemos fazer. E aquilo que não devemos fazer é contrariar o progresso, nem os resultados da ciência e da técnica nem os progressos no relacionamento e cooperação internacional e na liberalização do comércio.
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Descendo à (nossa) terra: Temos um problema, nosso, para além daquele que apanhámos por contágio: Não somos competitivos.
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Olhando a questão a curta distância, a nossa falta de competitividade decorre do facto de terem os salários crescido acima da produtividade global. Decorre também de terem os sectores não transaccionáveis desfrutado das vantagens que a moeda única concedeu mas que prejudicou os não transaccionáveis. Em resultado disso, o endividamento aumentou, os investimentos acolheram-se ao sectores não transaccionáveis, as importações cresceram, as exportações fraquejaram. O desemprego é a consequência natural de tudo isso.
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Medidas de curto prazo? Redução global dos salários. Contrariamente ao que possa parecer seria a medida socialmente mais justa, conforme refere V Bento em "Perceber a crise para encontrar o caminho."
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Estruturalmente, há pelo menos dois ou três domínios onde é fundamental adoptar políticas de revolução nas nossas atitudes colectivas, geralmente sustentadas no nacional porreirismo e no corporativismo. Mas para que tal aconteça é fundamental um consenso político alargado sem o qual a coisa faz que anda mas não anda.
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Um deles é a educação. Andamos nesta há anos e não se pega na questão por onde se deve. A minha proposta é esta: Deixem de acusar professores, alunos, os pais dos alunos, a ministra, porque os principais responsáveis são os empregadores, a começar pelo Estado. Se o Estado tiver a política de obrigatoriamente só admitir e promover mediante provas de avaliação das capacidades necessárias, salvo os cargos providos por eleição democrática, a qualidade da educação dará passos proporcionais às exigências colocadas pelos empregadores, incluindo neste conceito as Universidades na sua condição de avaliadores das competências dos candidatos à sua frequência.
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Esta política do Estado, creio eu, seria progressivamente adoptada pelo sector privado. Se não, continuaremos a valorizar mais o compadrio e a cunha que a competência. É facil perceber que a inversão só pode dar-se se houver inversão dos valores.
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Outro campo crítico: A Justiça. As pessoas respondem a incentivos e os agentes da justiça são, antes de mais, pessoas. Deveriam trabalhar por objectivos e serem compensados em função do seu cumprimento. Sei que esta proposta é escandalosamnte heterodoxa aos olhos de muitos. Mas, mudam-se os tempos, mudam-se as verdades. E é verdade que hoje os tempos impõem repensar processos, conceitos, garantias, obrigações e deveres. Sob pena de não mudarmos coisa alguma.
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Amanhã há mais.

Tuesday, July 21, 2009

SINTOMAS DE UM PAÍS SUSPENSO

A avaliação é uma inquietação. Tanto para os avaliados como para os avaliadores porque a partir daí quebra-se a corrente do nacional-porreirismo, salvo se não houver quotas.

Não havendo quotas, é um regalo: Somos todos bons.

Os sindicatos dos professores, e a generalidade dos professores, porque é por demais evidente que os sindicatos são, neste caso, a corporativização institucionalizada dos interesses dos instalados, não podem ser mais claros: avaliação sim, desde que não sejamos perturbados no descanso adquirido há muitos anos de não prestarmos provas perante seja quem for.

A Ministra, muito provavelmente, cessará funções no termo desta legislatura. Quem vier a seguir terá de passar descalço pelas brasas que os sindicatos não vão deixar de atear, com o aplauso geral e gáudio da oposição, qualquer que ela seja, a menos que aceite voltar aos tempos sem avaliações nem responsabilidades. Mesmo assim, será um mau ministro. Nunca houve um ministro da educação, sequer, razoável em Portugal, no entender da generalidade de professores e alunos. A probabilidade de o próximo ser tão mau como os predecessores é elevadíssima.

Dito isto, não se ignora que o sistema de avaliação na sua estrutura inicial não tivesse aspectos que devereriam ser revistos. Mas sempre me convenci, e continuo convencido, que os sindicatos rejeitariam, e continuarão a rejeitar, qualquer avaliação que distinga os professores uns dos outros com consequências nos seus salários e carreiras. Com este ou qualquer sistema de avaliação com consequências. Os sindicatos não podem ser mais claros: Os professores não devem ser avaliados.

Porque, obviamente, a avaliação ou tem consequências ou é outra coisa.

