Friday, May 03, 2024

Á JUSTIÇA O QUE É DA JUSTIÇA , À POLÍTICA O QUE É DA POLÍTICA

Foi este o sofisma de António Costa para, renitente, enfrentar a por demais evidente realidade: o Ministério Público atolava-se crescentemente na sua incompetência impune.

Até ao dia em que ele e os seus se apavoraram perante tão evidente falha no primeiro patamar da administração da justiça.
Perante a proposta de Rui Rio de colaboração na solução que os sucessivos e prolongados desacertos do Ministério Público exigiam há muito tempo, António Costa foi rude e encheu o peito: a separação de poderes impõe que a política não se intrometa na administração da justiça. 
Um sofisma lançado à solta querendo ignorar a mais elementar evidência: a justiça obedece às leis e as leis são da competência do poder legislativo. Foram várias as denúncias deste mal amanhado sofisma, que António Costa ignorou, continuando a navegar nas águas tranquilas da sua maioria absoluta. 
Até ao dia em que o Ministério Público foi além dos mais evidentes limites, acarretando a queda de um governo sustentado por uma maioria absoluta.
Marcelo Rebelo de Sousa, que se pela pela ribalta, não perdeu tempo e dissolveu a Assembleia da República, colocando o país em transe e o professor Ventura a manipular as marionetas.

Agora aparecem em cena 50 personalidades a criticar o actual estado do sistema da justiça, há tanto tempo tão evidente que até este grilo há muito mais tempo entrou em estado de sobreaquecimento incomodado com tanta incompetência que via à volta. 

Manifesto dos 50 exige fim do poder sem controlo do Ministério Público Cinquenta personalidades dos mais variados quadrantes criticam o atual estado do sistema da justiça e apelam à iniciativa política para que faça uma reforma do setor 

E agora política?
A Justiça que se desenrasque? 
Pior que a incompetência da Justiça tem sido o medo dos políticos de se envolverem na sua solução.
 
Sintoma recente (hoje aqui deste medo) : "À CNN Portugal, o ex-primeiro-ministro considerou também que não faz sentido que “processos concretos” sejam discutidos na Assembleia da República, numa referência à eventual ida da Procuradora-Geral da República ao Parlamento. O “local próprio” para serem discutidos são “os tribunais e não uma entidade política”, disse, sugerindo que uma audição de Lucília Galho para falar de processos concretos violaria o “princípio muito claro” da separação de poderes, inscrito na Constituição)
 
Mas quem é que falou que a PGR foi convidada para ir à AR falar de casos concretos?

Thursday, May 02, 2024

O DESTRAVADO

Ontem, num programa da Sic, Ricardo Costa considerou que Marcelo, mesmo após as incontinências libertadas durante um jantar, será cognominado na História pelo "Presidente Popular".
É um ponto de vista, respeitável. Contudo, prevejo, também tenho direito a prever pelo menos nesta toca de grilo sobre aquecida com tanta polémica inconsequente, que Marcelo passará para a pequena história como o "Destravado".

Marcelo Rebelo de Sousa, maquiavelista, talvez embalado pelos copos e pelos pratos, abriu num jantar que deu conversa para quatro horas e divagar sem filtros:
Considerou Montenegro um rural de difícil entendimento, intempestivo, desprogramado, inoportuno. 
Para compensar, atribuiu a António Costa raciocínio lento, próprio dos orientais.
Assumiu a responsabilidade dos portugueses pagarem reparações pela escravatura cometida sobre povos negros.
Renegou Marcelo, o seu filho Nuno pelas consequências do abusivo uso do nome do pai, presidente, no  envolvimento, que nunca existiu, segundo Marcelo, num processo de tratamento de gémeas brasileiras, em Santa Maria.
A rematar, atribuiu à Procuradora Geral da República, a coincidência maquiavélica de, para compensar, ter reaberto processo das gémeas em sequência da publicação pelo Ministério Público da informação de abertura de processo que envolvia o primeiro ministro.

As questões de natureza doméstica já foram grelhadas tempo mais que suficiente para já cheirarem a esturro. Mas para os meios de comunicação social, quanto mais esturrado melhor.
O que me levou agora a perder tempo com o destravado Marcelo, foi a questão das reparações pela imunda actividade dos portugueses no comércio negreiro.
Sobre este ponto não tenho nada a acrescentar a um artigo publicado hoje no Expresso, 
se é impreciso ou distorcido da verdade (e o que é verdade?), não serei eu competente para o corrigir.

