Wednesday, November 14, 2012

DEBAIXO DO COLCHÃO

Na passada sexta-feira, "dia da poupança", o governador do Banco de Portugal divagou ( vd aqui), perante uma assistência seleccionada, acerca dos benefícios e dos malefícios da poupança, e debitou, para além de um conjunto de lugares-comuns - a poupança em si não é produtiva e tem um impacto negativo sobre o consumo, só é virtuosa quando transformada em investimento, que, por sua vez, gera aumento de oferta e oportunidade de mais consumo no futuro - e uma afirmação patusca: se a poupança, decorrente da abstenção de consumo, for colocada num cofre ou debaixo do colchão, não se traduz em investimento nem em sustentação da procura.
 
Patusca, porque só por brincadeira com coisas sérias o governador do Banco de Portugal supõe, ou quer fazer supor não sei a quem, que os capitais que contam e que se escapam ao consumo e ao investimento se abrigam debaixo dos colchões dos portugueses. O governador do Banco de Portugal não ignora algumas das causas que permitem à Alemanha, além de outros países do norte e até a França, financiar a sua dívida a juros negativos ou próximos de zero, ao mesmo tempo que os países financeiramente fragilizados pagam juros incomportáveis e vêm as suas dívidas progredirem numa espiral medonha que ameaça a continuidade da União Europeia.
 
Mas também patusca porque o governador do Banco de Portugal sabe que a poupança e o crédito importado pelos bancos se direccionaram, em larga medida, durante muitos anos para o investimento em cimento e para aplicações especulativas que, em muitos casos, eram, e continuam a ser, um jogo de casino onde toda a batota, foi, e ainda é, ignorada pela supervisão do Banco de Portugal. Terminada a bebedeira do cimento, quem se apoquenta agora com o futuro, o que poupa ainda o confia aos bancos, a julgar pelas notícias que dão conta de, espantosamente, estarem a subir em Portugal os depósitos a prazo em Portugal.
 
O que fazem os bancos a estas parcas poupanças, governador? Aplicam-nas em investimentos reprodutivos que criem sustentavelmente riqueza e emprego?  Onde, governador?
 
"Poupar para investir é a estratégia certa". Pois é. Mas enquanto não houver, pelo menos, a união bancária, que o governador na ocasião disse defender, não haverá nem recursos suficientes, nem investimentos a sério. E até lá, debaixo dos colchões dos portugueses não creio que haja coisa que valha  um discurso do governador do Banco de Portugal.  

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