João Duque, Presidente do ISEG*, escreve no Expresso/Economia, a propósito dos riscos dos empresários e dos que trabalham em empresas em contraste com a inimputabilidade das decisões dos políticos e da segurança que protege os funcionários públicos, mesmo os mais medíocres, que o "Governo de Portugal é constituído por um primeiro-ministro e mais 16 ministros. Nem um só, trabalhou alguma vez numa empresa, participou em órgãos sociais (ou disso se orgulha) a ler pelo seus 17 curricula vitae. Como serão as suas reuniões quando falam sobre empresas e sobre elas decidem tudo e mais alguma coisa?".
Já uma vez ou duas apontei neste caderno as minhas dúvidas acerca da pertinência deste ponto de vista, que, aliás, é muito generalizado: o País não progride porque está entregue a uma cambada que não tem a mínima experiência de gestão. Começam nas jotas a colar cartazes e, às duas por três, são ministros.
Trabalhei a vida inteira em empresas, nunca tive a mínima experiência de qualquer cargo público. Não ignoro, portanto, as incertezas que pairam permanentemente sobre quem não tem emprego assegurado para toda a vida. E penso que a segurança de emprego do funcionalismo público é péssima para o País e só serve os interesses dos funcionários inaptos ou dolosamente incompetentes.
Mas, olhando à volta, o que se vê?
Em Portugal, e para não recuar mais na história, que neste caso se repete, Salazar e Caetano vieram da Universidade; depois do 25 de Abril, e passado o Prec e os governos chefiados por militares, (Palma Carlos, o primeiro chefe do governo, era advogado), Mário Soares nunca foi empresário ou gestor, Nobre da Costa, empresário, viu o seu programa de governo rejeitado na AR, Maria de Lurdes Pintassilgo, governou transitoriamente, a sua experiência de empresa não era de gestão, e, relembre-se, tanto Nobre da Costa com Pintassilgo foram nomeados pelo PR Ramalho Eanes, Sá Carneiro era advogado, Cavaco Silva veio da Universidade, Guterres não tinha qualquer experiência de gestão de empresas, e o mesmo se pode dizer de Durão, Santana Lopes e Sócrates. Francisco Balsemão foi a única excepção mas não parece que se possa retirar do seu governo uma conclusão favorável à tese de João Duque.
Dir-se-á: Pois foi o facto de só haver um caso entre tantos que o País não avançou o que devia.
Observemos o que se passa lá fora. Nos EUA, por exemplo, o País onde o capitalismo ganhou mais robustez e o progresso económico foi mais saliente.
Depois da 2ª. GG, para não recuar mais, mas a história também lá se repete, ao General Eisenhower seguiram-se Kennedy, Johnson, Nixon, Ford, Carter, Reagan, George H.W.Bush, Clinton, George W. Bush e Obama. Dos onze, apenas Carter e George W. Bush tiveram experiências de gestão empresarial: Carter com uma exploração agrícola de produção de amendoins, George W. Bush como gestor de um clube de futebol e de interesses familiares nos petróleos, iniciados pelo pai que, no entanto, cedo preferira a política aos negócios, ou a política pelos negócios.
Pode invocar-se que se o chefe do executivo não tem experiência de governo de empresas convém que algum ou alguns dos seus membros tenha, à semelhança do regulamento militar do século dezoito que determinava que o sargento deveria saber ler, escrever e contar, quanto ao capitão poderia saber ou não. Entretanto, os regulamentos mudaram, mesmo na tropa.
Se a salvaguada da democracia passa pelo primado do poder político sobre o poder económico, a situação mais salutar parece recomendar que não se meta no mesmo quarto o governo dos interesses públicos e a gestão dos interesse privados.
---
* Enviei cópia para jduque@iseg-utl.pt
Pode invocar-se que se o chefe do executivo não tem experiência de governo de empresas convém que algum ou alguns dos seus membros tenha, à semelhança do regulamento militar do século dezoito que determinava que o sargento deveria saber ler, escrever e contar, quanto ao capitão poderia saber ou não. Entretanto, os regulamentos mudaram, mesmo na tropa.
Se a salvaguada da democracia passa pelo primado do poder político sobre o poder económico, a situação mais salutar parece recomendar que não se meta no mesmo quarto o governo dos interesses públicos e a gestão dos interesse privados.
---
* Enviei cópia para jduque@iseg-utl.pt
5 comments:
A tese de qual deve ser a formação básica de quem nos governa já se discutia no meu tempo de universitário. Pelos vistos continua. As renhidas opções de então orientavam-se no sentido do curso de cada qual: os de Direito que o curso era generalista e ‘orientado’ para a política, os de Economia (não havia Gestão) que eram os mais preparados para compreender e orientar as exigências de governação. Os das outras ciências, engenharias e letras, coitados, ouviam e tomavam (ou não) posição. Eu arrimava-lhes com o Platão da ‘República’ (os filósofos, pois claro!) e, pelo menos, provocava a gargalhada quase geral. Bons tempos! E agora?...Ó Rui, permite-me que te diga, tens tantas coisas com interesse e que tens tratado no teu blog, e vens-me com essa treta do ‘limitado’ João Duque!
Porque é que hão-de ser os de gestão a governar melhor? Por causa do «primado do poder político sobre o económico» certamente que não. Então que sejam os ‘políticos’, tenham eles a formação que tiverem. E olha que, em meu entender, o ‘poder económico’ não está nas mãos dos economistas nem dos gestores. Joe Berardo não o é. O que é que tem a ver a governação de um País com a gestão de um negócio?
Discutir a formação escolar para se ser governante é como discutir o sexo dos anjos: qualquer um serve desde que seja (re)produtivo
Caro Francisco,
Não, a questão colocada por João Duque nada tem a ver com a formação académica mas com a experiência de gestão em empresa.
A formação académica até pode ser filosofia ou artes. O que está em causa é ter ou não ter experiência de gestão em empresas como mais valia para uma governação mais capaz da coisa pública.
Um abraço
Caro Rui, percebi, mas substitui
«experiência de gestão em empresas» por um conceito mais lato e mais trabalhado que as engloga - 'organizações' - e verás que os curicula da generalidade dos ministros(neste e noutros governos) a tiveram. O que Duque quis dizer - no que é useiro e vezeiro nos programas que a SIC tão prodigamente lhe disponobiliza - é que estes ministros (e este governo)são uns incompetentes. E dizer é fácil...basta ir ao «plano inclinado» que o Crespo até se orgasma. Mesmo agora acabo de o ouvir dizer que Sócrates fez bem em usar as 'goden share'...mas não aconselharia ninguém a correr esse risco. Valha-nos o dito 'bom senso'.Abraço, que vou de férias.
Caro Rui,
O João Duque não fala em experiencia de gestão diz apenas que nenhum membro do governo alguma vez trabalhou numa empresa. Por outro lado não parece lógico contrapor no caso dos USA com o curricullum do Presidente, seria necessário analisar todos os curriculla dos Secretarios de Estado porque Joaõ Duque refere-se a todo o governo.
Parece-me muito claro que Jão Duque desejou afirmar que nenhum membro do governo tinha alguma vez produzido algo na vida, que é como quem diz tenha trabalhado a sério.
"Parece-me muito claro que Jão Duque desejou afirmar que nenhum membro do governo tinha alguma vez produzido algo na vida, que é como quem diz tenha trabalhado a sério."
Só nas empresas é que se trabalha a sério?
João Duque não trabalha a sério por não trabalhar numa empresa?
Note que eu nunca trabalhei senão em empresas. Falta de experiência minha do não trabalho dos que não trabalham a sério?
Post a Comment