Thursday, July 31, 2014

NÃO SÃO COINCIDÊNCIAS

No mesmo dia em que foi anunciado o prejuízo do BES de quase 3600 milhões de euros no primeiro semestre por reconhecimento de imparidades que a administação presidida por Ricardo Salgado tinha desconsiderado, parte das quais devidas a operações realizadas à revelia de determinação do Banco de Portugal que as havia proibido, o Tribunal Constitucional decidiu renovar o seu aval à sanha contra os reformados e pensionistas julgando constitucional o alargamento do imposto extraordinário sobre reformas e pensões a partir de 1000 euros mensais.

Para a maioria dos juízes do Tribunal Constitucional a prepotente imposição de um tributo sobre uma classe,  "não constitui um sacrifício particularmente excessivo e desrazoável", uma sentença tanto mais insana quanto a sua obliquidade se agrava pelo facto de que - vd. aqui - "nem todos os reformados com pensões elevadas (agora, a aprtir de 1000 euros) saem a perder com a decisão do Tribunal Constitucional (TC). Os juízes e os diplomatas jubilados não são afectados pela polémica contribuição extraordinária de solidariedade (CES), viabilizada pelos juízes do Palácio Ratton."

Pelas acrobacias a que se dedicou a grande velocidade a fina flor dos banqueiros deste país, estatelando-se sobre o coiro dos contribuintes, com particular impacto sobre os ombros mais frágeis e indefesos dos reformados (atenção!, excepto se forem juízes ou diplomatas)  levarão os tribunais largos e dormentes anos à espera que o tempo prescreva e apague na fraca memória colectiva os fautores dos monumentais estatelanços. O sacrifício dos CESquestrados, "com carácter excepcional e transitório,  nem particularmente excessivo nem desrazoável, segundo os de Ratton, esse, já entrou imediatamente em vigor há quatro anos.Tudo em nome de um pseudo estado de direito em que se entorna uma democracia fluida.

Wednesday, July 30, 2014

O GARGANTA PÚBLICA / Act.

Neste caso, o crónico e sempre insondável mistério do Ministério Público, ou o jogo da cabra-cega na muito gozada variante da violação do segredo de justiça pelo garganta pública.

Lê-se aqui que "a revista "Sábado" noticia, na sua edição desta quinta-feira, que José Sócrates está sob vigilância do Ministério Público há bastantes meses, por suspeita de envolvimento no escândalo Monte Branco. De acordo com a notícia, que faz a capa da revista, o Ministério Público pondera deter o ex-primeiro-ministro para interrogatório e constituí-lo arguido. Também estará sob suspeita Hugo Monteiro, o primo de José Sócrates que foi um dos protagonistas do caso Freeport. Fonte da revista adiantou ao Expresso que Sócrates foi contactado antes da publicação da notícia e confrontado com as suspeitas de que será alvo, mas não quis comentar."

---
Act. -  "Na sequência de notícias vindas a público nas últimas horas, esclarece-se que José Sócrates não está a ser investigado nem se encontra entre os arguidos constituídos no Processo Monte Branco", diz a PGR em comunicado. "Em declarações prestadas entretanto à RTP, José Sócrates garante: "A minha família não faz tráfico de capitais nem movimenta largas somas". E acusa: "Constrói-se uma notícia falsa com o objetivo de me difamar". - vd. aqui

Já nada nos espanta neste país de generalizada irresponsabilidade ilimitada.
Se nada do que a "Sábado" relatou tem fundamento, espera-se que a PGR faça o difamador pagar exemplarmente pela suposta atoarda. Mas não costuma.
Pagaria para ver.

 

Tuesday, July 29, 2014

COMO SE FOSSE A COISA MAIS NATURAL DESTE MUNDO

A PT SGPS e a Oi anunciaram acordo sobre os termos para prosseguir com a Combinação de Negócios, e que,  quanto a matéria relevante,  não constituem novidade: em consequência de um empréstimo de 897 milhões de euros ao Grupo Espírito Santo, por razões que devem ter sido ponderosas e muito ponderadas, mas que até agora ninguém disse quais nem quem foi responsável por quanto, a participação da PT na coligação com a Oi sofre um rombo notável: de 37,3% para 25,6%. A recuperação desta queda depende da capacidade da PT recuperar o exótico empréstimo feito ao GES dentro num calendário de amortizações que se extingue ao fim de seis anos.

Dizem as notícias que Granadeiro e o administrador financeiro da PT ficarão de fora da administração do grupo resultante da fusão.

Leio, e continuo a perguntar-me (aliás, tanta gente pergunta) como aqui: Mais ninguém sabia da existência de uma prática que remontava a 2001? Granadeiro é culpado único, e nesse caso como é que se mantém ainda na presidência da PT, ou o cordeiro imolado a troca de uma pretensa inimputabilidade de todos os outros que, pelos cargos que exerciam, de administração, fiscalização, auditoria, revisão de contas, são tanto ou mais culpados que Granadeiro? Espera-se que as assembleias gerais que terão de se pronunciar sobre as consequências deste negócio bizarro (a PT endividava-se ao mesmo tempo que emprestava ao GES muito mais do que poderia estar autorizado a emprestar qualquer banco) obriguem o seu esclarecimento.

---
A PT e a Oi reviram os termos do acordo e a PT irá deter 25,6% do capital em vez dos 38% inicialmente previstos - esta participação já tinha sido revista para 37,3% com o exercício do lote suplementar de acções no aumento de capital da Oi. Ou seja, a participação dos accionistas portugueses na CorpCo passa de cerca de 12% para 8,95%.

