Saturday, April 18, 2009

SEGREDO IMPÚDICO

Caro PC,

Como bem sabes a intuição política não é o meu forte e a minha falta de vocação partidária uma evidência confrangedora. Daí que me sinta, quanto a estes temas que rodopiam à volta da corrupção, confundido com as posições basculantes que leio e ouço.

Quem há dias lesse ou ouvisse os discursos dos partidos na oposição era levado a pensar que o levantamento do segredo bancário e a tipificação do crime de enriquecimento ilícito estavam a ser impedidos pelo Governo e pelo PS, por razões inconfessáveis e de ocasião.

Agora, que Governo e PS decidem discutir e confundir os temas, e digo confundir porque as propostas do Governo não auguram que as leis que venham a ser aprovadas sejam significativamente avançadas relativamente às actualmente em vigor, os partidos da direita reagiram imediatamente invocando a anti constitucionalidade dos sacrossantos direitos individuais e da pérfida inversão do ónus da prova.

Pelo que me é dado perceber também continuas a perfilhar a opinião que o fim do segredo bancário é (seria) um atentado aos direitos individuais e um erro económico.

Ora, Caro PC, tu sabes bem que Portugal está muito mal situado em matéria de corrupção e que esta é uma praga que corrói o desenvolvimento económico de qualquer país. A correlação, neste caso, entre corrupção e subdesenvolvimento é também causalidade recíproca.

Pode combater-se a corrupção sem levantar o segredo bancário e tipificar o crime por enriquecimento ilícito?

Não creio. Sem meios de intervenção que permitam ver o que tem de ser visto, a justiça é a cabra cega vendada que anda à tonta dando voltas sobre si mesma enquanto os brincalhões dão gritinhos de alegria à sua volta.

Mas admito que esteja errado.

Se for o caso, muito agradecia que me esclarecesses, com cópia para a Presidência da República.

3 comments:

Rui Fonseca said...

Caro Rui:
Ora vamos lá por partes.
1. Logo para começar, o texto não indica, nem sequer indicia, a opinião que fazes minha de que " o fim do segredo bancário é (seria) um atentado aos direitos individuais e um erro económico". Pelo que a extrapolação não é devida. Tenho opinião, mas a mesma não está presente no texto. Porque a questão que levantei é independente da minha opinião ou da opinião de quem quer que seja.
2. O PS sempre se opôs ao que agora veio propor. Pelo menos, desde 2002 até Fevereiro/Março ou mesmo Abril deste ano. Por razões de natureza constitucional ligados à alteração do ónus da prova e do sigilo bancário, acrescendo ainda os efeitos nocivos da alteração do regime deste último. Era o PS e o Governo que o afirmavam até há dias.
3. A questão que levantei é a inesperada, incoerente e inopinada alteração da posição do PS. O que ontem era mau, passou hoje a ser bom.
4. Como penso que o PS continua a pensar que a proposta que fez é má, e se deve apenas a oportunismo político e demagogia eleitoralista, penso também que nunca a irá concretizar. Porquê? Porque, mesmo que a lei ainda possa ser aprovada, em tempo útil, a mesma terá que ser regulamentada. Acontece que entretanto há eleições, pelo que a regulamentação pode esperar, o efeito está produzido.
5. Não entrando no fundo da questão, posso-te dizer que o problema do sigilo bancário para efeitos fiscais é um sofisma. Desde que devidamente fundamentado pelo fisco, os Juízes dão sempre despacho positivo. E os Bancos cumprem. O que vinha acontecendo é que os pedidos de levantamento eram diminutos, o que pode ser explicado por dois motivos: ou incompetência dos serviços, desleixo ou deixa andar, ou porque o fisco pensa que não há razão para pedir mais.
6. E por aqui me fico


At 10:16, Rui Fonseca said...
Caro Pinho Cardão,

Tu, realmente, não disseste explicitamente que eras a favor ou contra mas há inferências óbvias.

Não precisas dizer, por exemplo,que és um "portista" ferrenho para ficarmos a saber que és. Se disseres que aquele golo do C Ronaldo foi um puro golpe de sorte que afastou o FCPorto, percebe-se que quem assim fala não é do Benfica.

E se à tua volta se juntarem uns amigos a afirmarem que além da sorte que beneficiou o Manchester o árbitro deveria ter marcado falta porque o Ronaldo levantou o pé mais alto que o ombro,se restassem dúvidas ficavam esclarecidas.

Ora o que te preocupa é o timming e as intenções do PS. Eu também penso que o Governo e o PS, mais do que quererem avançar estão a simular. Disse isso no meu comentário.

