Sunday, September 30, 2012

ESTÁ TUDO DOIDO?

A cena vem detrás mas ganhou outra velocidade nos últimos tempos com a reentrada no palco da famigerada redução e aumento da tê-esse-u. A histeria à volta da tsu varreu tudo quanto antes ocupava a ribalta e dominou a plateia política. O ministro das Finanças, ao tirar da manga a simultânea do aumento para empregados e redução para empregadores, tinha apostado numa jogada de alto risco. Cairam-lhe em cima, impiedosamente, uns e outros. O primeiro-ministro, que só se deve ter apercebido da peça quando viu o mar mais alto que a terra, tomou a decisão politicamente mais correcta de retirar a proposta e ir à procura de outro caminho, que não poderá deixar de ser, a todos os títulos, desgastante, sobretudo se, como vem sendo habitual, for imposto apenas aos mesmos de sempre.
 
Um ex-ministro das Finanças, filiado do principal partido que apoia o Governo afirmou que o primeiro-ministro não estava preparado para o desempenho do cargo, a ex-ministra da mesma pasta, anterior presidente do mesmo partido,  voltou a repetir o que vem afirmando há tempos - o prazo para consolidação é curto e o programa de reformas incumprível dentro dele -, para o ex-ministro, quanto mais alargado for o prazo mais difícil se torna desatar o imbróglio. Dois actores para dois discursos vezes sem conta declamado por vários coros à esquerda e à direita.
 
É no meio desta encenação surrealista, onde ao fundo passam os manifestantes convocados por quem lhes dá corda mas não sabe, nem quer saber, para onde os conduz, que um terceiro filiado do partido maioritário, de qualificações e méritos mais reconhecidos lá fora que cá dentro, eminência que pretendiam parda, volta a entrar na loja e partir a loiça: a proposta de redução e aumento da tsu era uma ideia genial e os empresários portugueses que a rejeitaram são ignorantes. Um escândalo.
 
Está mais que provado que o professor Borges não tem a mínima capacidade de adaptação à carreira política, que exige dissimulação, demagogia e sangue frio. Talvez por razões de índole pessoal, dos mais respeitáveis, o professor Borges, para além da sua manifesta inabilidade para se mover em espaços politicamente minados, deve andar azedo. Mas disse uma enormidade inconcebível capaz de mobilizar contra ele a fina flor da inteligência portuguesa?
 
Vejamos: Borges rematou a sua polémica intervenção afirmando que quem entende que " o programa de ajustamento se faz sem apertar o cinto estará um bocadinho a dormir". Não estará. Todos quantos, e são muitos, vêm os consumos e os lucros inerentes a cairem, discordam e aproveitam a falta de jeito do professor Borges para o desancar.*
 
A questão do ajustamento, em última análise a questão da recuperação  do orgulho há muito perdido de ser português, não se resume, longe disso, à redução dos salários como forma de ganhar competitividade e sustentar o equilíbrio da balança de pagamentos, mas também passa por lá. Aliás, está a passar,e só não vê quem não quer ver ou é curto de vista.
 
Mas não chega, nem com mais tempo, como advoga a ex-ministra nem com menos tempo, como friamente defende o ex-ministro. Porque a carga de juros é insuportável e não para de parir dívida que, por sua vez, gera mais juros. Por que é que não se desata o nó górdio pegando também nesta ponta decisiva? Até quando continuará troica a fingir ignorar as evidências com a complacência lorpa dos políticos?
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* Correl.- aqui

Saturday, September 29, 2012

O JOGO DA CABRA CEGA

A juíza-presidente, que vai  julgar os crimes de manipulação do mercado e falsificação de contas que alegadamente os ex-BCP Jardim Gonçalves, Filipe Pinhal, António Rodrigues e Christopher Beck cometeram entre 2002 e 2007, tem cábula para perceber os termos da gíria do sector, porque, assumiu ela, não percebe nada de banca,  lê-se no Expresso de hoje.
 
Em Off, acrescenta o semanário, a cábula servirá à magistrada presidente para descodificar siglas como CFO (chief financial officer, administrador da área financeira), CEO (chief executive officer, presidente da comissão executiva) ou UBO (último beneficiário da offshore), termos que deixam em água a cabeça da juíza.
 
O julgamento esteve adiado por um ano e os crimes começam a precrever já no próximo ano. Depôs a juíza: "pedi exclusividade para fazer este julgamento e não é que queira sobrepor-me aos outros processos, mas tenho um problema que é a prescrição", quer "dar gás ao processo para tornar o julgamento o mais célere possível" e "não abdica de três sessões por semana para evitar prescrição dos crimes".
 
Crimes, disse ela, que disse que não percebe nada de banca.
Mas, como é possível, se a Meretíssima não vê um UBO pela frente por mais sessões que convoque?

Friday, September 28, 2012

FRANCAMENTE MAUS

Uma lista das 11 mil empresas que receberam do Estado benefícios fiscais em 2010 , é, sem surpresa, liderada pelo pelotão das ancoradas na Zona Franca da Madeira, que, só à sua conta, abocanha a parte de leão dos 1,3 mil milhões atribuidos. A questão das vantagens/desvantagens da ZFM têm sido objecto de intervenções sem conta, e, ainda recentemente, Miguel Frasquilho se batia no Negócios pela continuidade dos benefícios fiscais para a manterem competitiva. Para o cidadão comum, a ZFM é uma nebulosa onde é possível descortinarem-se as mais diversas suposições de interesses obscuros. Uma ideia clara e uma conclusão independente do saldo entre custos e benefícios não há. Por esta lista divulgada agora pelo Ministério das Finanças (não se compreende porque não revelou os benefícios concedidos em 2011**) sabemos parte dos custos. Pela boca do AJJardim sabemos as vantagens que ele calcula. Calcular a diferença implica uma conta que está por fazer.
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Na sétima posição da lista figura a Portucel, com 27,7 milhões de euros de benefícios, muito distanciada da imediatamente anterior, da ZFM, com 40 milhões. A concessão feita à Portucel decorre do investimento na máquina de papel instalada em Setúbal, com um forte impacto nas exportações de valor acrescentado português e criação de várias centenas de postos de trabalho. Que vantagens resultam dos benefícios fiscais concedidos à ZFM que possam comparar-se com aqueles, que são bem mensuráveis, daquela unidade industrial?*
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Depois da 7ª posição da Portucel, seguem-se mais cinco franquistas madeirenses, até aparecer outro de outra equipa mas do mesmo ramo de negócio na 13ª posição: o BPI, com 17 milhões. Seguem-se mais nove da brigada da Madeira, e o 23º. lugar é da Volkswagen Autoeuropa (7,9 milhões), em 24º., a PT com 7,4 milhões, depois outra offshore e em 25º. lugar a Celbi com 7,3 milhões. Depois de mais cinco offshores, a Secil, 32ª. com 5,7 milhões. À 33ª, Lactogal, com 5, 6 milhões, seguem-se mais quatro offshores e a 39ª posição é do Banco Comercial Português, com 4,9 milhões. E até à 50ª posição, a lista é dominada por offshores.

Resumindo: Num país onde a entrada na zona euro, flagrantemente, favoreceu as empresas não sujeitas à concorrência externa, os benefícios fiscais, com raras excepções (Portucel, Volkswagen, Celbi, Secil) favoreceram o sector financeiro e as fugas ao fisco. Que capacidade de crescimento sustentável e de emprego garantiram tantos e chorudos benefícios fiscais concedidos à ZFM?

Onde está ele? Onde estão eles? Que resultados obtivemos?
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* Alguns dirão que a comparação não é pertinente porque, no caso dos benefícios fiscais à ZFM, as alternativas são algumas vantagens ou nenhumas, mas este é um argumento ardiloso. Ardiloso porque os incentivos fiscais se devem colocar em sede própria, isto é de IRC sem direito a recurso dos expedientes que só beneficiam os mais matreiros.