Comunicado  |  Lisboa  | 28 de julho de 2014 A PT SGPS e a Oi anunciam acordo sobre os termos para prosseguir com a Combinação de Negócios 
A Portugal Telecom, SGPS S.A. (“PT SGPS”) e a Oi S.A. (“Oi”) anunciam que chegaram a acordo sobre os termos definitivos dos principais contratos a celebrar na sequência do Memorando de Entendimentos (“MoU”) anunciado em 16 de julho de 2014. 
A celebração da documentação definitiva está sujeita à aprovação pela Assembleia Geral de Acionistas da PT SGPS e pelo Conselho de Administração da Oi. A documentação estabelece que: 
 A PT SGPS irá permutar (“Permuta”) com a Oi as aplicações de tesouraria na Rio Forte Investments, SA (“Dívida da Rioforte”) no montante de 897 milhões de euros, em contrapartida de 474.348.720 ações ON mais 948.697.440 ações PN da Oi (“Ações da Oi Objeto da Opção”):  À PT SGPS será atribuída uma opção de compra não transferível de tipo Americano (“Opção de Compra”) para readquirir as Ações da Oi Objeto da Opção (com o preço de exercício de R$2,0104 para ações ON e R$1,8529 para ações PN), a qual será ajustada pela taxa brasileira CDI acrescida de 1,5% por ano;  A Opção de Compra sobre as Ações da Oi Objeto da Opção entrará em vigor à data da Permuta, terá uma maturidade de 6 anos, expirando a possibilidade de exercício pela PT SGPS em 10% das Ações da Oi Objeto da Opção no fim do primeiro ano e 18% em cada ano seguinte;  Qualquer montante recebido como resultado da monetização da Opção de Compra através da emissão de instrumentos derivados tem de ser utilizado para o exercício da Opção de Compra;   A PT SGPS só pode adquirir ações da Oi ou da CorpCo através do exercício da Opção de Compra;  A Opção de Compra será cancelada se (i) os estatutos da PT SGPS forem voluntariamente alterados para remover a limitação de voto de 10%, (ii) a PT SGPS atuar como concorrente da Oi, ou (iii) a PT SGPS violar certas obrigações decorrentes da documentação definitiva, e  Os contratos serão celebrados assim que todas as aprovações societárias sejam obtidas e a Permuta está sujeita à aprovação da Comissão de Valores Mobiliários no Brasil e deve ser executada em ou antes de março 2015. 
O Conselho de Administração da PT SGPS irá solicitar ao Presidente da Assembleia Geral de Acionistas que convoque, nos próximos dias, uma Assembleia Geral de Acionistas da PT SGPS, a ser realizada até 8 de setembro de 2014, para deliberar sobre os termos dos acordos a serem celebrados com a Oi relacionados com a combinação de negócios entre a PT SGPS e a Oi.  
Os termos dos acordos a serem apresentados pelo Conselho de Administração à Assembleia Geral de Acionistas até vinte e um dias antes da realização da Assembleia também irão incluir uma estrutura acordada alternativa à incorporação da PT SGPS na CorpCo anunciada previamente, de modo a atingir os seguintes objetivos: 

  |  Comunicado   2/2  
 Permitir que a incorporação da Oi na CorpCo e a migração para o Novo Mercado sejam implementadas o mais rapidamente possível, com a cotação da CorpCo na BM&F Bovespa, Euronext Lisboa e NYSE;  Sujeito a aprovação dos acionistas em Assembleia Geral de Acionistas, convocada especificamente para o efeito, os acionistas da PT SGPS irão receber todas as ações da CorpCo detidas pela PT SGPS, após a execução da Permuta e antes que qualquer exercício da Opção de Compra, correspondendo a uma participação de 25,6% na CorpCo, ajustada pelas ações em tesouraria, e  A PT SGPS continuará cotada com a participação na Dívida da Rioforte e a Opção de Compra como os seus únicos ativos relevantes.

Monday, July 28, 2014

LINHAS SUBURBANAS

A., voou para os EUA há quase vinte anos, volta uma vez por ano por períodos de duas a três semanas. O irmão, que voou poucos anos depois na mesma direcção para se radicar mais tarde no centro da Europa, raramente aparece por cá, talvez desencantado com o país onde nasceu. A., gosta de voltar a pisar os caminhos antes percorridos. Há dias, ela e o marido, estrangeiro,  para se deslocarem a Lisboa preferiram o combóio à viatura à sua disposição. Voltaram antes da meia noite e A., vinha chocada com que viram e ouviram à juventude que vinha no combóio: uma linguagem altamente desbragada a acompanhar comportamentos insólitos. 
- É corrente, agora, este tipo de conversas em Portugal?, perguntava incrédula.
- Não sabemos. Não andamos de comboio, fica-te mais dispendiosa a viagem de combóio que o transporte em viatura própria se residires longe das estações e não haver, como geralmente não há, ligações de autocarro adequadas.
- Não pode ser.
- Pode, pode, as contas são fáceis de fazer. Mas, a propósito desse tipo de conversas, também te devo dizer que, não andando nós de combóio, não nos podemos escapar de vez em quando à audição desse tipo de linguagem de gente jovem, entre rapazes e raparigas, em qualquer local público.
- É espantoso.
- Não tanto. A moda não é recente, creio eu. Simplesmente, generalizou-se. Talvez por verem as séries made in USA ... Sabes que a quase totalidade das produções de origem estrangeira que passam nos canais de televisão ou nos écrans dos cinemas são de origem norte-americana. A população portuguesa bebe o north american lifestyle às litradas, e a juventude é naturalmente a mais permeável.
- Não acredito. Nunca, que me lembre, alguma vez ouvi nos Estados Unidos alguma coisa, sequer parecida, com o que ouvimos neste combóio entre Lisboa e Cascais. Lá, aquela linguagem, garanto-te, simplesmente não existe.
- Talvez exista em meios que não frequentas ...
- Hollywood, queres tu dizer?
- Hollywood não conta as histórias de pessoas normais, as pessoas normais, já se sabe, não têm histórias que interessem às pessoas normais. Para a juventude que as vê, as histórias de hollywood sustentam-se em estereótipos que induzem a imitação tanto nos comportamentos como nas expressões. 
- É possível. Lá em casa vê-se pouca televisão. 
- O puritanismo norte-americano também tem rombos de alto lá com eles ...
- ... mas a sociedade em geral comporta-se com grande civismo. Por exemplo, as carruagens dos comboios não apresentam o aspecto degradado das que se vêm aqui e, 
- ... pelo aspecto da carruagem imagina-se quem vai lá dentro.
-  É isso mesmo, é o princípio das janelas partidas.
- Voltando à linguagem e ao comportamento juvenil de hoje, aconteceu-me assistir há dias a uma cena macaca: estavam uns miúdos numa sala a ver televisão, atentos, comprometidos. Chega o avô à sala e percebe que os garotos deliciavam-se com uma cena de um filme da Fox que envolvia conversa sobre sexo oral. Desligou o aparelho e deu conta do sucedido aos adultos. Ficou mal visto por todos. Afinal aquilo era apenas uma história de uma violação, um filme da Fox, convém que os miúdos aprendam que há monstros à solta nesta selva em que vivem.
- Incrível teoria, não é?
- É uma teoria. E, nesta matéria, a cada qual a sua.
- Eu não compreendo.
- Ah! Voltamos a falar disso daqui a um ano. Valeu? Talvez nessa altura já  tenham lavado a cara às carruagens dos tranvias.

