Friday, January 05, 2007

O RAIO QUE OS PARTA

Há uma fracção da sociedade portuguesa cuja vocação e profissão é ser culta. Como em qualquer outra profissão, é no exercício da sua especialidade que estes profissionais da cultura realizam aquilo que é tão importante para eles como para quaisquer outros: ganhar com que pagar os necessários, e os supérfluos que for possível.

Em geral, os cultos notam-se na rádio, na televisão, nos jornais.

Hoje à tarde, num programa da Antena 2, que conta com a participação de Gabriela Canavilhas, Maria João Seixas e Vicente Jorge Silva, discutiam os cultos, também para ganhar a vida, além de outros assuntos da ordem do dia, a questão de em Portugal se desaproveitarem competências que, noutros países, são chamadas até para responsabilidades de gestão. Os filósofos, por exemplo, dizia a Gabriela, estão a ser convidados a participar nos Conselhos de Administração das empresas nos EUA.

Pois claro, apoiou logo a MJS, pois claro, tinha que ser, está mais que provado que gestores, economistas, financeiros e o raio que os parta, não vão a lado nenhum.

E ainda há quem ande por aí a dizer que nos falta, a nós portugueses, vocação para os métodos quantitativos de análise. Segundo MJS, não só há como há demais. O raio que os parta, o que nos faz falta são filósofos para colocarem isto nos eixos, diz MJS e os outros participantes no painel não podem estar mais de acordo.

Esta posição, vinda de quem vem, parece dar razão a quem (economista, seguramente, ou coisa parecida) assegura que os portugueses são avessos às contas, o que, á primeira vista parece natural porque as suas elites cultas não só abominam os algarismos como convocam os raios para destruir aqueles que ganham a vida a trabalhar com eles.

Contudo, a diabolização dos cultores das contas por parte dos cultores da cultura não reflecte nenhuma intromissão genética específica nos portugueses, em geral, e das suas elites cultas, em particular, porque a invocação dos filósofos é também a invocação do raciocínio lógico que se estriba, desde os pensadores da Antiguidade até aos nossos dias, na construção dos edifícios da matemática que, em grande parte, são obra sua. Neste sentido, teria MJS & Cª. de tirar todas as consequências da sua aversão às contas e juntar os filósofos à lista dos seus inimigos de estimação, a começar pelo Pitágoras.

Mas a razão da revolta de MJS e de muitos pseudo paladinos da cultura em Portugal é outra: À frieza dos resultados das contas eles propugnam por uma cultura de faz de conta que lhes permite ir acertando as suas próprias contas sem prestar contas.
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O que, reconheça-se, se percebe perfeitamente.

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