Naquela rua, à tardinha
Já quase nada se via.
Parece que o sol fugia
De aquela rua mesquinha...
.
Mas tinha pédios imensos,
Entrechocando telhados
Tão altos!, como suspensos
De lá dos céus afastados...
.
Tinha compridas varandas
De velhos madeiramentos,
Rangendo, embora, em bolandas
Na mão da chuva e dos ventos.
.
Tinha opulentos bocados
De primevas cantarias,
Restos de ferro forjados,
E até brasões e armarias.
.
E tinha, a meio em seu nicho,
Nossa Senhora das Dores
Negrinha do tempo e o lixo
Com dois palmitos de flores.
.
Só nas paredes leprosas,
Tortuosamente empinadas,
Eram pupilas brumosas
As janelas desvidradas.
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Perto, que vastas artérias
Patentes ao sol e ao ar,
Nas quais a vida eram férias
Que apetecia gozar!
.
Gente a cheirar bem, vestida
Com todo o apuro do luxo,
Vinha descendo a avenida
Para a olhar o repuxo.
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E o certo é que há centos de anos
Que a miséria nua e crua
Com seus viveiros humanos
Escolhera aquela rua:
Debaixo desses telhados
Se instalara, e a seus viveiros
- Pais e filhos misturados
Como animais em chiqueiros.
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Há centos de anos, puídas
Encardidas, amarelas,
Iguais roupas estendidas
Embandeiram as janelas
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José Régio
Thursday, February 15, 2007
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