Há dias, enquanto aguardavam os almoços que tardavam mais que o costume, tertúlios consumiam o tempo de espera a beber as boémias do costume, a mastigar os tremoços do costume, e a discutir o raio da bola, como de costume, enquanto não surgem questões ainda mais metafísicas.
Em tempo de defesa do pontapénabola, a conversa é outra. Sem pénalties nem foras-de-jogo para discutir, discutiam-se as compras e os lucros nas vendas mais mediáticas de artistas da bola. Perguntei-lhes: Mas, afinal, vimos para aqui para discutir negócios? Não era, concordaram, arrumou-se a bola mas a mesa ficou sem assunto.
Para remediar o estrago, a mastigar mais um tremoço perguntei: Alguém sabe de onde vêm os tremoços? Alguém já viu um tremoceiro? O ZêDê olhou-me de lado, com ar compungido, e diagnosticou-me uma pdi em estado avançado. Mas também não sabia.
Faz parte do anedotário mais básico aquela ideia da criança que supõe que o frango é feito na fábrica. Mas é incontestável que a urbanização das sociedades afastou há muito tempo a generalidade das pessoas do contacto com as realidades naturais mais elementares. Dos tremoceiros, por exemplo. Comem-se os tremoços, agora até lhe descobrem virtudes salutares, mas ignora-se de onde vêm tais bichos.
Tremoceiros, há muitos. Em Portugal podem ver-se ainda em campos que florescem de amarelo em Abril. Com eles se azotam os terrenos arenosos, um correctivo de solos que os avós dos nossos avós aprenderam a cultivar porque os adubos sintéticos só chegariam no sec. xx. Também abundam, espontâneos, ao longo das bermas de autoestradas. Estes tremoceiros de flor de um amarelo exuberante, não produzem tremoços comestíveis. As sementes são pequenas, do tamanho das lentilhas, cinzentos escuros. pintalgados de branco.
O tremoço amarelo, curiosamente, é o fruto do tremoceiro-azul (lupinus albus), mais discreto que o seu primo impante amarelo, geralmente de flor branca ou azul. O que é, aparentemente, estranho é que sendo os portugueses uns imbatíveis adeptos do tremoço, os tremoços que comemos são importados.
Não é caso único. Por exemplo, no Algarve vendem-se cestas, made in China, de passas de figo importadas da Turquia recheadas de amêndoas importadas da Califórnia com a etiqueta "Made in Algarve".
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1 comment:
Está tudo certinho, mas a etiqueta por acaso não diz Made in Algarve; diz sim - Embalado em Portugal por...o que é diferente.
O princípio está errado, mas desta vez até só se engana quem não estiver atento.
O seu a seu dono.
Fique bem...
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