Monday, July 20, 2009

INCOMPETÊNCIA CIVIL

Ouvi pela rádio que o presidente do BPP, nomeado pelo Banco de Portugal, quer deixar o cargo por se sentir cansado com tantas propostas feitas (quatro ao que parece) e todas rejeitadas, e o Ministro das Finanças e da Economia dizer que, se alguém tem razões para se sentir cansado é ele, e não se queixa. E que é o Banco de Portugal que tem de decidir quanto à questão por ter sido o BP quem nomeou a administração. Leio, agora, que Vítor Constâncio recusa pedido de substituição da administração do BPP. E que
"a administração de Adão da Fonseca do Banco Privado Português (BPP) prevê "um cenário de verdadeira guerra civil" em caso de insolvência e custos muito significativos para o Estado. E mais,
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"A insolvência envolverá responsabilidades para o Estado muito significativas, sendo um monstro insaciável horribile dictu que a todos envolverá - num cenário de verdadeira guerra civil entre todos e com todos", diz a administração do banco que pediu para ser substituída, num comunicado interno a que a agência Lusa teve acesso. Nesses "todos" envolvidas em guerra, inclui "Ministério das Finanças e Governo, Assembleia da República, Tribunais portugueses e estrangeiros, Ministério Público" e outros, além de "clientes, fornecedores, colaboradores, administradores antigos e novos, Banco de Portugal, CMVM e Sistema Financeiro". A equipa liderada por Adão da Fonseca diz que foi prevendo esse cenário e, face a "falta de alternativas", colocou à consideração das autoridades a proposta da sociedade Orey Financial. "Esta proposta, embora não fosse da responsabilidade do Conselho de Administração do Banco, foi por este considerada ser susceptível de implementação, sem prejuízo de eventuais melhorias que pudessem ser aprovadas em sede de negociação entre as autoridades, os bancos financiadores e os novos accionistas", refere-se na comunicação interna feita hoje aos funcionários do banco onde se explicam as razões do pedido de substituição. Esta proposta foi apresentada no passado dia 10 de Julho e é a quarta apresentada desde final de Dezembro de 2008, e todas as indicações provenientes do Ministério das Finanças vão no sentido de ser rejeitada.
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Mais uma vez, é colocada em causa o governo do Banco de Portugal para gerir situações que ponham à prova a sua capacidade de decisão. Adão da Fonseca, pelo que disse, imputou publicamente responsabilidades ao Estado (quer dizer, a todos nós) que não podem decorrer unicamente do facto da insolvência de uma empresa privada. Pois apesar da gravidade das declarações, Vitor Constâncio recusa aceitar a demissão do declarante.
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Por renovação de confiança nele?
A crise é grave mas mais grave é a gravidade da actuação de quem tinha obrigação de saber lidar com ela, e não sabe. Adão da Fonseca, que não conheço de lado nenhum, não devia ter pedido a demissão porque já devia ter sido despedido.

POUCO SEXY

" a economia portuguesa é pouco sexy"

Caro Fernando Alexandre,

Retirei do seu texto a afirmação que, na minha perspectiva, resume as suas explicações para a quase ausência da abordagem dos académicos portugueses aos nossos problemas económicos.
E fico perplexo com as razões que aponta, ainda que as compreenda.
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Perplexo, porque me parece que, apesar da invocada falta de dados, teremos, certamente, muita informação que permite retirar conclusões e apontar caminhos. O que é que tem feito o INE ao longo de tantos anos? E o Banco de Portugal? E os departamentos de estatística dos diferentes ministérios que, quase todos eles, são INE´s dentro do seu âmbito?
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Que a economia portuguesa não seja sexy para estrangeiros, compreendo. Que os académicos portugueses, a trabalhar em Portugal, se inferiorizem por os considerarem mal acompanhados de dados, já percebo menos. Afinal o que fazem, ou têm feito, os milhares de técnicos (ou para técnicos) estatísticos pagos pelos contribuintes portugueses?
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Desculpe Caro Fernando Alexandre, mas se a sua perspectiva é correcta, e eu receio que seja, penso que há uma questão elementar que deve colocar-se: Para que serve a função estatística económica do Estado e a investigação económica em Portugal aos portugueses?

Sunday, July 19, 2009

OS ADVOGADOS DO EMPREGO E O EMPREGO DOS ADVOGADOS

Expresso - Uma das críticas duras que desferiu ao seu próprio mundo foi a de que havia um exagero de novos advogados em Portugal. Se as regras de acesso à profissão que defende já estivessem em vigor, a sua filha seria advogada?
Marinho Pinto - Provavelmente, nem eu seria. Não podemos ter uma profissão massificada, em que o número de advogados é manisfestamente superior às necessidades sociais. A advocacia é uma actividade privada e liberal, com uma dimensão de interesse público e vinculação a valores éticos e deontológicos. Não pode haver ética profissional quando se luta pela sobrevivência. Não se pode deixar ao mercado a regulação que a Ordem deve fazer. O mercado não tem ética. Se necessário, há que cortar na própria carne.
Expresso - É assim que fala o bastonário sobre os 35 mil juristas portugueses, 26 500 dos quais inscritos na Ordem.
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O bastonário da Ordem dos Advogados é um personagem altamente polémico, sabe-se que tem muitos pares que detestam muitas das posições que ele defende e muitos interesses que ataca. Do que se transcreve atrás, de uma entrevista publicada na revista Única deste fim-de-semana do Expresso, serão muito poucos aqueles que, estando inscritos na Ordem, comandados pelos seus próprios interesses, discordarão dele.

Este excerto da entrevista é um exemplo acabado da defesa do espírito de corporativismo, que era um dos emblemas do regime caído há 35 anos, e que ainda subsiste em todo o seu esplendor.

