Thursday, January 10, 2013

A GRANDE CHUCHADEIRA

Há tempos, mas não há tanto tempo assim, José Barroso, que abandonara o País de tanga para se instalar em Bruxelas, abraçava José Sócrates, envolvidos num clímax incontido de felicidade, condensada naquele "Porreiro pá!" que é um marco nos anais do porreirismo nacional. Tinham chegado ao fim os tormentosos trabalhos de parição do Tratado de Lisboa, e os nossos Zés tinham conseguido que as pesadas patas da União Europeia tivessem dado um decisivo passo para  uma Europa unida.  

Enganavam-nos.
Passado pouco tempo, acontece o inevitável nos EUA: o safe-se como puder instalado no sistema financeiro  tinha permitido todas as manobras possíveis para enriquecer estratosfericamente uns quantos banqueiros com habilidade e oportunidade para enganar mais de meio mundo. Para evitar o colapso mundial do sistema, viu-se e ouviu-se por todo o lado onde chegaram os efeitos do tsunami financeiro, a ordem para manter a economia a funcionar injectando-lhe dinheiro. Sócrates ouviu a receita, e não perdeu a oportunidade, mandou aviar. É com votos que se ganham as eleições, é com dinheiro que se compram os votos. E, subitamente, a dívida, que já era tamanha, tornou-se imparável. Entretanto, o distraído senhor Vítor Constâncio, depois de não ter visto os buracos na banca, e o buracão do BPN, foi premiado pela distracção, fez as malas e rumou para Frankfurt. Mas tudo se iria compor, afiançavam-nos, com a ajuda de nossa senhora Merkel.

Enganavam-nos.
Pouco tempo depois, os credores olhavam para a dívida, franziam o sobrolho, e tiravam os cavalos da chuva. E Sócrates acabou por ser despedido. Entra, então em cena, a troica. Em pouco tempo, meia dúzia de iluminados sacou do chapéu um memorando que prescrevia o tratamento adequado a um país desregrado e falido. Ficou toda a gente admirada com tanta eficiência e pontaria. Incumbidos de administrar a receita, Passos & Gaspar esmeraram-se nas medidas  e, para impressionar quem pudesse ter dúvidas, até sobredosearam aqui e ali a posologia. Entretanto a troica vigiava, aprovava os resultados,  e todos se admiravam, desde a Dona Ângela até à Dona Christine, da insuspeita capacidade de resignação dos pacientes. E o prognóstico era sempre convincente: Em meados de 2013, o mais tardar, o doente está recuperado e pode ir aos mercados sem perigo de recaída.

Enganavam-nos.
Ontem foi magnânimamente  distribuido o parecer técnico do FMI. Receita: mais do mesmo. Cortes por todos os lados, menos por um: banqueiros e juros são completamente ignorados pelas sumidades consultadas. A nenhuma daquelas cabeças iluminadas ocorre que Portugal não tem a mínima hipótese de se desenvencilhar da espiral imparável da dívida se não conseguir, por mais cortes que fizer, gerar riqueza que possa reduzir a dívida e os juros que a alimentam? Ocorre, mas não foi essa a encomenda que receberam.
É por demais sabido que os pareceres dos consultores geralmente corroboram as intenções dos que os consultam. Das excepções, a maioria fica esquecida nas gavetas.

O parecer do FMI é um documento técnico, formalmente bem conseguido. Compete ao Governo, e não aos portugueses, discuti-lo com os consultores. E, a partir daí, formular as propostas que entenda sujeitar à apreciação pública. Antes, só se estiverem, mais uma vez, a chuchar com o pagode.

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