Sunday, July 27, 2014

CARLOS SILVA

Antes de sair de casa à procura da residência que nos tinham indicado, pedimos ajuda à internet e, munidos do print do itinerário recomendado pela electrónica lá fomos confiantes e a horas de não falhar a hora combinada. Já nas próximidades do local de destino, começaram as complicações na primeira rotunda. Será por aqui ou por ali? Deve ser por aqui, para o centro. Não era. Por sorte, encontrámos algumas voltas depois três polícias em tranquila cavaqueira, e um deles, o mais novo, deu-nos indicações para voltar para trás, depois sobe, depois corta à direita, depois corta à esquerda, depois ... depois é por aí, é uma questão de ir lendo as placas. E era por ali, mas até lá passámos por várias ruas sem qualquer identificação nas esquinas. Será esta? É rua ou avenida? É avenida. Então deve ser larga? Nem sempre. Se o homenageado foi tido por graúdo na altura da consagração, se não há avenida por nomear, ou ele morou ou andou por ali,  promovem uma rua a avenida. Deve te sido  esse o caso: a avenida é uma rua, aliás com trânsito, em grande parte da sua pequena extensão, num só sentido, obrigando o automobilista a contornar o bairro para descer a avenida de um sentido só.

- Quem foi este Carlos Silva?
- Não faço a mínima ideia, Carlos Silva há, e sempre houve, muitos.
- Este costume de dar a cada rua, ruela, ou beco sem saída, o nome de um sujeito que não passou à história baralha qualquer um que procure uma morada e não esteja munido de GPS actualizado ou não encontre polícia ou carteiro por perto.
- Hum! Não estás em Nova Iorque ou Washington DC. Aqui, às vezes, nem a vizinhança consegue ajudar. Quanto a glorificar em placas os nomes de efémeros pequenos notáveis é um hábito que os políticos não dispensam: por um lado, enquanto vivos cortam fitas e descerram placas evocativas da sua passagem por todo o lado,  e, por outro, logo que apanham um corelegionário morto tratam de lhe por o nome na esquina duma rua para que não se esqueçam deles quando chegar a sua vez.
- E depois, ao fim de pouco tempo, a vez de serem só nomes de quem ninguém sabe quem foi.
- Li ontem no Expresso que em Lisboa o número de nomes candidatos a um lugar na toponímia  da cidade excede largamente o número de ruas por nomear. A cidade não cresce, a população envelhece,  e a lista de espera de notáveis mortos não para de crescer.  De modo que a Câmara decidiu agora atribuir às freguesias, alguma coisa elas terão de fazer, a incumbência de escolher os preferidos. Os preteridos serão glorificados na denominação de bairros, conjuntos arquitectónicos, equipamentos e infraestruturas de ensino, saúde, culturais e desportivos, os parques e recintos associados a áreas verdes, de recreio e lazer, as pontes e os viadutos. A colocação de placas evocativas serão também alternativas para os não contemplados com a placana esquina de um beco, rua ou avenida. 

- Subdesenvolvimento cultural?
- Não, não é. É cultural. A cultura não é sobre nem subdesenvolvida. E nós por cá continuamos assim.

Friday, July 25, 2014

SANTA CLARA-A-VELHA

Santa Clara-a-Velha esteve semi soterrada por séculos de assoreamentos do Mondego quando o curso das suas águas não estava regularizado pela barragem da Aguieira. O "basófias" agigantava-se geralmente a partir de finais de Setembro depois de se ter encolhido a níveis mínimos, ficando quase invisível no pino do Verão ao passar por Coimbra. Uns quilómetros mais abaixo, quando o Inverno se antecipava, inundava os arrozais até princípios da década de 80 do século passado,  obrigando  os agricultores a ceifarem de barco  as espigas quase afogadas. Aos arquitectos do século XIII passaram despercebidos os caudais de terras e calhaus que o rio arrastava das serras e depositava quando o seu curso se aplanava subindo-lhe os níveis do leito. Aperceberam-se as clarissas, franciscanas, quando as águas começaram a inundar-lhes o Convento e a obrigarem à mudança de instalações para Santa Clara-a-Nova, no cimo do monte sobranceiro. Nesse dia, começou o enterramento secular de Santa Clara-a-Velha e a invasão dos silvados. Considerado monumento nacional em 1910, o Mosteiro de Santa Clara-a-Velha só em 2009 viria a ser aberto ao público após trabalhos de arqueologia, remoção de terras, recuperação possível e reconstrução sem lhe retirar carácter, um trabalho notável, merecedor de vários prémios, que merece ser visitado.


Não escapam, contudo, ao visitante menos espantado com as colagens recentes, alguns aspectos menos merecedores de aplauso. Desde logo, a entrada para a visita às ruínas do convento colocada no lado oposto do vasto logradouro não é convidativa a quem passa pelas principais vias de onde se lobriga o monumento. Isolado da malha urbana, a entrada escondida e distante aumenta-lhe o isolamento. 

