A história passa-se no tempo do Ramiro Valadão, não sei se algum dos leitores deste comentário já era vivo quando ele era presidente da RTP.
Um jovem consultor (tinha, na altura 30 anos) foi chamado a introduzir um sistema que permitisse calcular os custos dos programas emitidos pela RTP.
No dia seguinte ia ser transmitido o festival da canção, que Carlos Mendes ganharia com "A Festa da Vida", e o Diário Popular publicava um desenho que esquematizava o cenário e, no cenário, todos os intervenientes.
O consultor aproveitou o boneco do Diário Popular e, a partir dele, apresentou uma proposta que foi bem sucedida, até pelo inesperado conhecimento que o técnico demonstrava dos bastidores de uma empresa onde nunca tinha entrado.
Aceite a proposta, iniciaram-se entrevistas com todos os responsáveis pelos diferentes departamentos. Um deles, Soares Louro, que era responsável pela logística, um lugar fulcral para observar os acontecimentos, depois de ter respondido muito detalhadamente a acrescentado o que havia passado despercebido ao consultor, rematou para fim de conversa:
- Desejo-lhe boa sorte! Estamos a precisar duma coisa dessas há muito tempo.
Mas, sem querer desanimá-lo, sempre lhe digo que não vai ser fácil, mesmo nada fácil controlar nesta casa seja o que for.
E sabe porquê? Aqui, todos se consideram artistas. Desde o porteiro ao lugar cimeiro.
Acabado o trabalho de campo, apresentado o relatório, seguiu-se a implementação dos processos. Que requeriam uma coisa elementar a um sistema de cálculo de custos: que se soubesse onde estava quem e quando a fazer o quê.
Uma tal proposta foi considerado um insulto à liberdade criativa pela generalidade dos "artistas" e o relatório arquivado pelo administrador do pelouro antes que o levassem ao pelourinho.
Quatro anos depois, alguém teve a peregrina ideia de chamar o consultor para uma segunda tentativa para se saber o quanto custava o quê na RTP. Abortou logo na primeira reunião com os representantes da comissão de trabalhadores.
Hoje, os artistas são outros mas a cultura de inimputabilidade permanece. Porque somos nós a pagar o preço da liberdade criativa destes artistas.
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