** Act.- Segundo o Público de hoje (29/9) os dados referentes a 2011 foram disponibilizados ontem pelo MFinanças.( vd aqui)

Correl.- Mais de metade dos beneficios fiscais de 2011 passaram pelo offshore da Madeira

Thursday, September 27, 2012

TERRA AMANHADA

Um dia dos antigos, a ajoujar  de sol a sol.
Se fizesse as contas, a produção saía-me a, pelo menos, dez vezes superior aos preços das lojas do senhor Alexandre. Não faço, e é uma doce recordação pensar neles, orgulhosos e felizes por verem, pelo menos, esta terra amanhada.

- E não vendes nada?
- Nada. Para quê produzir para vender com prejuízo assegurado?
 
Após transformações, parte desta produção destina-se à exportação para leste e oeste, onde chegará a preços de custo de produção, transformação e transporte, imbatíveis por cima.
 
Entre o passado e o futuro, um fio de ligação fiado com pequenas coisas.

Wednesday, September 26, 2012

A CAIXA DEPENDURADA

Caixa Geral de Depósitos vai assumir perdas de 50 milhões com autoestradas em Espanha e na Grécia

É longa e escandalosa a lista das operações ruinosas enjorcadas pelos caixeiros que os portugueses têm de pagar com cortes de salários e pensões, impostos e taxas extraordinárias. Ontem foi divulgada mais uma dessas operações em que os caixeiros meteram a Caixa com objectivos obscuros. Quem é que deu ordens ou concedeu autorizações aqueles melros para financiarem autoestradas no estrangeiro e arruinarem os resultados do banco do Estado em Portugal?
 
Alguns dirão: Os bancos privados fizeram o mesmo. O que é verdade, mas que suscita uma questão que já devia ter tido resposta há muito tempo. Insisto nisto: Se a Caixa Geral de Depósitos não se distingue dos bancos privados e se limita geralmente a fazer pior que estes, para que queremos um banco do Estado?
 
Numa altura em que se ouvem novamente rumores acerca da eventual privatização da Caixa, são muitos os que saltam para o caminho, indignados, a berrar: Alto aí! A Caixa não!
 
E por que não?
 
Que vantagens têm os portugueses retirado da existência de um banco com o cadastro repleto de acções asnáticas? Desvantagens, conhecem-se muitas. Foram os caixeiros que municiaram as guerras no BCP, que geriram desastradamente o BPN nacionalizado, que emprestaram em larga escala contra garantias de barro, que enfiaram sem critério nem medida crédito na construção civil e embriagaram a economia.
 
Constou recentemente, a propósito das garantias exiguidas a Roquete, e que este se recusou a dar, que os caixeiros estão agora instruídos para se distingirem do rebanho. Mas o caixeiro-mor, que disse amen a tanta vilanagem,  quando não foi ele próprio autor das proezas, continua mantido no seu posto, acumulando funções com as de presidente da súcia de que seria suposto ter-se afastado, se alguma coisa mudou na missão da Caixa.
 

Tuesday, September 25, 2012

POR QUE É QUE NÃO SE PODEM ABRIR AS JANELAS DOS AVIÕES?

Sabe?

Com certeza que sabe. Mitt Romney, o candidato republicano à presidência dos EUA nas eleições de 6 de Novembro, não sabe.
 
Não sabe, e deu testemunho público da sua ignorância acerca de uma das mais elementares condicionantes do voo de um avião. É este senhor, multimilionário, candidato à presidência do país mais poderoso do mundo, com um mestrado pela Universidade de Harvard, ignorante de um dos mais básicos princípios da física. Até onde poderá ir a sua estruturante estupidez ou ocasional insanidade?
 
Seja como for, Romney pode ser o próximo presidente dos EUA, demonstrando que a ignorância está em progressão acelerada no domínio até do mais primordial acto democrático.
 
Veja aqui alguns vídeos desta hilariante, se não for trágica, anedota do dia. Especialmente este.

A MULHER DE JESUS

A interpretação do texto do sec II, tido por autêntico pela catedrática de História de Harvard que revelou na semana passada a tradução feita por especialistas de reconhecida competência, poderá vir a obrigar a Igreja Católica a rever a sua posição quanto à subalternidade a que votou a mulher desde a sua instituição formal?
 
A Igreja sustentou sempre a resistência das suas fundações na reacção tardia às convulsões que moldaram os caminhos das sociedades ao longo dos séculos. Quando, finalmente, reconheceu que o planeta terra era redondo ou o universo mais próximo heliocêntrico, já a ciência há mais de um século tinha posto em causa a criação divina do homem num lance instantâneo e demonstrado a evolução das espécies. Não há na história da Igreja nenhum salto abrupto a partir de uma revelação científica.
 
Não é, portanto, esperável que o reforço que este documento poderá induzir nas posições de leigos ou exegetas, favoráveis quanto à paridade da condição humana no seio da Igreja independentemente do sexo, possa alterar subitamente as convicções ancestrais da hierarquia. Essa evolução, que concederá às mulheres a dignidade teológica reservada aos homens e a liberdade de se realizarem, mulheres e homens, integralmente como seres humanos, acabará por decorrer da crescente crise vocações, um eufemismo que não significa outra coisa senão a crescente falta de capacidade da Igreja para motivar os jovens para uma carreira de sacerdócio.
 
Muito cruamente, a hierarquia da Igreja em matérias em que o sexo impere sempre preferiu fechar os olhos às transgressões aos seus tabus, mesmo quando estavam (ou estejam) envolvidos alguns dos seus mais altos dignitários. Os múltiplos processos de pedofilia, por exemplo, que têm sido notícia nos últimos anos, e têm levado à falência de algumas dioceses, não poderão deixar de ter na sua origem, na maior parte dos casos, a repressão institucional de uma parte substancial da condição humana que induz comportamentos aberrantes. Apesar destes e de muitos escândalos que habitam na sua história, a Igreja não deu qualquer sinal de mudança. Mudará agora com um documento onde consta uma alusão breve e imprecisa ao eventual casamento de Jesus? Não é crível.
 
Mudará por razões de oferta e de procura, uma perspectiva relativamente à qual a Igreja sempre manteve os olhos bem abertos. A Igreja será cada vez mais pressionada a alargar o seu campo de recrutamento de vocações num mundo onde a concorrência religiosa está a aumentar. E, por essa razão, indirectamente, talvez o tal documento favoreça os ventos competitivos de mudança .  
 
 
 
Sugestão de leitura: este artigo

Monday, September 24, 2012

O OURO DA CRISE

Quase dez por cento do crescimento das exportações este ano é resultado de vendas de ouro, segundo o INE. Nos primeiros sete meses de 2012, Portugal exportou 26.914 milhões de euros em bens. Este valor é superior em 2.193 milhões ao que se registou no mesmo período do ano passado (subida de 8,9 por cento; valores nominais). Nos primeiros sete meses de 2012, as exportações de ouro portuguesas ascenderam a 455,9 milhões de euros. Comparando com o mesmo período de 2011, Portugal vendeu mais 201 milhões de euros, um crescimento superior a 75%. Desde 2000, a evolução das exportações de ouro (em euros) foi a sguinte: 
2012 (até Julho) 445,9
2011 519,4
2010 216,4
2009 102,1
2008 33,4
2007 6,9
2006 8,5
2005 1,4
2004 1,9
2003 2,3
2002 4,5
2001 5,6
2000 9,3
 
O crescimento das exportações tem sido dos poucos indicadores que têm aliviado o quadro negro da economia portuguesa. Mas saber que dez por cento desse crescimento, este ano, é resultado de vendas de ouro, é um indicador de sentido contrário.
Porque se,
Portugal não está a exportar ouro extraído de minas. É possível que isso possa acontecer dentro de quatro anos, segundo declarações do ministro da Economia feitas há algum tempo, mas por agora não há extracção mineira de ouro em Portugal,
Não é provável que os artífices de ouro portugueses tenham subitamente ganho credenciais lá fora para um aumento das exportações de ouro trabalhado,
Não é provável que o Banco de Portugal esteja a vender ouro e essas vendas consideradas exportações, embora eu continue sem perceber a política do BP relativamente às relativamente elevadas (acredito que ainda sejam) reservas de ouro à sua guarda numa altura em que as cotações estão em alta e a dívida pública indomável,
Só há, penso, uma justificação para esta escalada nas  vendas de ouro: qualquer coisa como 10 toneladas até Julho: a venda forçada de ouro trabalhado em consequência da crise. Há muita gente a recorrer aos compradores de ouro, que já devem ter ultrapassado os seis mil, que derretem anéis, pulseiras, fios, medalhas,gargantilhas, brincos, etc., e o moldam em barras para exportação.   Vd vídeo aqui
Dez toneladas de ouro são muitos anéis, muitas pulseiras, muitos fios, muitas medalhas, muitas gargantilhas, muitos brincos. São dez mil quilos de ouro que se escaparam dos dedos de quem não poude continuar a segurá-los. Chamam-lhe exportações. 
 

