Wednesday, June 24, 2009

O PREÇO DOS PEANUTS

Há quem argumente, e com alguma razão, que se o Estado não investe em projectos de grande dimensão, e desvia o investimento público para obras de pequeno porte, o dinheiro investido acaba por ser em grande parte desbaratado em projectos sem sentido e sem retorno. E que, ainda pior que isso, se abrem novas oportunidades para uns quantos oportunistas comprarem viaturas de alta cilindrada, entre outros abusos afins.

Sabe-se que assim é, e muitos exemplos deste gastar sem critério, porque o dinheiro é dos outros, estão à vista de quem os queira ver. Em muitos casos, contudo, eles têm defensores ferrenhos, que votaram e continuam a votar naqueles que "fizeram obra", porque a obra lhes enche o olho sem lhes apoquentar directamente a barriga. Muitas dessas obras nascem por imitação, sem qualquer outro critério que as justifique. Se há um polidesportivo em tal parte também queremos um; se há courts de ténis nas cidades, também vamos ter uma coisa dessas aqui, mesmo que não haja quem saiba praticar; se acolá há uma rotunda, nós teremos duas; se os de lá de baixo encomendaram uma estátua a perpetuar os sapateiros, aqui honraremos os nossos padeiros.

Na minha aldeia, que agora é vila, vá lá saber-se porquê, está actualmente em curso a construção de um "anfiteatro ao ar livre, com bancada em circunferência ... numa zona de lazer de eleição para festas, eventos e para as ctuações das colectividades da terra". Estará pronto até final do mês e os trabalhos atingem os 205 mil euros. A vila tem, desde há muitos anos, três clubes de cultura e recreio (na designação antiga) com instalações próprias, duas das quais são mais que centenárias e a outra para lá caminha. Nunca tiveram tão pouca frequência. A cidade fica a meia dúzia de quilómetros, vão longe os tempos em que a aldeia tinha vida própria. Num parque infantil, junto ao local onde constroem o "anfiteatro ao ar livre" e noutro, na parte mais alta da vila, inaugurados há dois ou três anos com pompa e circunstância, não se vêm crianças.
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Ainda assim, há equipamentos que poderão oferecer alguma utilidade. Outros, claramente, não têm nenhuma, salvo os interesses próprios de quem os encomendou.
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Quem passa no IC19, um via rápida entre Sintra e Lisboa, nas imediações da saída para o Hospital Amadora Sintra, encontra instalado um painel (com uns três metros de altura) onde se lê "Amadora - Seja bem vindo" ou mensagem parecida. Dois quilómetros mais à frente, dois minutos de viagem se a via estiver desimpedida, outro painel idêntico "Amadora - Obrigado pela visita". Coisas deste estilo estão um pouco por toda a parte, ainda que o luxo dos painéis não seja o mesmo.
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Dir-se-á: São peanuts. O que é isto tem a ver com os milhares de milhões dos mega projectos?
Muito. Porque estes muitos peanuts (e nem tudo são peanuts) custam, somados todos, muitos milhões. São o indicador mais nítido da forma desbragada como se investem dinheiros públicos em Portugal.

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