Diz Marinho Pinto que não pode (a Ordem) aceitar que o número de advogados seja manifestamente superior às necessidades sociais. Poderia não ter acrescentado mais nada porque esta afirmação resume tudo aquilo em que se consubstancia a ideologia corporativa. A Ordem define as necessidades sociais estabelecendo numerus clausus para a admissão na profissão, protegendo os que estão dentro, arredando os que estão fora, independentemente do mérito relativo. E por quê? Porque não há ética no mercado do trabalho, e, segundo Marinho Pinto, a ética na advocacia é salvaguardada pela restrição da oferta de advogados.
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Se admitirmos, na perspectiva de Marinho Pinto, que a toda e qualquer profissão é legítimo invocar a ética como referencial indeclinável nas respectivas actividades, e que o mercado conduz a práticas não éticas, legítima se torna toda a prática corporativa que defende irrestritivamente os que estão dentro e repele os que estão fora.
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Lamentavelmente, Marinho Pinto não faz mais do que defender o que o corporativismo, ainda tão vivo na sociedade portuguesa em múltiplos aspectos, escandalosamente representa: uma sociedade onde a competência é frequentemente segregada pelo compadrio e pelos interesses de classe.
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Um escândalo que se torna ainda mais evidente quando a crise dupla se abate sobre os que estão fora. Talvez por razões de má consciência são, frequentemente, os que representam os interesses dos que estão dentro aqueles que mais clamam pela criação de empregos para os que estão fora.

Saturday, July 18, 2009

SAGRES 3

- E se, nesse caso, toda a gente quisesse um Lamborghini? E fumar um "habano"? Ou, mais prosaicamente, comer pescada? Haverá pescada para todos?
- Mudam-se os tempos, mudam-se os hábitos. Um dia, os Lamborghini estarão obsoletos e esquecidos. Só há evolução se houver sobrevivência, só há sobrevivência se houver adaptação. A máquina continuará a substituir muito trabalho do homem mas não repõe os recursos naturais destruidos sem recuperação.
- Na sociedade futura, quando a humanidade dispuser de energia como dispõe do ar e a máquina substituir o homem, a abundância acabará com a fome dos pobres, a inveja dos remedidados e a ganância dos ricos?
- Se o homem, entretanto, não destruir a humanidade, certamente.
- Então é uma Utopia?
- É um aviso. Sabemos hoje que o homem pode destruir a humanidade de forma instantânea, utilizando a energia nuclear, ou de forma lenta, destruindo ou exaurindo os recursos naturais. O caminho para o Jardim das Delícias tem muitas armadilhas.
- E qual será o papel do Estado na orientação do caminho?
- Aquele que o homem, livremente, quiser. O Governo do Estado, mesmo enquanto emanação da vontade da maioria, não pode ignorar as minorias discordantes sob pena de, mais tarde ou mais cedo, entrar por um beco sem saída. Enquanto resultado de um putch reaccionário ou revolucionário, o Governo terá sempre os dias contados.
- E não há alternativas para a Democracia?
- Haver, há. Mas estão no caminho da destruição da humanidade.

TÍTULOS DO DIA

Guilherme d`Oliveira Martins: "Quando for necessário, os julgamentos serão feitos"
Tribunal de Contas: negócio do terminal de contentores de Alcântara é ruinoso para o Estado
Menos sigilo bancário para combater a corrupção
TdC suavizou efeitos da lei dos ajustes directos
Sanções triplicaram num ano
Intelectuais lançam manifesto com “questões prementes” destinadas aos partidos políticos
Mira Amaral acusa gestores de power-points da EDP de ignorância

"Corrupção deve ser combatida com castigos exemplares"

SAGRES 2

Caro Francisco,

O trabalho não é um conceito unívoco, dizes tu aqui, e tens toda a razão.
A propósito, deixa-me que te conte uma anedota com barbas:
Dois lordes, já entradotes na idade, passaram a tarde a jogar ao gamão e, depois do chá das cinco, envolveram-se numa discussão interminável acerca da natureza do trabalho.
Defendia o anfitrião que até o amor era trabalho. Contrapunha o convidado, que não senhor, amor era prazer, logo não era trabalho.
Entrou o Jerónimo a meio da discussão para levantar a loiça, e diz-lhe o patrão:
- Jerónimo, tu, que tiveste o azar de nascer plebeu, tens entendimento, mas as tuas opiniões nada contam. De qualquer modo, gostaria que nos dissesses se, em teu entender, amor é ou não é trabalho.
Jerónimo, manteve-se calado por uns instantes a olhar os lordes, e depois respondeu: Senhor marquês, se amor fosse trabalho quem tinha de dormir com as criadas era eu!
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É só uma velha anedota mas resume o que está em causa.
O conceito de trabalho é, provavelmente, daqueles que mais evoluiram ao longo dos tempos, mas essa evolução acelerou-se com o desenvolvimento da ciência e da técnica. De tal modo que hoje todos os contornos que possam esboçar-se são necessáriamente difusos. A menos que levem os seus limites até ao limite da vida: a partir do primeiro bater do coração até ao seu último estremecimento, qualquer ser vivo está a trabalhar, mesmo quando dorme.
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O que nos importa, contudo, para a discussão do assunto que dialoguei aqui, é o conceito restrito de trabalho que envolve a produção de bens ou serviços. Neste sentido, o futebolista realiza um trabalho de produção de um serviço, o cantor outro, o trabalhador numa cadeia de enchimento de cerveja outro. Geralmente, e até estatistícamente, este conceito restrito é ainda mais restringido, reduzindo-o ao conceito de trabalho remunerado. Nesta acepção, por exemplo, o trabalho doméstico se realizado por empregados é quantificado no PIB, se realizado pelas famílias não é.
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Adoptando o conceito de trabalho no seu sentido mais restrito, é indiscutível que a produtividade reduz o número de horas de trabalho necessário para produzir os bens e serviços que consumimos. E também é verdade que o leque de produtos e serviços tem aumentado exponencialmente com a evolução exponencial da ciência e da tecnologia. A questão, tão candente, da insolvência dos sistemas de segurança social só se coloca se a evolução da redução do número de pessoas activas se processar a uma cadência mais rápida do que o crescimento da produtividade permite.
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O crescimento da produtividade, contudo, é ao mesmo tempo causa e consequência da competitividade entre os indivíduos, entre as sociedades, entre as nações. Consequência porque é a concorrência que incita à inovação e, portanto, à produtividade. Causa, porque a produtividade é um dos factores mais importantes da competitividade. A produtividade evolui, portanto, de forma muito diferenciada, e o crescimento do desemprego numa zona pode não estar, e geralmente não está, ligado a crescimentos de produtividade nessa zona mas aqueles que são observados em zonas concorrentes. Deste modo, o emprego cresce em zonas de maior produtividade e decresce em zonas de menor produtividade.
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Globalmente, contudo, o crescimento geral da produtividade implica, por definição de produtividade, a necessidade de menos recursos humanos para satisfazer o mesmo consumo per capita. Como o consumo per capita não pode crescer ilimitadamente (a não ser que a produção para desperdício continue a crescer desmedidamente, destruindo irracionalmente recursos) o trabalho reduzir-se-á até à inversão total do conceito: de penosidade paga a prazer remunerado.
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Pensa no dia em que o homem conseguir produzir energia de forma ilimitada, a custo zero, portanto. A partir desse dia, o valor, em termos pecuniários, deixará progressivamente de fazer sentido. Utopia? Não creio que haja utopias nos domínios das ciências da natureza.