Passada a porta de acesso, sobe o visitante para um edifício sobrelevado, projectado para materiais pretensiosos, dedicado a bilheteira, loja, bar, sala de visionamento de um vídeo explicativo, sala de exposição permanente de peças recuperadas durante as escavações ou alusivas à vida em clausura monacal, e ainda outra de exposições temporárias, de bordados de Castelo Branco, quando passámos por lá. Entre a estrutura elevada do edifício e o solo estão depositadas as pedras que escaparam aos desvios cometidos ao longo dos séculos e agora não têm com quem dialogar. Vistas as exposições e o vídeo, tem o visitante de percorrer não menos que uns trezentos metros por passadeiras de materiais igualmente pretensiosos, desenquadrados dos votos daquelas que há quase oitocentos anos habitaram o convento. No começo da jornada pode o visitante descer por rampa do mesmo estilo para visitar uma horta meio abandonada. Chegados à frente das ruinas,  surpreende-nos no lado direito da frente principal do convento um elevador exterior, qual cogumelo de aço gigante, que liga a entrada ao nível do solo com a saída ao nível do terreno adjacente. Podiam os acessos ser muito mais curtos, de laje de pedra ou terra batida e com desnível suficiente para evitar o insólito elevador, que um dia destes deixará de funcionar por falta de verba para a manutenção?

Podiam, mas não haveria o requinte do provincianismo que põe o pagode de boca aberta, dá votos, e faz as delícias de alguns arquitectos e construtores civis.

Thursday, July 24, 2014

MELHORES, MAS MUITO POUCO



 As Nações Unidas divulgaram ontem o "Human Development Report 2014".

No ranking do índice (a pgs. 160), Portugal é colocado na 41ª. posição. Subiu duas posições relativamente ao HDR 2013. Caiu 28 posições relativamente ao HDR 2002 (dados de 2000). Em 2000, Portugal era antecedido pelos países da Europa Ocidental, Estados Unidos da América, Japão, Nova Zelândia, Hong Kong, Singapura e Coreia do Sul. Ainda em 2000, Portugal situava-se na 26ª  posição do ranking do PIB per capita, significando isto que tinha, então, piores posições nos rankings da expectativa de vida e da escolaridade que no índice complexivo (esperança de vida, educação e PIB per capita). 

Em 2013 (HDR 2014) situavam-se acima de Portugal todos os países que já se encontravam acima em 2000, tendo sido apanhado pelo Chile (efeitos esperança de vida e educação), Emiratos Árabes Unidos (forte efeito PIB per capita e educação), Eslováquia (efeito PIB pc e educação), Polónia (educação), Lituânia (educação), Arábia Saudita (PIB,educação), Estónia (educação), Qatar (PIB, educação), Brunei (PIB, educação), República Checa (educação), Eslovénia (PIB, educação), e ainda Andorra e Liechtenstein, que não constavam dos rankings do HDR 2002. 

O efeito educação favoreceu todos os países que ultrapassaram Portugal.  Mesmo que se excluam da análise comparativa os países produtores de petróleo, a conclusão é a mesma. 

Ouve-se, com muita frequência dizer que "esta geração de portugueses é a melhor preparada de sempre". A propósito, tenho apontado neste bloco de notas que se trata de uma afimação que olha para o nosso passado e não repara para a evolução observada nos outros países com os quais essa geração melhor preparada tem de competir. Olha para trás, não olha para o lado. Pior ainda: uma larga maioria dessa (mal presumida) geração mais bem reparada de sempre emigrou ou está a preparar as malas.



Wednesday, July 23, 2014

SANTANA EM BELÉM

O senhor Santana Lopes foi entrevistado pelo Expresso e, a linhas tantas, afirma que "embora presunção e água benta cada um toma a que quer, acha que se tivesse continuado primeiro-ministro o país teria poupado tempo e dinheiro ... não teríamos navegado nesta lógica de fazer agora e pagar depois". Sente as pessoas na rua muito próximas dele e falam-lhe mais do que ele está a fazer na Santa Casa e às vezes de Lisboa ou da Figueira. Do passado como primeiro ministro ... não gosta dessa conversa.

O mais-que-certo candidato à presidência da República deixou obra feita na Figueira e Lisboa - não há autarca que não obre com cimento, que é a coisa mais fácil de fazer - mas esqueceu-se de pagar a fornecedores. Na Figueira deixou a Câmara mais endividada que nunca, Lisboa desatascou-se no primeiro mandato do senhor António Costa à custa da manobra da venda do Estado ao Estado dos terrenos do aeroporto. Agora, provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, um cargo que dá graças a Deus por lhe ter dado tal oportunidade, rodeado de receitas por todos os lados, está nas suas sete quintas.

Relativamento aos outros putativos candidatos a Belém, o entrevistado considera que Gueterres é batível porque um dia disse, vou-me embora que vem aí o pântano, que o eleitorado português ainda não recebeu Barroso de volta, que Marcelo tem feito de depender a candidatura do apoio dos partidos, logo não vai candidatar-se porque ele, Santana, vai estar na corrida, Rio tem mais perfil para contas. Quem é que pode dizer o contrário?

Linearidade e lábia não lhe faltam. Por agora, percebe-se que o menino guerreiro  já vai a caminho de Belém, com experiência e perfil de provedor para a misericórdia que precisa este país.

Tuesday, July 22, 2014

DESLUSTRES DO BCP

O BCP tem uma enorme dívida aos contribuintes portugueses. Como a generalidade da banca portuguesa, tem vastas culpas no cartório da irresponsabilidade com que o sistema se endividou e endividou o Estado e as famílias, provocando uma carga financeira insuportável sobre a economia. Depois, o resgate imposto sob a forma de recapitalização foi imposto pela troica com a intermediação do Estado para comprometer os contribuintes portugueses na manobra. Ouve-se, a este propósito, que o Estado está a ganhar bastante com a intervenção, mas as contas não estão bem feitas porque aos juros pagos pelos bancos recapitalizados via troica há que deduzir a rentabilidade conseguida pelas aplicações dos capitais das recapitalizações, incluindo os empréstimos ao Estado, e considerar os riscos de incumprimento dos recapitalizados, que não são nada negligenciáveis.

Pois o BCP, constatámo-lo hoje quando visitámos mais uma vez o Palácio de Monserrate com os netos, detem (supõe-se que ainda detem), um lustre que há muitos anos atrás pendia do tecto da "Sala da Música", agora recuperada. "Adquirido no leilão do espólio do Palácio em 1946, encontrava-se até há pouco tempo no Paço da Palmeira, em Braga, propriedade do BCP, mas não foi possível chegar a acordo com o banco para o seu retorno a Monserrate", lê-se num quadro explicativo exposto na "Sala da Música".

