Tuesday, May 07, 2013

OS BANCOS E AS PESSOAS

A notícia do dia foi  a emissão de três mil milhões de dívida pública a 10 anos, a uma taxa de juros abaixo dos 5,7%, que o ministro das Finanças considerou um sucesso, mas reconhecendo que se trata ainda de um juro elevado. Para o primeiro-ministro (segundo declarações de há dias) não são as taxas de juro que estão elevadas, a dívida é que está alta demais ... Quanto ao sucesso da emissão medido pelo procura que triplicou três vezes a oferta, estamos falados. Se a procura real fosse a que os computadores registam, a taxa de juro seria, naturalmente, bem inferior, segundo a elementar lei da oferta e da procura.

Soube-se hoje que a Caixa registou prejuízos de 38 milhões no primeiro trimestre deste ano, e a questão subsiste: para que queremos um banco do Estado que, apesar da situação historicamente privilegiada na captação de poupanças dos portugueses, não se distingue da banca privada, superando-a sobretudo nas práticas e tácticas que conduziram o país afogamento por endividamento e  operações especulativas? *
  
Soube-se também hoje que Durão Barroso apresentou em Bruxelas plano pormenorizado para uma União Económica e Monetária. Barroso faz o que pode, mas pode pouco. "A união orçamental, bancária e política têm de avançar ao mesmo tempo. Até onde estamos dispostos a ir na integração europeia?". Boa pergunta. A resposta da Dona Ângela & Companhia do norte pode prever-se aqui: a União Europeia quer blindar os depósitos bancários abaixo de 100 mil euros nos bancos em crise. A Dinamarca e um outro sócio europeu opõem-se e pretendem que todos os depósitos sejam chamados a tapar os buracos que vierem a observar-se nos bancos onde sejam depositantes.

Reflectindo a corrente financeira que corre para o norte corre no mesmo sentido a corrente da emigração. Também no El País de hoje se pode avaliar a dimensão dessa corrente humana provocada pela crise: Aumentou em cerca de 45% o fluxo de espanhóis para a Alemanha em 2012, envolvendo quase 30 mil pessoas. Da Grécia, mais 10000 que em 2011, 34109 no total, de Portugal, mais 4000, 11762 no total, da Itália mais 12000. Com uma grande diferença, encabeça a lista a Polónia. Em 2011 emigraram para a Alemanha 176000 polacos, da Roménia, 116000, da Bulgária, 59000.  Em 2012 a Alemanha terá recebido quase 1 milhão de imigrantes.
 
Do ponto de vista da teoria económica, é normal esta vaga migratória.
Até onde é que ela política e socialmente sustentável é uma questão que nenhuma norma pode servir de padrão de avaliação mas pode supor-se que terá um refluxo dramático se a União Europeia se desintegrar.   
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* Os temporariamente nacionalizados de facto BCP e Banif perderam, respectivamente, 152 milhões e 69,2 milhões de euros. O BES, contra as expectativas dos analistas também apresentou prejuízos de 62 milhões. O BPI registou 40,5 milhões de lucros.
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Correl. - Restrições à imigração no UK atinge cidadãos da UE.

4 comments:

Pinho Cardão said...

Oh Rui, ao ler este teu texto ia-me perguntando se o autor do post era o meu amigo e colega Rui Fonseca, economista e financeiro clarividente e que muito prezo.
Acho que não!...

rui fonseca said...

Caro António,

Obrigado pela visita, antes de mais.

Quanto à falta de clarividência, fico sem saber se te referes à matéria de facto ou a algum aparte meu que não encaixe razoavelmente no resto.

Se é este o caso, e só pode ser este o caso, ajuda-me sff a ver melhor com a tua experimentada capacidade de visão onde atirei ao lado.


Abç

Pinho Cardão said...

Caro Rui:
Porque gosto de te ler, e também por concordar com muito do que escreves, aqui vão as minhas observações, sobretudo por discordar do enquadramento que fazes das diversas situações, o que leva a lapsos de análise.
1. “Se a procura real fosse a que os computadores registam, a taxa de juro seria, naturalmente, bem inferior, segundo a elementar lei da oferta e da procura”.
Violentas a lei da oferta e da procura. Pode haver uma procura enorme, mas com os agentes a não descerem de determinado intervalo de preços, porque outras alternativas existem. Foi o caso.

