Tuesday, March 31, 2015

EXORCIZAR O PASSADO EM PARIS

Os franceses nunca ficaram de boa consciência com a história da colaboração com o ocupante   nazi entre Maio de 1940 e a libertação total do hexágono gaulês pelas tropas aliadas em Dezembro de 1944. Os britânicos parodiaram a resistência francesa na série televisiva da BBC "Allo, Allo", transmitida entre 1982 e 1992, um sorriso amarelo aflorou da coragem dos resistentes franceses durante a ocupação, que não apagou nunca da memória a vergonha colectiva  pela adesão e submissão da França ao regime hitleriano. 

Agora, 70 anos depois, os "Archives Nationales ( Hôtel de Soubise) estão expostos 300 documentos inéditos, testemunhos dos dias negros da França. 


Anteontem, Sarkozy, com uma carga de acusações em tribunal às costas, foi  ressuscitado pelos resultados obtidos nas eleições regionais, conquistando uma notável maioria de departamentos à custa da ameaça vislumbrada pelos resultados da extrema direita liderada por Marine Le Pen na primeira volta, no domingo anterior.

Obrigados a escolher entre Marine Le Pen e os fantasmas do passado, Sarkozy, suspeito de várias ilicitudes, e Hollande, comprovadamente inepto, os franceses deram a maioria dos votos ao ex-presidente por ausência de alternativas que não lhes invocassem a memória do passado. 

Monday, March 30, 2015

ENERGIAS CONTRÁRIAS

Para uns, as energias eólicas são um desastre iniciado nos tempos em que Guterres foi primeiro-ministro, relançado menos de três anos depois quando J Sócrates, ministro do Ambiente de Guterres, se tornou primeiro-ministro. Azar dos távoras, Passos Coelho chamou Jorge Moreira da Silva para ocupar a pasta do Ambiente, do Ordenamento do Território e Energia de Portugal, isto é, entregou a um renitente ambientalista  a faca e o queijo em matéria de opções energéticas, e a capacidade instalada, já excedente, de torres eólicas ameaça aumentar. Resultado: Porque o vento é fonte aleatória e a capacidade eólica tem de ser supletivamente suportada por capacidade instalada em centrais  de produção  programável, a factura da energia, em consequência dos sobrecustos da produção de energia eólica, irá continuar a penalizar as famílias e a contribuir para a redução da competitividade das empresas portuguesas. E porquê? Que interesses ou que fanatismos alimentam esta paixão eólica? Os interesses daqueles que andam à volta dos projectistas, dos construtores e dos instaladores das torres eólicas, e, naturalmente, dos bancos que financiam os investimentos, de rentabilidade garantida pelo Estado, na produção eólica. Estas coisas dão sempre dinheiro, muito dinheiro, a ganhar a muita gente escondida.

Para outros, o recurso aos recursos renováveis de produção de energia é condição necessária à redução da nossa elevada dependência externa de recursos não renováveis e à garantia de um ambiente suficientemente limpo, condição necessária ao desenvolvimento sustentado do turismo, o sector mais dinâmico da nossa economia. Aliás, a provar que a opção pelo eólico não é resultado de uma estranha eólicomania portuguesa está o no facto de a capacidade eólica instalada e prevista para os próximos anos estar a progredir aceleradamente em países com recursos energéticos tão diversos  como a China, os EUA (o parque Horse Hollow, no Texas é o maior do mundo), Alemanha, Espanha. 


Estes, alguns dos argumentos dos pró-eólico. Os outros, dizem estes, são pró-nuclear. Porquê?
Porque há muito que afiam o dente.


E assim vai a discussão da estratégia energética para o país: de cada meio campo a suspeição é o argumento mais rematado, à surdina, para o meio campo contrário.