E não há quem com força bastante capaz de os convencer?

clicar para aumentar


Monday, July 21, 2014

ROUBADOS E GOZADOS

"Como Gold Sachs e Nomura, de Londres, sacaram milhões aos contribuintes" portugueses em contratos de swap subscritos pela administração dos Transportes Colectivos do Porto. A explicação vem hoje publicada em The INDEPENDENT e constitui mais uma das peças com divulgação internacional das manobras com que, pela mão dos banqueiros, Portugal foi atirado para uma situação de insolvência financeira.  

Há uns tempos atrás anotei neste bloco de notas que nunca às adminitrações de empresas públicas deveria ser consentido negociarem contratos de financiamento bancários se dependem de subsídios ou reforços de capital do Estado. Aos gestores das empresas públicas deve exigir-se que dirijam as actividades operacionais das empresas optimizando os serviços públicos prestados e reduzindo os custos operacionais. O financiamento bancário das empresas públicas assumiu durante muitos anos a forma encapotada de endividamento público. Os sucessivos governos não só não impediram os gestores das empresas públicas de assumirem riscos financeiros que, manifestamente, não sabiam medir, como incentivaram essa via de desorçamentação. Hoje, a situação, é algo diferente mas não significativamente diferente. Subsistem as condições para se repetirem (ou estarem a repetir) mais estampanços financeiros com contas que os governos carregam depois às costas dos contribuintes. 
.
Afirma o articulista de The INDEPENDENT: Uma empresa pública portuguesa de transportes públicos negociou um contrato de swap de taxa de juro que acabou por custar uma fortuna. 
E pergunta (uma pergunta extremamente pertinente): Terão os negociadores portugueses percebido as páginas e páginas de álgebra do contrato?
.
O artigo vale bem uma leitura inteira. Começa, mais ou menos, assim:

"Se você não sabe quem está a ser otário numa mesa de poker o melhor que tem a fazer é retirar-se:  o otário é você. Este truísmo, ensinado a qualquer novo gestor de contas de um banco de investimentos, é geralmente ignorado pelos representantes do Estado destacados para negociar com os banqueiros.  Mas se  suspeita que  os contribuintes britânicos são espoliados nestes negócios do Estado com a banca deveria ver o que aconteceu na Itália, em França, em Portugal não apenas durante o período de gestação da crise mas também depois."*
---
*If you can’t spot the sucker at the poker table, better fold fast: the sucker is you.

That truism, taught to every investment bank intern, sadly rarely seems to filter out to civil servants when they’re sent in as cannon fodder to negotiate with the City’s deal makers.
But if you suspected that we British taxpayers have been fleeced at every turn by the bulge-bracket banks, you should see some of the deals the public sector was suckered into over in Italy, France and Portugal, not only in the run-up to the financial crisis, but also afterwards.

EXPLICA-ME COMO SE EU FOSSE MUITO BURRO*



QUE É O BCE?
- O BCE é o banco central dos Estados da UE que pertencem à zona euro, como é o caso de Portugal.

E DONDE VEIO O DINHEIRO DO BCE?
- O dinheiro do BCE, ou seja o capital social, é dinheiro de nós todos, cidadãos da UE, na proporção da riqueza de cada país. Assim, à Alemanha correspondeu 20% do total. Os 17 países da UE que aderiram ao euro entraram no conjunto com 70% do capital social e os restantes 10 dos 27 Estados da UE contribuíram com 30%.

E É MUITO, ESSE DINHEIRO?
- O capital social era 5,8 mil milhões de euros, mas no fim do ano passado foi decidido fazer o 1º aumento de capital desde que há cerca de 12 anos o BCE foi criado, em três fases. No fim de 2010, no fim de 2011 e no fim de 2012 até elevar a 10,6 mil milhões o capital do banco.

ENTÃO, SE O BCE É O BANCO DESTES ESTADOS PODE EMPRESTAR DINHEIRO A PORTUGAL, OU NÃO? COMO QUALQUER BANCO PODE EMPRESTAR DINHEIRO A UM OU OUTRO DOS SEUS ACCIONISTAS ?
- Não, não pode.

PORQUÊ?!
- Porquê? Porque... porque, bem... são as regras.

ENTÃO, A QUEM PODE O BCE EMPRESTAR DINHEIRO?
- A outros bancos, a bancos alemães, bancos franceses ou portugueses.

AH PERCEBO, ENTÂO PORTUGAL, OU A ALEMANHA, QUANDO PRECISA DE DINHEIRO EMPRESTADO NÃO VAI AO BCE, VAI AOS OUTROS BANCOS QUE POR SUA VEZ VÃO AO BCE.
- Pois.

MAS PARA QUÊ COMPLICAR? NÂO ERA MELHOR PORTUGAL OU A GRÉCIA OU A ALEMANHA IREM DIRECTAMENTE AO BCE?
- Bom... sim... quer dizer... em certo sentido... mas assim os banqueiros não ganhavam nada nesse negócio!

AGORA NÃO PERCEBI!!..
- Sim, os bancos precisam de ganhar alguma coisinha. O BCE de Maio a Dezembro de 2010 emprestou cerca de 72 mil milhões de euros a países do euro, a chamada dívida soberana, através de um conjunto de bancos, a 1%, e esse conjunto de bancos emprestaram ao Estado português e a outros Estados a 6 ou 7%.

MAS ISSO ASSIM É UM "NEGÓCIO DA CHINA"! SÓ PARA IREM A BRUXELAS BUSCAR O DINHEIRO!
- Não têm sequer de se deslocar a Bruxelas. A sede do BCE é na Alemanha, em Frankfurt. Neste exemplo, ganharam com o empréstimo a Portugal uns 3 ou 4 mil milhões de euros.

ISSO É UM VERDADEIRO ROUBO... COM ESSE DINHEIRO ESCUSAVA-SE ATÉ DE CORTAR NAS PENSÕES, NO SUBSÍDIO DE DESEMPREGO OU DE NOS TIRAREM PARTE DO 13º MÊS.
As pessoas têm de perceber que os bancos têm de ganhar bem, senão como é que podiam pagar os dividendos aos accionistas e aqueles ordenados aos administradores que são gente muito especializada.

