Thursday, November 15, 2012

CONCEITOS PROPOSITADAMENTE CONFUSOS

" ... Mas alguém pode justificar que, se a despesa pública não produz crescimento a um nível de 49% do PIB, como é o caso português, já o produziria se aumentasse para 51% ou 52%?", pergunta A. Pinho Cardão aqui
 
 
- ... para lá dos comentários que fiz em outros apontamentos teus com idêntico propósito - recusar os impostos, que são imediatamente sentidos, não basta e provoca desastres ao retardador, porque a despesa pública cresce entretanto, à custa do endividamento, invisível até acontecer o que aconteceu - gostaria de referir que não me parece correcto referir que a despesa pública é de 49% do PIB porque só o será se considerares que as pensões pagas aos oriundos dos sectores privados são despesa pública e as contribuições TSU, impostos. Na realidade, se retirares à "despesa pública" as contribuições dos sectores privados a relação baixa, segundo as minhas contas, para 38,5%.

Nem as contribuições TSU são impostos nem o pagamento das correspondentes pensões despesa pública. Se o fossem, eu teria pago durante dezenas de anos impostos que muitos outros portugueses não pagaram, incluindo os bancários, por exemplo. A função pública não presta um serviço nesta matéria para além de, grosso modo, receber de um lado e pagar ao outro. Tendo os governos,  durante muitos anos, aplicado as diferenças positivas para reduzir o défice.  Dirme-ás: Mas é assim que as contas são feitas. Pois é. Mas há muitas contas mal feitas.

- Quanto ao tema do post (que é de Março de 2005), as contas são o que são e o défice integra os custos da segurança social. Assim é em toda a Europa e para o Eurostat, e para o BCE e para a Troyca. Mas, mesmo que não integrasse, a questão seria absolutamente a mesma. Mais despesa pública e mais impostos, nas actuais circunstâncias, e também em 2005, não resolve nada na economia. Pior, só estraga. Só traz desvantagem e prejuízo.
Como está suficiente e abundantemente provado
 
- ... Calcular um valor a partir de dados abstrusos desvaloriza o resultado. Despesa pública é aquela que pagamos como contrapartida de um serviço prestado pela função pública. A redução das pensões aos contributivos não é uma redução da despesa pública porque as pensões não são pagas com impostos. Pelo contrário: Só este ano, segundo relatório do INE, a segurança social apresentou défice. Ao longo de muitos anos contribuiu para o défice. Contribuiram muitos, mas não todos. As contribuições TSU nunca foram exigidas a todos os portugueses. A sua abrangência é totalmente diferente da dos impostos. Misturar uma coisa com outra pode forçar uma conclusão mas não ajuda a boa compreensão do que está em causa.
As contas públicas, desde logo porque são contas de caixa, sugerem muitas conclusões falsas.
 
- ... Estás errado duas vezes:
a) as contas que servem de base ao cálculo da receita, da despesa e do défice validado pelo Eurostat são obtidas a partir da contabilidade nacional, não da contabilidade pública. Esta última é uma contabilidade de caixa, regista recebimentos e pagamentos; por seu lado, a contabilidade nacional aproxima-se da contabilidade empresarial, registando proveitos e custos. Entendido?
b)Todos podemos ter o nosso próprio conceito de despesa pública, a liberdade também dá para isso. E nesse conceito, englobar ou retirar o que nos aprouver. Mas há um conceito oficial de despesa pública, definido pelo Eurostat e a que todos os países da CE naturalmente obedecem. Sem o que comparações seriam impossíveis. E quer os custos da Segurança Social quer os proveitos estão lá incluídos. Entendido também?
Mas, pronto, acedamos ao teu critério. E o que é que resulta daí?
Torna-se a despesa sustentável? Se se mantiver o equilíbrio da Seg. Social não será necessário diminuir nas outras parcelas da despesa para que haja sustentabilidade?
A questão é que a despesa é demasiada face aos recursos. Pelo que terá que ser reduzida. Só isso. Sob pena cde colapso total dos serviços e da própria segurança social.
Mas para quê estar a dizer isto, se tu já há muito o entendeste e entendes bem?

- Vamos lá então analisar os meus erros?

Contabilidade pública ou contabilidade nacional, para este caso a diferença é irrelevante.
Qualquer que seja a contabilidade que recorras, a tua conclusão incorpora um conceito que está, do meu ponto de vista, e expliquei porquê, errado, ainda que seja o adoptado pelo Eurostat. Logo, salvo melhor opinião, não estou errado. O conceito, pelas razões que já referi, está. E tanto está que, por exemplo, a incorporação de fundos de pensões de bancos foi considerado receita mas não foram registados os respectivos compromissos. Se isto não é contabilidade de Caixa que, neste caso, nada difere dos conceitos adoptados em contabilidade nacional e aceites pelo Eurostat, o que é? Uma patuscada.

