Tuesday, August 16, 2016

FOGO NA FLORESTA

Pedro L.,

Talvez por ter nascido e vivido até à maioridade num mundo rural tenho uma perspectiva parcialmente diferente da sua.
Concordo consigo que, para ter campos e florestas cuidadas, é preciso que a exploração agrícola e silvícola seja racionalmente financeiramente apoiada. Para isso são precisos recursos e políticas redistributivas nesse sentido. E reestruturação da propriedade fundiária. 
Quem é que tem coragem para entrar nesse fogo?

Mas discordo quando afirma que "o mundo rural tem campos cuidados". 
Em Portugal?
Tem alguns, sim senhor, mas são excepções que confirmam a regra. A regra é ainda a exploração deficiente e, em muitos casos, o abandono.

Quanto à propriedade florestal, quem a quiser abordar com critério tem de começar para encarar uma realidade que está fragmentada em cerca de 360 mil propriedades. A título comparativo, os EUA, cem vezes maior, têm um número semelhante de proprietários florestais. 

Os fogos florestais ocorrem mais a sul que a norte porque as condições climatéricas - mais calor, menos humidade, mais vento - encontram enormes quantidades de combustível sob a forma de biomassa seca não retirada da floresta. E a lei é esta: se lá continua, o que não arde num ano, arderá no próximo ou nos próximos.

Enquanto subsistir uma tal fragmentação da propriedade não há condições para implementar políticas preventivas sérias. 
Li há dias no Expresso que o Governo está decidido, e o PR aprova, a entregar as propriedades abandonadas aos municípios.
Será uma fuga em frente para um desastre ainda maior.
Porque nem os municípios são competentes para gerir a floresta nem com a entrega das propriedades abandonada são criadas condições para o necessário emparcelamento racional da propriedade. 
Aliás, a relativamente reduzida (2%) parcela da propriedade florestal do Estado, não é resultado exemplo de boa gestão.    

(Diga-se, de passagem, que, em coerência, não se percebe porque não decide o Governo entregar aos municípios as propriedades urbanas abandonadas. Se a razão é o risco de incêndio, tudo arde, até as florestas de automóveis. Aliás as muitas propriedades públicas urbanas abandonadas são também outro mau exemplo da gestão pública da propriedade)

Uma exploração agrícola ou silvícola, mesmo apoiada financeiramente pela comunidade, requer dimensão crítica, e nisto não se diferencia em nada de qualquer outra actividade económica. A agricultura e a silvicultura são hoje actividades de capital intensivo e não de mão-de-obra intensiva.
A sua gestão requer conhecimento e competência.

Ainda há, lamentavelmente, muita gente a pensar que o sector primário é essencialmente para subsistência de gente não qualificada.


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