MAS QUEM É QUE MANDA NO BCE E PERMITE UM ESCÂNDALO DESTES?
- Mandam os governos dos países da zona euro. A Alemanha em primeiro lugar que é o país mais rico, a França, Portugal e os outros países.

ENTÃO, OS GOVERNOS DÃO O NOSSO DINHEIRO AO BCE PARA ELES EMPRESTAREM AOS BANCOS A 1%, PARA DEPOIS ESTES EMPRESTAREM A 5 E A 7% AOS GOVERNOS QUE SÃO DONOS DO BCE?
- Bom, não é bem assim. Como a Alemanha é rica e pode pagar bem as dívidas, os bancos levam só uns 3%. A nós ou à Grécia ou à Irlanda que estamos de corda na garganta e a quem é mais arriscado emprestar, é que levam juros a 6, a 7% ou mais.

ENTÃO NÓS SOMOS OS DONOS DO DINHEIRO E NÃO PODEMOS PEDIR AO NOSSO PRÓPRIO BANCO!...
- Nós, qual nós?! O país, Portugal ou a Alemanha, não é só composto por gente vulgar como nós. Não se queira comparar um borra-botas qualquer que ganha 400 ou 600 euros por mês ou um calaceiro que anda para aí desempregado, com um grande accionista que recebe 5 ou 10 milhões de dividendos por ano, ou com um administrador duma grande empresa ou de um banco que ganha, com os prémios a que tem direito, uns 50, 100, ou 200 mil euros por mês. Não se pode comparar.

MAS, E OS NOSSOS GOVERNOS ACEITAM UMA COISA DESSAS?
- Os nossos Governos... Por um lado, são, na maior parte, amigos dos banqueiros ou estão à espera dos seus favores, de um empregozito razoável quando lhes faltarem os votos.

MAS ENTÃO ELES NÃO ESTÃO LÁ ELEITOS POR NÓS?
- Em certo sentido, sim, é claro, mas depois... quem tem a massa é quem manda. É o que se vê nesta actual crise mundial, a maior de há um século, para cá. Essa coisa a que chamam sistema financeiro transformou o mundo da finança num casino mundial, como os casinos nunca tinham visto nem suspeitavam, e levou os EUA e a Europa à beira da ruína. É claro, essas pessoas importantes levaram o dinheiro para casa e deixaram a gente como nós, que tinha metido o dinheiro nos bancos e nos fundos, a ver navios. Os governos, então, nos EUA e na Europa, para evitar a ruína dos bancos tiveram de repor o dinheiro.

E ONDE O FORAM BUSCAR?
- Onde havia de ser!? Aos impostos, aos ordenados, às pensões. De onde havia de vir o dinheiro do Estado?...

MAS METERAM OS RESPONSÁVEIS NA CADEIA?
- Na cadeia? Que disparate! Então, se eles é que fizeram a coisa, engenharias financeiras sofisticadíssimas, só eles é que sabem aplicar o remédio, só eles é que podem arrumar a casa. É claro que alguns mais comprometidos, como Raymond McDaniel, que era o presidente da Moody's, uma dessas agências de rating que classificaram a credibilidade de Portugal para pagar a dívida como lixo e atiraram com o país ao tapete, foram... passados à reforma. Como McDaniel é uma pessoa importante, levou uma indemnização de 10 milhões de dólares a que tinha direito.

E ENTÃO COMO É? COMEMOS E CALAMOS?
 Isso já não é comigo, eu só estou a explicar...
---
* O texto transcrito circula há algum tempo já na internet. Recebi-o hoje via e-mail remetido por um ex-líder líder durante alguns anos de um dos partidos representados na AR. Se ele não entende, haverá por aí alguém que lhe explique. E, já agora, a mim também.
 

Saturday, July 19, 2014

OS INVENTA MILHÕES

Para onde foram os milhares de milhões em que se mede a falência do grupo Espírito Santo?, perguntava um amigo há dias como quem pergunta para onde vai a alma dos pardais. Evaporaram-se, sabe-se lá onde param? E de onde vieram as centenas de milhões com que os Espírito Santo aumentaram o capital do BES para evitar evitar a recapitalização receitada pela troica, perguntava quinta-feira à noite o putativo candidato a primeiro-ministro António Costa?

Neste último caso, a resposta parece mais fácil mas desperta uma data de dúvidas grossas.
Sabe-se que o grupo ES emitiu "papel comercial" como os bancos centrais emitem papel moeda, contando enrolar a manta como qualquer dona Branca sem pedigree nem banco atrás. A emissão de "papel comercial" pelo GES,  passado aos balcões do BES, era do conhecimento do Banco de Portugal. Desconheciam,  nessa altura, no Banco de Portugal a progressão do sobreendividamento do GES? A emissão de papel moeda faz-se consoante a regra do senhor-se-queira? À vontade do freguês? Tinha mais poder de emitir papel o Espírito Santo que o senhor Carlos Costa, que não tem nenhuma?

A prestidigitação financeira continua perante o embevecimento do regulador. O presidente do Banif afirmava ontem que não tem pressa em dar entrada a capitais da Guiné Equatorial por ter, para já, resolvido o problema da recapitalização do banco; o presidente do  BCP, depois de anunciar maus resultados, anunciou que vai antecipar o reembolso do empréstimo troica intermediado pelo Estado.
De onde vêm os cabritos vendidos por esta gente sem cabras?
---
Correl. - (22/7) - BPI prevê que BCP diminua prejuízos e aumente margem financeira








Friday, July 18, 2014

NUNCA DIGAS TUDO

Mesmo "se tudo corresse mal no BES, a solvência estaria garantida e os clientes estariam salvaguardados". Palavras do senhor Carlos Costa, hoje, na comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Administração Pública.

Tudo, é claramente demais. 
O senhor governador, querendo estabilizar o barco, exagerou. A menos que, partindo do princípio de
que, em última instância, pagam as culpas os contribuintes, sendo o BES too big to fail, os depósitos estarão sempre garantidos pelos impostos. Porque, quanto ao cerne da situação, a opacidade é cada vez mais densa: tanto que o novo presidente CEO pretende uma auditoria às contas, o senhor governador do Banco de Portugal uma auditoria forense, e a PGR informa que se encontram abertos vários inquéritos de averiguação de relevância penal. 

