No Expresso do passado Sábado, 21, foram publicados dois artigos, na mesma página, sobre o novo Tratado Europeu: 1 -"Texto do novo Tratado é difícil de perceber" , 2 - "Constitucionalistas querem referendo".
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No primeiro, pode ler-se, por exemplo, que Manuel Lobo Antunes, o Secretário de Estado para os Assuntos Europeus considera que o texto se tornou "mais complexo" (relativamente ao rejeitado Tratado Constitucional), porque resulta da revisão dos anteriores tratados. A Constituição era um texto único, este é mais um tratado, cujas emendas são feitas sobre os tratados anteriores.
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É por demais evidente que a leitura de um tal documento, se é difícil para os iniciados nas matérias, é inextrincável para o cidadão comum. Parece, portanto, absurdo que alguém defenda a ideia bizarra de submeter a referendo um tratado, demais a mais resultante de muitas discussões técnicas e políticas, de negociações e cedências mútuas em que participaram, e vão continuar a participar até à assinatura do Tratado, se vier a ser assinado, representantes dos 27 países envolvidos.
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E, no entanto, ilustres constitucionalistas defendem um exercício para o qual, de modo algum, os
cidadãos não estão minimamente habilitados a realizar. É o caso de Jorge Miranda que " avança três razões em defesa do referendo: as alterações introduzidas "foram mais cosméticas que outra coisa" (relativamente ao rejeitado Tratado Constitucional), houve um "compromisso eleitoral dos maiores partidos" e efectuou-se uma revisão constitucional em 2004 com uma disposição transitória "expressamente para permitir o referendo".
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Quer dizer: o referendo não se justifica porque é um meio insubstituível de votação democrática mas porque fez parte do pacote de promessas eleitorais.
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Sabemos todos que de promessas estão as campanhas eleitorais cheias e nunca ninguém foi preso por não as cumprir. E se é certo que um incumprimento não justifica outro, também é certo que a votação se fez para um conjunto de propostas e, eventualmente, uma ou outra seria maioritariamente rejeitada se tivesse sido votada em separado.
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Muito, provavelmente, o bom senso colectivo rejeitaria a incumbência de votar em referendo uma matéria claramente muito complicada. E digo muito provavelmente porque, mesmo em assuntos onde as questões são bem mais fáceis de apreender pela generalidade dos cidadãos, os referendos têm tido votações baixíssimas.
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Que o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista, o CDS, e outros partidos com menor expressão eleitoral, anseiem por todas as oportunidades que lhes dêm visibilidade, percebe-se. Que ilustre professores de Direito façam coro com eles já é mais difícil de entender.
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No fundo, e salvo, talvez, o BE e o PC, muitos daqueles que defendem o referendo ao Novo Tratado Europeu , supõem que, em referendo, o Sim está garantido. Admitamos, porém, que por alturas do referendo o Governo está desgastado e os cidadãos descontentes. E que na votação em referendo se repercutirá esse mesmo descontentamento interno, e é, maioritariamente, Não. Saímos da União Europeia?
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A adopção do referendo ao Tratado Europeu é uma ameaça à continuação da União Europeia. A menos que, quem vote Não, saia.
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Quem defende o referendo era por aí que deveria começar.