Sunday, September 23, 2012

LEITURA RECOMENDADA A MENORES DE QUARENTA ANOS

  

O JOGO DA CABRA CEGA

O PGR, Pinto Monteiro, enviou recentemente ao Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) todos os elementos de que dispunha no âmbito do caso Freeport - cópia do acórdão do Tribunal Colectivo do Montijo e um CD contendo a gravação áudio da prova testemunhal produzida em julgamento -, e solicitou que se apure a eventual intervenção do ex-primeiro-ministro José Sócrates. (aqui) ... O antigo chefe de governo poderá assim defender o seu nome, após nunca ter sido ouvido em qualquer momento, quer na fase de inquérito, quer durante o julgamento como testemunha.
 
O PGR Pinto Monteito cessa funções em Outubro. Durante anos, a PGR declarou que José Sócrates não era arguido nem suspeito. Por isso nunca o interrogou, mesmo quando era público e notório que o nome do então PM estava a ser posto em causa por notícias que circulavam nos media e enxovalhado na praça pública. Sete anos depois de terem começado a surgir denúncias da imprensa portuguesa que José Sócrates alegadamente renunciou restrições ambientais, depois da intervenção do tio e primo,  (e permitiu) a concessão de licença à empresa britânica Freeport para construir o shopping Alcochete, o PGR admite as suspeitas e reabre o processo.
 
Nada disto é inédito, nada disto era imprevisível. O que é intrigante é o súbito estremunhar do PGR Monteiro - que resolveu diligenciar a situação junto do DCIAP, apesar da certidão extraída pelo Tribunal do Montijo ainda não ter chegado aquele departamento - num momento em que se esperaria que estivesse mais preocupado em arrumar as malas para sair aposentado.
 
Porquê? É mistério público.
 
 

Saturday, September 22, 2012

PORTUGAL AO NATURAL

Em Cascais, no paredão, colocou a Câmara local um conjunto de trinta e muitos cartazes publicitários, no âmbito de uma campanha de propaganda política a que chama "Orçamento Participativo".  O que é isto? Percebe-se, sem grande dificuldade, que é demagogia descarada: encomendaram os demagogos a concepção, produção, transporte e colocação do material (e a retirada um dia destes, espera-se) e convidam a população residente que vote a realização de um conjunto de pequenos projectos. Muito provavelmente, fica mais cara a propaganda que alguns dos projectos submetidos a referendo popular.
 
 
Um destes projectos, por exemplo, é o arranjo do passeio da Rua Homem Cristo! Aquilo, cuja realização, é suposto ser a mais elementar responsabilidade autárquica é condicionada à aprovação popular. E os outros passeios, e são muitos, à procura de reparação, senhores autarcas, não vão a votos?
 
Para o Estoril, está sujeito a votação a criação de um "Dog Park". Note-se que não é um "Parque para Cães", uma designação sem political appeal e que, muito provavelmente, por essa minúcia, poderia ser rejeitado pelos interessados.
 



Há já uns anos atrás, presidia na Câmara de Lisboa o inenarrável Santana Lopes, eram colocados  nas ruas, onde havia obras de reparação do asfalto, cartazes de propaganda ridícula "Já reparou que estamos a melhorar a sua rua?" . Estes demagogos de Cascais dizem agora aos papalvos: "Reparem como somos democratas".

Em Setúbal, também há anos, montaram na Av Luísa Todi um enorme e caríssimo contador electrónico decrescente do número de dias até à conclusão dos trabalhos da "Polis" prometida. Quando o relógio estava a chegar a zero e o retiraram ainda os trabalhos não tinham sido iniciados. Começaram muito mais tarde.    
 
Exemplos de demagogia à solta neste país encalacrado, num "Demagoguery park" .

Friday, September 21, 2012

AS CONTAS DO BANQUEIRO

O banqueiro Ulrich não se coíbe de dizer o que pensa, honra lhe seja.
 
Lê-se aqui que ontem disse à Reuters que, se a medida relativa à taxa social única avançar, o BPI deverá ter um ganho de 10 milhões de euros em 2013, e que a Comissão Executiva do banco quer reinjectá-lo a favor dos colaboradores do banco, da qualidade do serviço e da própria economia. Quanto é que os executivos pretendem reinjectar nos colaboradores, na qualidade do serviço e na economia, não sabemos. O que sabemos é que, contas feitas, têm 10 milhões para fazerem deles o que entenderem.
 
Mas também podemos fazer uma ideia. Comecemos pela economia. Como é que o BPI vai reinjectar na economia e quanto? Durante o primeiro semestre deste ano, o banco facturou, segundo relatório divulgado aqui cerca de 603 milhões de euros. Se fizer uma segunda parte idêntica, facturará no ano cerca de 1,2 mil milhões de euros. Admitamos que em 2013 faz, pelo menos, o mesmo. Admitamos ainda que, a reinjecção na economia de que fala Ulrich será concretizada sob a forma de redução dos preços (juros, comissões) e que, patrioticamente, lhe destina metade dos 5 milhões. Quanto se reduzirão, por este efeito, o custo dos encargos financeiros dos clientes do BPI? Quem divide 5 por 1200, encontra um balúrdio de 4,167 por mil!
 
Acrescentou o banqueiro Ulrich, além do mais, repreendendo os líderes empresariais e líderes de associações empresariais, que pensam de outro modo, que eles "deviam deixar as questões políticas aos políticos, por isso é que os elegemos", "O que está em cima da mesa é um bolo de 2.000 milhões de euros” e que “o impacto que isto terá na economia depende do que as empresas façam"
Mais:
Fernando Ulrich referiu que seria "pedagógico" outras empresas dizerem o que vão fazer com uma descida da TSU "porque ajuda as pessoas a perceber o que é que pode resultar daqui".
 
Ora, é fácil perceber, senhor banqueiro Ulrich que as empresas que se confrontam no mercado com a concorrência externa serão levadas a aproveitar a redução da TSU para reduzir os preços, ainda que essa redução seja imperceptível se as outras, as que não estão sujeitas à concorrência externa, comerem parte ou a totalidade do bolo, como se propõe fazer o BPI.
 
Por outro lado, senhor banqueiro Ulrich, o senhor sabe que aos reformados da segurança social procedentes dos sectores privados estão a ser, e vão continuar a ser, cortadas duas prestações das suas pensões de reforma, pensões que foram calculadas em bases anuais, que por cretinice máxima foram dividas por 14 e, duas delas, por cretinice absoluta, alcunhadas de subsídios ( um deles, subsídio de férias a reformados!). Mas há excepções, senhor banqueiro Ulrich. Várias. Entre as quais, os reformados bancários!
 
O orçamento geral do estado é, não devia ser mas é, um composto por dois reservatórios - receita e despesa - onde os impostos e as contribuições para a segurança social se confundem em vasos comunicantes. Os sucessivos governos têm lançado mão das contribuições da segurança social para reduzirem os défices do Estado. Contas que deveriam ser claras, são omitidas à opinião pública. O que é que isto significa? Que aos pensionistas a quem são cortadas duas prestações da sua pensão contratualizada (forçadamente contratualizada com o Estado) é imposto um grau de contribuição de austeridade superior aqueles a quem esse esforço proporcional não é pedido. Isto é, quando o banqueiro Ulrich reinjecta nos vencimentos dos colaboradores do banco parte daquilo que a redução da TSU lhe garante, está objectivamente a agravar ainda mais aquela iniquidade.   
 
