Tuesday, April 28, 2015

E EU, O QUE LHE POSSO CORTAR, EXCELÊNCIA?

No tempo do outro senhor as empresas fornecedoras de serviços e bens de utilidade pública chamavam-se companhias: eram as companhias das águas, do gás, da electricidade, dos correios e telefones, dos caminhos de ferro, entre outras. Aliás, a designação "companhia" era, de um modo geral, sinónimo de uma empresa grande: CUF, Companhia União Fabril, Real Companhia Velha, e por aí atrás até à Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro. Actualmente, só as seguradoras reclamam o título.

Há dias circulava na net uma recomendação irónica:
Evite as más companhias: das águas, do gás, da electricidade, das telecomunicações, dos seguros...

Hoje o ZC., enviou-me e-mail transcrevendo reclamações repetidas junto da Goldenergy, que não produz gás nem electricidade mas factura uma coisa e outra, ameaçando anular instruções de débito em conta se não lhe for dada resposta às questões que há muito tempo colocou. Casualmente, eu tinha  momentos antes recorrido a um meio de última instância, depois de esgotados todas as vias normais possíveis - e-mails, loja, telefone - por causa de um débito indevido, e facturado em duplicado, da EDP.

Interrogo-me muitas vezes se, por traquinice dos deuses estas coisas, só me acontecem a mim ou a generalidade das pessoas não confere as facturas. Os e-mails do H. e do Z.C., levam-me a considerar como mais provável a segunda hipótese. Compreensível, aliás. Conferir uma factura da electricidade ou do gás é, em muitos  casos, um complicado quebra-cabeças.

Solução: Cancelar os débitos directos em contas bancárias, reclamar, com prova suficiente de que reclamou, e não pagar se, em tempo útil, aquele que decorre entre a recepção da factura e  a data do vencimento, não for recebida resposta do fornecedor. 
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Ilus. e Ex.mo Senhor Carlos Pinto Coelho
digno director da Companhia das Águas e
digno membro do Partido Legitimista:

Dois factos igualmente graves e igualmente importantes, para mim, me levam a dirigir a V. Exa. estas humildes regras: o primeiro é a tomada de Cuenca e as últimas vitórias das forças Carlistas sobre as tropas Republicanas, em Espanha: o segundo é a falta de água na minha cozinha e no meu quarto de banho.
Abundam os Carlistas e escassearam as águas, eis uma coincidência histórica que deve comover duplamente uma alma sobre a qual pesa, como na de V. Exa., a responsabilidade da canalização e a do direito divino.
Se eu tiver fortuna de exacerbar até às lágrimas a justa comoção de V. Exa., que eu interponha o meu contador, Exmo. Senhor, que eu interponha nas relações de sensibilidade de V. Exa., com o Mundo externo; e que essas lágrimas benditas de industrial e de político caiam na minha bandeira!
E, pago este tributo aos nossos afectos, falemos um pouco, se V. Exa. o permite, dos nossos contratos. Em virtude do meu escrito, devidamente firmado por V. Exa., e por mim, temos nós – um para com o outro – um certo número de direitos e encargos. Eu obriguei-me, para com V. Exa., a pagar a despesa de uma encanação, e aluguer de um contador e o preço da água que consumisse.
V. Exa. fornecia, eu pagava. Faltamos, evidentemente, à fé deste contrato; eu, se não pagar, V. Exa., se não fornecer.
Se eu não pagar, faz isto: corta-me a canalização.
Quando V. Exa. não fornecer, o que hei-de fazer, Exmo. Senhor? É evidente que para que o nosso contrato não seja inteiramente leonino, eu preciso, no análogo àquele em que V. Exa. me cortaria a canalização, de cortar alguma coisa a V. Exa.
Oh! E hei-de cortar-lha!…
Eu não peço indemnizações pela perda que estou sofrendo, eu não peço contas, eu não peço explicações, eu chego a nem sequer pedir água. Não quero pôr a Companhia em dificuldades, não quero causar-lhe desgostos nem prejuízos…
Quero apenas esta pequena desafronta, bem simples e bem razoável, perante o direito e a justiça distribuída: – quero cortar uma coisa a V. Exa.!
Rogo-lhe, Exmo. Senhor, a especial fineza de me dizer, imediatamente, peremptoriamente, sem evasivas nem tergiversações, qual é a coisa que, no mais santo uso do meu pleno direito, eu posso cortar a V. Exa.
Tenho a honra de ser
De V. Exa. com muita consideração
e com algumas tesouras

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