Tuesday, August 23, 2011

BANDA GÁSTRICA


Em Junho do ano passado, Luís Amado defendia publicamente a proposta alemã de constitucionalização dos limites da dívida e do défice, colocando-se, deste modo, numa posição contrária à defendida por Sócrates. Vd aqui e aqui. Recordo-me que, na altura, Paula Teixeira da Cruz, actual ministra da Justiça, num programa Frente-a-Frente, de Mário Crespo, ter considerado a ideia "um verdadeiro disparate". 

A proposta fez, entretanto, o seu caminho, e voltou agora a ser formalmente reposta no acordo Merkel-Sarkozy sobre outro pacote de medidas para salvar o euro e a União Europeia da desintegração. Curiosamente, tanto do lado do Governo como da Oposição, não se conhecem reacções relevantes e só o Presidente da República discordou sumariamente num apontamento colocado no seu Facebook. A esta discordância de Cavaco Silva anotei a minha discordância com o PR aqui pelas mesmas razões que concordei com Amado há mais de uma ano.

A constitucionalização dos limites da dívida e do défice é, sem dúvida, uma restrição desagradável para quem governa ou pretende vir a governar, na medida em que cerceia a sua liberdade de mostrar obra feita quando essa obra implica a disponibilidade de crédito. Mas é, provavelmente, a única forma de garantir a continuação da construção da União Europeia sem os abalos que a ameaçam derrocar em situações de crise como aquela que atravessamos.

Seria, evidentemente, mais salutar que cada país membro tivesse a capacidade de autodisciplina para conter a dívida dentro dos limites que a sua capacidade de a honrar permite. Sabemos que assim não acontece, e a Alemanha, que foi uma das primeiras infractoras das regras estabelecidas no acordo assinado em Maastricht, há muito que deu esse passo de estabelecimento do tecto do endividamento em função do crescimento da riquesa do país. Sarkozy já declarou que a França tomará a mesma medida, Zapatero e Rajoy anunciaram ontem o seu acordo para o mesmo objectivo.

Trata-se, sem dúvida, de uma medida que se enraiza mais na doutrina clássica que na keynesiana. A limitação da dívida pode colocar restrições indesejáveis ao relançamento das economias em fase recessiva.
O equilíbrio e ponderação que estas coisas requerem podem, e devem, no entanto, estar presentes nos termos em que as limitações forem constitucionalizadas.

O caminho faz-se caminhando

6 comments:

Anonymous said...

rubalcaba (psoe, ferraz) se reía de la propuesta.......

Luciano Machado said...

Rui
Limites para evitar desvarios? então teríamos que pôr limites em muitas mais coisas.E continuar nessa linha qualquer dia dispensam-se os governos, os funcionários dirigem a manada.
A política orçamental é dos poucos instrumentos que restam aos países integrantes da UEM e não vejo método objectivo que permita postular um limite ao défice que possa ser coerente com as necessidades da economia em cada momento. Tu próprio afirmas "a limitação da dívida pode colocar restrições indesejáveis ao relançamento das economias em fase recessiva". Em que ficamos?
A evolução recente da economia portuguesa está a dar razão aos críticos da política de contenção do défice a qualquer custo.
Aguardemos a cenas dos próximos capítulos.

rui fonsecs said...

Luciano,

A questão não é pacífica, evidentemente.

Mas, das duas, uma: ou há regras muito apertadas que possam garantir a coesão e a manutenção do euro, e da União Europeia, ou não há maneira de haver união possível.

Aqueles que defendem os eurobonds (vd. meu apontamento de hoje sobre oassunto) defendem, geralmente, a integração política.

Mas uma coisa é a teoria, outra a possibilidade da sua execução prática.

Hoje debate-se muito a política de austeridade e os seus malefícios.
Auateridade não rima com crescimento económica a curto prazo, já se sabe.

Mas qual é a alternativa? Sair do euro, voltar ao escudo e pôr as rotativas a trabalhar?

Pergunta ao João.

Luciano Machado said...

Não é preciso perguntar pois já sei qual é a resposta dele: sair com uma ajuda financeira que permita promover o crescimento económico.
Também começo a crer que esta política restritiva vai, mais tarde ou mais cedo empurrar-nos para o abismo. E que só não acontecerá se o crescimento dos nossos parceiros for tal que nos empurre para a frente. Só que não estou a ver nada disso, bem pelo contrário.
Antes do fim do ano, quando se começar a concluir da inviabilidade de se atingirem as metas comprometidas com a troika,e depois de termos vendido a desbarato alguns activos que nos restam, muito provavelmente iremos ser empurrados para a saída. Aí não nos restará alternativa que aproveitar para pedir as tais compensações. Não vejo outro caminho.

rui fonseca said...

Luciano,

A saída seria uma tragédia, até para a União Europeia. Não quero crer que isso vá acontecer.

E, depois, o que é que se ganharia com saída? Uma moeda fraca, mais inflação, a redução dos salários reais dos rendimentos fixo (reformas) e dos trabalhadores pior remunerados.Etc., etc.

Depoiis o crescimento é possível: Vê o que se está a passar na Irlanda, aqui:

http://online.wsj.com/article/SB10001424053111904875404576530613971799994.html

Luciano Machado said...

Rui,
Também estou de acordo que será uma tragédia mas infelizmente teremos que nos ir praparando para a eventualidade desse cenário.
Acreditas que é possível cumprir as metas do défice? E se não o que é que vai seguir-se?
A pag de WSJ que me recomendas já não está disponível. Tens outra fonte?