2. “Soube-se hoje que a Caixa registou prejuízos de 38 milhões no primeiro trimestre deste ano, e a questão subsiste: para que queremos um banco do Estado que, apesar da situação historicamente privilegiada na captação de poupanças dos portugueses, não se distingue da banca privada, superando-a sobretudo nas práticas e tácticas que conduziram o país afogamento por endividamento e operações especulativas?

a) Misturas o que não podes misturar: prejuízos e Banco do Estado. No caso, nada tem a ver uma coisa com outra.
b) Atribuis os prejuízos da Caixa, como de outros Bancos, a operações especulativas. Quais? Claro que terá havido operações “políticas”, crédito de favor, má ponderação de risco. Mas o essencial dos prejuízos deve-se a imparidades resultantes da concessão de crédito perfeitamente normal a empresas cuja actividade se ressente da conjuntura económica. Se a economia, as empresas e os particulares vão mal, claro que a situação se repercute de imediato nos Bancos. Se assim não fosse, então terias razão: os Bancos não tinham injectado fundos na economia, porventura por os terem aplicado na especulação. Onde, também já o tens dito, os Bancos ganham dinheiro. Em que ficamos?
3. Os temporariamente nacionalizados de facto BCP e… perderam, respectivamente, 152 milhões e 69,2 milhões de euros.
Oh Rui, onde é que o BCP foi nacionalizado? De facto, devido à tecnocracia de Bruxelas, foi “obrigado” a encaixar dinheiro do Estado para apresentar rácios de solvabilidade muito elevados. Hoje, o BCP tem dos rácios de solvabilidade mais elevados dos Bancos europeus. Para quê?
Aliás, seria praticamente certo que capital privado acorreria ao Banco em operações com taxas inferiores às que o Estado cobra. Simplesmente, o absurdo existe: segundo as normas estabelecidas pela tecnocracia europeia, se o capital fosse privado não contaria para os rácios!!!.... Tinha que ser capital público!...
Donde, algum do prejuízo do BCP também se deve à taxa superior a 8% que o Banco tem que pagar ao Estado por um apoio que lhe foi imposto. Com graves prejuízos para a economia, pois quem paga mais que 8% não pode emprestar a taxas razoáveis e adequadas.
E, aqui para nós, um rácio de 12% ou de 10% não faz diferença de maior. Assegurado um patamar de solvabilidade, o problema, se houver, está sempre na liquidez, não no rácio de solvabilidade. Mas por Bruxelas, Basileia e outros lugares há quem confunda tudo. O importante é que o Estado intervenha.
E aqui estão as minhas observações.

rui fonseca said...

1

"Violentas a lei da oferta e da procura.Pode haver uma procura enorme, mas com os agentes a não descerem de determinado intervalo de preços, porque outras alternativas existem. Foi o caso."

Se os agentes não descem de determinado intervalo, pode qualquer deles subscrever quase ilimitadamente sem qualquer perda.

Por que o faz? Se estiver industriado nesse sentido.

(Não entendo porque dizes que violento a lei da oferta e da procura.... Eu é que violento?)

2
a)"Misturas o que não podes misturar: prejuízos e Banco do Estado"

Mas é matéria de facto: o Banco do Estado observou aqueles prejuízos.
Ou não? Seria esperável que isso acontecesse? Penso que não.

E penso que não pelas razões que sucintamente referi. A Caixa, por razões conhecidas historicamente uma posição privilegiada enquanto
colector de poupanças dos portugueses. Durante muitos anos toda a função pública era obrigatoriamente paga através de contas na Caixa. E a inércia, neste caso dos depositantes, tem muita força.

b) "
Atribuis os prejuízos da Caixa, como de outros Bancos, a operações especulativas. Quais?"

Há muitas.
Desde logo, e sobretudo no caso da Caixa, o financiamento à construção gerou uma espiral especulativa de preços que determinou um excesso de stock habitacional que levou à existência média de 1,3 habitações por cada família. Um valor só superado pela Espanha.

Ninguém ignora que a Caixa ( e não
só) concedia 100% de crédito e ainda mais para o recheio e etc.
Evidentemente, esta prática determinou expectativas que aumentaram os lucros dos construtores e os bónus dos banqueiros.

Por outro lado a Caixa (imitando os seus pares) alimentou e continua a alimentar uma actividade de aplicação em fundos de investimento, geralmente opacos, sem aplicação na economia portuguesa.

A Caixa municiou as armas de alguns na conquista do domínio no BCP. Há operação mais especulativa (em todos os sentidos) e mais condenável para um banco, sobretudo sendo público, que esta?

E há mais, há muito mais.

Com que fundos financiaram os bancos (incluindo a Caixa) estes desaforos? Importando endividamento de forma desenfreada.

Só os bancos, incluindo a Caixa, a Associação Portuguesa de Bancos, e o Banco de Portugal, conjuntamente com as entidades públicas (ir)responsáveis, sabiam que níveis de endividamento estava a ser atingidos.

Foi da reciprocidade perversa de interesses entre os governos e os bancos que resultou a crise com que hoje nos defrontamos.

Quanto ao BCP, também não concordo com a forma como impuseram a intervenção do Estado no assunto. Mas é um facto. A esmagadora maioria do capital permanente do banco está de facto detida por um Estado. Ainda que os fundos aplicados pelo Estado tenham sido emprestados pela troica. É absurdo? Para mim, é.

Salvo melhor opinião.