Sunday, January 15, 2012

ERA DE REVOLUÇÃO?*

ou de transição?

A actual situação de crise caracteriza-se nos EUA por uma apatia que a distingue de fases da história económica anteriores, no meadamente da destruição criativa que caracterizou a transição do século XIX para o século XX.

Com duas excepções: o Tea Party e Occupy Wall Street.

Aparentemente, o Tea Party representa a revolta contra as conivências entre os banqueiros e o poder em Washington. Começou pela oposição ao resgate de  Wall Street  de700 biliões (700 mil milhões) de dólares em Outubro de 2008, que só foi aprovado pelo Congresso em segunda votação. No entanto, o Tea Party é
dominado por uma base fundamentalmente constituida por brancos de meia idade e idosos, tradicionalmente conservadores. Os seus maiores protestos fizeram-se sentir em Agosto de 2009 contra a reforma do sistema de saúde acusando Obama de roubar fundos do "Medicare" (que assegura os serviços de saúde gratuitos a partir dos 65 anos) para assegurar o serviço de saúde a todos (portanto, também aqueles que estão em idade activa) que não possam pagar um seguro.

No entanto, um inquérito recente concluiu que mais de três quartos dos apoiantes do Tea Party declaram-se favoráveis à manutenção do actual sistema - Medicare, Segurança Social e  sistema público de pensões - que absorve a maior fatia do orçamento federal. Quando o ano passado a administração federal pretendeu reduzir os benefícios Medicare, os republicanos enjeitaram a proposta e Newt Gingrich, anterior líder da maioria republicana no Congresso, atacou o plano do governo considerando-o "uma engenharia social de direita". 

"Os norte-americanos detestam o governo em abstracto mas adoram os programas de governo que os beneficiam em particular".


A base demográfica do Tea Party, por outro lado, explica porque razão os cortes na despesa promovidos pelos republicanos, que agora controlam o Congresso, tenham atingido os programas da educação, infraestruturas, investigação e desenvolvimento, e outros items que envolvem as gerações mais jovens.

Para Ronald Brownstein, editor do National Journal, um semanário de Washington, os EUA entraram numa nova era política de "cinzentos contra castanhos" - um partido "Anglo" Republicano em crescendo contra uma coligação não homogéna dos mais novos e de outras raças que apoiam os Democratas. Esta oposição beneficiou Obama em 2008 na Virgínia e Carolina do Norte, tradicionalmente republicanos.

Obama tem o apoio de largas maiorias de americanos de origem africana, hispânica e asiática, mas de menos de 40% dos brancos "blue-collar, uma separação que se tem acentuado desde 2008. Obama já escolheu Charlotte, Carolina do Norte, com uma população prevalecentemente jovem, multi-étnica e bem preparada, para a convenção da sua nomeação; os republicanos escolheram Tampa, Flórida, uma zona preferida pelos reformados brancos. Se há uma guerra política essa guerra é mais entre gerações e grupos étnicos do que entre classes. 

Segundo o recenseamento de 2010, a população branca estará em minoria nos EUA em 2040. O mesmo censo revelou que 46,5% dos norte-americanos com menos de 18 anos são não-brancos, em 2000 eram 39%. Nos últimos dez anos o número de crianças brancas reduziu-se em 4 milhões enquanto o número total cresceu 6 milhões, em consequência do aumento da população hispânica. À medida que a austeridade fiscal reduz os rendimentos líquidos cada grupo tende a defender a sua fatia no orçamento federal. Apesar dos confrontos observados no ano passado acerca do teto da dívida o diferendo continua adormecido.

O relançamento do confronto entre o 1% dos ricos e o resto, um tema do discurso de Obama, está a ser realizado pelo "Occupy". Contudo, contrariamente ao "Tea Party", o "Occupy" não dispõe de qualquer organização formal. Enquanto o "Tea Party" é republicano e urbano, o "Occupy" forma-se com activistas da esquerda radical, estudantes e anarquistas. Mas nem o "Tea Party" se revê em Romney nem o "Occupy" é entusiasta de Obama, restringindo-se o populismo ao discurso dos candidatos. O contraste entre o populismo das mensagens e as origens dos fundos para as campanhas (Wall Street) não podia ser mais flagrante.

Frente a um eleitorado desiludido, Obama tenta agora entusiasmar a sua base de apoio, nomedamente hispânica, prometendo reformas nas leis de imigração, um assunto praticamente ignorado durante os seus dois primeiros anos de mandato. Romney dirigir-se-á sobretudo aos eleitores mais velhos e prometerá mais cortes na despesa. Com Obama-Romney, avizinha-se um confronto arredado da paixão política.

Avançará o libertário Ron Paul para uma terceira candidatura? Beneficiaria, obviamente, Obama e, por isso não é previsível que ocorra. O mais provável, segundo alguns, é que em Novembro se assista a uma luta suportada por financiamentos record com a mesma origem.

A esta distância temporal, quando o grau de insatisfação é grande, as intenções do   eleitorado tornam-se mais voláteis. Vivemos um tempo de desencanto com a democracia, a confiança no sistema está a desaparecer.
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* Este apontamento é continuação do anterior.

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