Tuesday, October 28, 2008

O PROBLEMA MAIOR



Anda meio mundo a dizer que a crise ainda está para chegar e ninguém irá escapar, e outro meio à espera que o anunciado apocalipse não lhes bata à porta. Nada de novo, portanto. Há, pelo menos dois anos, que começaram os alertas e nada foi feito para evitar o desastre. Agora, que o sistema financeiro estoirou, a aflição volta-se para a economia real, aquela que quando começa a engasgar aumenta o desemprego, os ordenados em atraso, e os meses ficam ainda mais compridos que antes. E, pior ainda, é estar o pior ainda por chegar.
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Neste ambiente carregado, que antecede o auge das tempestades, que discutem os portugueses? Basicamente, a bola. Nem o senhor presidente da câmara municipal de Sintra, um concelho que tem mais problemas por resolver que o número de cabelos do senhor presidente autarca, abdica de continuar participar semanalmente num programa televisivo à roda da bola.
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A outro nível, muito mais restrito, discutem-se as prioridades e intensidades do investimento público, para o qual, aliás, talvez não haja poupança nem crédito. Uma bizantinisse, portanto. Esforça-se o governo a dizer que o aeroporto e o TGV são investimentos de realização plurianual e, nos próximos tempos, é o tempo de facturarem os consultores; reclama a oposição à direita a libertação de meios para o investimento privado. Qual? Ninguém sabe. Seria a oposição muito mais eficiente junto da opinião pública se fixasse as suas propostas primordialmente no desafio ao governo de pagar o Estado, nos vencimentos, as facturas que deve.
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Um dos argumentos da oposição às propostas do governo invoca que os grandes investimentos públicos irão sobrecarregar as responsabilidades das gerações vindouras, com desrespeito do compromisso transgeracional. Ora isto só será verdadeiro se os investimentos em causa não tiverem mérito económico bastante, isto é, se forem mais dois elefantes brancos a pastar na nossa paisagem desertificada. Mas, nesse caso, a questão não será de timming mas de interesse económico. De qualquer modo, os constrangimentos financeiros actuais são um bom conselheiro à reapreciação do assunto. Safam-se os consultores.
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O problema maior não é a crise financeira actual nem a crise económica que está a chegar. Uma e outra estarão digeridas dentro de um par de anos, na pior das hipóteses até meados da próxima década. E a economia portuguesa, com o atraso reactivo habitual, seguirá a tendência.
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O problema maior, para além da educação, é a energia. Num mundo com os problemas energéticos a agudizarem-se, a economia portuguesa, pela nossa actual dependência energética e baixa produtividade dos consumos de energia, enfrentará nessa dependência o maior obstáculo ao seu desenvolviento. Sem energia não voam os aviões nem correm os combóios. É no investimento em fontes energéticas próprias, na investigação dedicada à produção e à produtividade da energia, que reside o maior desafio. É também nesse campo que deveria colocar-se a discussão do investimento público.
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Para não legarmos às gerações futuras um país mais endividado e às escuras.

5 comments:

Francisco Carvalho said...

Esses donos da bola são uns bons cromos todos, só dizem patacuadas mas, ao que consta, são pagos principescamente(com o que eu nada tenho a ver. Alinham todos pela mesma cartilha política(também nada tenho a ver com isso)e são uns intectualoides chatos(mas também não sou obrigado a vê-los.

Rui Fonseca said...

Ora viva, Grande Francisco!

Por onde tens andado que tanto estás ausentado?

Pois eu lembrei-me deste livro quando li no Sábado um artigo acerca do hidrogénio como provável alternativa aos combustíveis fósseis. Li-o há uns três ou quatro anos, e a partir daí tenho-me interessado por tudo o que me passa à frente acerca do assunto.

Daí o relambório que tiveste a paciência de ler.

Abraço.

Rui Fonseca said...

Volto para acrescentar que o artigo a que me referi foi publicado no Expresso.

António said...

Boa tarde.
Mas enquanto não pomos o hidrogénio a funcionar, coisa que vai ainda demorar muito tempo, pergunto eu, que nada sei disto, o que se passa com as nossas fábricas de biodiesel.
Tanto quanto sei, a sua produção total está reduzida a cerca de 30% porque não há quem compre.
Ou antes, a galpe não compra mais que isso e agora anda a dizer aos brazucas que lhes vai comprar o biod.
Isto parece-me mais uma pouca vergonha a juntar à enorme pouca vergonha que é o mercado dos combustíveis neste país.
Só volto a chamar Portugal a esta Nação, quando a roubalheira acabar.
Por enquanto não tenho orgulho nenhum em dizer onde nasci.

Rui Fonseca said...

António,

O pessimismo é sempre mau conselheiro.

Hoje, quando toda a gente fala da crise que veio e da que ha-de vir, falar das suas causas e das suas prováveis consequências é música de realejo.

Onde é que andava tanta gente que hoje tão bem diagnostica e antes se calou?

É por essas e por outras que, por não me apetecer repetir o que toda a gente diz, que abordei a questão energética, para mim muito mais decisiva para o futuro que a crise que atravessamos.

A discussão centrada no aeroporto, no TGV e nas PME é uma discussão política de curto prazo, por mais alargados que sejam os seus períodos de realização.

Todas as civilizações tombaram por escassez de energia. Às civilizações de hoje volta a colocar-se a mesma ameaça à sua sobrevivência.

O petróleo está agora a baixar de preço. Mas vai ser uma baixa transitória causada pela crise.

Ou me engano muito ou ainda um dia haverá "mundialização" dos recursos energéticos não renováveis.

Vou escrever hoje um post acerca disso.