Vítor Bento volta, em artigo colocado no blog da Sedes, a alertar para o beco sem saída onde se meteu a economia portuguesa e a lamentar-se, qual Galileo Galilei no meio da indiferença geral, que esteja a pregar para penedos. Depois de repetir as evidências, Vítor Bento conclui que, agora, só temos "três saídas: 1) redução concertada dos salários e/ou aumento do horário de trabalho (o sucedâneo de uma desvalorização que não podemos fazer), reganhando competitividade e reduzindo a despesa interna; 2) um massivo desemprego, à medida que as actividades não competitivas vão fechando (e obtendo com isso a redução da despesa interna, embora eventualmente para além do que seria necessário) e até que o aparelho produtivo se reestruture ou parte da população emigre; e 3) um milagre."
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Em recomentário, Vítor Bento acrescenta: "Nas actuais circunstâncias, em que há mais dúvidas que certezas e em que, como diz o MF, nos temos que guiar pelas estrelas e por vezes o céu está nublado, o que eu gostaria de ver era uma convergência da principais forças políticas para, em conjunto com as principais forças sociais, se empenharem na elaboração de um Consenso Político-Social que, dentro de todas as restrições e se perder de vista o médio prazo, permitisse responder à(s) crise(s), minimizando os impactos negativos e os custos sociais.Em lugar desta gritaria de todos contra todos."
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Os textos de Vítor Bento são de uma clareza extrema, e a sua disponibilidade para o contraditório notável. Vale a pena ler, e pensar, os textos, e os comentários, e reler aqueles que publicou em Julho do ano passado, e que comentei aqui , aqui e aqui .
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Contrariamente, porém, ao que lamenta Vítor Bento não penso que seja na oposição endémica entre o optimismo reinante e o pessimismo responsável que reside o bloqueamento do consenso suficiente necessário à adopção das medidas que a situação impõe, ainda que concorde inteiramente com o diagnóstico e lamente também que o consenso para a ultrapassagem do imbróglio não se sobreponha ao berreiro.
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Porque, convenhamos, independentemente da apreciação da inevitabilidade das saídas (ou das entradas forçadas) que Vítor Bento afinal resume a uma (reduções salariais) já que quem se fia em milagres o mais certo é levar um tombo, e o desemprego não é uma saída mas uma calamidade que dispensa consenso, se é imperioso consensualizar uma medida tão drástica (reduções salariais) é também fundamental que esse consenso se prossiga com o consenso de outras medidas (outras saídas) sem as quais ficaremos na mesma difícil posição mas num patamar mais baixo. Dito de outro modo, uma operação de desvalorização dos salários, sendo equivalente a uma operação de desvalorização da moeda sem anestesia, se não for acompanhada de outras intervenções conduz o doente, muito rapidamente, a uma situação de recaída.
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Ora tem sido a falta de discussão de propostas alternativas claras que tem conduzido a política em Portugal para um diálogo de surdos entre o governo e a oposição, num jogo táctico que nos tem conduzido a este empate pirrónico para a queda.
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Para além do governo e da oposição temos a "sociedade civil" (temos a Sedes), temos o PR.
Do PR esperava mais. Nos tempos que correm precisa-se do PR uma intervenção mais incisiva e mobilizadora traduzida em indicações concretas. Da "sociedade civil" uma participação mais comprometida e mais afirmativa pela positiva. Estar contra o TGV e outras megalomanias não chega, até porque quem não tem dinheiro não tem megalomanias. É preciso, sobretudo, dizer às pessoas o que podem esperar depois de lhe serem reduzidos os salários. O que elas menos esperam, obviamente, é que lhes digam que vão ter menos ordenado mas irão chegar ao Porto em menos meia hora ou a Madrid em três.
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Como a carga é enorme a sua remoção impõe a intervenção de alavancas em múltiplos pontos de apoio. Arquimedes disse um dia que se lhe dessem um ponto de apoio e uma alavanca deslocaria o mundo. Não deslocou.
E, provadamente, para mudá-lo só um ponto de apoio não chega.
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