Ouço na rádio que os bancários da Caixa Geral de Depósitos estão em pé de guerra contra a decisão do governo lhes ir abarbatar dois ordenados, que abrange todos os funcionários públicos ou de empresas do Estado, pensionistas do Estado e pensionistas que não trabalharam para o Estado, mas que o Estado se arrogou desde sempre o direito de gerir os seus fundos de pensões. Os outros, mesmo aqueles que dispõem de rendimentos superiores a todos aqueles, estão isentos.
Ouço ainda que o senhor FernandesTomás, administrador da Caixa Geral de Depósitos em nome do CDS e em substituição da senhora Celeste Cardona, disse que também ele não concorda que os bancários da Caixa Geral de Depósitos sejam abrangidos pela decisão do governo. Numa empresa digna desse nome um administrador que se pronunciasse publicamente contra uma decisão tomada em nome do accionista único, ou se demitia ou era demitido. Em Portugal, o senhor Fernandes Tomás assume a posição fácil: o partido que representa participa numa decisão que ele tem de fazer cumprir mas sacode a água do capote, e não se passa nada.
Mas vamos ao tema central: Para lá dos protestos dos bancários da Caixa, que têm toda a razão de ser, há os protestos dos trabalhadores da TAP, os funcionários do Banco de Portugal não protestam porque já embolsaram dois dos catorze salários do ano, seguindo uma prática corrente na paralítica instituição de receber em Janeiro os ordenados extra do Verão e de Inverno.
Todas estas embrulhadas, que se enfernizarão à medida que os tormentos da austeridade se tornarem cada vez mais insuportáveis, eram previsíveis a partir do momento em que o governo decidiu atingir apenas uma parte da população portuguesa, isentando os que têm rendimentos inferiores a determinado limite, o que é muito justo, e os que têm rendimentos superiores, mesmo muito superiores aos atingidos, mas estão fora da alçada das decisões discricionárias de corte do governo.
A isto chamou o governo, corte da despesa pública, o que é uma habilidade semântica, porque a dimensão do Estado não encolheu um milímetro com a decisão.
Entretanto a administração da Caixa, segundo as notícias, vai engendrar meios para compensar os seus funcionários dos rendimentos abarbatados, através de promoções e outras habilidades afins.
E os outros? Que habilidades vão inventar os outros para recuperar os rendimentos perdidos?
Em suma: vamos assistir a uma sucessão de fugas dos melhor colocados. O habitual, em Portugal.
Não teria sido mais equitativo, mais suportável, mais eficiente, mais legal e moralmente aceitável se o sacrifício foi-se distribuido por todos, a partir de certo nível de rendimento, através de impostos? Claro que seria.
Mas a ideologia tem razões que só ela conhece.
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