Há, contudo, nesta questão das responsabilidades portuguesas nas atrocidades cometidas aos nativos das terras para onde se aventuravam pela costa africana até chegarem ao oriente, tenho de observar:
1º - Esta contrição serôdia num tempo em que os ocidentais esmagam, a olhos vistos, os valores que cimentaram, mas não consolidaram, as democracias liberais (há outras?) alimenta as ideologias (serão ideologias?) anti liberais, autocráticas, ditatoriais, que se expandem (como há cem anos) como fogo posto em palheiro. 
2º. - Sugiro que procurem na net "BRASIL, País do Futuro - Stefan Zweig", o testemunho de um grande escritor, de origem judaica, nascido em Viena, que, desgostoso com o que se passava no seu país, abandonou a Áustria, rumou para o Brasil, onde, angustiado com o que se passava na Europa, dominada pelos nazis, se suicidou em 1942.
 
"Da maneira mais simples o Brasil  tornou absurdo - e a importância desse experimento parece-me modelar - o problema racial que perturba o mundo europeu, ignorando simplesmente o presumido valor de tal problema"
 
Houve africanos capturados por esclavagistas portugueses? Sem dúvida.
Portugal tinha envolvido na sua aventura das descobertas a quase totalidade, muito poucos porque o país era pequeno e pobre, dos seus homens válidos. Onde mobilizar homens para animar uma economia em princípios de desenvolvimento senão do outro lado do Atlântico? 
 
Em 1822 o Brasil torna-se independente por vontade do herdeiro do rei português, Pedro I.
A partir dessa data gloriosa, para ambos os países, o povo brasileiro era senhor dos seus destinos.
A escravatura já tinha sido condenada mas o caudal negreiro entre África e o Brasil não cessou porque os senhores do engenho (de açúcar) clamavam não poder prescindir do seu negócio e a industrialização, também por essa razão, chegou tardiamente ao Brasil. Os brasileiros, uma designação vaga, continuaram a negociar com os, supostamente portugueses, outra designação vaga,  traficantes de escravos, durante muito tempo depois da independência e da abolição da escravatura.
Os portugueses devem saber isto; os brasileiros também. Para sossego consciente de algumas más consciências de um lado e do outro. 

Leiam o testemunho de Stefan Zweig, e a nossa história comum ficará mais clara do que parece estar hoje.

Friday, April 26, 2024

Thursday, April 25, 2024

A ORIGEM DO 25 DE ABRIL DE 1974

Na origem do 25 de Abril de 1974,  esteve este Decreto-Lei assinado por Marcello Caetano e promulgado em 29 de Junho de 1973 - O decreto que esteve na origem do 25 de Abril - , foi publicado aqui, no Diário da República em 13 de Julho de 1973. 

"Sabe-se que, historicamente, foi a contestação (corporativa) a este diploma que esteve na génese do  movimento dos capitães, que, em menos de um ano, viria a derrubar o Estado Novo". 

A contestação do movimento dos capitães viria a concretizar-se através do golpe militar 25 de Abril de 1974, que o povo aclamou como Dia da Liberdade. 
Se a origem era corporativa o proveito maior, para o povo, foi a liberdade devolvida depois de lhe ter sido retirada por outro movimento militar 48 anos antes.
 
Depois, e durante cerca de dois anos e meio, a liberdade esteve sob ameaça ser retirada por alguns dos quais, ou por pressões políticas antagónicas, sobre os quais, a tinham devolvido ao povo. 
Foram tempos de indignidade do 25 de Abril de 1974 que só tiveram fim em 25 de Novembro de 1976.
 
Correl. -
 

Wednesday, April 24, 2024

MARCELO EM MODO COMPLETAMENTE DESTRAVADO

Marcelo diz que Montenegro “dá muito trabalho” e que tem “comportamentos rurais” Marcelo Rebelo de Sousa considera que o primeiro-ministro Luís Montenegro "dá muito trabalho", é muito "imprevisível" e que vem de um "país profundo". As declarações foram feitas num jantar esta terça-feira, com jornalistas estrangeiros. A história é revelada pelo jornal Correio Braziliense, que conta a conversa com o Presidente da República. Já antes, o mesmo jornal tinha revelado que Marcelo Rebelo de Sousa garantiu ter cortado relações com o filho, em consequência do caso das gémeas. Além das considerações que fez sobre o actual primeiro-ministro, o Presidente da República fez ainda comentários sobre António Costa, que "por ser oriental, era lento".

Marcelo põe água na fervura após comentários sobre Montenegro: vem da “raiz” do PSD 

Marcelo sem filtros  

Portugal deve “pagar custos” da escravatura e dos crimes coloniais, diz Marcelo.

OH! PREC FICA LÁ ONDE TU ESTÁS!

 

 

Monumento a Vasco Gonçalves desenhado por Siza para a Alameda está num limbo.