Ora esta confusão de critérios que leva a considerar a despesa no ensino (uma prestação de serviços) ou da saúde, ou da justiça, da mesma natureza com o recebimento de contribuições e pagamento de pensões pode ajudar às tuas conclusões mas não me convencem a mim.

E não me convencem porque a confusão nem é inocente nem inconsequente. Sabes qual o valor dos superavites acumulados ao longo de muitos anos pela segurança social e absorvidos pelo défice das contas públicas? Não sabemos.

Mas, agora que a crise chegou, o desemprego aumentou, e a demografia declinou, para redução da despesa pública reduzem as pensões. O poder descricionário do governo pode muito. Mas é iníquo para poupar a palavra mais adequada.

E é iníquo porque os contributivos pagaram contribuições e impostos enquanto que muitos não pagaram, quando pagaram, senão impostos.

Podem retirar-nos tudo mas, por favor, não nos considerem a todos ignorantes!

Já agora, e ainda a propósito de contabilidade pública/contabilidade nacional: Meu caro António, o que passa propositadamente ao lado de uma não é apanhado pela outra. E tu sabes bem que foi, e continua a ser, assim. Não ignoras a bandalheira das desorçamentações nem as omissões que vigarizaram as contas da Madeira. Por exemplo. Há muito mais para lá desta confusão de conceitos que tanto desconcertam as contas públicas como as nacionais. Mas não vou abusar deste espaço nem da tua paciência

3 comments:

Pinho Cardão said...

Meu caro Rui:
1.Podemos filosofar sobre o conceito de despesa. Mas aquele que é válido para a CE, FMI, BCE, Eurostat, OCDE, Banco Mundial, o que quiseres, é o que apontei.
2. Claro que tu podes ter outro, mas para ouco serve.
3. Não incluir na despesa pública a despesa com segurança social só seria certo se o nosso sistema fosse de capitalização. Mas, infelizmente, não é. O nosso sistema é de solidariedade: são os actuais trabalhadores que pagam as reformas de quem está reformado, como foram estes a pagar as reformas de quem os antecedeu. E, nas falhas, intervém o Estado. É por isso que os mais novos, a tudo continuar assim, só podem ter uma leve suspeita de que receberão alguma coisa que se veja quando chegar a vez deles. Iníquo? Claro que é. Mas é no que dá uma "solidariedade" demagógica ou mal entendida.
4. Mudando de assunto, vamos à desorçamentação.
Claro que aquilo que é desorçamentado, fica escondido. Só não escapa à dívida pública. Por isso, e quase todos os anos, o acréscimo da dívida é muito superior ao défice e não é explicado pelo investimento em activos financeiros, investimento que não conta para o défice.
Mas desorçamentação não acontece só na Madeira. Também lá há, mas é uma gota de água em relação à desorçamentação, por exemplo, do governo de Sócrates. Os pareceres do Tribunal cde Contas sobre a Conta Geral do estado são bem elucidativos. Vai lá ver e ficas a saber.
5. De qualquer forma, foi uma boa discussão.

rui fonseca said...

Caro António,

Uma coisa são os conceitos usados pelas entidades que referes, outra a análise isenta que devemos fazer deles. Se queremos concluir alguma coisa consistente. Já te referi um exemplo de um conceito obtuso usado e aceite por alguns orgãos internacionais: o de considerar um proveito sem considerar os encargos que lhe estão inerentes.
Mas há muitos mais. Uma análise isenta de habilidades contabilísticas não pode senão concluir que é uma prática errada à luz do abc das regras da contabilidade e do mais elementar senso comum. Portanto, quanto a critérios destes, estamos falados.

Não concordo e já expliquei porquê o pagamento de pensões da segurança social não são despesa pública porque não pagos por impostos. Independentemente da segurança social ser de capitalização ou de pay as you go.
Imagina que a mesma tarefa era desempenhada por uma seguradora privada, adoptando o mesmo procedimento. Os pagamentos efectuados eram despesa da seguradora e as contribuições recebidas receitas? Evidentemente, não. O negócio da seguradora, nesse caso, era a cobrança de uma comissão (receita) e o pagamento dos seus custos de gestão (despesa).

Quanto à desorçamentação, citei a Madeira mas disse, "por exemplo".
É por demais sabido que vigarices dessas aconteceram por toda a parte. O da Madeira foi maior e mais condenável porque foi escondida propositadamente. Num país a sério o senhor AJJardim teria sido obrigado a demitir-se no momento seguinte. Mas como vivemos no país dos isaltinos não passa nada. A justiça dorme o sono dos coniventes.

Pinho Cardão said...

Caro Rui:
A da Madeira não foi a maior, foi a mais publicitada. O que é bastante diferente.
Quanto ao resto, cá nos vamos (des)entendendo...