Thursday, April 22, 2010

COMO ÍAMOS DIZENDO

Os orgãos do estado, centrais e locais, têm de ser mais eficientes: menos caros e de melhor qualidade. Enquanto tal não acontecer a competitividade de um largo segmento da economia portuguesa estará, também por esta razão, irremedivelmente comprometida. A Justiça, quase toda a gente concorda, é o mais gritante caso de ineficiência e ineficácia das instituições estatais e um dos principais factores de repulsão do investimento em Portugal.
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Mas a ineficiência da administração do estado não se situa apenas a nível dos orgãos de maior dimensão e complexidade mas observa-se igualmente nas células mais elementares do estado: as juntas de freguesia. Considerando a evolução demográfica, económica e social do País nos últimos cem anos, mais ou menos tantos quantos já leva a actual organização administrativa do País, e os meios tecnológicos de que hoje dispomos, a estrutura orgânica da administração local está completamente desfasada daquelas realidades.
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Não sendo o poder local aquele que mais recursos emprega é nele que se observarão sempre as maiores resistências às mudanças que o progresso do País impõe. Se há convicção atávica das populações de que as suas fronteiras são sagradas e o seu castelo invicto juntarmos as confrontações demagógicas das lutas partidárias teremos de reconhecer que a mudança só pode ser obra de um poder democrático forte e muito determinado que, por entre estes dias de crise aguda não se vislumbra.
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E, no entanto, há exemplos simples, que deveriam convencer todas as mentes despidas de preconceitos, das ineficiências decorrentes da administração de territórios tão partilhados.
Tomemos um que é paradigmático de muitos outros que nos adiantam para justificar o stato quo: Há dias um presidente de uma junta de freguesia do concelho de Oeiras decidiu ocupar o lugar do motorista de um transporte de crianças para a escola, não sei se por ausência do profissional do volante ou por decisão de trabalho do autarca para aquela dia. Evidentemente, apareceu a televisão a dar conta da ocorrência. Estava toda a gente feliz: as crianças, os pais das crianças e, naturalmente, o presidente motorista.
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Pergunta-se: Por quê e ninguém dá uma resposta que valha uma junta de freguesia. Porque se a opção é transportar as crianças para as escolas a resposta mais conveniente não pode ser dada por um orgão de dimensão que não justifica um serviço de transporte privativo e muito menos por uma pessoa que não é profissional do volante. Se a substituição se deu por falta do profissional, e não pode uma junta de freguesia contar com dois, um titular e outro suplente, é óbvio que o serviço deverá ser da responsabilidade de um orgão que tenha dimensão adequada e um quadro de pessoal que conte com vários titulares e os suplentes em número conveniente para um nível de intervenção geograficamente alargado.
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Mas quem é que vai convencer os autarcas e os fregueses? Só se forem estes a pagar directamente as contas.
Porque pagar, pagam, mas pagam sem dar por isso.

5 comments:

António said...

"Os orgãos do estado, centrais e locais, têm de ser mais eficientes: menos caros e de melhor qualidade."

Porreiro!
Comece pelos grandes, os mais caros e deixe as migalhas para o fim.Obtém resultados de volume considerável mais rápidamente.
Aconselho-o e encorajo-o a começar pela câmara municipal de lisboa, que como todos sabemos não tem nada que ver com qualquer junta de freguesia.

rui fonseca said...

Caro António,

Mas é evidente que estou muito de acordo consigo.

O que não invalida que a forma como se governam os dinheiros dos contribuintes em Portugal tenha sinais de graves comportamentos desde o vértice até à base.

E depois, repare, havendo 4300 freguesias, é uma base considerável para dela resultar um produto não negligenciável.

Se em cada uma delas houver desperdícios de, em média, por exemplo de 10 000 euros teremos
43000000, qualquer coisa como 43 milhões de euros! Já é dinheiro.
Mas o custo médio de uma junta de freguesia (só custos fixos) é muitíssimo superior.

António said...

Tem vários anos a luta da Associação de Moradores e Comerciantes do Parque das Nações (AMAPN) pela criação de uma freguesia que unifique esta área de 340 hectares, actualmente "espartilhada" em dois concelhos e três freguesias. Hoje o Parlamento aprecia uma petição, com mais de cinco mil assinaturas, que pede uma "gestão unificada" daquele espaço, sustentando que tal constitui "um reflexo de uma comunidade já existente".

rui fonseca said...

Caro António,

Agradeço-lhe a sua informação.
Mas ela apenas confirma a regra: a da criação de novos orgãos administrativos. A tutela de duas câmaras municipais sobre o mesmo espaço urbano apenas confirma também a extrema dificuldade que há em mexer no stato quo. E quando mexem é para aumentar o número de freguesias ou concelhos. A demagogia encontra nestes casos campos extremamente férteis para
florescer.

Para quê uma junta de freguesia no Parque das Nações que, reconheça-se de passagem, tem mais área e residentes que muitos concelhos do País?

Consegue dar-me um exemplo de um serviço que, naquele caso, uma junta de freguesia está mais apta que nenhum outro tipo de organização possa prestar?

Limpar os passeios? Recolher o lixo? Levar as crianças à escola? Ir à farmácia buscar as receitas para os idosos incapacitados de se deslocarem? Registar os caninos?
Que mais?

António said...

Que mais?
Mais nada. Deixa-se ficar assim que está melhor. Ou deve estar.
Para quem está de fora, claro.