E logo a Vasco Gonçalves, muito provavelmente o mais desastrado actor na balbúrdia que enxovalhou a pureza da melhor das intenções do  movimento popular que fez do 25 de Abril de 1974 um dia de devolução aos portugueses da liberdade encarcerada em 28 de Maio de 1926.

Monday, April 22, 2024

CONTAS DO 25 DE ABRIL - 3

9/Janeiro/76

EM NOME DA REVOLUÇÃO

Fernando Amaral (PPD):

"O povo português, aqui e além, viveu aquele drama de iniquidades donde sobreleva os atentados à liberdade pessoal - roubar a tranquilidade dos lares para se prender um homem, às tantas horas da madrugada; invadir o domicílio de tantos, com a G3 apontada e dedo no gatilho, acordando mulheres e crianças para um pesadelo de força e opressão e violência; prender pela força das armas, sem mandato legítimo, sem autoridade e sem lei; expulsar, sanear, vilipendiar e enlamear a honra e a dignidade alheias, foi o caminho seguido pelos mais furiosos e violentos que a uma perseguição frenética postergaram para a monteira do sórdido o que de mais belo nos prometera o 25 de Abril: a paz, a liberdade e a igualdade...
 
... Prende-se sem culpa formada; tortura-se: mutilam-se física e moralmente os cidadãos; prativam-se actos de violência gratuita e sádica ...
 
... fez-se apelo aos baixos instintos das massas, transformadas em ralé, alienada e submissa.
Criaram-se tribunais revolucionários, tribunais especiais, numa ambiência cega de destruição dos direitos fundamentais do homem que, afinal, foi causa e razão suprema da Revolução.
O afastamento das garantias jurídicas e o banimento dos direitos  de defesa das pessoas que seriam levadas perante tais tribunais despertou a Comissão Internacional de Juristas, que chegou a Portugal ao condenável e detestável regime chileno ...
 
A imprensa vem produzindo testemunho do que se  passara no Regimento de Polícia Militar, em Caxias, em Alcoentre, em Custóias; aí se cometeram autênticos crimes que violam os mais elementares direitos do homem; interrogatórios sob coação das armas; "brigadas revolucionárias" que saquearam a casa dos detidos ...

... incomunicabilidade por longos períodos ...

... sevícias graves, violências ...

Afonso Dias (UDP) - Sr. Presidente: Protesto contra esta intervenção em defesa dos fascistas e da  libertação dos pides. Protesto contra o facto de esta Assembleia não se opor a tal tipo de intervenção ...
 
Fernando Amaral - E tudo isto se passou ... e viveu em nome da Revolução! ...
 
Foi a revolução da violência! Foi a revolução pela revolução!
Sem sentido, sem norte, vivida apenas na anarquia das paixões!
Desprezara-se o direito, banira-se a legalidade democrática e os homens estavam sujeitos ao medo: medo de ser preso por criticar os que detêm o Poder; medo de ser insultado por expressar as suas ideias; medo de perder o emprego por denúncia de quem apenas pretende  o lugar; medo de sair à rua e de ser agredido ou de ter a casa assaltada ...
 
... e nessa senda terrível e acabrunhante, em vez de construirmos o um Estado, teríamos certamente gerado um monstro, porque havíamos reduzido o Homem à condição mais abjecta de escravo" 


CONTAS DO 25 DE ABRIL - 2

 

17/Novembro/75

Primeira cena do II acto . – um momento crucial –

 

A propósito da manifestação promovida pelo PCP, UDP e outras organizações políticas da esquerda revolucionária, Octávio Pato teceu considerações na Assembleia (Constituinte) que o PS e o PPD apuparam.

Disse aquele deputado:

“O nosso país e a Revolução portuguesa atravessam um momento crucial. Os acontecimentos demonstram, de forma inequívoca, que uma viragem à direita na política portuguesa não resolve, antes agrava, a crise político-militar, assim como os conflitos sociais e a situação económica” …

No domingo no Terreiro do Paço, mais uma vez se provou o que por mais de uma vez temos afirmado: no Portugal de hoje não é possível governar sem o Partido Comunista Português, e muito menos contra o Partido Comunista Português”…

Segunda cena do II acto . PCP justifica o sequestro

Octávio prosseguiu a sua intervenção referindo-se â manifestação afecta à construção civil que sequestrou os deputados no Palácio de S. Bento durante a noite de 12 para 13 de Novembro e manhã do último dia.

