PORTUGAL LAPIDAR

Ontem, deparei-me, mais uma vez, com uma lápide comemorativa da inauguração de um espaço para arrumar seis viaturas. Quase tão grande como o espaço inaugurado, com letras gravadas a ouro salientando a presença do excelentíssimo senhor engenheiro presidente da câmara municipal cá do sítio e do senhor presidente da junta de freguesia local. Não sei se no mesmo dia se noutro, outro parque para meia dúzia de viaturas, mereceu placa igual, também com letras douradas a assinalar a presença dos mesmos figurantes. Perto desta última, na sede da junta de freguesia, construída pelo povo (no sentido real, obreiro, do termo) há cerca de cinquenta anos, de que não há placa inaugural, há outra placa registando a inauguração de obras, feitas há uns oito, dez anos atrás, de conservação, na presença do excelentíssimo senhor ... , a mesma conversa. Esta praga de placas atinge todo o território. Se continuo a referir-me a estas é porque é com elas que mais frequentemente se confronta a minha vergonha de ter governantes com uma mentalidade tão tacanha. Com muitas palmas do povo.

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Hoje, fomos de novo mostrar o Portugal dos Pequenitos aos mais novos. Como já conheço o sítio de cor e salteado, entretive-me, desta vez, a ler as placas inaugurais. Foram todas colocadas no tempo do regime democrático. Arrancaram as anteriores ou o culto do chefe estava centralizado no cume, e agora descentralizou-se?

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Há uma ironia que se desprende do ridículo destas lápides colocadas em edifícios em miniatura. O museu do mobiliário, por exemplo, é um pequeno espaço reconvertido para exposição de umas dezenas de miniaturas de móveis (camas, cómodas, etc.). Não sei qual era a ocupação anterior do pequeno edifício mas percebe-se que não foi construído para a exposição que agora alberga. De qualquer modo o que feriu a minha atenção foi a placa em acrílico, desmesurada para a dimensão do espaço onde a colocaram, celebrando, em letras de ouro, a inauguração do museu pelo excelentíssimo senhor doutor presidente da assembleia da república.

Do outro lado da praça em miniatura está o museu da marinha, um espaço reconvertido para exposição de miniaturas de barcos de modelos relativamente recentes. Também aqui temos de nos confrontar imediatamente com a placa inaugural do museu, enorme e dourada, que contou, neste caso, com a presença do excelentíssimo senhor ministro da defesa senhor professor doutor.

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Mas a mais devota celebração ao culto da personalidade é um monumento construído em 2003 dedicado ao presidente da autarquia coimbrã. "Por amor a Coimbra" é o lema de campanha para as próximas autárquicas inscrito nos out doors do celebrado presidente no Portugal dos Pequenitos.

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Um amor assim só pode ser tecido em ponto pequenito.