Sunday, March 29, 2015

AFIRMA VAROUFAKIS

"Quando, nos princípios de 2010, o governo grego deixou de poder pagar os débitos da Grécia aos bancos franceses, alemães e gregos, manifestei-me contra o pedido de um enorme novo empréstimo que acabaria por ter de ser pago pelos contribuintes europeus. Dei três razões ..."  vd. aqui ou aqui, se preferir a tradução em espanhol.
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Quem pode discordar?
Em finais de Outubro de 2013 anotei aqui: Do que precisamos mesmo é de outra coisa
Entretanto, as circunstâncias alteraram-se, escapámos àquele segundo resgate, mas as ameaças mantêm-se, e a minha convicção é a mesma.
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ATHENS – A German television presenter recently broadcast an edited video of me, before I was Greece’s finance minister, giving his country the middle-finger salute. The fallout has shown the potential impact of an alleged gesture, especially in troubled times. Indeed, the kerfuffle sparked by the broadcast would not have happened before the 2008 financial crisis, which exposed the flaws in Europe’s monetary union and turned proud countries against one another.
When, in early 2010, Greece’s government could no longer service its debts to French, German, and Greek banks, I campaigned against its quest for an enormous new loan from Europe’s taxpayers to pay off those debts. I gave three reasons.
First, the new loans did not represent a bailout for Greece so much as a cynical transfer of private losses from the banks’ books onto the shoulders of Greece’s most vulnerable citizens. How many of Europe’s taxpayers, who have footed the bill for these loans, know that more than 90% of the €240 billion ($260 billion) that Greece borrowed went to financial institutions, not to the Greek state or its people?
Second, it was obvious that if Greece already could not repay its existing loans, the austerity conditions on which the “bailouts” were premised would crush Greek nominal incomes, making the national debt even less sustainable. When Greeks could no longer make payments on their mountainous debts, German and other European taxpayers would have to step in again. (Wealthy Greeks, of course, had already shifted their deposits to financial centers like Frankfurt and London.)
Finally, misleading peoples and parliaments by presenting a bank bailout as an act of “solidarity,” while failing to help ordinary Greeks – indeed, setting them up to place an even heavier burden on Germans – was destined to undermine cohesion within the eurozone. Germans turned against Greeks; Greeks turned against Germans; and, as more countries have faced fiscal hardship, Europe has turned against itself.
The fact is that Greece had no right to borrow from German – or any other European – taxpayers at a time when its public debt was unsustainable. Before Greece took any loans, it should have initiated debt restructuring and undergone a partial default on debt owed to its private-sector creditors. But this “radical” argument was largely ignored at the time.
Similarly, European citizens should have demanded that their governments refuse even to consider transferring private losses to them. But they failed to do so, and the transfer was effected soon after.
The result was the largest taxpayer-backed loan in history, provided on the condition that Greece pursue such strict austerity that its citizens have lost one-quarter of their incomes, making it impossible to repay private or public debts. The ensuing – and ongoing – humanitarian crisis has been tragic.
Five years after the first bailout was issued, Greece remains in crisis. Animosity among Europeans is at an all-time high, with Greeks and Germans, in particular, having descended to the point of moral grandstanding, mutual finger-pointing, and open antagonism.
This toxic blame game benefits only Europe’s enemies. It has to stop. Only then can Greece – with the support of its European partners, who share an interest in its economic recovery – focus on implementing effective reforms and growth-enhancing policies. This is essential to placing Greece, finally, in a position to repay its debts and fulfill its obligations to its citizens.
In practical terms, the February 20 Eurogroup agreement, which provided a four-month extension for loan repayments, offers an important opportunity for progress. As Greece’s leaders urged at an informal meeting in Brussels last week, it should be implemented immediately.
In the longer term, European leaders must work together to redesign the monetary union so that it supports shared prosperity, rather than fueling mutual resentment. This is a daunting task. But, with a strong sense of purpose, a united approach, and perhaps a positive gesture or two, it can be accomplished.

This is an updated and extended version of a post at yanisvaroufakis.eu.
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Saturday, March 28, 2015

A LAMPREIA JÁ NÃO É A QUE ERA

Lampreia? Não gosto. Tem um aspecto esquisito. Não. Só de a ver não me atrevo, sequer, a provar.  Nunca me arrisquei, não consigo, que queres? E aquele molho! Não sei como alguém consegue tragar uma coisa daquelas. 
O que é que há que se coma para além da lampreia? Só bifes? Bom, então traga o bife, que não seja muito duro, se faz favor.

Até há poucos anos os apreciadores do ciclóstomo eram relativamente poucos, a lampreia dava para todos, ainda que tivessem que esportular mais que o costume. De repente, por razões com que, tanto quanto se saiba, ainda nenhum académico compôs tese de doutoramento, começaram a multiplicar-se por esta altura do ano cartazes em restaurantes a publicitar que lá dentro há lampreia. Do Minho, reclamam muitos. 

Que alterações se observaram nos mecanismos cerebrais dos portugueses para esta mudança radical que transformou em delicatessen o que antes era simplesmente repugnante? Não sabemos. O que sabemos é que a procura aumentou tão desmesuradamente que logo se impôs a dúvida: de onde vem agora tanta lampreia?  E outra ainda: este súbito e acentuado aumento da procura não provocou um aumento dos preços, por quê? Muito simplesmente porque passaram a ser importadas toneladas de lampreia de França e do Canadá, pelo menos, onde a lampreia não motiva os grastónomos locais.

