Wednesday, May 21, 2008

INDICADORES

J. Pacheco de Oliveira escreve no Sorumbático que
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"é universalmente reconhecido que a energia, principalmente a energia eléctrica, a mais versátil forma de energia, constitui o suporte do crescimento económico, sendo o consumo de energia per capita um dos parâmetros que melhor caracteriza o estádio de desenvolvimento de uma sociedade. (...) Ora, em 2006 o aumento do nosso consumo de energia eléctrica limitou-se a 2,6%. Em 2007 apenas a 1,8%. E no decurso de 2008 o crescimento em período homólogo é praticamente nulo. O problema é que a estagnação do consumo nacional de electricidade não se verifica pelas melhores razões. O país não está a racionalizar consumos, nem a substituir a energia eléctrica por qualquer outra forma de energia."
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As afirmações de J. Pacheco de Oliveira não são, em princípio, contestáveis salvo se ele não tem, e se tem não deu provas disso, dados que lhe permitam afirmar que "o país não está a racionalizar consumos". Provavelmente, lamentavelmente não estará. Mas é esperável que o crescimento dos preços dos combustíveis tenham, pelo menos duas consequências, sobre os consumos: redução por redução da actividade e redução por melhor utilização da energia.
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É por demais reconhecido que a produtividade dos consumos energéticos em Portugal é bastante baixa quando comparada com a observada na generalidade dos restantes membros da UE: significa isto que por cada unidade de PIB produzida em Portugal o consumo energético é bastante superior ao observado na Dinamarca, em França, no Reino Unido, em Espanha, etc. O mesmo vale por dizer que é possível, e desejável, que o crescimento económico não seja, em determinado momento, função do crescimento proporcional dos consumos energéticos. E esta pode ser uma vantagem do aumento dos preços dos combustíveis. Foram as crises petrolíferas anteriores que forçaram, por exemplo, à concepção de motores com menores consumos sem perdas de performance.
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Parece, portanto, que acusar o governo de fautor de uma situação que ele não domina (o aumento dos preços do crude) é bater no sítio errado. O que deve exigir-se do governo é a adopção de medidas que incentivem ou obriguem os cidadãos, individualmente ou nas empresas, a reduzirem os consumos energéticos sem que desse facto resultem perdas de produção. O que é, provadamente, possível atendendo ao que se pode observar nos países membros da União Europeia.
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E este objectivo, que é também de defesa dos interesses de menos dependência energética dos portugueses, não tem apenas incidências económicas mas também ecológicas, constituindo um caso extremamente relevante da prova que ecologia e economia não são adversárias.
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Todo o excesso de consumo energético, entendendo-se por excesso de consumo aquele que se dispende sem contrapartida económica, compromete a competitividade porque aumenta desnecessariamente os custos totais, e desvia para bolsos árabes (entre outros) recursos que nos faltam para os investimentos que necessitamos.
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Resumindo e concluindo: O consumo de energia é um bom indicador do crescimento económico mas, como todos os indicadores, tem de ser lido em simultâneo com outros. Se o nosso discurso não tiver por detrás intenções partidárias.
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Ainda a propósito de indicadores, podia ler-se no caderno de economia do Público da passada sexta-feira que o mesmo tipo de informação (barómetro da economia) pode ser dada pelo consumo de whisky. Quem acredita nesta correlação é Paul Hughes, director do Centro Internacional de Cervejas e Bebidas destiladas na Universidade de Heriot Watt, em Edimburgo, Escócia: o whisky é um produto verdadeiramente global, vendido em mais de 200 países, e pode por isso constituir um indicador de padrões de consumo. Numa perspectiva histórica, as vendas de whisky tenderam a acompanhar a curva económica global. Nos últimos 30 anos, o valor das vendas apenas sofreu quedas em 1983, 1998 e 2004. Mas o ano passado escapou. Nos Estados Unidos, contudo, - o maior mercado da indústria, com vendas que atingem 529 milhões de euros - as vendas recuaram em 2007 cinco por cento. Mas a indústria está agora mais preparada para um abrandamento económico do que em qualquer outro momento nos últimos 30 anos, sobretudo devido às incursões que foi realizando nos mercados emergentes: Rússia, China e África de Sul foram os que mais se desenvolveram.
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Como o consumo de alcool é responsável por grande parte de acidentes nas estradas, como em Portugal o consumo de alcool é dos mais elevados no âmbito da UE e o número de vítimas por acidentes com automóveis também, seguindo esta linha de raciocínio facilmente se chega à conclusão absurda de o crescimento económico se poder avaliar pelo aumento de acidentes rodoviários.

1 comment:

Jorge Oliveira said...

Caro Rui Fonseca

Colocou muitas questões e eu vou procurar esclarecê-lo. Mas vou por partes, para não deixar aqui um texto demasiado extenso.

Eu cingi-me ao consumo de energia eléctrica do país. É o único sobre o qual tenho informação que considero fidedigna (como digo no artigo, fui eu que dirigi a equipa da EDP que instalou o sistema de telecontagem que executa as leituras, com grande exactidão, dos trânsitos de energia na rede).

Acerca dos consumo de outras formas de energia não me pronuncio. Até porque sei que não merecem a mesma confiança. Basta dizer que o petróleo que é utilizado para fins não energéticos é contabilizado como consumo de energia do país. Parece mentira, mas é verdade. Basta perguntar à Direcção Geral de Energia e Geologia. E representa cerca de 10% do petróleo que é adquirido. Por outro lado, não há contadores nas petrolíferas e nas refinarias que se comparem aos contadores de energia eléctrica, para já não dizer que todo aquele negócio é um pouco da cor do petróleo.