…”É inesquecível o espírito de sacrifício de milhares de trabalhadores que, durante trinta e seis horas,  sem dormir …

… ao frio da noite, sentados ou deitados nas ruas ou nas escadarias junto ao Palácio de S. Bento. Ali se mantiveram e dali não arredaram pé …”
… O significado dessa luta de dezenas e dezenas de trabalhadores que auferem um salário de miséria não o quiseram ver os deputados do CDS, do PPD e parte ds deputados do PS … Não quis ver o dr. Mário Soares, que afirmou que a luta dos trabalhadores da construção civil era “uma acção de sabotagem económica”…

 

IV acto . retrospectiva dos acontecimentos

 

Falou depois José Luís Nunes (PS) que narrou assim os acontecimentos: 

Na passada quarta-feira, dia 12, foi convocada por trabalhadores da construção civil uma manifestação que deveria dirigir-se ao Ministério do Trabalho, com vista a pressionar o Governo e, através da razão da força, procurara obter o que a força da responsabilidade e da razão não podia outorgar”… 
 “Tendo sido encerrado o Ministério do Trabalho, entenderam os Manifestantes dirigir-se ao Palácio de São Bento, efectuando o cerco deste edifício público, bem como residência oficial do Chefe do Governo, que lhe fica contígua”. 
“Finda a sessão da Assembleia Constituinte, foram todos os deputados, e não só os deputados, mas também os trabalhadores desta casa … impedidos de abandonar o Palácio de São Bento por manifestantes cuja atitude agressiva não era certamente alheia a incúria, ou melhor dizendo, a cumplicidade com que certas autoridades militares actuaram, deixando o Palácio de São Bento sem qualquer protecção, em flagrante contraste com o que anteriormnte acontecera em manifestações menos concorridas e menos anunciadas” 
... “Mais importa também declarar () que o direito de manifestação acaba onde começam os restantes direitos individuais. E o que se passou aqui na noite de 12 para 13 deste mês não foi o uso legítimo direito,  mas um inqualificável abuso de direito” … 
“Choca, em primeiro lugar, o local escolhido para fazer a manifestação. Se efectivamente se encontra encerrado o Ministério do Trabalho, os manifestantes, em vez de se dirigirem a outros Ministério, ou a outros pontos do Governo, admitindo, por hipótese absurda, que eram conduzidos de boa fé, o que só por hipótese se admite, vieram para a Assembleia Constituinte. É preciso dizer que nós deputados eleitos pelo povo, que só deputados eleitos, não temos competência para outorgar salários ou aumentar regalias” … 
“Deve dizer-se que sequestro não é uma forma de reivindicação” … 
“Deve dizer-se que o saneamento é uma forma de extorsão”
 
 


 

Sunday, April 21, 2024

POR FAVOR, NÃO MATEM OUTRA VEZ A AVEZINHA!

 

Não me venham contar histórias,

já tantas vezes repetidas,

de heróis de intenções generosas e almas puras

que o povo idolatrou,

porque me repugnam as idolatrias.

Não me venham contar  histórias de heróis impolutos,

que arriscaram a vida

rumo ao sul

para soltarem a ave encarcerada por outros seus iguais,

igualmente idolatrados,

de norte a sul,

quarenta e seis anos antes.

É verdade, só quarenta e seis anos antes, 

uma imensidão de tempo para quem nasceu há menos de cinquenta!

Conheço essas histórias contadas e recontadas como contos de fadas

embrulhadas, enfeitadas, perfumadas de poemas piegas, 

discursadas com vozes cheias

de intenções ocas. 

Conheço-as todas.

E vi, porque senti, que a avezinha solta naquela manhã de primavera

desenhou no céu puro e limpo um perfeito e único golpe de asa

como eu nunca antes tinha visto.

E que, como um raio me tivesse trespassado,

e emocionalmente tivesse fulminado as minhas congénitas reacções

à irracionalidade das emoções das turbas.

Porque também eu me juntei aos que idolatravam os heróis do dia

que tinham aberto a gaiola onde outros parecidos,

também idolatrados, 

como libertadores do povo,

por terem engaiolado a avezinha quarenta e seis anos antes.

Até me aperceber que a intenção dos heróis daquele dia,

de libertação da avezinha,

não era tão desinteressada e pura como a turba tinha acreditado,

e como, num qualquer catecismo, ainda continua a querer acreditar. 

Ainda a avezinha não se tinha regalado de voar,

levou uma chumbada numa asa,

atirada por quem tinha chumbo para atirar,

a avezinha,

deu de lado mas não caiu ao chão,

batendo desesperadamente as asas feridas,

depois de a uma chumbada ter sido atingida por outras,

piando, desesperadamente por clemência,

até pararem as chumbadas quase dois anos e meio depois.

A avezinha sobreviveu, tem-se mantido viva,

ao longo de quase mais quarenta e seis anos,

mas não está garantido que se mantenha sempre solta e viva.

Há sempre alguém à espreita 

para ensaiar a pontaria com uma chumbada,

reflectida.