E é boa?
Há quem diga que é melhor, até. Mas também há quem diga o mesmo da sardinha congelada e assada em Dezembro. Gostos, são discutíveis. Mas o que é indiscutível é o facto desta lampreia importada não ter o gosto da lampreia capturada nos nossos rios. Melhor dizendo: não sabe a lampreia. Talvez por isso esteja a tornar-se tão popular.

Há gente assim:
- E de peixes, gostas? 
- Gosto.
- De qual gostas mais?
- Gosto mais de pescada, porque sabe menos a peixe.


Friday, March 27, 2015

CADA VEZ PERCEBO MENOS

Há nove dias atrás anotei aqui que não percebia a intenção dos discursos dos responsáveis da União Europeia, e nomeadamente do presidente do Eurogrupo, que publicamente confirmavam o que o Spiegel tinha divulgado: os alemães (leia-se o grupo liderado por Schäuble) estavam a preparar medidas que bloqueassem as fugas de capitais da Grécia, encerrando os bancos gregos por uns dias, aplicando a receita adoptada em Chipre.  Cf. aqui: "Cyprus Scenario possible for Greece, says Dijsselbloem".

Estranhei que medidas destas fossem divulgadas e confirmadas, uma vez que, segundo a lógica comum, elas iriam provocar novas ondas de fuga antes que fossem adoptadas. Meu dito, meu feito, lia-se menos de uma semana depois no Financial Times, aqui, que o governo grego estava a mobilizar os fundos do sistema de saúde e do metropolitano de Atenas para poder pagar as responsabilidades mais imediatas. Cf. aqui: "Athens raids public health coffers in hunt for cash". E isto porque a fuga de capitais observada nos últimos dias está a deixar os bancos gregos à beira do colapso. 

Hoje, pode ler-se no mesmo FT um artigo, vd. aqui, do correspondente do jornal em Bruxelas, que os dados conhecidos evidenciam uma corrida aos bancos perante a perspectiva de um segundo resgate. Normal, não? O que não se percebe, e não se percebe desde o início do processo de ataque à crise espoletada em 2008, é o conjunto de medidas que suscitaram a fuga de capitais dos países mais fragililizados do sul para refúgios a norte, e principalmente para a Alemanha, aumentando insuportavelmente a carga dos juros aos primeiros (fragilizados) e permitindo aos segundos (confortáveis) financiarem-se a taxa negativas. E muito menos se entende que, num momento em que decorrem conversações entre gregos e alemães, i.e., entre Tsipras e Merkel (os outros assistem), o discurso da eurogrupo empurre os gregos para o suicídio do seu sistema financeiro.

A menos que o objectivo seja mesmo esse: Correr com eles da zona euro, e depois se verá...
O desastre.
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Correl. - Greece to pay pensions ... for this month
ou
os apertos do tesouro e a indisciplina fiscal grega.

Thursday, March 26, 2015

COM QUANTOS ADVOGADOS DE DEFESA CONTA RICARDO SALGADO?

"A supervisão, se calhar, também devia ter visto mais cedo ... ", disse ontem, vd. aqui, a ministra na última sessão da CPI ao caso BES.

Há desde já, em resultado do que se ouviu durante as sessões púbicas da comissão parlamentar de inquérito ao caso BES, várias conclusões que legitimamente se podem retirar. Uma delas foi a evidente, e já implícita ou explicitamente admitida pelas partes,  descoordenação entre os supervisores envolvidos na resolução das questões colocadas pela erupção da falência do GES, uma vez falhada, pelos mesmos,  a sua prevenção: o Banco de Portugal,  a Comissão de Mercado de Valores e, em certa medida, a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões. 
E a ministra?

A ministra, se calhar, não fez o que devia. Um se calhar que só pode significar certamente, porque não é admissível que a ministra tenha dúvidas acerca dos flancos abertos pela descoordenação observada entre os supervisores ao longo do processo. Viu o que toda a gente viu e, no mínimo, deveria ter oportunamente intervindo no sentido de concertar a coordenação que a complexidade exigia. Com a preocupação de sacudir a água do capote, a ministra acaba por dizer o que deveria calar. A quem aproveita esta escaramuça mesquinha entre forças (incompetentes) que deveriam estar alinhadas do mesmo lado?