Lamentável, senhor banqueiro Ulrich, além do mais,  porque foram os senhores banqueiros, de braço dado com os políticos quem cavaram o buraco em que nos lançaram.

Thursday, September 20, 2012

TOMBO MESTRE

Uma sondagem realizada pela Universidade Católica (ref aqui) mostra uma rotunda queda do PSD e uma pequena subida do PS nas intenções de voto dos portugueses. Mais impressionante, contudo, do que a queda previsível dos partidos que formam a coligação do Governo é a desesperança do eleitorado: 60% dos portugueses não vê alternativa credível ao actual Governo.

Há pouco mais de um ano, o PSD ganhava destacadamente as eleições



mas era por demais óbvio que o período do estado de graça seria curto. A situação dramática em que o país se encontrava, e da qual ainda não se desembaraçou, fazia prever que a coligação, se desobrigasse o PS de participar no esforço político de implementar as medidas que o Governo anterior tinha negociado com a troica, em pouco tempo ficaria queimada pelo tição que iria pegar.

Na altura, escrevi aqui, o que me pareceu óbvio:

Qual será o comportamento do PS, fora do Governo, se a maré alta do descontentamento saltar para a rua? O PS é subscritor do memorando (MoU) mas a aplicação deste não obedece a critérios tão objectivos que não possam provocar diferenças de interpretação e os resultados diferentes leituras logo à partida. Repare-se, por exemplo, na tão controversa redução da TSU. Quando o Governo e os partidos subscritores do MoU se comprometem a uma "major reduction" de quanto é que se está a falar? Sabemos que não se trata de uma redução pequena e gradual, como, para efeitos eleitorais, tem prégado Sócrates. Mas não sabemos quanto nem como. Só esta questão, e há dezenas delas sensíveis à controvérsia, dá para excitar a opinião pública ao rubro e corroer o governo.

Uma coligação tripartida parece, neste momento, estar fora das perspectivas dos partidos da troica, apesar de ter sido, e continuar a ser, sujerida de vários quadrantes politicos. Do meu ponto de vista, que defendo praticamente desde quando iniciei este caderno, há mais de cinco anos, Portugal, na situação de crise em que se encontra há mais de uma dezena de anos, precisa de um governo que represente a grande maioria a população. Será sempre um governo fraco o que deixar de fora a representação de quase 50% dos portugueses

PSD cai a pique mas PS não sobe

Passos é o político com avaliação mais negativa

Um pouco depois de mais de um ano do actual Governo ter tomado posse, confirma-se o óbvio.
Há muita gente, politicamente influente, que continua a rejeitar sem concessões uma solução de governo alargado. Por razões óbvias, o BCP e o BE afirmam-se contra, ainda que obtivessem dividendos. O líder do PS sente-se confortável, vê aumentar a sua popularidade e a votação no seu partido, limitando-se a defender propostas de que nem ele sabe os contornos, as consequências e as possibilidades de concretização, mas que emprenham os ouvidos dos eleitores arreliados com uma situação de que são os menos responsáveis.
 
Apesar do recente rombo, publicamente denunciado na comunicação social (uma garotice, segundo uma eminência parda) nas relações institucionais entre os dois partidos no Governo, tudo leva crer que a ruptura final, por agora, fica adiada. Mas que ela ocorrerá um dia destes, é tão certo como Portugal continuar a ver o desemprego a subir, a economia imersa, a dívida a subir e o défice  a recusar-se a ir ao sítio, e o simpático António José seguro nas sondagens.
   
 Para corrigir uma rota errática, que já vem de longe, é preciso determinação mas esta não significa auto suficiência. A redução/aumento da TSU, à volta da qual se gerou todo o charivari que monopolizou a discussão política, não parece agradar nem a empregados nem a empregadores. O aumento das contribuições dos trabalhadores corresponde, inquestionavelmente, a um aumento de impostos. Só por obsessão ideológica enveredou o PSD por uma via em que atascou o Governo. Se os compromissos com a troica não lhe permitem outra margem de monobra senão o aumento dos impostos, porque não diz isso de forma calara e concisa aos portugueses e procede como não pode (ou não sabe) deixar de proceder?

Wednesday, September 19, 2012

AS DÍVIDAS DOS RICOS

O Economist publica hoje aqui um quadro interactivo quantificando em percentagem do PIB as dívidas totais dos principais países ricos e dos países de economias emergentes. É flagrante o sobreendividamento dos primeiros quando comparado com o endividamento dos segundos.
 
Portugal, segundo os dados do Banco de Portugal e do Eurostat, em 2010 a dívida pública atingiu 138% do PIB (incluindo o sector empresarial do Estado, excluindo o sector financeiro do Estado)
e a dívida privada 280,3%. Dívida total: 418% do PIB. Quanto a dívidas, portanto, somos um país tipicamente endividado com um país rico. E esta é uma condição de que não se despega com mais prazo de ajuda externa.
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Há já bastante tempo coloquei neste caderno um Youtube de explicação da dívida, que, apesar de notoriamente simplificado e, portanto, pouco rigoroso, ainda assim contém algumas conclusões incontestáveis.
 
Vale a pena revê-lo aqui.
 
 

APANHADO, MR. ROMNEY

A divulgação de um vídeo, gravado à socapa, onde o candidato republicano às eleições presidenciais de 6 de Novembro estigmatiza 47% de norte-americanos que são, segundo ele, subsidiados pelo Estado, não pagam impostos, uma grande parte não procura emprego, e ... votam em Obama, aumentou a desconfiança em Romney mesmo entre as hostes mais conservadoras.

Romney falava a um grupo de doadores da campanha num espaço reservado e não contava que a intromissão de uma câmara pudesse ter o impacto que está ter junto da opinião pública norte-americana.
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Para além da crueza moral que as palavras do candidato republicano revelam, se é verdade que cerca de 47% de norte-americanos não pagam impostos sobre o rendimento, essa situação decorre em grande parte das isenções decididas por administrações republicanas com o intuito de beneficiar os cidadãos de baixos rendimentos (vd gráfica abaixo). Destes 47%, contudo, 28,3% pagam contribuições de segurança social e, evidentemente, todos pagam impostos sobre os consumos.

Por outro lado, uma grande parte dos eleitores mais apegados aos republicanos residem em estados onde é elevado o número daqueles que não pagam impostos precisamente porque os seus rendimentos não atingem os limites mínimos de tributação. Um tiro no pé de Mr. Romney.


Tuesday, September 18, 2012

GASPAR VAI À ORAL - REVISÃO DA NOTA

Há dias, a cinco fusos daqui, ouvi através da Internet parte da entrevista ao primeiro-ministro, dois ou três dias depois do sua comunicação atabalhoada sobre (parte, veio a saber-se depois) das medidas de austeridade para 2013, incluindo aquela que viria a polarizar as discordâncias de todos os quadrantes políticos e sociais: a redução e aumento das TSU. Nessa entrevista, quando interpelado por um dos entrevistadores sobre a posição de P Portas sobre o assunto, Passos Coelho foi peremptório: O Governo é suportado por uma coligação de dois partidos e, em caso algum, o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, que é presidente do partido parceiro do PSD na coligação, poderia deixar de ter sido ouvido sobre um assunto tão importante. Se as palavras não foram estas, seguramente que o sentido foi este. A coligação parecia estar sólida, apesar dos rumores de que acusava indícios de fracturas.
 
