Sunday, October 16, 2011

SALÁRIOS E PRODUTIVIDADE NA FUNÇÃO PÚBLICA

Em 1996 governava António Guterres e João Cravinho era Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território. Convidado a participar num Colóquio a que assisti, João Cravinho dissertou sobre a urgente necessidade de Portugal aumentar a produtividade, a única via que poderia colocar Portugal num patamar de desenvolvimento económico e social sustentado. Anteriormente, o Ministro tinha ouvido uma exposição feita acerca do crescimento exponencial da produtividade numa empresa quase dedicada à exportação e, entusiasmado com a performance exibida, nem se deu conta que se a produção tinha duplicado em dez anos os efectivos tinham sido reduzidos a 1/3 no mesmo período.

Houve lugar a perguntas, e eu coloquei uma ao senhor ministro: Que medidas tinha em carteira o XIII governo, de que ele era membro, para aumentar a produtividade do sector público, uma vez que toda a sua apreciação tinha sido voltada para as obrigações do sector privado. O senhor ministro não respondeu, bichanou algo a um assistente seu sentado ao lado dele, e o senhor assistente disse mais ou menos isto: As situações não eram comparáveis. Ali, naquela empresa, como em muitas outras, a produção era facilmente mensurável e o crescimento da produtividade evidente. Mas na função pública, cuja produção não pode medir-se em toneladas o conceito fazia pouco sentido. Repare nestes exemplos: Como é que se pode medir a produtividade das forças armadas? Pelo número de tiros dados? E da justiça? Pelo peso dos processos julgados? E da educação? Pelo número de alunos aprovados? E na saúde? Pelo número de consultas, pelo número de radiografias, pelos número de outros exames complementares de diagnóstico quaisquer? E na administração interna? Pelo número de presos pelas polícias? Bem vê: seria uma missão impossível.

Dito isto, levantou-se o ministro a caminho da sala onde ia ser servido um almoço, e, obviamente, toda a gente imitou o senhor ministro. E pressenti, então, ter ficado a pairar no ar a ideia de que eu tinha feito a pergunta mais absurda da manhã. 

Passados 15 anos, entre eliminar orgãos que não funcionam, porque nunca funcionaram, porque funcionam mal ou porque, pura e simplesmente, nunca se justificaram - embora tenha sido uma promessa estafada de tanto repetida e incumprida eliminá-los - e cortar nos salários e pensões, o Governo acaba por adoptar a via mais fácil, que, por natureza, é cega e improdutiva. Continuará, portanto, por resolver o problema da produtividade na função pública. Aliás, ela, do mesmo modo que cresceu (estatisticamente) por decreto, é reduzida pela mesma via.

O urgente ultrapassou outra vez o mais importante.

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