“Ninguém pode ser a favor de um país de gente pobre, onde não se ganha bem a vida. O nosso futuro não é esse, nem nenhuma política pode ser baseada nesse argumento ... “Nós precisamos é de um novo modelo de desenvolvimento económico que torne possível que as pessoas tenham salários que se aproximem dos níveis europeus" ... "De facto o que é que se tem passado com os salários em Portugal? Têm de facto baixado. Estamos numa situação muito dfícil, muito complicada, há muito desemprego e realmente (é preciso) algum realismo que permita a economia crescer mais depressa, isto é uma coisa que o país precisa, que ajuda o país no momento difícil que atravessamos. Agora construir com base nisto uma política para o futuro não faz sentido." - Prós e Contras (12/6)
Borges mudou de discurso? Não mudou. Mudou o tom. E o tom, é (quase) tudo no discurso político.
Se a moderadora do programa lhe tivesse perguntado que "novo modelo de desenvolvimento económico é esse que torne possível que as pessoas tenham salários que se aproximem dos níveis europeus"?, provavelmente Borges mudaria de registo político.
Porque Borges sabe que os salários (e pensões) de alguns foram discricionariamente reduzidos, que os salários de outros estão a ser reduzidos pelo aumento do desemprego, e que, finalmente, os rendimentos de outros, incluindo os de Borges, permanecem intocáveis. Borges não advoga a redução dos salários como suporte de um desenvolvimento económico que nos aproxime dos europeus. Nem ele nem ninguém que saiba o que está a dizer. O que ele diz, sem tirar nem pôr, é que, "há muito desemprego e (é necessário) algum realismo (leia-se, redução de salários) que permita a economia crescer mais depressa, isto é uma coisa que o país precisa que ajuda no momento difícil que atravessamos".
"Agora construir com base nisto uma política para o futuro não faz sentido", rematou Borges, facilmente, com um remate já mil vezes ouvido em todos os quadrantes políticos.
O que Borges não disse, o que ninguém diz, é como é que a economia portuguesa (e não só, já que o fantasma do desemprego paira por toda a parte) vai absorver mais de 700 mil desempregados de sectores, e nomedamente da construção e obras públicas, que não voltarão tão cedo aos níveis de actividade que o crédito descontrolado a preços de saldos seduziu.
A redução do poder de compra de uma parte da população tem promovido o reequilíbrio da balança comercial (mais exportações, menos importações, mais poupança) e, provavelmente, atingirá no fim do ano um saldo praticamente nulo, o que constituirá uma novidade em Portugal. Mas, e Borges não disse isto, ao mesmo tempo que as exportações se animam, o desemprego aumenta.
As privatizações já realizadas foram um sucesso, segundo Borges. E espera que as da ANA e da TAP vão pelo mesmo caminho, atendendo à quantidade de interessados. O José Maria (Brandão de Brito) de quem Borges é "muito amigo" chamou-lhe a atenção que em nenhum dos casos já consumados (EDP e REN) se deu um influxo de mais actividade e, portanto, de mais emprego. Simplesmente mudaram de dono.
Borges, contudo, não se ficou pela mudança de tom quanto áo realismo da redução de salários, e avançou para a completa recomposição da sua imagem criticando os desmandos dos bancos (!) e enaltecendo a social democracia sueca, onde a participação do estado é maioritária na produção da riqueza, mas também onde o sentido do respeito pelos interesses comuns é universalmente prosseguido.
A finalizar, ainda referiu que em Portugal os níveis de desigualdade social são dos mais elevados no âmbito da OCDE, uma situação que se agravou nas últimas décadas. Isto é, também neste caso, Borges falou contra os seus próprios interesses, passados e actuais, mas não sei quantos entenderam isso.
Precisamos de arrumar a casa, domesticando o défice e a dívida, e implementando as reformas estrurais receitadas pela troica.
E que mais?
Já passava da meia noite e meia. Hoje, a que horas se levantaram os portugueses, que viram o programa, para ir trabalhar?
A que horas se deitaram os suecos?
A que horas se deitaram os suecos?
2 comments:
Nitidamente foi um programa para redimir a face do Borges! Nunca se viu ir tão longe para a remissão de um "politico" pois não se tratou de redimir o tecnocrata mas sim o politico, daí este discurso todo. Não se deixou de notar no fundo quem Borges serve pois quando se falou de privatizações o Borges só conseguiu dar a versão de quem quer comprar. Só são apetecíveis esta e esta empresa. As águas ainda trazem problemas mas ele está a trabalhar para que elas se tornem apeteciveis ao senhores do dinheiro. E Portugal aonde ficou?
A Fátima Campos ficou aquem daquilo que deve ser o seu papel.
Mas Borges também não foi contraditado pelos outros, salvo de forma muito breve pelo seu amigo José Maria.
De qualquer modo não pode negar-se a Borges a capacidade para dominar um jogo que, à partida, lhe parecia muito desfavorável.
Vitor Bento esteve aquem do que es esperava, aparentemente inseguro, sem razões aparentes, Vitorino foi exuberante mas redondo, Brandão de Brito muito low profile como é seu hábito.
E Borges saiu por cima.
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