Concluí: Na próxima reunião do Conselho de Estado, o ministro das Finanças não vai chumbar na prova oral porque nem o primeiro-ministro recua nem o presidente da República o demite. E o ministro passa administrativamente. Enganei-me, redondamente. Portas tinha sido ouvido e tinha discordado, e Passos Coelho cometeu um erro clamoroso ao declarar publicamente que estava certo de um acordo que não existia. Portas, que já ouvi ser acusado de se ter pronunciado ao retardador, fez o que devia ter feito e deixou ao primeiro-ministro a batata quente de se desenvencilhar do imbróglio.
 
Neste momento, tudo leva a crer que o primeiro-ministro vai apresentar-se em Belém na sexta-feira com uma alternativa para ultrapassar o impasse em que o Governo se meteu. Um alternativa que dificilmente poderá deixar de passar por um aumento gereralizado e progressivo dos impostos sobre os rendimentos, uma opção que, se tivesse sido adoptada desde o início, teria poupado estas confrontações de agora e evitado muitos erros no passado.
 
Por convicções, que não são indefenidamente inabaláveis, como agora se demonstrará, aqueles que defendem a redução da intervenção do Estado na economia, opõem-se sistematicamente ao aumento de impostos, o que, reconheça-se é uma atitude consequente com as suas opções de liberalismo económico. Esquecem-se, ou não querem lembrar-se quando são eles os maiores ganhadores com as obras e serviços que o Estado lhes encomenda, que, enquanto há crédito há dinheiro, se não sobem os impostos agora sobem descontroladamente a dívida e os juros, que se traduzirão em impostos que nos engasgam amanhã. Isto é, estão a engasgar-nos agora porque nos iludimos antes.
 
Passos Coelho entendeu (mal, insisto) desobrigar o PS de empurrar a carga com que o governo anterior, sobretudo, sobrecarregou, e deixou sobrecarregar, de endividamento até ao insuportável os portugueses. Desta vez, ouviu Portas e desvalorizou, e agora está só no meio de uma conjuntura medonha. Mais uma vez a intervenção mais activa do presidente da República poderia carrilar uma situação a caminho de um descarrilamento à grega. Mas nem Passos se entende bem com ele nem também ele se entende bem com Passos.
 
Tudo considerado, a redução/aumento da TSU não deve fazer parte da prova oral de sexta-feira e haverá um aumento considerável dos impostos com que terão de pagar erros de obras megalómanas do passado, participações público privadas suportadas por pressupostos falseados, serviços sem préstimos, roubos impunes (só à sua conta, o BPN representará uns 5% do PIB), empresas públicas e municipais descontroladas, juros insuportáveis. Gaspar passará coxo na oral, e talvez Passos e Portas se entendam até ao próximo aperto da austeridura.

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Act.- Ouço parte  de um discurso do secretário de estado adjunto do primeiro-ministro reafirmando que o Governo vai manter a proposta de redução/aumento da TSU, modelando-lhe alguns efeitos junto dos trabalhadores com salários mais baixos.   

Monday, September 17, 2012

AUSTERIDURA

Com alguma surpresa ouço na rádio ao começo da tarde que Bruxelas exige mesmo a adopção das medidas de redução/aumento da TSU como condição para a libertação da tranche de 4,5 mil milhões do empréstimo intermedidado pela troica. Ou, em alternativa, outras medidas que atinjam os mesmos objectivos do défice*. Se essas medidas vão agravar  a recessão e aumentar o desemprego, tal facto, a verificar-se, é secundário segundo Merkel e, consequentemente, para a Comissão Europeia. Esta posição já tinha sido, aliás, anteontem antecipada pelo vice-presidente do BCE, o imperdoável Constâncio.
 
Estudo empírico realizado a partir dos pressupostos da controversa medida, citado aqui e aqui, conclui pela forte probabilidade de impacto negativo sobre o emprego com uma legenda irónica sobre a fé de Gaspar (pelos vistos, não só) e o trabalho realizado pelo grupo que fez estudo: In God we trust; all others bring data. 
 
Mas bem poucos, afinal, suportam as suas posições com dados trabalhados. O próprio ministro das Finanças até hoje não tornou público o modelo, ou os modelos, que levam a concluir pelos benefícios da medida, limitando-se a afirmar que possui vários estudos que suportam a sua proposta. Admito uma razão para este secretismo, que, aliás decorre das declarações de Merkel feitas hoje: Eles sabem que as medidas vão ser recessivas, que o desemprego subirá, que a recessão persistirá, e esperam que o saldo comercial com o exterior continuará a equilibrar-se, e que o défice das contas públicas se encaminhe para os 3% em 2014. Nada garante, contudo, que, mesmo com sacrifício de tudo o resto, o objectivo dos sacrossantificados 3% seja atingido.
 
A dívida pública continuará a crescer e a eventual redução do défice primário (antes de juros) não será suficiente para cobrir o crescimento dos juros se a economia não crescer vigorosamente, e nada pressupõe que isso aconteça. Assim sendo, persistirá o diktat de uma situação de subordinação implacável  a que não se vê o fim.
 
E é quando a ameaça persiste que PSD e CDS-PP medem forças em público por causa da nova TSU, lê-se em manchete no Público. Também não foi informado Paulo Portas? Insisto nisto: É cada vez mais claro que Passos Coelho sofre da mesmo excesso de autosuficiência que caracterizava o seu antecessor.
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Act-.Uma proposta de alternativa: Aumentar a progressividade dos impostos (aqui)

Sunday, September 16, 2012

AMERICAN GIRL

A injecção de liquidez, sem limite fixado, na economia norte-americana, via compra de dívida pública, que Ben Bernanke, ou alguém por ele, designou QE3 (Quantitative Easing 3), a que fiz referência aqui, terá certamente efeitos sobre o crescimento da economia mas não é seguro que a esse crescimento corresponda um crescimento relevante do emprego e uma redução do desemprego para os níveis a que os norte-americanos se habituaram. O sector do imobiliário ainda continua dormente, os empregos têm aparecido sobretudo nos sectores financeiro, a recuperar lentamente de um grande abalo, e na saúde. A indústria voou há muito para outras paragens e não podem agora os EUA contar com ela para a retoma, como contaram em depressões anteriores.
 
Entramos nas lojas, e os produtos etiquetados "made in China", sobretudo, mas também "made in Índia", "made in Indonesia" enchem os espaços de vendas. A America Girl, uma série gizada na mesma ideia que fez da "Barbie" um sucesso de marketing mundial, é, uma concepção produzida na China. Vendida a preços que não são da China, a diferença entre o custo de produção industrial, baixo, se não não seria "made in China" e o preço de venda, que é elevado, é tomado pelos criativos e distribuidores, que são geralmente ser os mesmos.  

Na Anthropologie, uma cadeia de venda de roupas para senhora, mas também de cerâmicas e vidros , para além de alguns outros artigos decorativos, dirigida sobretudo às classes jovens A/B (alta média alta) o cenário é idêntico: as roupas são "made in China", algumas"made in Índia", tendencialmente mais mais requintadas, e portanto também mais caras, estas que aquelas. Ao lado, nos expositores de louças e vidros, a China continua a ter lugar preponderante mas aparecem alguns items, que não são nem os mais elaborados nem os de  preço mais elevado, "made in Portugal".   

No Whole Foods, uma cadeia de supermercados, também dirigida às classes A/B, os produtos à venda são, na sua maioria, de origem (protegida) norte-americana, a China não entra ali, de Portugal encontra-se uma representação escassa de vinhos do Porto e um ou outro vinho verde, geralmente de qualidade inferior, no meio de uma garrafeira impressionante de vinhos da Califórnia, mas também da Argentina, do Chile, da França, de Itália, da África do Sul, entre outras procedências com forte representação, até da Alemanha e da Áustria!   

Para Mr. Conard, amigo, ex-colaborador e patrocinador de Mr. Romey, já apontei neste caderno, "os EUA devem (continuar) a abandonar a indústria, encaminhar os talentos para as tecnologias de ponta e para as áreas financeiras. Os outros, aqueles a quem a natureza não talentou, que cuidem das crianças e os jardins dos talentosos". Vá lá. Mr. Conard não incluiu mas também não excluiu o sector primário.
 
