Sunday, April 21, 2024

CONTAS DO 25 DE ABRIL.

Extraído de "Cenas Parlamentares", de Victor Sá Lopes - Edição EDITUS

10/Julho/75 

"UMA ESTAMPA DO MUSEU CARNAVALÉ"

I acto (primeira cena)

 "A propósito da "ostensiva, e, por vezes impudica falta de respeito pelos direitos, liberdades e garantias individuais", António Arnault (PS) afirmou a certa altura da sua vibrante intervenção:

"O meu ofício, Srs. Deputados, é o de advogado. No desempenho da minha profissão. defendi, sempre gratuitamente, alguns antifascistas e visitei-os nas cadeias da PIDE.
Julgava eu que essa época tenebrosa, de prepotências, arbítrios, delongas e dolorosas prisões sem culpa formada, era apenas uma página negra do passado. Página que não apenas uma página negra. página que não devemos arrancar, para que jamais se apague da memória dos homens - alguns de memória tão curta - esse rol infamante de atrocidades ...
Porém, Srs. Deputados fui vítima nas últimas semanas de actos e atitudes que reputo gravemente ofensivos dos direitos fundamentais da pessoa humana, para garantia dos quais também se fez a revolução. Actos, portanto, genuinamente contra-revolucionários, por se filiarem na raiz totalitária que os homens do 25 de Abril quiseram definitivamente arrancar da terra portuguesa. Actos que, objectivamente, não servem a revolução, e aproveitam à reacção, por irem minando a confiança do povo.
Um velho companheiro de luta antifascista, que passou anos amargos nas masmorras da PIDE e veio comigo para a rua, nos dias seguintes ao 25 de Abril, saudar entusiasticamente, com a força da nossa alma liberta. a revolução triunfante, foi preso no dia 28 de Maio, por acaso dia de aniversário de uma filha; às 7 horas da manhã - e não às 5 da tarde como a Lorca - forças militarizadas cercaram-lhe a casa, arrancaram-no da cama e conduziram-no à Penitenciária de Coimbra. Do mandato de captura, assinado pela autoridade militar, constava a acusação de pertencer a uma "associação de malfeitores"...
Um destes domingos tentei visitá-lo como seu advogado, a sua solicitação e da mulher. Os guardas da cadeia informaram-me, porém, que ele estava entregue às Forças Armadas e que só estas podiam autorizar a visita. Um guarda encarregou-se de obter telefonicamente a necessária autorização, mas, incrivelmente, esta foi negada sem qualquer explicação" 
 
I acto (segunda cena)

(Os cinco deputados do MDP levantam-se dos lugares. E, talvez para darem mais força dramática ao seu gesto, abandonam a sala desfilando pelo caminho mais longo; isto é passam diante da tribuna da presidência, em vez de sairem mais rapidamente pela porta mais próxima da sua bancada. Agita-se a Assembleia- Apupos de socialistas e "pêpêdês" para os "mêdêpês".)
...
(A exemplo do MDP, também o PCP retira do hemiciclo os seus deputados- O ambiente é de total agitação. Assobios, Apupos. Manifestações nas bancadas e nas galerias).
 
Vozes diversas - Fascista! Fascista!
...

... A.A. - Está na bancada do Partido comunista um camarada que se acolheu várias vezes em minha casa ...  Agora abandonaram esta Assembleia, mostrando à evidencia que não sabem compreender a palavra "liberdade"

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