Escrevi aqui que a educação não é um factor crítico para a superação da crise de crescimento com que Portugal se debate há mais de uma década, e que foi exacerbada pela crise global rompendo o frágil reequilíbrio das contas públicas e atirando o endividamento externo para patamares insustentáveis a médio prazo. O meu Amigo Francisco C. colocou aqui a sua discordância quanto ao papel que atribuí à educação na recuperação da economia. Por toda a consideração que essa discordância me merece, volto ao assunto. .
A letargia que se apoderou da economia portuguesa há já muito tempo, e não apenas desde a crise global, tem raízes no crescimento de sectores de baixa tecnologia que fundaram o seu sucesso temporário na disponibilidade de mão-de-obra indiferenciada, que transitou de um sector primário decadente, e que claudicaram, ou está em vias disso, a partir do momento em que de outras regiões do mundo, onde a mão-de-obra é ainda mais barata, apareceram produções concorrentes a preços muito mais baixos.
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Cumulativamente, a entrada de Portugal no euro veio tornar mais apetecíveis ao investimento os sectores não transaccionáveis e menos evidente as consequências do crescimento do endividamento externo. Em consequência, os sectores tradicionais (têxteis e calçado) recuaram e as importações aumentaram, a balança comercial desequilibrou-se como nunca e o endividamento externo atingiu níveis que ameaçam sufocar toda a economia.
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Não sendo esperável que a saída esteja no abandono do euro (nem que sejamos expulsos dele) pelas razões que referi aqui, não temos outra alternativa que não seja a reestruração da economia, progredindo em sectores de média e alta tecnologia, mas essa progressão será sempre inevitavelmente lenta. A curto e médio prazos, o peso dos sectores de baixa tecnologia é ainda, inevitavelmente, muito determinante no relançamento das exportações, ou da substituição de importações. Mas a sua recuperação não passa, lamentavelmente, de modo crítico pela educação e pelo treino. E digo lamentavelmente porque se fosse esse o obstáculo seguramente que já teria sido ultrapassado. .
Diz-se, frequentemente, que o problema da nossa economia é a falta de competitividade, e que esta falta de competitividade, além do mais, decorre da falta de produtividade. A produtividade, porém, é um conceito que tem as suas subtilezas. Esqueçamos, por agora, essas subtilezas e consideremos o conceito na sua expressão mais simples: a produção realizada por cada trabalhador em cada dia (hora, mês, ano). São os trabalhadores portugueses menos habilitados e, portanto, menos produtivos que os seus concorrentes chineses ou do Leste da Europa, por exemplo. Não são. A deslocalização das fábricas que aqui se instalaram há três décadas deve-se essencialmente às remunerações pagas aqui e lá. Em que é que pode ajudar, neste caso, mais ou melhor educação? Alguma coisa ajudará mas não decisivamente.
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É então apenas uma questão de salários que, fundamentalmente, está em causa? No caso dos sectores tradicionais, de baixa tecnologia, é.
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E nos outros?
Temos empresas que são competitivas nos mercados externos, temos várias outras que são muito lucrativas abrigadas da concorrência no mercado interno. Mas não chegam para preencher o espaço ocupado ainda por muitas empresas que vão tombando derrubadas por uma concorrência que joga com outras armas. Porquê? Por falta de educação?
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Creio que não. O nosso sistema educativo sofre de muitas debilidades (exaustivamente identificadas mas não capazmente enfrentadas) mas não é, certamente, por falta de capacidades disponíveis que a economia não ganha velocidade e o desemprego aumenta. Há muitos licenciados desempregados, outros em funções que não exigem essa qualificação, outros que emigram. O ensino profissional foi retomado. Há algum projecto emperrado por falta de gente habilitada? Não creio que haja nem vejo que a falta de meios humanos seja geralmente indicada como factor de repulsão ou não atracção de investimentos.
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Só mais dois apontamentos: O aumento da produtividade depende mais da organização do trabalho que da formação de base do trabalhador. Um operário mexicano analfabeto atinge os níveis de produtividade mais elevados quando enquadrado em equipas a trabalhar nos EUA na construção civil, por exemplo.
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A educação em Portugal só atingirá níveis de maior qualidade quando os empregadores (Estado e privados, mas também as Universidades quando seleccionam os candidatos à admissão) forem exigentes desses níveis de qualidade. As pessoas reagem a incentivos. Se as exigências são baixas as respostas são-lhe proporcionais. Para que serve uma boa formação em matemática se uma boa cunha concorre?