Friday, July 17, 2009

TÍTULOS DO DIA

Tribunal de Contas: negócio do terminal de contentores de Alcântara é ruinoso para o Estado
BE vai pedir desclassificação de documentos sobre ampliação do terminal de contentores
Ana Gomes diz que "nunca existiu vontade política" no combate à corrupção
Trabalhadores do PÚBLICO chegam a acordo com a administração e evitam despedimento colectivo
Wall Street com melhor semana desde Março
Bill Gates quer travar furacões

SAGRES

No monitor, um filme antigo das actividades na fábrica da Almirante Reis.
Centenas de pessoas encadeando-se nas operações que realizam.
Hoje, em Vialonga, aqui um, ali outro, olham, quase desprendidamente, para as cadeias transportadoras na ala do enchimento. A produção multiplicou-se incessantemente mas o emprego reduziu-se. É a produtividade, que contribui com a sua quota parte na luta pela quota de mercado onde o marketing e as vendas são os sectores decisivos numa guerra sem tréguas.
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- Um dia destes, (mandam-se as máquinas às malvas) e voltamos aos tempo antigos.
- E por quê?
- Porque a continuação de perdas de emprego vai gerar convulsões sociais imparáveis. As pessoas precisam de trabalhar.
- Precisam por quê?
- Ora por quê ... porque têm necessidade de garantir a sua subsistência.
- Não é o trabalho que garante a subsistência mas os rendimentos que são colocados à disposição de cada um. O que não quer dizer que o trabalho não seja necessário por razões de natureza psicológica. Inserido numa sociedade onde o trabalho é visto como uma ocupação que dignifica o trabalhador, o não trabalho induz uma imagem contrária.
- Mas de onde provêm os rendimentos para sustentar a crescente redução do trabalho?
- A redução do trabalho não é de agora. A história económica mostra que a evolução do tempo de trabalho se tem reduzido para a generalidade das ocupações tradicionais, isto é, daquelas que não estão relacionadas com as inovações tecnológicas mais recentes em cada período considerado. Essa redução tem sido observada não só no número diário de horas trabalhadas mas também no número de horas de dias de trabalho anuais. E não há nenhuma situação em que se tenha observado uma tendência inversa. Uma vez experimentada uma inovação tecnológica que substitui o homem pela máquina, o ajustamento que essa substituição implica tem-se realizado pela redução do trabalho. Por outro lado, já hoje se oberva a oferta de serviços gratuitos na área da informação. A Internet é o exemplo mais visível desta tendência.
- E o resto?
- A evolução para um sociedade onde a automatização dispensará do trabalho a maior parte do tempo da humanidade será lenta. Mas é inevitável porque a capacidade de produção é tendencialmente ilimitada mas a capacidade de consumo (seja do que for) está tendencialmente limitada pelo número de horas de cada dia. Deste modo, caminha-se para uma situação económica inversa daquela que se observa actualmente. A oferta de bens e serviços satisfará toda a procura, o trabalho tornar-se-á escasso. Como, pelas razões psicológicas que referi, haverá sempre candidatos a trabalhar e o trabalho passa a ser escasso, o acesso ao trabalho passa a ser remunerado. Quem quiser trabalhar, paga.
- Como?
- Com dinheiro?
- Mas de onde virá esse dinheiro?
- Dos bancos emissores. Como hoje.

