Wednesday, May 05, 2021

DEMASIADA TRANSPARÊNCIA

 

Novo Banco paga prémio de dois milhões por prejuízos de 1329 milhões - aqui

O banco liderado por António Ramalho prevê atribuir uma remuneração variável de 1,860 milhões de euros à gestão, num exercício em que a instituição voltou a pedir uma injecção de dinheiros públicos.

 
 
A gestão de António Ramalho terá um prémio de 1,86 milhões de euros num exercício em que registou um prejuízo de 1329 milhões de euros, o quarto consecutivo com perdas acima dos mil milhões de euros. Isso mesmo consta do relatório e contas publicado na Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e representa uma repetição do que se verificou há um ano e que mereceu críticas generalizadas, inclusive do actual governador do Banco de Portugal, Mário Centeno.

Este dado é divulgado na mesma semana em que o Tribunal de Contas entregou uma auditoria especialmente crítica ao acompanhamento que o Fundo de Resolução fez de todo o processo de venda do Novo Banco. E a poucos dias de ser aprovada uma nova injecção de dinheiros públicos, que deverá ficar algures entre os 430 milhões referidos pelo fundo e os quase 600 milhões solicitados por António Ramalho. 

A atribuição da remuneração variável está dependente do cumprimento de algumas condições de desempenho e, tal como a de 2020, só será paga depois de terminar o actual período de reestruturação, em 2022. 

Segundo o relatório e contas de 2020, o banco explica que, “para o ano de 2020, a remuneração variável foi atribuída condicionalmente, sujeita à verificação de condições diversas, de 1860 milhares de euros aos membros do conselho de administração executivo. Este prémio teve como base o desempenho individual e colectivo de cada membro, avaliado pelo comité de remunerações”. 

Adicionalmente, “o direito de receber [este prémio] só terá efeito após o término do período de reestruturação (actualmente, 31 de Dezembro de 2021), portanto, não haverá pagamentos até essa data”. E acrescenta que “o valor da componente variável da remuneração pode ser inferior ao montante atribuído ou mesmo zero, dependendo dos indicadores financeiros do banco no momento do pagamento”.

Esta medida replica a atribuição de um prémio semelhante no ano passado relativo ao exercício de 2019, que mereceu reparos do então ministro das Finanças. Há praticamente um ano, Mário Centeno sublinhou no Parlamento que, “apesar de os prémios só serem devidos em 2021, as empresas vão acompanhando a evolução dos tempos”, acrescentando que “consideraria que ainda vamos a tempo de ver corrigida esta situação” de atribuição dos prémios. E apelou ao “bom senso”, esperando que “haja aqui uma empatia, ou pelo menos um entendimento, sobre enquadramento em que estas decisões são tomadas hoje no Novo Banco”.

A atribuição de prémios foi também motivo para uma divergência entre António Ramalho e Luís Máximo dos Santos, presidente do Fundo de Resolução. Na chamada de capital do ano passado de 1037 milhões, o Novo Banco incluiu o valor da remuneração variável, mas o fundo recusou esse pedido, fixando a injecção nos 1035 milhões. A auditoria do Tribunal de Contas — que identificou riscos de complacência, conflitos de interesse e falta de independência na actividade do Fundo de Resolução — confirma esta decisão: “O Fundo de Resolução deliberou, em 20 de Abril de 2020, deduzir dois milhões de euros ao valor a pagar [na chamada de capital], relativos a atribuição de remuneração variável aos membros do conselho de administração executivo do Novo Banco.”

Sobre este tema, o Novo Banco explica ainda, no documento das contas de 2020, que, dado o actual período de reestruturação em curso, “até 30 de Junho de 2020, o banco não poderia pagar a qualquer colaborador ou membro de órgão de administração e fiscalização um salário anual total (inclui salário, contribuição de pensão, prémios/bónus) superior a 10 vezes o salário médio anual dos colaboradores do banco”. E sublinha que “no período compreendido entre 30 de Junho de 2020 e o final do período de reestruturação, este limite poderá ser ultrapassado caso todos os compromissos de viabilidade estabelecidos tenham sido cumpridos”.

Os salários fixos ficaram no mesmo nível do ano anterior, nos 2,4 milhões de euros para nove administradores. O presidente executivo, António Ramalho, manteve o salário de 367 mil euros, perto do limite máximo referido, o que diferiu cerca de 30 mil euros para quando acabar a reestruturação, à imagem do que aconteceu nos últimos anos.

“Em qualquer caso, será possível ao banco atribuir bónus diferidos relativos a performances ocorridas no período de reestruturação, efectuando o pagamento apenas no final do referido período”, contextualiza, referindo que, “tendo em vista o cumprimento dos compromissos para 2019, a restrição mencionada deixou de vigorar em Julho de 2020. No entanto, o Banco optou por manter este limite, mantendo a sua política de remuneração inalterada”, conclui.

Sobre saídas e entradas, os três administradores que se demitiram no final do ano passado tiveram direito a três meses de remunerações relativas a 2021, num total de 200 mil euros para fazerem a transição. Já a contratação de um novo administrador financeiro valeu um prémio de assinatura de 320 mil euros, tal como tinha acontecido também no ano anterior pela mesma razão.

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