A Ricardo Salgado, obviamente. 
Se as inabilidades dos polícias não justificam os actos dos criminosos, a estes aproveita sempre a oportunidade de esgrimirem em juízo, se lá chegarem, com as contradições nos depoimentos dos guardas de serviço.

Wednesday, March 25, 2015

O PAPEL DE CARLOS COSTA

A avaliação do desempenho do sr.  Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, está longe de ser consensual mas serão, relativamente, raros aqueles que lhe baterão palmas. O caso BES seria em qualquer caso um grosso bico de obra para quem tem de tomar decisões em território minado mas C Costa mostrou-se tão titubeante a lidar com as manobras ilícitas cometidas no BES como o seu antecessor tinha abordado as perpetradas no BPN, no BPP, ou no BCP. Conceda-se-lhe como atenuante, na comparação com Constâncio, o facto de terem sido mais intensas e prematuras as suspeitas das moscambilhas de Oliveira e Costa e sua trupe do que as que antecederam as evidências das praticadas por Ricardo Salgado e sua corte; considere-se, por outro lado, a agravante de os crimes no BES terem sido antecedidos pelos crimes de natureza idêntica cometidos no BPN, no BPP e, em alguma medida, no BCP. 

Ontem o sr. Carlos Costa foi ouvido na CPI ao caso BES, e começou por ler um extenso texto que pode ser lido aqui : "Intervenção Inicial do Governador Carlos da Silva Costa na Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão do BES e do GES, ao processo que conduziu à aplicação da medida de resolução e às suas consequências, nomeadamente quanto aos desenvolvimentos e opções relativos ao GES, ao BES e ao Novo Banco". No essencial, o governador reafirma neste comunicado o que já se sabia dos seus argumentos de suporte das decisões que tomou. Acrescenta, contudo, como mais valia algumas propostas - ponto III . Lições para o futuro - de medidas que, em seu entender, devem ser tomadas para prevenir que voltem a repetir-se casos como o BES ou parecidos. Propostas que não perdoam a inevitabilidade de lhe perguntar por que é que só aprendeu tais lições agora.  

Lido o comunicado, as perguntas dos deputados centraram-se em larga medida na discussão das eventuais responsabilidades do Novo Banco no reembolso do papel comercial da Rioforte, vendido aos balcões do BES sendo óbvias as tentativas politicamente correctas dos membros da CPI, incluindo uma intervenção final do presidente da Comissão no mesmo sentido, de obter de Carlos Costa um compromisso público de atendimento às reclamações dos investidores logrados pela falência da entidade emitente, e única legalmente responsável pelo reembolso, a Rioforte. Carlos Costa resistiu, bem, e explicou porquê.

Ricardo Salgado está, obviamente, à espreita de todos os deslize do BP ou da CMVM que abram brechas legais por onde ele possa passar da condição de (eventual) arguido e culpado à de acusador e vítima. O reembolso, não legalmente suportado, do papel comercial da Rioforte pelo Novo Banco cair-lhe-ia como sopa no mel.

Tuesday, March 24, 2015

SE ELE CANTASSE, TALVEZ NÃO GAGUEJASSE*

O sr. Carlos Tavares, presidente da CMVM, e aplaudido cantor amador quando enche o peito, está a depor desde as nove horas da manhã de hoje numa segunda volta perante a CIP ao caso BES. E é enervante ouvi-lo: outra vez inseguro, titubeante, trémulo na voz e na expressão, incapaz de dar respostas convincentes às perguntas que os deputados lhe fazem mesmo quando nos apercebemos que é muito verosímil o que diz ou muito pertinente o que propõe. Parece-se com o aluno que presta provas sobre matéria que colou na memória apressadamente na véspera. Como é que este homem que assumiu diversas responsabilidades políticas, incluindo a de ministro da Economia, pode agora mostrar-se tão pusilânime quando responde sobre actos e factos que não lhe deveriam impor a mínima hesitação nas respostas?

"A iliteracia financeira dos pequenos investidores mas também dos bancários (que venderam o papel comercial aos balcões do BES) está também na origem do que se passou", disse Carlos Tavares, repetindo um discurso obtuso com que se refugiam os principais responsáveis pelos escândalos financeiros que têm acontecido, e nada garante que não estejam a acontecer neste exacto momento. Se a CMVM deu luz verde à divulgação do prospecto de colocação do papel comercial do GES que iludiu os investidores e, pelos vistos, até os vendedores bancários, ou não analisou o seu conteúdo ou não entendeu o que leu, dando prova pública de uma intolarável "iliteracia financeira" por parte da CMVM ou de um laxismo criminoso.