Thursday, July 16, 2009

VALORES DE HOJE


APOIO AOS PEQUENOS E MÉDIOS VOTOS

As expectativas sobre o evoluir da situação económica continuam a deprimir-nos os dias.
Mas pior que as expectativas do arrastar da crise global é a expectativa do continuar do arrastamento da economia portuguesa, que já vinha de há uma década atrás e promete continuar por tempo indefenido. E porquê? Porque nos falta potencial para aproveitar a retoma internacional quando ela chegar. E porquê? Porque investimos durante muitos anos as poupanças, as doações e os empréstimos, sobretudo em meios especulativos, ou de retorno baixo ou curta reprodutividade. E porquê? Por falta de alternativas competitivas. E porquê? Porque as políticas existentes ou adoptadas privilegiavam a especulação e a expectância dos activos adormecidos, os monopólios de facto, o emprego seguro, e penalizavam, e penalizam ainda, as actividades que têm de competir no mercado. Perdeu-se potencial por desigualdade de oportunidades na competição.
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A mais corrente explicação para a falta de produtividade e competitividade do nosso tecido industrial vulgarmente aponta para a geral falta de capacidade dos nossos empresários. O que não deixa de ser verdade mas é uma verdade amarga. Porque muitos daqueles que assim pensam nunca foram empresários porque as circunstâncias da vida lhe proporcionaram uma actividade profissional tranquila e normalmente razoavelmente remunerada. Frequentemente, o nosso tecido empresarial é feito de pequenos e médios empresários que não tiveram oportunidade de obter os diplomas que lhes permitiam viver sem arriscar.
A selecção para a condição empresarial fazia-se, ainda se faz, frequentemente pela negativa.
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É a estes pequenos e médios e micro empresários que as forças políticas agora acenam com promessas de apoios para superar a crise. Não porque a crise se supere desta forma, mas porque ela atinge quase todos eles e os apoios têm incidências sociais, sobretudo na sustentação do emprego. Como são muitos, e em democracia a cada eleitor um voto, este interesse partidário súbito pelas PME é, em vésperas de eleições, disfarçadamente também um apelo ao voto.
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Passada a crise global, as PME continuarão a ser o que têm sido até aqui: as filhas de um deus menor. E a crise estrutural da economia portuguesa continuará porque nada, de realmente relevante, mudará enquanto não houver um consenso alargado sobre as medidas que há muito se impõem, e a que tantos já se referiram, para mudar Portugal.
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Banco de Portugal espera recessão em 2009 e 2010
O Produto Interno Bruto deverá contrair-se 3,5 por cento este ano e continuar em recessão durante 2010, anunciou hoje o Banco de Portugal (BdP). O banco central mantém a previsão de Abril passado, mas aponta para uma quebra de 0,6 por cento da actividade económica em 2010.
Taxa de inflação vai ser negativa em 2009
Desemprego vai continuar a crescer em 2010

Médicos uruguaios para o Algarve e Alentejo
Para responder ao crescente aumento do número de turistas, a Administração Regional de Saúde do Algarve (ARS) pôs em marcha um Plano de Verão, mas debate-se com a falta de médicos, pelo que vai recrutar médicos uruguaios.

Wednesday, July 15, 2009

NO PAÍS DOS ISALTINOS

A especulação imobiliária transaccionada com as câmaras municipais só tem uma solução: Retirar aos especuladores e seus comparsas camarários as vantagens decorrentes das suas manobras. Um, entre muitos outros casos, é aqui relatado e prescrito o tratamento que estes processos deveriam ter: " Estas mais-valias urbanísticas deveriam, segundo a Lei de qualquer país civilizado que nos serve de inspiração, reverter à posse pública uma vez que foram criadas por decisões administrativas e não pelo mérito empreendedorístico do promotor."
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A proposta não é original mas confronta-se com mil e um interesses que se enredam, frequentemente, na apreciação que uma grande parte dos eleitores fazem das obras que vêm crescer à sua volta e que tomam como reflexo de uma gestão camarária de progresso. É, ainda, a alternativa diabólica entre a competência e a honestidade que faz, geralmente, perdoar o eleitorado a falta desta pelo, geralmente, falso sabor da outra.
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O JOGO DA CABRA-CEGA


O advogado do presidente da Eurojust critica a opção do procurador-geral da República (PGR) de não ser ele a decidir sobre o eventual pedido de afastamento do instrutor do processo disciplinar a Lopes da Mota.
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Em nome de que liberdade continua o PGR a aguardar o encerramento de um inquérito disciplinar que já devia, e ele mesmo prometeu, estar concluído há muito tempo?
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Em nome da continuação da promoção do desprestígio do Ministério Público por parte dos seus próprios agentes?

O JOGO DA CABRA CEGA

Tribunal da Relação declara algumas atribuições da ASAE inconstitucionais
O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) considera que a ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica) tem funcionado de forma ilegal, uma vez que é inconstitucional a sua transformação em órgão de polícia criminal, ocorrida em 2007.
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A Justiça continua a surpreender-nos pela negativa. Justiça em sentido amplo, entenda-se, já que pela Justiça que não temos não são apenas responsáveis os tribunais mas todos os órgãos do Estado que, de um modo ou outro, interferem na aprovação e na administração da justiça.
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Neste caso, a ilegalidade declarada pela Relação de Lisboa reporta-se ao eventual desrespeito formal que inquinou a constituição da ASAE: a lei que aprovou as suas atribuições deveria ter sido aprovada pelo Parlamento, segundo os juízes desembargadores que apreciaram o processo. Não tendo sido, a ASAE está a funcionar desde a sua criação de forma ilegal, podendo ser reclamada a nulidade de todos o seus actos e solicitados ao Estado indemnizações pelos prejuízos que desses actos resultaram para os penalizados.
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Se, por exemplo, a ASAE detectou a presença de roedores na cozinha de um restaurante e restos de excrementos dos bichos entre os sacos de farinha e arroz, e daí resultou a multa dos responsáveis e o encerramento temporário do estabelecimento, o Estado (quer dizer, nós contribuintes), se o Tribunal Constitucional confirmar a sentença da Relação em três casos semelhantes, terá de indemnizar os restaurantes com ratos pelo facto da ASAE ter defendido a saúde pública.
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Porém, para além do insólito da situação, há pelo menos uma dúvida que sobra no meio deste emaranhado de contradições judiciárias em que vivemos: Se competia ao Parlamento aprovar uma tal lei, se a lei era conhecida e a ASAE ainda muito mais, até porque nunca fez da discrição uma norma da sua conduta, porque razão nunca a Assembleia da República, onde têm assento 230 representantes dos portugueses, agendou a discussão em plenário de uma eventual usurpação dos seus poderes legislativos pelo Governo? Não compete ao Parlamento o controlo dos actos do Governo? Estiveram todos distraídos?
E o Provedor de Justiça?
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Ninguém é culpado de nada porque é o contribuinte quem paga. Até quando?
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Só mais uma dúvida: Quem é que, a partir de agora, inspecciona a presença de ratos, baratas, e outros frequentadores clandestinos de restaurantes? Ninguém?

