Sunday, July 27, 2014

CARLOS SILVA

Antes de sair de casa à procura da residência que nos tinham indicado, pedimos ajuda à internet e, munidos do print do itinerário recomendado pela electrónica lá fomos confiantes e a horas de não falhar a hora combinada. Já nas próximidades do local de destino, começaram as complicações na primeira rotunda. Será por aqui ou por ali? Deve ser por aqui, para o centro. Não era. Por sorte, encontrámos algumas voltas depois três polícias em tranquila cavaqueira, e um deles, o mais novo, deu-nos indicações para voltar para trás, depois sobe, depois corta à direita, depois corta à esquerda, depois ... depois é por aí, é uma questão de ir lendo as placas. E era por ali, mas até lá passámos por várias ruas sem qualquer identificação nas esquinas. Será esta? É rua ou avenida? É avenida. Então deve ser larga? Nem sempre. Se o homenageado foi tido por graúdo na altura da consagração, se não há avenida por nomear, ou ele morou ou andou por ali,  promovem uma rua a avenida. Deve te sido  esse o caso: a avenida é uma rua, aliás com trânsito, em grande parte da sua pequena extensão, num só sentido, obrigando o automobilista a contornar o bairro para descer a avenida de um sentido só.

- Quem foi este Carlos Silva?
- Não faço a mínima ideia, Carlos Silva há, e sempre houve, muitos.
- Este costume de dar a cada rua, ruela, ou beco sem saída, o nome de um sujeito que não passou à história baralha qualquer um que procure uma morada e não esteja munido de GPS actualizado ou não encontre polícia ou carteiro por perto.
- Hum! Não estás em Nova Iorque ou Washington DC. Aqui, às vezes, nem a vizinhança consegue ajudar. Quanto a glorificar em placas os nomes de efémeros pequenos notáveis é um hábito que os políticos não dispensam: por um lado, enquanto vivos cortam fitas e descerram placas evocativas da sua passagem por todo o lado,  e, por outro, logo que apanham um corelegionário morto tratam de lhe por o nome na esquina duma rua para que não se esqueçam deles quando chegar a sua vez.
- E depois, ao fim de pouco tempo, a vez de serem só nomes de quem ninguém sabe quem foi.
- Li ontem no Expresso que em Lisboa o número de nomes candidatos a um lugar na toponímia  da cidade excede largamente o número de ruas por nomear. A cidade não cresce, a população envelhece,  e a lista de espera de notáveis mortos não para de crescer.  De modo que a Câmara decidiu agora atribuir às freguesias, alguma coisa elas terão de fazer, a incumbência de escolher os preferidos. Os preteridos serão glorificados na denominação de bairros, conjuntos arquitectónicos, equipamentos e infraestruturas de ensino, saúde, culturais e desportivos, os parques e recintos associados a áreas verdes, de recreio e lazer, as pontes e os viadutos. A colocação de placas evocativas serão também alternativas para os não contemplados com a placana esquina de um beco, rua ou avenida. 

- Subdesenvolvimento cultural?
- Não, não é. É cultural. A cultura não é sobre nem subdesenvolvida. E nós por cá continuamos assim.

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