Pergunta-lhe um deputado: Quem é que nos garante que, neste momento, não estejam a ser realizadas nos bancos operações do tipo daquelas que aqui estamos a analisar?
Responde Carlos Tavares: Temos de confiar nos bancos onde colocamos os nossos depósitos, não podemos colocar-nos numa posição de sistemática desconfiança do sistema. 
Mariana Mortágua comentaria pouco depois: "de todas as pessoas e instituições as que deveriam desconfiar dos bancos são a CMVM e o Banco de Portugal. Aliás fazem-no (deveriam fazer) para que todos os outros possam confiar. Não parece que a confiança seja um princípio de regulação. Temos de encontrar os encaixes institucionais que não depender da confiança".
Comenta Tavares: Eu não disse isso, senhora deputada.

Pois não.

Se Ricardo Salgado mente, mente convictamente. Os Carlos Supervisores gaguejam mesmo se são sinceros.
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*Por que o gago não gagueja quando canta?

Monday, March 23, 2015

DOUTOR ESTRANHO AMOR

Putin, entalado entre as sanções económicas do ocidente e a queda brutal dos preços do petróleo, sem alternativas para inverter a consequente depressão económica e o descontentamento popular, precisa de uma forte ameaça externa para excitar o fervor nacionalista, e, deste modo,  sustentar -se como czar da grande mãe russa. A receita é antiga mas funciona sempre.  Todos os ditadores se alcandoraram ao poder apontando para um inimigo, real ou inventado. Mesmo em democracia, o inimigo externo é muitas vezes factor de uma coesão interna que,  de outro modo, se esfarelaria. E se a história da humanidade também se conta pelo caudal de sangue ininterruptamente derramado ao longo dos milénios em nome de deuses ou de interesses desconhecidos, a partir do momento em que as armas inventadas atingiram o grau de potencial apocalíptico, a sobrevivência de toda a humanidade pode estar dependente do humor de um ditador enlouquecido.

Stanley Kubrick parodiou em 1964 aquela possibilidade de extermínio extremo da humanidade - Dr. Strangelove (Or: How I Learned to Stop Worring and Love the Bomb) -, já em período de Guerra Fria, e o episódio ficcionado foi recentemente relembrado por John Sawers, até há pouco tempo chefe dos serviços de inteligência exteriores britânicos (M16), numa conferência dada no mês passado no King´s College de Londres. Sobre o assunto, o El País de hoje publica um artigo - Teléfono Rojo: muy malas notícias - que mereceria ser lido e compreendido por todos os terráqueos em geral, e pelos senhores do mundo em particular, se o entendimento dos primeiros fosse suficiente e os umbigos dos segundos não lhes enviesassem o raciocínio.


Sobre o mesmo tema o Financial Times publicou recentemente   dois artigos reveladores das actuais intenções de Putin: ontem, Russia delivers nuclear warning to Denmark, no dia 12 deste mês, Sweden sent troops to Baltic island amid Russia tensions.

Sunday, March 22, 2015

A DESCONSTRUÇÃO EUROPEIA

A construção europeia assemelha-se a um daqueles edifícios embargados, algumas paredes por levantar, o telhado meio coberto, sujeitos à erosão dos ventos e das chuvas, em risco de soçobrar perante um vendaval mais forte. As inquietações gregas têm levado muitos politólogos e outros com   devoções ou ofícios aparentados a presumirem que uma eventual saída da Grécia da zona euro e, por tabela, da União Europeia desequilibrará irremediavelmente as fundações do projecto e atirará a médio prazo com o conjunto ao chão. 

Não penso que o Grexit venha a acontecer. A Grécia ocupa uma posição geoestratégica por demais determinante no jogo político de influências entre o ocidente e o leste para ser deixada à deriva à procura do abraço de Putin ou de outro qualquer czar russo no futuro. Por outro lado, qualquer retoma de desenvolvimento da construção da união europeia não pode abstrair-se da localização das raízes mais profundas da civilização ocidental sob pena de lhe vir a faltar sustentação histórica suficiente. Se a queda do império grego de Bizâncio no sec. XV e a submissão dos gregos ao domínio turco otomano durante 350 anos lhe induziu traços indeléveis de uma cultura diferente, e se o Grande Cisma da cristandade os tinha voltado para leste, a unidade europeia tem de fazer-se pelo reposicionamento da Grécia no seu seio e nunca pela dispensa dos gregos nessa unidade. 

