Monday, February 02, 2009

MADE IN PORTUGAL

(...) diga-me quais são os produtos "made in Portugal" que podemos comprar?

A questão, muito pertinente, foi colocada aqui a propósito de um comentário meu à política norte-americana, que se avizinha, de protecção às indústrias transformadoras dos EUA como umas das formas de relançar a economia e inverter a tendência de desemprego crescente, e que se resume no slogan "Buy American".

É muito frequente em textos de projecções macroeconómicas utilizar-se o raciocínio simplista: "Se tudo o mais se mantiver igual, acontecerá isto". A realidade social é de tal modo complexa e dinâmica que os modelos que possam construir-se para a sua análise prospectiva têm de, forçosamente, optar pela simulação da observação parcial de um número restrito de factores, imobilizando todos os outros. "Ceteribus paribus..."

Voltando à realidade económica portuguesa actual, provavelmente o factor mais crítico é a dívida, externa ou interna, pública ou privada, individual ou conjunta. Trata-se de uma questão muito discutida (por exemplo aqui , mas parece inquestionável que a dívida atingiu níveis preocupantes e, se nada for feito para contrariar a tendência, as consequências serão dramáticas: redução (consensualizada) dos salários (hipótese improvável na actual conjuntura política interna) ou aumento das taxas de desemprego (forçando a redução salarial a médio prazo).

Nada disto é novo. Já em Fevereiro de 2006, Olivier Blanchard, na sua comunicação à 3ª Conferência do Banco de Portugal, à qual me referi aqui dizia isso mesmo. Recordo-me que algum tempo depois, Fernando Ulrich, com aquele modo que ele tem de partir a loiça, dizia o mesmo. De que não tenho é notícia de que ele tenha começado por dar o exemplo. Avisos destes, geralmente, não alteram nada porque imediatamente incomodam pouco.
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O que deveria ser espantoso, mas não é, é a repetição até à náusea com que se enchem as colunas dos jornais (e dos blogues) com solenes e sérios avisos de gente que sabe do que fala mas que fala, geralmente, "ceteribus paribus", isto é, alertam vezes sem conta de que vamos no caminho que nos conduz ao desastre se não arrepiarmos caminho mas não nos dão conta das vias alternativas.
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Que têm, necessariamente, de ser várias em simultâneo. Se houvesse uma, larga e desimpedida, seguramente que já teria sido descoberta. Dir-se-á: No ponto em que as coisas estão já não há solução amigável. O que é, altamente, provável. Mas essa elevada probabilidade de termos de atravessar um caminho ruim não nos deveria coibir de procurar alguns meios que tornassem menos dolorosa a travessia.
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Se a dívida está a crescer de forma que só não é imparável porque não pode ser, se fosse não valeria a pena preocuparmo-nos, parece que o que deveríamos fazer era produzir mais e importar menos; ou, preferivelmente, importar mais e exportar muito mais.
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Para atingir este objectivo há que alterar políticas (privilegiando a produção de bens e serviços transaccionáveis) reduzindo os gastos improdutivos (muitos no perímetro gerido pelo governo - central, regional e local) e promover "made in Portugal" também entre os portugueses.
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Porque a maior parte das pessoas não sabe o real preço das coisas que compra. Porque há preços que só se pagam mais tarde.

4 comments:

A Chata said...

Vamos voltar à agricultura e à pesca?

Ouvi hoje.
As fábricas de vidro de Murano estão a fechar. 75% dos trabalhadores já foram despedidos.
O administrador de uma delas dis que estão a voltar-se para a China, India e países arabes, com artigos de luxo, para tentar sobreviver.

A fábrica Bordalo Pinheiro está em risco de fechar.

Será que existem 'ricos' suficientes neste Mundo para salvar estes patrimónios?

Umberto Ecco diz que estamos em passo de caranguejo.
Pergunto-me quão longo vai ser o passo atrás?

João Vaz said...

A Câmara Municipal da Figueira da Foz, liderada pelo ex-Ministro Duarte Silva, continua a gastar dinheiro sem rei nem roque. Em clima de contracção o Carnaval deste ano custará mais 15.000 euros, totalizando uma despesa para a Câmara de 165.000 euros....e isto em tempo de crise. Assim, o país atrasa-se irremediavelmente !

Rui Fonseca said...

Cara Amiga A.,

Voltar à agricultura e à pesca, não diria tanto. Até porque são coisas que não se aprendem de um dia para o outro.

Mas voltar a atenção do governo para adoptar políticas que tornem Portugal menos dependente da importação de alimentos, certamente. Já tenho escrito acerca disto mesmo. Políticas que não serão fáceis de adoptar mas são importantes se quisermos defender a nossa sobrevivência física.

Rui Fonseca said...

Caro João,

Tens toda a razão.

Mas em tempos de crise se tiras aquilo a que chamam Carnaval aí à malta, uma pinderiquice que o povão adora, caía o governo municipal.

Não seria má ideia mas eles não te vão dar esse gosto.

De modo que, lá vai barão...