Tuesday, July 14, 2009

FIGUEIRA



Embarcava na automotora que saía do Rossio cerca da uma hora da tarde.
Entrava o ardina, ajoujado de revistas e jornais, a apregoar: É para entreter a viagem! Quem não sabe ler, vê bonecos!
O calor e a trepidação dos rodados nas juntas dos carris, na altura não soldados, adormeciam-me a meio da viagem.
Acordava com o cheiro da maresia que me adoçara a infância quando a Figueira já estava à vista.

LIBERDADE E SEGURANÇA

"They that can give up essential liberty to obtain a little temporary safety deserve neither liberty nor safety." -- Benjamin Franklin, Historical Review of Pennsylvania (1759)

"Quem troca a liberdade por segurança, acaba por não merecer nem uma coisa nem outra", citou, há dias, o Procurador-Geral da República, a propósito do aumento da intervenção securitária que muitos reclamam como forma de suster o crescimento dos índices de criminalidade, e que leva a generalidade das pessoas a considerar a segurança como uma das questões mais relevantes.

Citando Benjamin Franklin, (Thomas Jefferson teria dito mais ou menos o mesmo uns anos mais tarde numa carta a James Madison) o PGR pretendeu alertar para o risco que corre a liberdade da sociedade com a progressiva instalação de meios de controle das actividades dos cidadãos. Dois polícias tinham sido baleados na zona da Amadora e a questão coloca-se entre considerar o facto como um "risco que se corre", nas actuais circunstâncias, ou como "um acto intolerável" que exige o reforço de medidas que o tornem irrepetível.

JMFernandes, em editorial do Público do dia 10, considerava o discurso de Pinto Monteiro como o "mais à esquerda dos últimos anos, corajoso e desassombrado sobre o equilíbrio entre liberdade e segurança. Palavras certeiras mas que dificilmente qualquer partido subscreveria nos dias que vivemos".

Lê-se este e outros comentários, e parece ponto assente para muita gente que liberdade e segurança são irreconciliáveis: quando uma sobe a outra tem, inevitavelmente, que descer. Em certa medida, trata-se da mesma perspectiva, muito frequente, que considera serem incompatíveis nos políticos a competência na gestão com a honestidade de processos, a que aludi aqui.

Uma perspectiva de equilíbrio deprimente, porque exclui a hipótese de conciliação entre liberdade e segurança por um lado, e da competência e honestidade por outro. Talvez por isso, haja, entre nós, tantos casos de reeleição de políticos a contas com a Justiça e a Justiça não tenha o brio de garantir que a segurança seja a condição primeira de liberdade.

Monday, July 13, 2009

CALIFÓRNIA V TEXAS

É muito frequente a ideia, entre os europeus, de que os EUA apresentam uma homogeneidade política, cultural e económica entre os seus Estados que contrasta com a diversidade observada nos Estados membros da União Europeia. É inegável que existem, em geral, muito mais afinidades entre os norte-americanos dos diferentes estados do que entre os europeus dentro da União Europeia, e é compreensível que assim seja. Mas tal não significa que não haja, mesmo entre estados vizinhos, diferenças substanciais de desenvolvimento económico e social, dificuldades e oportunidades muito distintas, presentes que se confrontam com problemas muito desiguais, futuros que se apresentam com perspectivas bastante diferentes.
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O artigo, que se transcreve do Economist, California v Texas: America's future, é muito elucidativo acerca desse constraste de que também é feito, e de que em grande parte depende, o sucesso dos EUA.
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Seria bom que os europeus estivessem geralmente conscientes disto.
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AMERICA’S recent history has been a relentless tilt to the West—of people, ideas, commerce and even political power. California and Texas, the nation’s two biggest states, are the twin poles of the West, but very different ones. For most of the 20th century the home of Silicon Valley and Hollywood has been the brainier, sexier, trendier of the two: its suburbs and freeways, its fads and foibles, its marvellous miscegenation have spread around the world. Texas, once a part of the Confederacy, has trailed behind: its cliché has been a conservative Christian in cowboy boots, much like a certain recent president. But twins can change places. Is that happening now?