Os Mr. Conard não vêem, ou não querem ver, que os chineses não garantiram a ninguém que não estão já a saltar para o lado admirado das hig-tech. O desafio chinês tem cada vês mais frentes de confronto.  
 
 
E, em Portugal, sem indústrias de tecnologia de ponta nem um sector primário competitivo, que alternativas temos para competir no mercado das baixas tecnologias que é aquele, salvo algumas excepções notáveis, sem confronto com as produções chinesas, onde os salários são baixos?
 
Leio aqui  "as economias ajustam-se pelo mercado e não por medidas de choque de eficácia não comprovável e obviamente reversíveis com mudanças de governo".
Mas devo estar a ler mal.
 
 

Saturday, September 15, 2012

GASPAR VAI À ORAL

e passa por via administrativa.

Quero ouvir os meus conselheiros, afirmou hoje o presidente da República, respondendo à questão das razões pelas quais convocou o Conselho de Estado para a próxima sexta-feira.
 
Fazem parte deste órgão, para além do próprio presidente da República, Assunção Esteves, presidente da Assembleia da República, o primeiro-ministro, o presidente do Tribunal Constitucional, o Provedor de Justiça, o presidente dos Governos Regionais dos Açores e da Madeira, os ex-presidentes da República, Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio; designados pelo presidente da República, João Lobo Antunes, Marcelo Rebelo de Sousa, Leonor Beleza,Vitor Bento e Bagão Félix; eleitos pela Assembleia da República, Luis Marques Mendes, Francisco Pinto Balsemão, Manuel Alegre, António José Seguro e Luis Filipe de Menezes*.
 
O ministro das finanças também está convocado, confirmando-se, também deste modo, que esta reunião do Conselho de Estado será uma audiência de Vitor Gaspar perante os vinte conselheiros. Tema em exame: As medidas de austeridade anunciadas pelo primeiro-ministro e, particularmente, a redução da TSU para as empresas e o aumento da contribuição dos trabalhadores.
 
Cá fora, incorporam-se nos protestos públicos às medidas do Governo, para além das presenças previsíveis de Francisco Louçã e Jerónimo de Sousa, as declarações de Ferreira Leite, Pires de Lima, Paulo Rangel, Cardeal Patriarca, entre outros. Num ambiente destes, quem é que vai oficiosamente aprovar no Conselho de Estado a posição do Governo, ouvida a argumentação técnica do ministro? Aliás já debilitada pelo mesmo quando reconheceu que os efeitos esperados da redução da TSU para as empresas dependem da boa vontade das maiores empresas, não sujeitas à concorrência externa. Dos 20 Conselheiros, Gaspar só vai poder contar, provavelmente, com o voto favorável de Menezes e ouvirá, certamente, críticas severas de vários lados.
 
Nestas circunstâncias, sobejamente conhecidas do presidente da República, que resultados práticos podem resultar desta prova oral a Gaspar para o Governo? Obriga Passos Coelho a recuar e a concertar políticas com o PS susceptíveis de serem aceites pela Troica? É muito improvável que não o tenha tentado.
 
O senhor vice-presidente do Banco Central Europeu, que se distraiu e consentiu que a banca e os governos metessem o País no buraco financeiro em que se encontra, revelou, conspícuo e redondo, como é seu normal, que as novas medidas de austeridade têm de ser cumpridas. Mas não creio que este Vitor com estas declarações ajude as convicções do outro.
 
Que fará, então, o presidente da República se Passos Coelho não recuar? Demite-o? Obviamente, não o demite. Para quê, então esta reunião, que só pode ser inconsequente?
      
<p>Constâncio desdramatizou as consequências da ruptura do consenso nacional</p>
 
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Act. - Leio aqui: "Há muito que as pessoas em torno da actual política financeira propõem a chamada "desvalorização fiscal", que já vi ainda mais eufemisticamente chamada de "reset salarial". E, logo à noite, vamos ter o Dr. Vítor Bento, economista de respeito, mas com as ideias erradas, defender isso mesmo na televisão". 
* Act.- (17/9) - Menezes defende que executivo deve ter humildade para dar um passo atrás.

OBAMA VERSUS ROMNEY








O Economist publica esta semana aqui um vídeo sobre a evolução dos resultados das sondagens às intenções de votos dos candidatos às eleições de 6 de Novembro.
 
Para já, Obama parece estar a distanciar-se do seu opositor que demonstrou grande inabilibidade e sofreguidão de poder durante esta crise, aberta no Médio Oriente por um filme manhoso realizado por um especialista em fitas pornográficas.
 
Na Rua Árabe continua a fúria à solta (vd aqui ) desencadeada também desta vez, como em várias outras situações semelhante no passado recente - Versículos Satânicos de Salman Rushdie, a caricatura de Maomé publicada num jornal dinamarquês, a ameaça de um tipo qualquer norte-americano de ameçar queimar em público o Corão - que confirmam um distanciamento civilizacional marcada por uma irredutível diferença de valores morais que serve de bandeira aos movimentos que no Médio Oriente, com destaque para A-Qaeda, persistem numa Jihad sem fim até vitória sobre o Ocidente.
 
Até que ponto Obama vai ser capaz de dominar a situação e continuar a ganhar pontos com este acontecimento inesperado, não se sabe. O que se sabe é que Romney dificilmente poderá dele retirar vantagens a 6 de Novembro depois das declarações precipitadas que fez.

Friday, September 14, 2012

QE 3 E ESPERAR PELO RESULTADO


"As preocupações aumentaram na última semana com o relatório, decepcionante, do emprego em Agosto e o aumento do número de desempregados. Qualquer destes indicadores confirma uma quebra de dinamismo no mercado do trabalho, e aparecem numa altura em que o desempego de longa duração e o desemprego jovem são muito elevados, os norte-americanos estão a desistir de conseguir trabalho, a pobreza está aumentar, a desigualdade de rendimentos está a alargar-se."  (aqui)

Onde se lê " os norte-americanos" poder-se-ia ler "os portugueses" porque o diagnóstico possível, salvo o tamanho do doente e a gravidade relativa da situação, não difere substancialmente. Mas os EUA são, pelo menos, em termos de PIB, sessenta vezes maiores que Portugal e a taxa de desemprego cerca de metade. 

Envolvido numa situação económica que parece ter perdido a resiliência que permitiu inverter vigorosamente das fases descendentes dos ciclos, que caracterizam as economias de mercado, em crises anteriores, Obama, a mês e meio de eleições presidenciais, só pode contar agora que a nova dose de "quantitive easing" - leia-se, libertação de mais liquidez pela FED - possa espevitar o indolente e quebrar a apatia dos empresários, que, segundo alguns, se sentaram nos lucros acumulados à espera que a crise passe, segundo outros, porque não há ambiente macroeconómico que faça germinar mais investimentos.

A crise espoletada pelo imobiliário decorreu em larga medida da dimensão que este sector tinha atingido na economia norte-americana (mas também em Espanha, no Reino Unido, em Portugal, entre outros). Os EUA desindustrializaram-se, e o sector industrial que no passado tinha sido a mola fundamental das retomas em crises anteriores, desta vez tem a mola pasmada. Alguma semelhança com a situação da economia portuguesa, o aumento de desemprego, a falta de políticas consequentes (de que muita gente fala sem dizer em que pensa, se é que pensa em alguma coisa, salvo injectar dinheiro sem proveito consistente) não é, portanto, mera coincidência.

Passos Coelho reafirmou ontem a sua determinação de ir por diante com as políticas anunciadas, e de outras a anunciar, com cariz idêntico. Por agora, a discussão e a contestação polarizam-se nas medidas de austeridade, porque ninguém sabe como é que se podem recuperar centenas de milhares de postos de trabalho perdidos em sectores económicos que irremediavelmente pasmaram. Na entrevista da RTP, o primeiro-ministro referiu que "muitas empresas do sector de construção civil e obras públicas encerraram as portas mais cedo do que o Governo esperava", e daí o aumento de desemprego acima das suas previsões. O que, não custa a crer, pode ser verdade. Mas é uma verdade que não aponta para uma solução. Logo a seguir, Passos Coelho afirmou que "não é possível voltar aos níveis de actividade nesses sectores - construção civil e obras públicas - que se observaram no passado recente". Estou a citar de cor, mas creio estar a reproduzir o sentido das afirmações produzidas pelo PM.  

