Friday, November 25, 2016

RIQUEZA ENVERGONHADA

Aqui próximo da área em que resido há uma propriedade ladeada por um muro alto, talvez quatro metros, laranja ocre, sempre bem cuidado. Visíveis da estrada, tem dois portões, mas só hoje, de relance, quando passei de carro defronte daquela que julgo ser a entrada lateral, percebi que por detrás dos muros da fortaleza se esconde uma majestosa mansão que deve ter sido construída no tempo da outra senhora. Nas proximidades há outros muros longos e altos que devem esconder outras propriedades da mesma geração onde só o google, suponho, é capaz de meter olho míope. 

Não são apenas as fortunas antigas que escondem as residências dos olhares de quem passa. Se há portugueses que exibem, sem complexos de qualquer dimensão, e, talvez, até com orgulho ou demonstração ou presunção de sucesso, as mansões em que habitam, há outros que rodeiam os edifícios de muros tamanhos ou paliçadas de vegetação cerrada. 

A pobreza envergonhada esconde a perda de bens ou rendimentos que a posicionavam em escalão alto ou remediado da sociedade e que se viu privada, por razões diversas, do suporte financeiro que lhe dava prestígio social, apartando-se discretamente da sociedade a que pertenceu. 
Da riqueza envergonhada não se ouve falar. E, no entanto, ela existe e esconde-se, sabe-se lá porquê, em mansões requintadas mas camufladas na paisagem. 

Nos EUA, e em geral nos países do norte da Europa, os proprietários de moradias, desde as mais grandiosas às mais discretas, não as escondem e percebe-se até a intenção de as fazer participar no prestígio dos locais em que se situam. Por cá, os muros escondem a beleza de muita riqueza estética que o conjunto poderia, sem perda de valor para os proprietários, dar ao meio em que se insere.
Há pudor neste recolhimento de alguns muito ricos, simétrico daquele que leva a marginalizar-se quem perdeu o que tinha?

Relembrei-me disto quando ouvi esta manhã na rádio que o sr. António Domingues continua sem apresentar as declarações que deve. Riqueza envergonhada de quê, neste caso? À custa de que pobreza envergonhada?


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