Lisboa Abandonada era o título de um "site" que denunciava a situação de abandono que, em muitos pontos da cidade, fere a sensibilidade de quem nos visita (parece Havana, uma velha senhora decadente, diz quem conhece Havana) mas dificimente belisca a indiferença dos que nela habitam ou nela vêm trabalhar. O "site", provavelmente um dos primeiros na "net", e seguramente o primeiro dedicado a Lisboa, foi criminosamente estropiado. Sabe-se lá por quê e por quem.
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Sobra, interrompida, dessa aventura, que certamente exigiu muita dedicação, tempo, e sacrifício dos interesses pessoais,Lisboa renovada , que pretendia dar conta da renovação que se ia observando. Já me referi várias vezes a este assunto nestas palavras cruzadas com que entretenho a viagem. Tentei mesmo mobilizar algumas boas vontades para repor na bloglosfera parte da intenção que suportou "Lisboa-Abandonada", sem sucesso.
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Se volto ao assunto, é porque as próximas eleições para a Câmara de Lisboa estão, naturalmente, a ocupar mais espaço na imprensa, na televisão, nos blogues. E, ainda que este seja um espaço de um corredor solitário, não quero deixar de marcar presença.
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Como sempre acontece em períodos de batalha eleitoral, as claques vão ao saguão buscar as bandeiras e vêm para a rua berrar pelos seus heróis transitórios. A discussão fulaniza-se e as ideias são remetidas para segundo plano. E se, por acaso, alguma pequena vaga se forma ao redor de uma ideia ou de uma proposta, é certo e sabido que algum pequeno escândalo, alguma trivialidade, algum esqueleto se soltará do armário para repor o curso normal das regras do jogo.
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O que é uma pena, porque Lisboa merecia uma reflexão séria. Porque é que essa reflexão não acontece é a questão que me coloquei.
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É indiscutível que, tendencialmente, a discussão dos fulanos se sobrepõe à discussão das ideias.
O marketing político há muito que concluiu que é muito mais fácil e rentável vender caras do que ideias, que o ataque ao passado é consensualizador, que a discussão de propostas para o futuro fracturante.
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No caso de Lisboa, é indiscutível que os interesses da capital são subalternizados tanto pelos candidatos como pelos eleitores, jogando-se o resultado das eleições muitas vezes em função de outros interesses. Um exemplo, que sendo recente poderemos considerar clássico, porque é paradigmático, é a construção do túnel das Amoreiras.
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O túnel foi prometido a Lisboa, em cartazes bem visíveis, por Santana Lopes, e o túnel era cabeça de cartaz da sua campanha. Santana Lopes venceu, ainda que por escassa margem. Se não tivesse prometido o túnel, provavelmente ganharia na mesma, e da mesma maneira. Se o não tivesse construído só a oposição o teria reclamado. O túnel acabou por ser (quase todo) reaberto, depois de vários acidentes processuais, e hoje, diz-se, consensualmente quase, que o túnel facilita muito a entrada e a saída da cidade. Carmona, candidato, orgulha-se da redução de poluição que o túnel permite. E esta conclusão passou, sem contestação de maior. Carmona, esquece-se, e ninguém parece dar por isso, do aumento de poluição que o mesmo túnel vai determinar.
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O túnel, é fácil perceber, não serve quem vive e trabalha em Lisboa. Serve para quem entra e para quem sai de Lisboa, sendo certo que só uma minoria residente em Lisboa trabalha fora de Lisboa. O túnel facilitou a entrada em Lisboa e dessa facilitação resultou, e vai resultar cada vez mais, a entrada de mais veículos em Lisboa, reduzindo ainda mais a qualidade de vida em Lisboa.
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Por que razão o túnel foi usado como cartaz de campanha de Santana Lopes, por que razão é que o túnel não teve qualquer influência na sua eleição, por que razão, sendo o túnel, objectivamente, um agente facilitador do abandono de Lisboa, a sua abertura (parcial) calou toda a polémica que a sua construção (até agora) envolveu, são as perguntas para as quais julguei interessante procurar respostas.
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(Continua)
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