Não é possível, não senhor. Então que fazer? Que fazer, senhor primeiro-ministro? Que fazer, senhor líder do principal partido da oposição?

Voltando aos EUA, e a Obama, Ben Bernanke decidiu injectar QE3 sem limite de volume. Resulta, não resulta, alguma coisa resultará. Para já o dólar está a cair significativamente contra o euro (está neste momento a fazer 1,316) e até o franco suíço (que está a fazer 1, 218 contra o euro) parece agora mais agarrado à moeda norte-americana que à moeda única europeia. O Yuan Renmimbi chinês, apesar da valorização pontual, deve manter-se no intervalo de variação em que tem flutuado nos últimos doze meses. A competitividade monetária resultante desta injecção de QE3 vai, portanto, sobretudo impor-se às economias da zona euro, se nada fizer inverter a tendência. Mas resolverá o problema da mola pasmada?
Duvido.

Voltando a Portugal, à QE3 da FED só podemos, parece, corresponder com a fé do senhor ministro das finanças. O que é manifestamente pouco. Quando em Maio do ano passado aquecia a campanha eleitoral em Portugal, anotei algures neste caderno de apontamentos que uma coligação que não englobasse os três partidos subscritores do programa de ajuda externa estaria condenada a não governar mais que dois anos.
Insisto nisto: O PS nunca deveria, nas circunstâncias da crise em que o país se afogou, ter sido dispensado de participar directamente na solução dos problemas de cuja criação foi principal protagonista. Não o tendo feito, o primeiro-ministro confronta-se agora com a totalidade da oposição externa e parte significativa do seu próprio partido. Até quando? Receio que me tenha enganado por excesso.

Thursday, September 13, 2012

A INOCÊNCIA DE MR. ROMNEY

Um agente imobiliário da Califónia, de ascendência judaica, convicto de que o Islão é "uma religião do ódio" dirigiu e produziu uma longa metragem - "Innocence of Muslims"- de má qualidade, segundo a generalidade dos críticos, e os trailer publicados no Youtube confirmam.

Na terça-feira passada, 11 de Setembro, os norte-americanos e o mundo relembravam o 11 de Setembro de há 11 anos atrás. Tudo parecia calmo, talvez calmo demais, num país a menos de um mês de eleições presidenciais, para quem se habitou a ouvir a chinfrineira política que assalta as ruas em ocasiões semelhantes, os outdoors a baterem-se em tamanho, impondo-nos as fronhas dos candidatos por todo o lado. Aqui, os raros cartazes fixados ao solo nas bermas das ruas não vão muito além de 40*30 cm, com os nomes dos candidatos. A propaganda política passa sobretudo pela televisão e pelos comícios dos candidatos. À segurança social (onde Romeny já se aproximou da política de Oabama)  e ao desemprego (onde nenhum dos candidatos quer arriscar uma aposta concreta) tinha-se juntado nos últmos dias a greve dos professores em Chicago como um dos tópicos mais fracturantes do eleitorado. Faltava a guerra do petróleo, onde os republicanos marcam mais pontos apoiados por uma massiva propaganda nos media (televisão e imprensa) favorável ao aproveitamento das reservas do Alasca promovida pelas corporações petrolíferas do país.

No dia 11, como é sempre esperável em cada 11 de Setembro que passa, da guerra do petróleo voltou a ouvir-se o sinal da Al-Qaeda. "A Inocência dos Muçulmanos" tinha sido recentemente descoberta e arvorada como símbolo maldito do inimigo de sempre, e conduzido a fúria fanática até à morte de quatro norte-americanos, incluindo o representante consular em Benghazi, a segunda maior cidade Líbia. Mr. Romney, mal teve conhecimento do ataque, e ainda sem conhecer nem quem nem quantas eram as vítimas, apressou-se a criticar a política de Obama para o Médio Oriente.

Há quase 33 anos, era presidente Jimmy Carter, foi assaltada a embaixada norte-americana em Teerão, e feitos 60 prisioneiros. Só seriam libertados 444 dias mais tarde, já Ronald Reagan tinha sucedido a Carter, que foi derrotado em larga medida pela afronta de Teerão e pela incapacidade em libertar os refens. É bem provável que Reagan, ainda candidato, tenha manobrado nos bastidores políticos externos pelo adiamento da libertação. 

Estaria Mr. Romney a calcular aproveitar uma situação idêntica para ganhar votos quando, inusitadamente, criticou a política de Obama?   Se essa era intenção, para já o tiro saiu-lhe pela culatra.

Wednesday, September 12, 2012

OBAMA E OS PROFESSORES

Agora, com as eleições presidenciais norte-americanas de 6 de Novembro quase à porta, qualquer erro flagrante dos candidatos pode ser decisivo. As divergências nas questões mais críticas - segurança social e emprego - tendem a ser torneadas e a tornarem-se menos fracturantes. Romney, antes tão assertivo acerca da sua intenção de redução drástica da segurança social implementada por Obama, admite agora manter as principais medidas se for eleito. É neste contexto de esbatimento da radicalização inicial dos republicanos que irrompe um factor perturbador interno a desafiar a liderança de Obama a poucas semanas do acto eleitoral: a ameaça de greve dos sindicatos dos professores em Chicago, de onde geralmente alastram os movimentos grevistas para todo o país.

E porquê?

Muito sucintamente, porque o mayor de Chicago, que foi chefe de gabinete de Obama, decidiu implementar as políticas de reforma na educação pelas quais o presidente se bateu durante o seu mandato: elevar os padrões de conhecimentos académicos, aumentar o número de horas de ensino nas escolas públicas, aumentar a exigência de qualidade do ensino através da avaliação dos professores. Como resposta, os sindicatos dos 26 mil professores ameaçam fazer greve.

Como seria de esperar, iniciaram-se imediatamente contactos de bastidores no sentido de dissipar um tornado político que pode atingir seriamente Obama, que conta na classe dos professores -  4,5 milhões de filiados nos sindicatos em todo o país - com uma forte base de apoio. Quem, naturalmente, espera calado para tirar proveitos, qualquer que seja a saída engendrada pela administração democrata, é Romney. A questão mais intrincada em jogo é a avaliação dos professores, que o mayor de Chicago quer alargar a 40% deles (25%, actualmente).

Mas, com Romney, os professores das escolas públicas não ficarão melhor posicionados. Romney promete entregar vales de ensino aos pais dos estudantes de modo a que estes possam frequentar escolas privadas ou de iniciativa religiosa, um programa que os sindicatos contestam.

Uma greve destas, onde os sindicatos reclamam estar em causa não apenas os professores mas toda a função pública, não podia ter vindo na pior altura: para Obama e para os sindicatos.

Tuesday, September 11, 2012

RENOIR POR SETE DÓLARES



“Paysage Bords de Seine”

A história está contada aqui. Resumidamente, em 1926 o quadro foi adquirido a um dos mais destacados agentes do pintor por um norte-americano casado com uma prima de um casal de grandes coleccionadores de arte de Baltimore. O casal divorciou-se em 1927 e é provável que o ex-marido tenha ficado com o quadro. O que é que aconteceu ao quadro durante estes 85 anos até ir parar a  um "flea market" onde foi adquirido por sete dólares é um mistério.