Mas admitamos que, por cegueira europeia e abstenção norte-americana, que considero altamente improvável, o Grexit se consuma. Cai o edifício europeu? Cairá, mas levará algum tempo a cair, apesar da aceleração e da dimensão que os factos políticos e os actos bélicos ganharam depois do princípio do século passado. E, no entanto, as ameaças de desmoronamento do edifício europeu são agora mais fortes que nunca. Hoje, os franceses votam na primeira da ronda das eleições locais que, muito provavelmente, confirmarão o alargamento da presença da FN de Marine Le Pen em todo o hexágono francês. As sondagens apontam para 30%, que se vierem a ser confirmadas, ou até superadas, nas urnas colocarão Marine em posição de conseguir chegar ao Eliseu dentro de dois anos.

Se isso acontecer, e pode acontecer, a União Europeia será submetida a um safanão de consequências imprevisíveis e, em qualquer caso, o projecto europeu concebido pelos fundadores será radicalmente alterado. A eventual separação da perna grega tornará a União Europeia perigosamente coxa; a saída do braço britânico tornará até ridícula a sua designação; a saída francesa será um ataque ao coração europeu. Entretanto, terá aumentado a força centípetra a leste, a Hungria já está há muito tempo mais lá que cá.

Merkel e os seus pais fiéis seguidores têm agora menos de dois anos para reforçar o edifício e colocá-lo  à prova de qualquer sismo anti democrático que faça voltar o fantasma da guerra de novo ao território europeu. A actual ebulição grega, se não tiver outro mérito, poderá pelo menos obrigar os europeus à inevitável opção entre a subsistência dos nacionalismos que lhe minam a unidade ou a federação mínima que, de forma suficiente, garanta a solidariedade que cimente uma unidade democraticamente sufragada.

A BESTA E O SOBERANO


Na quarta-feira passada a direcção do Museu de Arte Contemporânea de Barcelona decidiu cancelar uma exposição internacional colectiva - A besta e o Soberano - por causa de uma escultura da artista austríaca Inez Doujak, considerada demasiado polémica: representa o rei Juan Carlos de Espanha a ser cavalgado por Domitília Barrios de Chúngara, uma activista sindical e feminista boliviana, já  falecida em 2012. O conjunto alegórico remete, muito obviamente, para o imaginário das sequelas da brutalidade espanhola no continente sul americano há séculos atrás mas também, certamente, para a fogosidade do rei garanhão reformado.

Após o cancelamento, levantaram-se fortes protestos em nome da liberdade de expressão, e a exposição foi reaberta ontem.

Mais informação: leia aqui.

Saturday, March 21, 2015

A MELHOR PREPARAÇÃO DE SEMPRE DOS JOVENS PORTUGUESES

"Milhares de estudantes partiram ontem para Espanha, onde vão festejar o final do ensino secundário. Como vem sendo hábito, nas fronteiras terrestres de Vilar Formoso, Caia e Vila Real de Santo António, as autoridades portuguesas e espanholas passam a pente fino os autocarros e as malas para evitar que os jovens levem consigo substâncias ilícitas. ... "É uma altura preocupante, porque temos grandes aglomerados de jovens e já assistimos a episódios marcados por abusos de álcool e outras substâncias", destaca João Goulão, presidente do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD). Por outro lado, "há uma apetência deste grupo etário para a novidade e estas novas drogas têm potencial de atração". - cf. aqui

Friday, March 20, 2015

ANDAM RATOS PELO SÓTÃO

Ricardo Salgado pode estar a ocultar factos relevantes, distorcer outros, fugir à verdade. Mas é altamente improvável que não seja dele o testemunho mais próximo da verdade prestado à CPI acerca da carga crítica que derrubou o "conglomerado misto" a que presidia: "Bava, Granadeiro e Oi sabiam que havia dinheiro da PT em dívida do GES"cf. aqui. "Os accionistas da Oi sabiam? "Sabiam e depois desmentiram. Tanto sabiam que elas estavam nas contas do prospecto do aumento de capital da Oi". Mas, por outro lado, sabendo os accionistas da Oi da aplicação em dívida de sociedades do GES, que acabaram por falir, por que razão não impediu que os termos da combinação de negócios entre a brasileira e a PT fossem revistos, prejudicando a portuguesa? 

A resposta  de Salgado - "estava demasiado centrado nos problemas do BES " - é claramente inconsistente porque a aceitação da redução da participação da PT SGPS, onde o  GES detinha a posição relativa mais relevante, sancionou de facto o argumento dos brasileiros - que invocaram  desconhecimento do empréstimo como razão bastante para rever os termos do acordo reduzindo as participações iniciais - um argumento que Salgado refuta, invocando o prospecto do aumento de capital da Oi, mas depois não suporta com a posição tomada na assembleia de accionistas que aceitou a redução da participação portuguesa.