Mas a mim, que não tenho clube, não me interessa o que está por detrás (não tenho a tua perspicácia política) mas o que vejo pela frente. E o que vejo é uma intenção, real ou simulada não me interessa por agora.

E vejo que o PSD, que estava anteriormente fogoso no combate à corrupção, passa imediatamente a levantar o espantalho da anti constitucionalidade.

Se houvesse da parte da oposição uma intenção honrada de combater a corrupção, aproveitaria o movimento ensaiado pelo Governo para o fazer tombar para esse lado.

Parece que é essa a táctica básica dos judocas.

Afinal quem tem medo da lei anticorrupção? Eu não.

O Presidente da República é da mesma opinião, se bem entendi as suas palavras.

A propósito: Enviaste cópia?

( 4-0!)

Rui Fonseca said...

At 11:01, Pinho Cardão said...
Caro Rui:
Em primeiro lugar, uma precisão: não disse nem explicitamente, nem implicitamente que era a favor ou contra. E a construção que fizeste a seguir para justificar a teoria é meramente virtual.
Posto isto, só faltará dizer que a Constituição não permite o combate contra a corrupção, o enriquecimento ilícito e sem causa, o locupletamento à custa alheia, à custa do universo dos cidadãos ou o combate à fuga ao fisco. Isto é, tem que se actuar à margem da Constituição para conseguir efeito útil nesta matéria. O que não é manifestamente verdade. Não o sendo, só restam duas hipóteses: conformar a legislação com a Constituição ou alterar a Constituição. Era isso o que o PS deveria propor, num Estado de direito e não deixar arrastar-se pelas demagogias do Bloco de Esquerda, de quem aparece como satélite e braço armado.
Mas já que estás tão curioso em relação à minha posição sobre o caso, aqui vai ela: sou a favor da implantação de todos os regimes necessários para combate à corrupção e enriquecimento ilícito que se conformem com a lei, isto em obediência a um princípio que tenho como essencial, o de que os fins não justificam os meios. Como tal, sou contra este projecto do Governo ou do PS, ou dos dois, até porque apresentaram projectos diferentes, porque altera normas básicas e essenciais do nosso direito. Porque pouco ou nada traz, apesar da violação das normas, em ralação ao que actualmente existe. Porque, neste caso, o problema não está na autorização dos Tribunais, mas no Fisco. Porque não evita o recurso à Banca estrangeira e, muito menos, aos off-shores, de que se serve a grande corrupção. Porque não altera a nefanda norma de dispensa de concursos públicos e permite uma livre escolha administrativa. Porque não altera a possibilidade de fazer concursos à medida.E porque um cidadão normal tem o direito de não ver as suas contas devassadas por mera suspeita de um funcionário das finanças. E podia continuar.
E porque é assim, e o PS e o Governo bem o sabem, e tu também, porque o dizes, a lei vai ser apenas fogo de vista, para agradar à esquerda PS, sem qualquer efeito prático. O que é lamentável, porque estamos numa ocasião única para legislar bem, com pés e cabeça, sobre matéria tão importante e evitar situações escandalosas com que nos deparamos no dia a dia.


At 13:22, Rui Fonseca said...
Caro Pinho Cardão,

Nesta questão, como em muitas outras, quando não hà vontade política, e não há vontade política porque aos partidos que tiram partido da situação não interessa a solução do problema mas o seu arrastamento, as diferenças de interpretação acerca da constitucionalidade ou inconstitucionalidade das leis é um expediente que serve sempre bem aos propósitos dos adeptos do stato quo.

Porque, como bem sabes, se há matéria em que os constitucionalistas portugueses são peritos é na interpretação diversa da constituição. Aliás, têm dias. Os mesmos nem sempre interpretam da mesma maneira. A interpretação é antes de mais uma conveniência dos juristas.

Ora há uma solução à mão: Porque não fazemos como os países mais desenvolvidos da União Europeia? Porque andamos a inventar a roda?

Ainda não respondeste à questão: enviaste cópia ou não? Se citas o PR no teu post mais recente (e eu subscrevo) porque não o citas neste caso da quebra do sigilo bancário que ele diz ser a favor desde há muito?

Rui Fonseca said...

At 22:20, Pinho Cardão said...
Caro Rui:
Não é preciso de mandar. Qualquer Presidente da República lúcido, como é Cavaco Silva, de certeza que lê a Quarta República, condição aliás essencial ao bom desempenho das suas funções!...
E logo ao acordar, antes do pequeno almoço, para poder começar, com ciência certa, o dia de trabalho!...

Quanto ao sigilo: claro que estou de acordo com o levantamento mediante proposta justificada pelos serviços e autorizada por um Juíz, não por um funcionário administrativo das finanças.