Em que ficamos, afinal?
O senhor governador, que ocupa o cargo há três anos, sabendo que o seu antecessor, considerado pelo senhor Daniel Bessa, na presença divertida do senhor Carlos Costa, o culpado número um da nossa desgraça, por se ter distraído na supervisão do BPN, BPP, BCP, Banif, Caixa (sim, senhor governador, sabe que na Caixa também se produziram muitas porcarias) consentiu os descalabros que ainda ninguém conseguiu medir como deve ser e pela Justiça podemos esperar sentados, durante estes três anos não ouviu retinir no Banco de Portugal nenhum alarme mesmo quando das contas do BES constava um grosso crédito ao grupo Espírito Santo? Se não se tivessem arranhado os primos até quando o senhor Carlos Costa continuaria a fazer o papel de senhor constâncio?

Até quando, senhor Carlos Costa, abusarão da nossa paciência?
---
(30/7) - "BES precisa de 1500 a 3000 milhões de capital
O Governo já assegurou junto do BCE que há 6.400 milhões disponíveis para ajudar recapitalização do BES. O colapso do GES e alegadas actuações ilícitas causaram perdas de 3.250 milhões no banco, ou seja, 90% dos maiores prejuízos da história da banca."

PORTUGAL ARRASA A ALEMANHA





No tempo em que não havia televisões havia imaginações. 
Era o tempo em que o ego dos portugueses inchava o que podia, a ver, ouvindo, as derrotas que os rapazes do hoquei em patins infligiam a todos quantos lhes aparecessem pela frente, salvo se fossem espanhóis ou italianos, aí as coisas fiavam mais fino, e o tempero patriótico redobrava o desgosto se ganhavam os castelhanos. Os locutores radiofónicos imprimiam tal entusiasmo aos relatos que não havia nenhum português legítimo que não visse mesmo visto a bola a girar quase à velocidade da luz entre os patinadores portugueses para se anichar na rede dos adversários. Seriam raríssimos os que algumas vez tivessem visto ao vivo uma batalha daquelas mas a  ninguém escapava o traçado das jogadas que tinham levado aos golos. Hoquistas e ciclistas rivalizavam em popularidade com os futebolistas mais destacados da altura, mas só os equilibristas de cacete em punho mostravam nas disputas com estrangeiros  de que massa tinham sido feitos os portugueses.

Um dia arribei a Lisboa, e pouco tempo depois fui ver um jogo no ringue.
Uma desilusão total. A bola, pequena e preta, rodopia em distâncias curtas, escapa-se à visão do espectador menos habituado à dança, anda por trás e pelos lados das redes, só se sabe se é golo quando os goleadores levantam os cacetes a celebrar o sucesso. De tal modo que continuo convencido que melhor que ver um jogo de hoquei em patins é ouvi-lo pela rádio. Ou, simplesmente, ler as notícias.

Caramba. No fim, nem sempre ganha a Alemanha.

Thursday, July 17, 2014

A CRISE DOS OUTROS

Repetidamente, solta-se a notícia do estilo: Os portugueses lideram as compras de automóveis na Europa*. Alguns dirão ainda bem, é sinal que a economia está a recuperar. Mas, lamentavelmente, não são essas as indicações das estatísticas oficiais. A associação de importadores de automóveis dirá que a maior parte dessas compras são feitas por operadores de rent-a-car, ou que, tendo havido uma quebra tão elevada das vendas no primeiro ano da crise, o crescimento agora observado reporta-se sobre uma base muito deprimida. Talvez tudo isso seja em parte verdade mas não justificam o crescimento espectacular nas vendas dos carros de gama alta.

O que, realmente, acontece é a confirmação do que há muito se sabe: há muita gente que não foi atingida pela crise, há muita gente até que beneficiou com ela. É o resultado da iniquidade da política deste governo que faz pagar a crise aqueles que nenhuma culpa tiveram na sua génese e desenvolvimentos posteriores.

Mas como não há nada que explique tudo, é bem possível que parte deste crescimento de vendas de automóveis, e do consumo em geral, que já determinou a inversão do saldo da balança comercial, seja determinado pelo crescimento do crédito individual e pela redução das poupanças das famílias, sem que queiram, ao que parece, os responsáveis ter mão nisso.
---
*Portugal tem a maior taxa da Europa no registo de carros novos no primeiro semestre do ano: 37,7%. Com o registo de 75.780 veículos ligeiros de passageiros, Portugal supera em mais de cinco vezes a taxa média da União Europeia, que ficou nos 6,5% no período em análise, de acordo com os dados hoje divulgados pela Associação Europeia de Fabricantes Automóveis (ACEA). Na análise da evolução mensal de um dos sectores que mais sofreu o impacto da crise económica, a associação refere que a subida de registos na Europa foi de 4,5% continuando a tendência de alta no comércio automóvel iniciada há 10 meses. Em junho, a Alemanha foi o único país, entre os grandes mercados europeus, a ver cair (1,9%), mas, no semestre, o registo de carros alemães também cresceu 2,4%.
cf . aqui

Wednesday, July 16, 2014

PESCADO DE RABO NA BOCA

À primeira vista Henrique Granadeiro era a "bête noire",  o culpado até aos gorgomilos de um investimento astronómico desastrado para desenrascar o amigo e protector, ou vice versa, Ricardo Salgado. Segundo esta versão, Granadeiro teria tomado uma decisão de altíssimo risco sem consultar o conselho de administração, sem informar a parceira Oi e sem dar cavaco ao grande mágico, Zeinal Bava. A Oi, aliás, informou o mercado que não tinha sido ouvida e, segundo as notícias, Zeinal Bava mostrou-se surpreendido com a notícia.