Há nestes jogos de sombras em que se têm envolvido os protagonistas da mais intensa série de crimes financeiros e de corrupção alguma vez praticada em Portugal, envolvendo banqueiros, políticos e ofícios correlativos, um persistente encobrimento dos comparsas menores: sabemos, por exemplo, que Oliveira e Costa é cabeça de cartaz de uma trupe que continua impune e é inacreditável que tenha sido protagonista isolado; sabemos que José Sócrates é preso preventivo por eventuais crimes que não pode ter executado apenas em dueto com Carlos Silva, mas desconhecemos os executantes, a Procuradora Geral da República afirmou há três semanas atrás que "há uma rede que utiliza o aparelho de Estado e da Administração pública para concretizar actos ilícitos, muitos na área da corrupção". - vd. aqui - e mais não disse, pelo menos por enquanto.

Na obscuridade em que se desenrolou a ainda incompreensível subjugação da PT SGPS aos seus parceiros da Oi que interesses cruzados, ainda por revelar, beneficiaram aqueles que entregaram a PT aos brasileiros por tuta-e-meia e deram, com a mesma cajadada, o golpe final no GES?

Thursday, March 19, 2015

MUDANDO DE ASSUNTO


Acrílico sobre papel colado em tela
121x152 cm 
 Vendido por 180 mil euros num leilão em Lisboa

Wednesday, March 18, 2015

NÃO PERCEBO

Ontem, o sr. Jeroen Dijsselbloem, ministro holandês das Finanças e presidente do Eurogrupo admitiu publicamente que, estando a Grécia à beira de ficar sem dinheiro e ter de pagar 350 milhões de euros ao FMI até depois de amanhã, os alemães estarão a pretender que aos gregos seja administrada a receita imposta a Chipre: fecho dos bancos e controlos de capital, com o suspeito objectivo de um corte nos depósitos a favor das finanças públicas gregas, ainda que as razões avançadas sejam relacionadas com um terceiro resgate. A notícia tinha sido avançada pelo Spiegel e as declarações de Dijsselbloem  instantâneamente publicadas em todo o mundo. Vd., p.e., aqui e aqui ou aqui.

O que é que faz um grego ao ouvir estas declarações, se tiver dinheiro que valha um salto? Salta.
Só não saltarão os que já saltaram ou não saltam porque têm a perna demasiado curta. Ainda há dias, e na sequência da expectativa da vitória do Syriza noticiaram os media uma fuga maciça de capitais, depois reforçada com a confirmação da vitória e a constituição de um governo heterodoxo, segundo os padrões ocidentais. 

Não percebo como se admite publicamente uma acção destas que, obviamente, terá imediatamente espoletado um movimento que pretende vir a evitar. Se a intenção é proceder a um haircut dos depósitos e fundos guardados pelos bancos, o governo grego tem sempre a possibilidade de, se for compelido a exercê-la, a impor essa decisão sobre os fundos a atingir registados nos bancos, p.e, no   início deste ano. Afinal o confisco não é uma forma de prepotência menor que a retroactividade das leis. Anunciando esta hipótese, muito grego estará a esta a hora a coçar a cabeça lamentando-se de não se ter  decidido há mais tempo. Claro que terá de pagar por isso: as taxas pagas por bancos em países de baixo risco (a Alemanha é já há muito tempo a ganhadora destas encrencas em que ela mesma lidera)  são, toda a gente sabe isso, negativas. Cerca de 2,2 biliões de euros de dívida pública já pagam, vd. aqui, taxa de juro negativa. Portugal emitiu hoje 1250 milhões a uma taxa, vd. aqui, abaixo de 0,1%.

Por outro lado, ou do mesmo lado?, o FMI diz, vd. aqui,  que "a Grécia é o país mais incapaz de se ajudar em 70 anos de história". Com ajudas destas como pode a Grécia pagar até depois de amanhã 350 milhões do que deve ao FMI.

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Correl. - Casal alemão pagou a sua "parte da dívida" à Grécia por danos da II Guerra

Tuesday, March 17, 2015

VAN GOGH EM MONS


Em 1990 o Museu Van Gogh de Amsterdam celebrou o centésimo aniversário da morte do genial artista com a exposição do maior acervo até então reunido das suas obras. A afluência de público excedeu todas as previsões e, se bem me recordo, o período inicialmente previsto foi largamente ultrapassado. 