Em 2007, um quadro que tinha sido roubado 20 anos antes foi encontrado num caixote de lixo e vendido num leilão por um milhão de dólares. (aqui)

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Act.- (28/9) Flea market Renoir was allegedly stolen from Baltimore Museum of Art
Act. - (06/04/2013) - Só falta saber quem roubou o quadro

EXORTAÇÃO AOS CROCODILOS

O Expresso on line publicou ontem um documento interno do Governo dirigido aos gabinetes ministeriais habilitando-os com respostas às questões que lhes sejam colocadas pelos media relativamente às medidas de austeridade já anunciadas pelo primeiro-ministro, e, nomeadamente, aquela que promete maior discussão: os benefícios e os malefícios da redução da contribuição da TSU para as empresas e o seu aumento para os trabalhadores.

Nunca percebi, e agora ainda menos, como é que uma redução da TSU das (de todas) empresas, da ordem dos 5,75 pp (há um ano referiam-se valores entre 4-5 pp) pode contribuir decisivamente para o relançamento de uma economia em acentuada recessão. Em Março do ano passado escrevi aqui que a medida seria melhor que nada mas nunca seria o rebocador que o barco encalhado precisa para se safar. Na mesma altura foi divulgado um estudo do Banco de Portugal que afiançava o contrário mas não se viu um debate fundamentado sobre as virtudes da medida redentora, e a questão adormeceu.

Acordaram-na agora, revista e complementada: a redução da TSU das empresas será compensada, não por um aumento do IVA, que não obstante a não redução da TSU foi aumentado, mas, de forma excedente, pelos trabalhadores. Independentemente da justiça/injustiça fiscal subjacente a esta medida, subsiste-me a dúvida das virtudes esperadas pelo Governo, mais explicitadas no documento interno divulgado pelo Expresso.

Além de outras vantagens, argumenta do Governo que a redução da TSU "Permite baixar custos, o que aumenta a competitividade das empresas exportadoras e das empresas que no mercado nacional concorrem com importações, e, no caso das empresas produtoras de bens não-transaccionáveis, permite baixar preços, o que, por sua vez, aumenta o rendimento disponível das famílias num período de recessão económica. Quanto a este último caso, deve ser deixada uma nota de exortação às empresas para que adiram a este esforço nacional de redução dos custos e preços, e façam traduzir este alívio das contribuições para a Segurança Social nas suas políticas de preços."

Ora é aqui que está a chave da questão que eu não tinha conseguido até agora decifrar: o sucesso da medida depende, para não se resumir a uns débeis 1 a 2,5% dos custos unitários de produção, da resposta das empresas não sujeitas à concorrência externa à exortação que o Governo lhes faz.

Resulta, não resulta, é uma questão que talvez a parapsicologia saiba responder.

GEORGE BELLOWS




Monday, September 10, 2012

CINCO MITOS ACERCA DA CRISE DO EURO


Se há economistas norte-americanos que há bastante tempo vêm a prognosticar o fim do euro (Paul Krugman, Joseph Stiglitz, Nouriel Roubini, por exemplo) também há quem tenha uma perspectiva mais optimista acerca do futuro da moeda única europeia. O Washington Post publica no seu caderno semanal "Outlook" uma série genericamente intitulada "Five myths about" onde  procura desmistificar um conjunto de ideias adquiridas (supostamente mal adquiridas) pela opinião pública acerca dos mais variados assuntos da vida social. Do tema de ontem - "Five myths about the euro crisis" incumbiu-se C. Fred Bergsten que terá uma opinião tão abalizada quanto as de alguns que discordarão dele.

Em todo o caso é interessante saber o que pensam muitos norte-americanos acerca da crise do euro e o que pensa acerca do mesmo assunto o senhor Fred Bergsten, cuja opinião reflectirá, certamente, a opinião de muitos norte-americanos geralmente bem informados.

1 - Os europeus nunca se unirão numa união política.
A zona euro nunca evoluirá para a os Estados Unidos da Europa, e a cacofonia de vozes na Europa continua a baralhar os mercados. Mas, apesar disso, os países da zona euro têm respondido à crise com uma rapidez notável. Para evitar o colapso financeiro dos membros mais fragilizados foram criados fundos de resgate da ordem de 1 trilião de dólares e o Banco Central Europeu tem emprestado muito mais, como aliás o tem feito a Reserva Federal Americana, e, recentemente, reafirmou o propósito de fazer o que for necessário para evitar uma catástrofe. Os membros da zona euro concordaram no estabelecimento de um conjunto de regras fiscais - com penalizações aos prevaricadores - com o objectivo de limitar os défices orçamentais, avançando no sentido de uma união fiscal parcial que possa sustentar uma política de ajuda dos países mais fortes aos outros. Vão avançar também para uma união bancária total que previna corridas aos bancos através de garantias globais aos depósitos. Os países devedores estão a implementar políticas de reformas estruturais que promovam o crescimento, encoragem o emprego e aumentem a produtividade.
Os países mais fortes, e nomeadamente a Alemanha, não podem dizer que garantem resgates ilimitados de modo a manter a pressão sobre os devedores. Mas a zona euro parece estar encaminhada para a completa união monetária e económica que foi prometida há vinte anos e que, por falta dela, emergiram as actuais dificuldades.

2 - A saída da Grécia da zona euro acabará com a zona euro
Não. Se a Grécia sair, a moeda única europeia sairá reforçada. O resultado será tão caótico para a Grécia que os outros devedores farão tudo o que for preciso para evitarem um desastre semelhante, acelerando as reformas. Por outro lado, no caso de "Grexit", os países mais fortes reforçarão as barreiras financeiras de defesa e acelerarão a união fiscal e bancária.
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3 - Os contribuintes alemães jamais pagarão para que sejam assegurada as pensões de gregos (ou espanhóis ou italianos)

A Alemanha é, e continuará a ser, o principal pagador da Europa, reclamando e exigindo austeridade e reformas, mas fará tudo para manter a zona euro unida. Tem assegurado a maior parte dos fundos de resgate e financiado os défices dos países devedores através do BCE.

Há várias razões para a Alemanha manter esta posição. Primeiro, o projecto de integração europeia iniciado há seis décadas atrás, de que o euro é o símbolo mais decisivo, surgiu a seguir à guerra provocada pela Alemanha. Os alemães não vão querer correr o risco de destruir a Europa outra vez, uma acção de que serão facilmente acusados se espoletarem a desintegração. Para além disso, a  economia da Alemanha sustenta-se em larga medida nas exportações para os outros estados membros e os bancos alemães estão muito expostos nos países devedores, pelo que os contribuintes alemães não têm alternativa senão resgatá-los se a Espanha ou a Itália falharem os seus compromissos. Na Alemanha todos os líderes políticos estão cientes destes factos e os partidos pró-euro têm ganho as eleições mais decisivas desde a erupção da crise.

4 - Se as medidas de austeridade continuarem, os eleitores revoltar-se-ão e os extremistas tomarão conta do poder

Um dos aspectos mais interessantes da crise do euro até agora tem sido a permanência em funções dos governos liderados por partidos moderados, e a rejeição das alternativas radicais tanto à esquerda como à direita. Na Grécia os eleitores entusiasmaram-se com as propostas de um partido radical mas o início de uma corrida aos bancos levou-os a mudar de ideias. 

5. A crise do euro deprimerá a economia dos EUA e poderá até influenciar a eleição presidencial em Novembro.
Sem dúvida, a recessão na Europa reduziu as exportações dos EUA e os lucros das empresas norte-americanas, desencentivou o emprego e a confiança dos investidores, reduzindo-nos cerca de 1% do produto. Analistas de macroeconomia calculam que o eventual colapso do euro provocaria nova recessão no próximo ano e a taxa de desemprego atingiria os 9% em 2013. Como as economias emergentes, lideradas pela China e Índia, que já representam metade da economia global, continuarão a expandir-se a uma taxa anual agregada de 6%, a economia, incluindo os EUA, continuará globalmente a crescer. Por outro lado, as perturbações na zona euro provocam a preferência de muitos investidores pelas obrigações do Tesouro americano, permitindo a manutenção das taxas de juro muito baixas, o que permitirá a recuperação do imobiliário e o crescimento do consumo interno.
Finalmente, a perspectiva de uma evolução favorável na Europa protege-nos - e às nossas eleições - de piores repercussões económicas.