Segundo o Expresso de hoje, - vd. aqui - O conselho de administração da Portugal Telecom estará a  avaliar, relativamente à dívida da Rioforte, a possibilidade de processar o Banco Espírito Santo.  O BES, que tem um acordo de parceria desde 2001 com a PT, foi sempre quem aconselhou os vários investimentos feitos pela operadora. E foi também quem indicou o investimento em papel comercial da Espírito Santo International e da Rioforte.
.
Lê-se isto, e o nosso espanto não tem medida. 
Como é que Zeinal Bava ignorava a existência de uma dívida que foi rolando ao longo de vários anos, durante a maior parte dos quais ele mesmo foi primeiro responsável pela gestão da PT?
Como é que a Oi desconhecia, quando se realizaram as negociações de fusão, a existência no activo da PT de um valor descomunal relativamente aos activos totais da PT? Podia o BES desconhecer a situação financeira da Rioforte e, deste modo, ter recomendado os empréstimos da PT à Rioforte de boa fé? Não podia. Ricardo Salgado, presidente do BES estava inteiramente ciente da situação financeira do grupo Espírito Santo.
.
As dúvidas acumulam-se e adensa-se a opacidade da situação. O governador Carlos Costa reafirma a garantia que o banco está sólido, as acções do BES conseguiram hoje uma recuperação memorável de 20%!, no mesmo dia em que a PT diz pretender responsabilizar o banco por uma tramóia em que todos - Bava, Granadeiro, Salgado, e outros comparsas?, e a Oi? - foram intérpretes. Até agora só Granadeiro tinha aparecido na fotografia. A rapidez com que foram renegociadas as condições de alteração da participação da PT deixa antever que, com o tempo, haverá mais gente a ficar muito mal nela.
---
Act. - (17/7) Granadeiro fora da empresa que resulta da fusão PT/Oi "A decisão poderá prender-se com o facto de Granadeiro ter aprovado o aumento da exposição da PT ao GES, no mês de Fevereiro de 750 milhões de euros para 950 milhões".    

Vamos lá a ver se percebi bem. Até Fevereiro a exposição da PT ao GES estava em 750 milhões. Quem aprovou? Não pode ter sido apenas Granadeiro, se fosse a decisão de o afastar não poderia resumir-se à aprovação de mais 200 milhões. Alguém aprovou, ou homologou, a aprovação da exposição até 750 milhões. Alguém que não pode ter sido Granadeiro. Quem foi? Não sabemos. Mas é altamente improvável que o conselho de administração da PT, Zeinal Bava, e o conselho de administração da Oi desconhecessem o valor que tinha atingido a exposição até fevereiro. Decidiram, em algum momento, bloquear qualquer aumento dessa exposição e Granadeiro desrespeitou essa decisão? É improvável. Se o aumento da exposição autorizada por Granadeiro em fevereiro tivesse desrespeitado qualquer decisão em sentido contrário, como é que o mesmo Granadeiro se mantem na presidência da PT desde fevereiro? Ninguém olhou para as contas?
Continuamos a assistir ao desbobinar de thriller. 
Habitualmente, neste género de fitas os culpados tardam a aparecer.
---
(24/7) -
Carlos Tavares: CMVM suspeita de crime no negócio PT/GES.
"No caso da PT, não funcionaram os mecanismos de controlo interno da sociedade. Como é que foi possível?" O líder do supervisor confessou estar surpreendido que tal posso ter acontecido "numa empresa cotada, com muitos acionistas, sem que os órgãos devidos de controlo tenham funcionado".  "Não nos basta aquela afirmação de que não sabiam. 900 milhões de euros não se escondem em qualquer sítio. Alguém, dentro dos auditores, do revisor oficial de contas, alguém tem que pedir informações". Daí, no seu entendimento, terá que haver responsabilização dos auditores e dos órgãos de fiscalização da PT. Até porque o mercado tem que saber "se a PT está exposta a riscos que não sejam do seu próprio negócio". - cf. aqui.




Tuesday, July 15, 2014

ONDE MORA A ÉTICA?



(Comentário colocado aqui )

"Concordo que o sentido de responsabilidade não pode ser assumido apenas perante a ameaça de punição porque deve decorrer de uma cultura de respeito pelos valores éticos prevalecentes. Divirjo, no entanto, da sua afirmação de que "a cultura da responsabilidade anda há muito afastada da nossa sociedade."
 .
E divirjo porque não me apercebo de um período da nossa história em que essa cultura de responsabilidade (poderemos chamar-lhe civismo?) tivesse alguma vez assumido um nível superior ao observado nos nossos dias. É verdade que, a julgar pelas palavras hoje esquecidas (vergonha, honra, etc.) poderíamos ser levados a concluir que o civismo na nossa terra já teve no passado dias melhores. Mas não é verdade. Terão existido sempre algumas excepções notáveis à generalizada mediocridade remida por penitências e bulas consoante os recursos dos pecadores, mas hoje também não somos todos velhacos. 
 .
Aliás, a consciência cívica de uma sociedade mede-se num intervalo que não vai de zero a cem. Há actos eticamente reprováveis em toda a parte. A sociedade portuguesa estará, no entanto, mal posicionada no ranking. Mas nunca esteve melhor. A reforma protestante se não estabeleceu vincou uma fronteira de exigência ética entre o norte e o sul. Daqui infiro que não é uma cultura de responsabilidade adquirível por outra via que não passe pela aplicação oportuna e universal da lei. Ora a percepção do que se passa em Portugal é precisamente a sistemática inobservância destes requisitos fundamentais ao funcionamento equilibrado de uma sociedade: a justiça é lenta e atinge sobretudo os mais desprotegidos. 
 .
Chegado a este ponto poderá perguntar-se se a maior perseguição da justiça aos pequenos terá induzido nestes comportamentos cívicos mais elevados que os que caracterizam os mais abonados. Em termos relativos estou certo que sim. *(Para lá) do  efeito imitação que geram, que sobe da base para o vértice em simetria com o efeito exemplo com percurso inverso, é inquestionável que as grandes transgressões ficam geralmente impunes, por sentença ou prescrição, (fomentando a reincidência e o alastramento da impunidade nos estratos mais elevados da sociedade).

No meio de tanta porcaria (desculpe o termo mas não encontro outro mais adequado) largada por banqueiros, políticos e outros coniventes que deu à tona nos últimos decénios interroga-se o cidadão comum: E ninguém vai preso? Se roubar um pão no supermercado, vai. Se for apanhado por evasão de vários milhões ao fisco, não. Onde mora a ética se anda tão ausente dos tribunais?"
---
*Modificado relativamente ao comentário original.