Wednesday, October 31, 2018

ALIÁS


Aliás, 13

OUTUBRO 31, 2005


O PRESIDENTE PODE

“Se não for cobarde o Presidente pode…”


Leio esta frase na crónica dominical de António Barreto no “Público” do passado domingo, 23 de Outubro, e constato que ninguém reagiu ou eu não dei por isso.
E, no entanto, a gravidade dos termos pareceria dever suscitar reacção equiparada. Nos tempos em que a defesa da honra se sobrepunha à defesa da vida, alguém teria obrigado AB a um duelo.
Nos dias de hoje, contudo, o instinto de sobrevivência sobrepõe-se a tudo e a honra anda pelas ruas da amargura. Duelos, só verbais, e mesmo assim, com todas as cautelas, não vá alguém ficar arranhado.
Algumas questões elementares se podem, no entanto levantar a propósito da acção possível do Presidente sobre, por exemplo, a decência na política em Portugal.



Se o Presidente tivesse dirigido à Assembleia da República uma mensagem exortando aqueles que, vergonhosamente, apresentaram contas por viagens fictícias, a demitirem-se por peculato, os casos Marco de Canavezes, de Felgueiras, Oeiras e outras roubalheiras teriam acontecido?



Se o Presidente tivesse, em nome da decência política, denunciado publicamente a contradição entre as promessas (de Durão) de não aumento dos impostos e a prática oposta logo que ganhou as eleições, aumentando-os, teria Sócrates procedido exactamente do mesmo modo passado pouco tempo, quando chegou o seu tempo?



Se o Presidente tivesse exortado os agentes da Justiça a procederem de forma que a Justiça exista, teríamos tantos processos acumulados, tantos prescritos, tanta descrença, tanta falta de sentido de Estado?



Se o Presidente, antes de promulgar, perguntar porquê, assistiríamos a esta corrida oportunista dos autarcas para salvaguardar o seu regime especial de reforma antes da entrada em vigor de novas condições, aproveitando o propositado relaxe das entidades por onde transitaram até chegar até ele?



Se o Presidente, eleito por sufrágio universal, usar todos os poderes que a Constituição lhe confere, não poderemos passar a viver num País mais decente, mais justo e mais próspero?



Para exercer tão alto cargo é preciso assim tanta coragem?



Não é. Basta cumprir o juramento.

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