Este ano, é em Mons, uma pequena cidade belga, designada capital da cultura europeia em 2015, que serão expostas 160 obras do grande impressionista holandês por ocasião do 125º aniversário. A notícia vem aqui, no El País de ontem e vale uma leitura.

Em 1881, ano em que desenhou Café au Charbonnage, o seu desenho mais antigo conhecido,  Van Gogh declinou a intenção de se tornar pastor protestante evangélico e decidiu dar lugar à sua vocação de artista. Admirador de Jean-François Millet, replicou em desenho, ainda nesse ano, as pinturas "Angelus" e " O semeador" do artista romântico francês. A primeira grande obra de Van Gogh - "Os comedores de batatas" viria a ser criada quatro anos depois. 

Os comedores de batatas (1885)

 

Monday, March 16, 2015

MESTRES MANHOSOS

O El País publicava ontem, aqui, um artigo garantindo que a banca quer aumentar o nível de literacia financeira dos espanhóis, mal posicionados num grupo de 18 países, que não incluiu Portugal, segundo um estudo do PISA, disponível aqui.

Depois das surpresas com que muitos banqueiros aterrorizaram os seus clientes e que, em muitos casos,  forçaram o saque dos bolsos dos contribuintes, os senhores banqueiros descobriram que  a culpa dos seus actos perversos deve ser atribuida à ignorância em matéria de finanças daqueles que confiaram neles. E que, portanto, há que educá-los!

Curiosamente, o mesmo diário espanhol dá conta que, vd. aqui, o Banco de Madrid, uma filial da Banca Privada d´Andorra, suspendeu hoje o levantamento de depósitos e outros fundos, na sequência de o BPA ter sido acusado pelos EUA de veicular o branqueamento de capitais destinados ao financiamento do crime organizado.

Acerca deste mesmo assunto anotei apontamentos neste caderno, além de outros, aqui, aquiaqui.

Sunday, March 15, 2015

VALKYRIE OCTOPUS

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Joana de Vasconcelos
Casino de Macau

Até onde vais, Joana?


Saturday, March 14, 2015

COSTA, LISBOA E BENFICA

Quando o então primeiro-ministro Guterres precisou de um voto para fazer passar na AR o rectificativo ao OE 2001 foi comprá-lo a Ponte de Lima: "Eram 13.40 do dia 28 de Novembro de 2001 quando o segundo Orçamento rectificativo foi viabilizado. O PS não tinha maioria, mas Daniel Campelo, deputado independente (já em ruptura com o CDS na sequência de ter votado com os socialistas no Orçamento do "Queijo Limiano") acabou por viabilizar esta alteração ao abster-se" - vd. aqui

Hoje noticia o Expresso que "o PS tem em marcha um plano B para governar a capital sem os votos dos Cidadãos por Lisboa (CpL), liderados por Helena Roseta, decisivos para a maioria na Assembleia Municipal, ... que prometem votar contra a isenção de taxas urbanísticas em dívida ao Benfica. Para dispensar a srª. Roseta, o sr. António Costa está a (ou mandou) negociar com o MPT, o partido em que se fez eleger, para depois abandonar, o eurodeputado o sr. Mourinho e Pinto, contando ainda com o apoio de um pseudo independente que preside ao Parque das Nações. O voto emepetista é incomparavelmente mais intragável que o voto limiano.

Que contrapartidas vai receber o sobrante deputado do MPT não sabemos, mas sabemos que a persistência do sr. António Costa em oferecer benefícios ao Benfica não pode ter outro objectivo se não o de comprar a seu favor os votos dos benfiquistas nas próximas eleições. Se a concessão em causa estivesse protegida por lei por que razão teria de haver uma decisão política dos orgãos municipais? Bastava que os serviços (supostamente) competentes analisassem a pretensão benfiquista, olhassem para a lei, e fizessem proposta em conformidade para aprovação superior.

Pretende assim, o sr. António Costa ultrapassar, por via esconsa, as observações pertimentes que os primeiros suportes  lhe colocaram, talvez inesperadamente, no caminho. Se for essa a sua tácticta como putativo primeiro-ministro, a de mudar de parceiro conforme as circunstâncias ou as restrições das leis, continuaremos entregues à inimputabilidade do regabofe em que participam o futebol,  a construção civil e os políticos.  

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Correl .- (19/3) - Proposta de isenção de taxas ao Benfica não cumpre a lei