Sunday, May 06, 2007

AS MOSCAS

Comentário a "A terceira entidade", publicado no Público e no
Abrupto

“Os presidentes passam, mas os mesmos homens e mulheres ficam lá agarrados aos seus pequenos e pequeníssimos poderes, nas secções, uns na oposição, outros controlando secções onde funcionam como caciques há longos anos”... (sem) ...”qualquer ética de serviço público, qualquer vontade cívica, qualquer projecto que não esteja ao serviço de objectivos que são para eles “profissionais” no sentido pleno, para si ou para os seus familiares e amigos”

Em “A terceira entidade”, artigo publicado no Público de ontem, JPP faz uma desesperada fotografia do ambiente enxameado que caracteriza a actividade das bases dos partidos políticos (“ou se tinha poder para os despedir ou dinheiro para os comprar; infelizmente ...a situação nos partidos não é muito diferente e ninguém tem uma coisa nem outra). JPP reporta a sua análise à distrital de Lisboa do PSD, que estarão, segundo JPP, por detrás dos tombos de Carmona Rodrigues. JPP, acrescenta ainda, que tudo o que diz da distrital de Lisboa se aplica “ipsis verbis” à estrutura do PS na capital, para acabar por generalizar afirmando que “a questão está muito para além de ser do PSD ou do PS, tem a ver com a degradação acentuada dos aparelhos partidários em Portugal.”

Sendo o mote deste artigo de JPP a mais que provável renúncia de Carmona, a essência do texto centra-se na caracterização das bases dos partidos, que influenciam decisivamente as agendas políticas na prossecução dos seus interesses mesquinhos.

Mais uma vez, JPP chega à porta dos acontecimentos, espreita, relata, mas não passa à proposta de soluções que possam enxotar as moscas que ele vê a dançarem interminavelmente lá dentro. Mesmo quando franqueou a porta e lá viveu, JPP não conseguiu limpar o ambiente, e, juízo dele, ninguém o fará porque "o poder de “Carmona, Paula Teixeira da Cruz ou Marques Mendes é quase nenhum". A sua conclusão é patética, e dificilmente se entende, quando JPP invoca a insuficiência de dinheiro e poder para resolver a fragilidade do poder dos dirigentes, quaisquer que eles sejam, porque o poder pertence às moscas.

E, no entanto, é da mais elementar sabedoria doméstica que, para nos livrarmos das moscas, ou as eliminamos ou retiramos-lhes a papa. Pondo de parte, por razões óbvias, a hipótese de extermínio destas moscas que atormentam JPP, e mim também, resta a alternativa de lhes retirar o alimento que volteiam e de que se banqueteiam.

Um grande número destes pequenos políticos vivem dos ordenado pagos pelas juntas de freguesias que, nitidamente, poderiam dispensar os seus serviços. Os cargos das juntas de freguesia poderiam ser desempenhados em regime de voluntariado, isto é, sem remuneração, sendo insultuoso para a democracia o argumento de que, com ela, o voluntariado não funciona. Se o desempenho dos cargos na juntas fosse realizado de forma graciosa, certamente que muitas moscas desarvoravam. Algumas outras, provavelmente, entrariam, mas menos ciosas. A moeda fraca daria lugar à moeda forte.

Com as vereações dos municípios, a questão é em tudo semelhante. Faz algum sentido que um vereador seja executivo da função financeira quando nos quadros de qualquer município existe um director com essas atribuições? O mesmo se pode dizer quanto à função pessoal. E quanto às funções técnicas. A gestão municipal deveria competir a uma comissão executiva presidida por um vereador-delegado eleito pela vereação, e pelos directores dos municípios, competindo à vereação as atribuições sensivelmente equivalentes às dos administradores não executivos das sociedades anónimas.
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Sei bem que estas ideias soam de forma muito estranha aos ouvidos de muitas pessoas: uns porque nunca pensaram nelas, outros porque pensaram e se arrepiaram. São estes últimos, as moscas que atormentam JPP. E a mim também.

1 comment:

A Chata said...

Parece-me que o que se está a passar é que, com o desemprego a subir, as moscas cada vez são mais e a "papinha" começa a escassear.

Quais os empregos, que não sejam Operador de Call Center (400 Euros salário e contractos renovaveis de 3 ou mesmo 1 mês) ou empregado de restaurante (se não houver brasileiros disponíveis), que estão disponíveis para recem-licenciados?

Mosca!

Trabalho qualificado (e não qualificado), neste momento, é feito na India e mão-de-obra é coisa que abunda por lá.

Depois de ler Made in India e alguns artigos sobre a deslocalização de emprego comecei a ter a noção que vai ser muito dificil limparmos a casa.