Já tinha desistido de prestar atenção à destilação de VV quando, involuntariamente, deparei com mais uma das suas clonadas colunas. Aquele que é considerado por muitos dos seus admiradores um dos mais finos e inteligentes críticos deste país, concluía mais uma vez que não temos saída do buraco onde a história nos meteu. Como perante as conclusões de sua eminência se dobra concordante, espantada e bloqueada a generalidade da intelectualidade portuguesa, não podemos concluir outra coisa senão de que ou estão todos à espera que alguém venha do exterior (talvez os turcos) tirá-los da enrascada ou se resignaram a cair para o lado por inanição ou falta de ar.
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Diz VV que
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«Cada vez que há uma crise do petróleo, aparece a ortodoxia a proclamar zelosamente duas coisas. Primeira, que temos de pensar a sério na energia solar e na energia eólica. Segunda, que temos de mudar de vida. É uma conversa sem sentido. A energia eólica e a energia solar, no estado actual da tecnologia, não resolvem problema nenhum: cobrem uma pequeníssima parte do consumo e, sobretudo, são caríssimas.
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Depois de avisar que as energias alternativas não são solução, e que a sua promocão é uma conversa fiada, avança o Inteligente com alguma proposta (carvão, lenha,nuclear,vela de cera, sílex, etc) ? Nicles. Sua sumidade não nasceu para propor seja o que for. As energias solar e eólica nao servem para nada, todos os tipos que por esse mundo fora andam a pensar que fazem faísca com o vento ou o sol ou a água, doce ou salgada, são uns idiotas chapados. Onde é que o Vasco foi aprender tanta coisa acerca de energias para ser tão afirmativo, ninguém sabe. O que se sabe é que o Vasco, diga o que disser, passa recibo e ganha para as sopas.
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Não tendo safa possível, segundo o Vasco, a "populaça" (designativo recorrente na valente prosa ) nem tem petróleo nem pode deixar de acender o candeeiro. Mais do que condenada à pobreza, a "populaça" esta condenada a ficar baralhada. A menos, hélas!, que haja um milagre.
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É o que ele diz:
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Quanto à necessidade, e à urgência, de mudar de vida, nunca a ortodoxia explica exactamente o que isso na prática significa: significa um empobrecimento tão extenso e tão profundo que, mesmo num país como Portugal, com a sua miséria e o seu atraso, 80 por cento da população não a suportaria. "Mudar de vida" seria pior do que uma revolução, seria o fim de uma civilização.
Com a minha idade, um homem pode imaginar um país devolvido de repente a 1948 ou 1949, antes de enriquecer e de engordar com o petróleo barato. Bem sei que o Portugal de Salazar não serve de exemplo (mas já lá vamos). Por agora, basta falar da classe média urbana. Em Lisboa quase não se viam "automóveis" (como se dizia). Toda a gente andava de eléctrico (muitos do século XIX) ou de autocarro (de resto, poucos). Viagens não se faziam ou só se faziam de longe em longe com trepidação e sacrifício. Em casa, não existiam electrodomésticos fora a telefonia (um luxo) e o frigorífico (outro luxo) e o ocasional aspirador ou ferro de engomar (o fogão era naturalmente a gás). Não me lembro de ar condicionado: nem na escola, nem na faculdade, nem no trabalho. As roupas, como os livros, passavam de irmão a irmão ou de pais para filhos. Ninguém desaproveitava comida, meticulosamente medida e recozinhada, que ia ressuscitando de "prato" em "prato". Ninguém acendia a luz sem precisar. E o cinema estava reservado para sábado ou domingo (um dia por semana).
Quando comecei a sair de Portugal, num Mini perigosíssimo, não encontrei auto-estradas que me separassem do mundo, encontrei estradas de vinte e trinta anos com um trânsito suportável e até simpático. Em Inglaterra, apesar da euforia do tempo, as pessoas contavam tostões - libras, se quiserem - e andavam vestidas para "durar". Até em Londres (como na "Europa" inteira) o "automóvel" não se tornara ainda uma sufocação. Esse "equilíbrio" - se me permitem a palavra - acabou.
O slogan "mudar de vida" é uma pura fraude, com que os políticos mistificam a populaça. Tirando um milagre, voltar à pobreza é do que se trata. Pela força e pelo sofrimento.»
Com a minha idade, um homem pode imaginar um país devolvido de repente a 1948 ou 1949, antes de enriquecer e de engordar com o petróleo barato. Bem sei que o Portugal de Salazar não serve de exemplo (mas já lá vamos). Por agora, basta falar da classe média urbana. Em Lisboa quase não se viam "automóveis" (como se dizia). Toda a gente andava de eléctrico (muitos do século XIX) ou de autocarro (de resto, poucos). Viagens não se faziam ou só se faziam de longe em longe com trepidação e sacrifício. Em casa, não existiam electrodomésticos fora a telefonia (um luxo) e o frigorífico (outro luxo) e o ocasional aspirador ou ferro de engomar (o fogão era naturalmente a gás). Não me lembro de ar condicionado: nem na escola, nem na faculdade, nem no trabalho. As roupas, como os livros, passavam de irmão a irmão ou de pais para filhos. Ninguém desaproveitava comida, meticulosamente medida e recozinhada, que ia ressuscitando de "prato" em "prato". Ninguém acendia a luz sem precisar. E o cinema estava reservado para sábado ou domingo (um dia por semana).
Quando comecei a sair de Portugal, num Mini perigosíssimo, não encontrei auto-estradas que me separassem do mundo, encontrei estradas de vinte e trinta anos com um trânsito suportável e até simpático. Em Inglaterra, apesar da euforia do tempo, as pessoas contavam tostões - libras, se quiserem - e andavam vestidas para "durar". Até em Londres (como na "Europa" inteira) o "automóvel" não se tornara ainda uma sufocação. Esse "equilíbrio" - se me permitem a palavra - acabou.
O slogan "mudar de vida" é uma pura fraude, com que os políticos mistificam a populaça. Tirando um milagre, voltar à pobreza é do que se trata. Pela força e pelo sofrimento.»
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O nosso fado nao é ter o Vasco, é ter uma data deles.
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pescado em
http://jumento.blogspot.com/2008/06/umas-no-cravo-e-outras-tanta-na_21.html
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