Toda a gente percebeu a intenção do seu discurso mas ninguém pode ter entendido o seu alcance.
Penso mesmo que nem o senhor estava ciente do que disse. Acontece quando nos escapa o sentido daquilo que dizemos.
.
Percebemos todos os que estão cientes do imbróglio onde nos meteram, e de onde ainda não começámos garantidamente a sair, que não nos safamos sem mais austeridade; que o senhor precisou de dizer publicamente à troica antes da troica colocar a classificação na pauta de exame que já tem medidas alternativas para ultrapassar a sentença do tribunal constitucional; que, hélas!, até descortinou fórmula curiosa para matar dois coelhos de uma cajadada: tributar o trabalho no sector privado e reduzir a TSU.
O que ninguém percebeu, e o senhor também não, é para onde nos levam estas medidas que, este ano, provadamente, salvo a TSU, que não foi posta à prova, não permitiram cumprir o défice por colapso de receitas e crescimento dos subsídios de desemprego.
A redução de cinco e meio pontos percentuais da TSU representará um decréscimo dos custos de produção das empresas em ambiente concorrencial quanto muito de metade daquele valor, se forem de mão de obra intensiva. As outras, nas telecomunicações, electricidade, águas, bancos, transportes, monopólios ou quase monopólios de facto, o que farão com o bónus? Algumas aumentarão os ordenados dos seus colaboradores, aumentando o valor do IRS, noutras embolsarão os que põem a mão na massa o subsídio inesperado. Pouco, para não dizer nada, se reflectirá nos preços pagos pelos consumidores.
Depois, o senhor sabe que o coelho que lhe saiu da cartola continua a padecer de mixomatose constitucional: a iniquidade subsisiste, a austeridade não chega a todos. E, das duas uma, ou o TC lhe elimina sumariamente o bicho ou procede como este ano e lhe consente a habilidade torta. De qualquer modo, subsistirá a questão mais problemática: como é que nos safamos sem alijar parte da carga de juros que, indubitavelmente, é superior às nossas forças? Mais tempo para cumprir o défice só pode ser consequente se a economia crescer a olhos vistos. Ora o que toda a gente sabe, incluindo o senhor primeiro ministro, é que ela por este caminho não vai lá. E a redução da TSU nem cuidado paliativo chega a ser, mesmo se ministrado com fé.
Para onde vamos, senhor primeiro ministro, sabe? Diga outra vez, se faz favor. Mas de modo que o senhor entenda.
No comments:
Post a Comment