It is easy to find evidence that California is in a funk (see article). At the start of this month the once golden state started paying creditors, including those owed tax refunds, business suppliers and students expecting grants, in IOUs. California’s governor, Arnold Schwarzenegger, also said that the gap between projected outgoings and income for the current fiscal year has leapt to a horrible $26 billion. With no sign of a new budget to close this chasm, one credit agency has already downgraded California’s debt. As budgets are cut, universities will let in fewer students, prisoners will be released early and schemes to protect the vulnerable will be rolled back.

800 POR CENTO



Duas miniaturas encomendadas por D. João V foram vendidas em Lisboa por 48 mil euros e, nove meses depois, renderam 432 mil euros num leilão da Christie´s, em Londres.

in Público de ontem

LOT #113
A PAIR OF SILVER GILT-FRAMES WITH TWO...

DIVERTIMENTOS 2

Já aqui tem sido dito e redito que nem só as obras megalómanas, sem retorno que as justifique, arruinam as finanças públicas e, portanto, as poupanças dos portugueses. Há uma teia de muitos milhares de pequenos gastos, a que alguns querem continuar a chamar investimentos e obra feita, que têm efeitos acumulados sobre a dívida do Estado que rivalizam com os desastres provocados à economia pelos elefantes brancos.

Via O Ambiente na Figueira, cheguei a um post aqui que dá conta de um dos muitos casos com que os autarcas ganham aplausos das populações locais e votos dos eleitores à custa da anestesia fiscal que retira aos contribuintes sensibilidade para avaliarem os custos destes divertimentos autárquicos.
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Enquanto as autarquias não forem responsabilizadas pela liquidação e cobrança dos impostos com que sustentam as suas actividades e devaneios, situações como a descrita no blog Outra Margem continuarão a multiplicar-se até onde o tacho não der mais para rapar.

Sunday, July 12, 2009

DIVERTIMENTOS

A crise, como a maré-baixa, pôs a descoberto várias e velhas querelas que se encontravam submersas pelas vagas de prosperidade, em grande parte aparente, que garantiram sucessos e fortunas a muita gente. Hoje, quando do lodo sobressaem os conflitos apaziguados no fundo em tempos de mará-alta, cada qual aponta o bode expiatório que convém aos seus interesses ou às suas convicções.
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Os economistas académicos (há outros?) envolveram-se, praticamente desde o começo da crise, numa dicussão, inevitavelmente académica, acerca da responsabilidade das academias na formação, incorrecta segundo alguns, daqueles que inventaram e distribuiram os produtos que intoxicaram a economia global. Quando a crise global emergiu, nós já tínhamos a nossa, mas essa tinha, e continua a ter, outros fertilizantes.
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De um momento para o outro, fomos surpreendidos pelas declarações de muitos daqueles que ensinam nas escolas de economia e gestão de que, eles mesmos, tinham andado a injectar no cérebro más teorias aos aprendizes de feiticeiro que, coitados deles, acabaram por lançar fogo ao sistema que lhes vinha a dar grande glória e grossos proventos. E nem o facto de Madoff ter sido condenado a 150 anos de prisão parece poder convencer esses professores de economia e gestão de que da sua arte pouco aproveitam artistas como o Bernard. A arte destes é outra e não haverá regulação, qualquer que ela seja, que os contenha dentro dos limites da legalidade, se, directa ou indirectamente, das suas artes resultarem benefícios para o infractor e seus comparsas.
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Outra guerra do alecrim trava-se entre os que privilegiam as finanças relativamente à economia e os que esquecem as finanças nas suas propostas económicas. Ora, para além da Direcção-Geral de Contribuições e Impostos, e das suas inevitáveis repartições de finanças, não sei doutra entidade onde economia e finanças não andem necessariamente de braço dado. De modo que a desintonia só pode atribuir-se a uma perspectiva irresponsável por parte daqueles para quem é possível comprar tudo porque serão outros a pagar a factura.
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É ainda nesta desintonia que aparece invocado o nunca demais venerado nome de J M Keynes. Mas a questão é outra. A política de investimentos públicos concretizados em doses maciças de betão armado, como estímulo da economia, com invocação de Keynes serve primordialmente os interesses cruzados entre políticos e empresários de obras públicas e não é de agora, porque estamos em crise dupla. Pelo contrário, ela tem caracterizado a gestão pública central e local, qualquer que tenha sido o sinal da conjuntura, que encaminhou para ela os recursos, próprios, doados ou emprestados, colocados à sua disposição. Deixar obra tem sido o lema aferidor dos mandatos. O keynesianismo, neo ou clássico, não tem nada a ver com as reais motivações de muitas destas obras.

