Wednesday, January 19, 2011

REPETE, REPETE, REPETE

Também me repito.

No mesmo dia em que o Secretário de Estado do Tesouro considera a emissão de dívida pública a um ano outro sucesso (4,029%), e que o governo se encontra no rumo certo, a Moody´s ameça voltar a cortar o rating de Portugal.

O Governo congratula-se com o cumprimento do objectivo de redução défice em 2010 (7,3%) mas tal facto parece não sensibilizar minimamente as agências de rating que continuam a não acreditar que Portugal possa safar-se pelos seus próprios meios uma vez que a evolução da economia previsto não permitirirá a inversão do crescimento imparável do endividamento externo. Em resumo: Apesar das medidas de austeridade já adoptadas, a Moody´s considera que, sem outras intervenções, Portugal não se safa. 

Percebo a ameça da Moody´s, e tenho-o dito aqui repetidamente: As taxas de juro que Portugal tem estado a aceitar conduzem à asfixia completa um dia destes. A manta não pode continuar a enrolar-se indefinidamente. De sucesso em sucesso na emissão da dívida (chamam-lhe venda de dívida, curiosa venda que tem de ser paga pelo vendedor) a dívida não pára de subir, sobrecarregando insuportavelmente o futuro já a médio prazo.

Ontem houve confrontos entre a polícia e activistas sindicais.
O único meio de ultrapassar estes confrontos passa pela constitucionalização dos limites da dívida pública e dos aumentos do funcionalismo público. Já o referi aqui neste caderno de apontamentos várias vezes. Mais tarde ou mais cedo, a convulsão social que a actual situação propicia, obrigará ao reconhecimento daquilo que é, há muito tempo, transparente.

Acerca disto, os candidatos à presidência da República, têm dito nada.

2 comments:

António said...

Sucesso, vender coisasboas e baratas?
Qual quê?
Sucesso é isto:

O Diário do Professor Arnaldo - A fome nas escolas
Publicado em 19 de Novembro de 2010 por Arnaldo Antunes

Ontem, uma mãe lavada em lágrimas veio ter comigo à porta da escola. Que não tinha um tostão em casa, ela e o marido estão desempregados e, até ao fim do mês, tem 2 litros de leite e meia dúzia de batatas para dar aos dois filhos. Acontece que o mais velho é meu aluno. Anda no 7.º ano, tem 12 anos mas, pela estrutura física, dir-se-ia que não tem mais de 10. Como é óbvio, fiquei chocado. Ainda lhe disse que não sou o Director de Turma do miúdo e que não podia fazer nada, a não ser alertar quem de direito, mas ela também não queria nada a não ser desabafar. De vez em quando, dão-lhe dois ou três pães na padaria lá da beira, que ela distribui conforme pode para que os miúdos não vão de estômago vazio para a escola. Quando está completamente desesperada, como nos últimos dias, ganha coragem e recorre à instituição daqui da vila - oferecem refeições quentes aos mais necessitados. De resto, não conta a ninguém a situação em que vive, nem mesmo aos vizinhos, porque tem vergonha. Se existe pobreza envergonhada, aqui está ela em toda a sua plenitude. Sabe que pode contar com a escola. Os miúdos têm ambos Escalão A, porque o desemprego já se prolonga há mais de um ano (quem quer duas pessoas com 45 anos de idade e habilitações ao nível da 4ª classe?). Dão-lhes o pequeno-almoço na escola e dão-lhes o almoço e o lanche. O pior é à noite e sobretudo ao fim-de-semana. Quantas vezes aquelas duas crianças foram para a cama com meio copo de leite no estômago, misturado com o sal das suas lágrimas...Sem saber o que dizer, segureia-a pela mão e meti-lhe 10 euros no bolso. Começou por recusar, mas aceitou emocionada. Despediu-se a chorar, dizendo que tinha vindo ter comigo apenas por causa da mensagem que eu enviara na caderneta. Onde eu dizia, de forma dura, que «o seu educando não está minimamente concentrado nas aulas e, não raras vezes, deita a cabeça no tampo da mesma como se estivesse a dormir».

Aí, já não respondi. Senti-me culpado. Muito culpado por nunca ter reparado nesta situação dramática. Mas com 8 turmas e quase 200 alunos, como podia ter reparado?

É este o Portugal de sucesso dos nossos governantes. É este o Portugal dos nossos filhos.

rui fonseca said...

"Mas com 8 turmas e quase 200 alunos, como podia ter reparado?"

Trata-se de um relato que nãopode deixar ninguém indiferente. Mas também é preciso refrir que a relação alunos/professor é das mais baixas da União Europeia. Não há falta de professores.
Estão é, provavelmente, mal distribuidos.