Thursday, June 28, 2012

UM PAÍS SEM JUÍZO

O António Pinho Cardão tem referido com alguma insistência, nomeadamente no Quarta República, que em Portugal a liberdade de empreender e investir é um mito. No "Portugal 2020", que sintetiza as conclusões do Projecto Farol, de que fez parte, escreve "Centenas de projectos de investimento acabam por perder o timing, depois de passarem anos e anos nos departamentos oficiais, e outros aguardam tempos infindos os pareceres intermédios e finais que possibilitam uma tomada de decisão. A prática está tão consagrada que, quando o licenciamento é rápido, em vez de se louvar a diligência, logo surgem vozes a acusar de suspeita ou de corrupção quem interveio na autorização".

O APC terá certamente informações acerca do assunto que me escapam.
Há cerca de um ano perguntei a um assessor financeiro num banco de investimento se os objectivos da entidade onde trabalhava se resumiam à venda de produtos financeiros, se o banco, nominalmente de investimento, não direccionava os recursos que captava para o fomento de novos investimentos, e, sobretudo para a economia reprodutiva. O assessor esboçou um sorriso condescendente e respondeu-me que os seus colegas do departamento de financiamento, por não terem projectos para analisar, se entretinham a jogar com uma bola de papel nos corredores.

Por outro lado são frequentes as notícias de novos investimentos estrangeiros que se esvaziaram pouco tempo depois. Toda a gente reclama crescimento económico, porque sem crescimento económico não há crescimento de emprego, mas sem investimento não há uma coisa nem outra. Com o país endividado até ao cocuruto, alguns continuam a exigir investimento público por abstinência de investimento privado, mas esses também não sabem como é possível o investimento público com o Estado no estado em que está.

É neste ambiente desesperado que o APC diz que há quem queira investir, sim senhor!, o diabo é que o condicionamento industrial de facto continua a afundar este país desde o tempo do outro senhor.
Continuo perplexo.

Hoje ouço na rádio que (vd aqui ) "Um fiscal há 17 anos ao serviço da Câmara Municipal de Valongo exigiu 1100 euros a um casal para legalizar o café de que era proprietário. Os comerciantes aceitaram, mas quando exigiram o recibo do dinheiro a pagar, o funcionário da autarquia ameaçou fechar o estabelecimento por falta de licença."
Foi condenado a 30 dias de suspensão sem vencimento. Se respondesse perante um patrão privado teria sido demitido com justa causa.

Temos um Instituto do Investimento Estrangeiro. Não temos Instituto de Investimento Nacional. Por que não se abrevia o nome ao IIE e se alargam as suas atribuições? Por que não Instituto do Investimento, com um departamento que fizesse o follow up dos licenciamentos solicitados aos orgãos incumbidos da matéria?

Que, além do mais, recebesse e averiguasse as reclamações dos investidores, nacionais e estrangeiros?

Alguém é capaz de dizer isto ao Álvaro?

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Cor.- Ministro da Economia insultado e cercado na Covilhã.
Pires de Lima dizia anteontem no programa "Olhos nos Olhos" que nunca foi convidado para ME. E que o Ministério da Economia é o que é porque este ministro não conhece as empresas e o ME sempre foi atribuído ao Bloco Central. Está disponível, portanto, se o PM insiste em governar com o PS fora da execução dos compromissos que assumiu.

3 comments:

Pinho Cardão said...

Caro Rui:
Disse, escrevi e mantenho.
Tu referes, citando alguém da Banca de Investimentos, que não há projectos. Mas nem todos os projectos passam pela banca de investimentos, longe disso. Por aí passam só os grandes. Muitos passam pela banca comercial e a quase totalidade não passa por uma ou por outra antes de obtido o licenciamento.Por aí já vês que não podes tirar conclusões do que te foi dito. Agora o que te posso asseverar é que há muitos e muitos projectos a jazer na burocracia. A burocracia impede tudo.Ainda hoje me contaram, e é fidedigno, que os promotores, brasileiros, de um grande projecto no Porto desistiram de um projecto que até já estava aprovado, porque a Câmara lhes pediu 6 milhões de euros pela certidão do licenciamento. Um investimento que empregava umas centenas de pessoas.

Rui Fonseca said...

António,

Obrigado pelo teu comentário.

A minha perplexidade decorre precisamente das tuas afirmações quando as confronto com a ideia generalizada que não há quem queira investir, sobretudo nestes tempos de incerteza máxima.

A notícia de ontem do caso de Valongo, apesar de envolver um pequeníssimo negócio, confirma a tua posição.

Parece-me, portanto, que continua a haver uma (mais uma!) actividade criminosa a subverter o processo de crescimento económico, em tão larga escala que até atinge o licenciamento de pequenos estabelecimentos comerciais.

O ministério da Economia, do meu ponto de vista, deveria olhar por isto acolhendo, analisando e processando, se for caso disso os bloqueadores, corruptos ou simplesmente incompetentes.

Porque, afinal, anda o ministério à procura de investimento e não cuida de perceber o que se passa cá dentro.

Pinho Cardão said...

Pois é isso mesmo, caro Rui. Simplesmente, parece que não há nenhum governo capaz de fazer com que a burocracia esteja ao serviço do país e não ao serviço dela própria.
Há muitos pequenos projectos presos pela vontade de meia dúzia de funcionários. O que eles não dinamizariam actividades locais?
Aliás, é aqui, nos licenciamentos, que está muito da génese da corrupção.
Existe um condicionamento industrial burocrático tão nocivo como o de Salazar.