Saturday, July 11, 2009

OBVIAMENTE

Bancos rejeitam proposta de Grupo Orey para o BPP
Grupo Orey garante que compra do BPP não exige investimento do Estado
Constâncio confirma ter recebido proposta do grupo Orey para o BPP
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Há coisas que só acontecem nos filmes, há notícias em que só os jornalistas querem acreditar.
A notícia, amplamente divulgada ontem, de que a Orey tinha comprado o BPP por um euro, e de que o encerramento do negócio se encontrava apenas dependente da autorização do Banco de Portugal, só era credível para quem tinha interesse em que o fosse. Mas não tinha a mínima sustentabilidade, nos termos em que era anunciada.
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Hoje, soube-se que os bancos que haviam emprestado 450 milhões de euros, com garantia do Estado, para que o BNP pudesse solver compromissos junto de um banco estrangeiro, o City se a memória não me falha, rejeitam, obviamente, dar poleiro a um concorrente subscrevendo como capital os empréstimos garantidos. Nem outra posição poderia esperar-se da parte de quem teria muito a perder e nada a ganhar ao apoiar uma proposta, que lhes retiraria as garantias que o Estado lhes concedeu, sem quaisquer contrapartidas.
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Significa esta rejeição que os bancos credores não consideram que a eventual falência do BPP possa ter efeitos sistémicos sobre as suas próprias posições ou que, se esse risco existe, é mínimo,
e que o Governo, estando amarrado a compromissos que impedem o Estado de sair do negócio sem prejuízos para os contribuintes, colmatará esse risco.
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Donde resultará, muito provavelmente, uma transformação dos empréstimos garantidos em capital subscrito pelo Estado, tornando-nos (a nós contribuintes) "silent partners" de um banco que foi um ninho de vigarices. Apesar do que garantiam ontem os gestores do Grupo Orey e as declarações do Ministro das Finanças: de que a compra do BPN pelo Grupo Orey não envolveria qualquer investimento do Estado. Na altura, os bancos credores ainda não se haviam pronunciado, mas era muito óbvio que iriam recusar patrocinar um concorrente.

O QUE É ISTO?

Friday, July 10, 2009

CALVINO

Calvino, nasceu, faz hoje, 100 anos.

Genebra, onde se refugiou e desenvolveu o seu pensamento reformador, celebra este ano o centenário com a encenação da intervenção de Calvino na sociedade do seu tempo. O Museu Internacional da Reforma Protestante, junto da Catedral de São Pedro, inaugurado em 2005, é, naturalmente, também dedicado sobretudo à intervenção reformadora de Calvino.
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David Landes, que em "A Riqueza e a Pobreza das Nações", edição portuguesa da Gradiva, subscreve as teses de Max Weber a propósito da contribuição de Calvino para a emergência de sociedades social e economicamente mais bem sucedidas, afirma:

"...desde cedo a Igreja decidiu que apenas as pessoas qualificadas, certos clérigos, por exemplo, deveriam conhecer a Bíblia, que, com as suas leis e moral igualitárias e reprimendas proféticas ao poder e exaltação aos humildes, convidava à indisciplina entre os fiéis e ao desentendimento com as autoridades seculares. Só depois de censurada e suavizada poderia a Bíblia ser a conhecer aos leigos. Foi preciso aguardar o aparecimento de seitas heréticas , tais como Valdenses (c.1175), Lolardos (c. 1376), Luteranos (a partir de 1519) e os Calvinistas (meados do séc XVI), com a sua ênfase sobre a religião pessoal e a tradução da Bíblia para vernáculo, para essa tradição judaico-cristã ingressasse explicitamente na consciência política europeia, ao lembrar aos soberanos que recebiam de Deus a riqueza e o poder, mas na condição de se portarem bem. Uma doutrina inconveniente."


" Em 1506, Lisboa viu o seu primeiro progrom, que deixou um saldo de 2000 "cristãos novos" mortos. (A Espanha já praticava essa prática há duzentos anos). Desde então, a vida intelectual e científica de Portugal nasceu a um abismo de intolerância, fanatismo e pureza de sangue... Em 1600, mais ainda em 1700, Portugal tornara-se um país atrasado e fraco. Os cientistas, matemáticos e físicos criptojudeus de anos idos, tinham fugido todos os lados e nenhuma voz discordante veio ocupar o lugar deles. Em 1736, D. Luís da Cunha deplorou a ausência de uma comunidade reformista (calvinista) em Portugal. Assinalou que o desafio huguenote evitara que o clero católico francês tivesse mergulhado no "sórdido" nível de obscurantismo dos seus confrades portugueses. Palavras muito provocadoras, mas certeiras: se os lucros do comércio de mercadorias são substanciais, são contudo pequenos quando comparados com o intercâmbio de ideias."

"Max Weber publicou em 1904, provavelmente, a mais estimulante explicação para o avanço do Norte (protestante) sobre o Sul (católico), "A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo". A sua tese: o protestantismo - mais especificamente, as suas ramificações calvinistas - promoveu a ascenção do capitalismo moderno, ou seja, o capitalismo industrial que ele conheceu na sua Alemanha natal. Para tanto, disse ele, o protestantismo não atenuou ou aboliu os aspectos da fé romana que tinham impedido ou dificultado a actividade económica livre (a proibição da usura, por exemplo), nem encorajou, muito menos inventou, a busca de riqueza: mas definiu e sancionou uma ética de comportamento quotidiano que conduzia ao sucesso nos negócios.

"O protestantismo calvinista, disse Weber, fez isso inicialmente ao afirmar a doutrina da predestinação ... Uma tal crença poderia ter facilmente encorajado uma atitude fatalista... Porque ser bom? Porque, de acordo com o calvinismo, a bondade é um sinal plausível de eleição. Qualquer um pode ser eleito, mas é razoável supor que a maioria dos eleitos teria de mostrar pelo seu carácter e pelo seu modo de vida a qualidade da sua alma e a natureza do seu destino ("Nem todas as pessoas asseadas são boas, mas existem poucas pessoas boas que não sejam asseadas")... E, embora a crença firme na predestinação não durasse mais de uma geração ou duas, ..., acabou por se converter num código secular de comportamento: trabalho perseverante, honestidade, seriedade, uso parcimonioso do dinheiro e do tempo (ambos concedidos por Deus).